segunda-feira, 31 de agosto de 2009

À CIDADE DA BAHIA

Gregório de Mattos
Triste Bahia! ó quão dessemelhante
Estás e estou do nosso antigo estado!
Pobre te vejo a ti, tu a mi empenhado,
Rica te vi eu já, tu a mi abundante.
A ti trocou-te a máquina mercante,
Que em tua larga barra tem entrado,
A mim foi-me trocando, e tem trocado,
Tanto negócio e tanto negociante.
Deste em dar tanto açúcar excelente,
Pelas drogas inúteis, que abelhuda,
Simples aceitas do sagaz Brichote.
Oh se quisera Deus, que de repente,
Um dia amanheceras tão sisuda
Que fôra de algodão o teu capote.

A BAHIA
Gregório de Mattos

Tristes sucessos, casos lastimosos,
Desgraças nunca vistas, nem faladas.
São, ó Bahia, vésperas choradas
De outros que estão por vir estranhos
Sentimo-nos confusos e teimosos
Pois não damos remédios as já passadas,
Nem prevemos tampouco as esperadas
Como que estamos delas desejosos.
Levou-me o dinheiro, a má fortuna,
Ficamos sem tostão, real nem branca,
macutas, correão, nevelão, molhos:
Ninguém vê, ninguém fala, nem impugna,
E é que quem o dinheiro nos arranca,
Nos arrancam as mãos, a língua, os olhos.

Crise urbana: não é o fim do mundo

Antonio Risério*
De uns tempos para cá, é cada vez maior o número de pessoas que me dizem que, em matéria de crise urbana, chegamos a um beco sem saída. Estaríamos vivendo em cidades definitivamente encalacradas, à beira do colapso final.
A propósito, costumo lembrara posição de Peter Hall contra a perspectiva apocalíptica de Lewis Mumford. Em The culture of cities, Mumford argumentou que a megacidade mais não era do que uma parada ou estação na estrada para Necrópole, a cidade dos mortos. Por seu gigantismo disforme, terminaria estrangulada em suas próprias tripas urbanas. Esta visão da macrocidade estrangulada em seus próprios intestinos é retomada em A Cidade na história. “A desintegração de Roma foi o resultado final de seu supercrescimento, que resultou numa falta de função e numa perda de controle dos fatores econômicos e agentes humanos que eram essenciais à continuação de sua existência”, escreve Mumford. Para ele, “a principal contribuição de Roma ao desenvolvimento da cidade é a lição negativa de seu próprio super crescimento patológico”.
Vejam: “Todo centro megalopolitano supercrescido, hoje em dia, e toda província, fora dele, que é tocada por sua vida, exibe os mesmos sintomas de violência e desmoralização.Aqueles que fecham os olhos para estes fatos estão repetindo, com mímica exótica, justamente os atos e palavras, igualmente cegos, de seus predecessores romanos”. E ainda: “Em toda parte onde se reúnem multidões em números sufocantes... Necrópole está perto, embora não tenha ruído sequer uma pedra”.
Escrevendo seis décadas mais tarde, Peter Hall diz, em Cities in civilization, que não pode partilhar a perspectiva mumfordiana, pelo fato de que “estamos mais longe do que nunca de assistir à destruição da cidade gigante. Pelo contrário: rebatizada de Cidade Global, ela atrai desproporcionalmente as organizações que comandam e controlam a nova economia global, tanto quanto as agências de serviço especializado que as atendem; por esta razão, continua a atrair os talentosos e ambiciosos; e, justamente por isso, permanece um crisol único de criatividade”. Em Cities in civilization, Hall defende que “nenhuma espécie de cidade, ou qualquer tamanho de cidade, tem o monopólio da criatividade ou do bem viver; mas que as cidades maiores e mais cosmopolitas, apesar de todas as suas desvantagens evidentes e óbvios problemas, têm sido, através da história, os lugares que acenderam a chamas agrada da inteligência e da imaginação humanas”.
Para lembrar o milenar conceito védico, podemos dizer que Mumford aponta para o advento da kali yuga, o mais tenebroso e desgraçado entre todos os ciclos das épocas humanas. E que Hall, ao contrário, acena para uma futura idade de ouro da vida urbana, a partir da articulação ou da união de arte, tecnologia e organização. Por isso mesmo, Kotkin fala, a propósito de Hall, em The city: a global history, de um “novo otimismo”, fundado na passagem da economia industrial para uma economia baseada na informação.
Penso que o melhor é ter um olho mumfordiano e um olho halliano. E cruzá-los, sistematicamente, diante da realidade. Mas, em última análise, tendo mais para o ponto de vista de Peter Hall. Coisas decaem, sim. Cidades gigantescas, inclusive. Mas é preciso cultivar uma desconfiança essencial diante do elenco de teses que a armadilha e a realidade, simultaneamente inscritas na palavra decadência, têm gerado.
Num livro intitulado, justamente, A ideia de decadência na história ocidental, o historiador Arthur Herman escreveu: “Gostaria de salientar que, apesar de os intelectuais andarem prevendo o iminente colapso da civilização ocidental por mais de um século e meio, sua influência aumentou mais, durante este período, do que em qualquer outra época na história. Hoje, as instituições e os conceitos culturais (do Ocidente) gozam de mais prestígiodo que durante o apogeu do império europeu e suas colonizações”. Do mesmo modo que a cultura ocidental não decaiu, o grande núcleo urbano não experimentou o colapso. Nem acredito que vá experimentar. Mas também não se tem dúvida de que a crise atual das grandes cidades é complexa, tremenda eassustadora. Pode não ser o fim do mundo. Mas, com certeza, é o fim de um mundo.
* Escritor, poeta e antropólogo.
Artigo publicado no jornal A Tade de 31/08/2009

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Valência, Salvador e a Copa

Marcus Alban
No último domingo, com Rubens Barrichello vencendo o Grande Prêmio de Valência, pudemos novamente gozar da sensação de estar no centro dos grandes esportes globais. Mas o GP de Valência não deveria ser percebido apenas pela vitória de Barrichello. Ocorre que em Valência vimos também um verdadeiro exemplo de como sediar grandes eventos desportivos.
Eventos desportivos, como a Fórmula-1, as Olimpíadas e a Copa, são na atualidade empreendimentos extremamente custosos, em si deficitários, e que, por isso mesmo, não se viabilizam apenas com recursos privados. Mesmo assim, são cada vez mais disputados por cidades e países interessados em sediá-los. A razão desse aparente paradoxo é que esses eventos têm também enormes externalidades positivas.
Assim, se bem planejados, eles podem transformar os déficits de curto prazo em virtuosos superávits de longo prazo.
A principal externalidade desses eventos é certamente a mídia espontânea que eles geram.
É por isso que eles são tão demandados por cidades turísticas. Se uma cidade é turisticamente atrativa, ou potencialmente atrativa, com o evento se monta a infraestrutura necessária – inclusive no tocante aos atrativos –, e na realização do mesmo se divulga ao mundo, praticamente sem custos, um novo destino a ser conhecido por todos. Em linhas gerais, foi exatamente esse o processo vivido por Valência.
Como toda cidade mediterrânea, Valência de há muito possuía uma economia turística.
Esta, entretanto, era basicamente voltada para o mercado interno. Para reverter esse quadro, espelhando-se em Barcelona, a partir dos anos 90 ela passa a implementar toda uma estratégia de desenvolvimento que, entre outras ações, irão implicar: a dinamização de seu centro histórico, a implantação da Cidade das Artes e das Ciências (fotos)– com os grandes projetos de Calatrava – e a reconfiguração, para atividades de cultura e lazer, de sua antiga zona portuária.
Com essas intervenções, Valência, ainda mais bonita, tornou-se uma das cidades mais modernas e cosmopolitas da Europa, e de maneira bastante planejada vem se divulgando nos últimos anos através da atração de grandes eventos como a America’s Cup e mais recentemente a Fórmula-1. Esses eventos, naturalmente, ocorrem no entorno das recentes intervenções. Assim, quem no domingo viu a vitória de Barrichello viu também a moderna orla da cidade e boa parte dos projetos escultóricos do Calatrava .
Tudo isso, é claro, tem muito a ver com Salvador.
Somos uma cidade de graves problemas, mas com grande potencial cultural e turístico e devemos ser uma das sedes da Copa em 2014.
Temos, portanto, uma chance fantástica de dar uma grande virada na cidade. Para isso, porém, é preciso desenvolver a cidade e os seus atrativos e, até o momento, não temos sequer a estratégia para tal. Infelizmente, continuamos apenas com a discussão do estádio, correndo o risco, quem sabe, de termos a Copa em Pituaçu, onde mostraremos ao mundo o nosso belo CAB, que nem se fez no propalado GP da Stock Car.
Artigo publicado no jornal A Tarde em 25/08/2009

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Cidades Sustentáveis

Osvaldo Campos Magalhães
Inspiradas no modelo do movimento "Bogotá Como Vamos", diversas organizações da sociedade civil brasileira vem estruturando movimentos sociais voltados para a transformação e sustentabilidade das cidades onde atuam.
Principal responsável pela revitalização da capital colombiana, este movimento social esteve à frente das transformações pelas quais passou a cidade desde o início da década de 90, mudando para melhor a vida dos habitantes de Bogotá.
Entre as principais iniciativas podemos destacar o sistema de transportes Transmilênio, as redes de bibliotecas e ciclovias, os parques, além da implementação de programas sociais e de fomento à cultura. Os projetos que promoveram as mudanças em Bogotá lhe renderam o prêmio de Leão de Ouro na Bienal de Arquitetura de Veneza, em 2006.
No Brasil, é em São Paulo que se estruturou o mais avançado movimento social urbano. Integrado por cerca de 550 organizações da sociedade civil, o Movimento Nossa São Paulo, criado em 2007, vem servindo de inspiração para diversas cidades brasileiras. O movimento social da capital paulista tem como principal objetivo a construção de uma força política, social e econômica capaz de comprometer a sociedade e sucessivos governos com uma agenda e um conjunto de metas a fim de oferecer melhor qualidade de vida para todos os habitantes da cidade, recuperando para a sociedade os valores do desenvolvimento sustentável, da ética e da democracia participativa.
Em 2008, em Belo Horizonte, foi fundada a Rede Social Brasileira por Cidades Justas e Sustentáveis. Formada por movimentos de 21 municípios, entre eles Ilhéus na Bahia, a rede é integrada por organizações plurais e apartidárias que aglutinam vários atores sociais de cada localidade. Além da troca de experiências, a rede vem contribuindo para o fortalecimento do movimento em cada município. Os principais focos de intercâmbio estão centrados na metodologia de construção e acompanhamento de indicadores; ampliação do conhecimento sobre o Plano Plurianual e o Programa de Metas dos municípios, bem como a reflexão sobre instrumentos de democracia participativa.
Uma das principais iniciativas da Rede foi o estabelecimento de Programa de Metas em cada cidade, que obriga os prefeitos a divulgarem um plano de governo adequado ao Plano Plurianual em até 90 dias após assumirem o cargo e prestarem contas à população a cada seis meses. Em São Paulo e outras seis cidades o programa já é lei municipal.
Em Salvador, cidade com graves problemas sociais e administrativos ainda não foi estruturado um movimento social similar.
Tendo sido realizado em maio, na Reitoria da UFBA, uma reunião inicial, com palestra do intelectual colombiano Bernardo Toro, aguarda-se que as organizações da sociedade civil soteropolitana consigam estruturar um movimento capaz de liderar e promover as transformações sociais, econômicas e culturais que nossa capital tanto demanda.
Osvaldo Campos Magalhães – Coordena o Núcleo de Estudos em Logística, Transportes e Tecnologias Sustentáveis –NELT : nelt.oscip@gmail.com
Artigo publicado no jornal A Tarde de 24/08/2009

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

SUAVE COTIDIANO - Um ano sem Caymmi

Stella Caymmi*
A viida de Dorival é bem simples. Não há grandes mudanças na sua rotina não importando se está em Copacabana, Pequeri ou Rio das Ostras. Costuma acordar por volta das seis da manhã. Até antes. Fica na cama, esperando o movimento da casa começar para não acordar ninguém. Faz, em silêncio, a Oração da Manhã que conhece desde menino: Depois da oração, medita e espera pelo café da manhã. Por causa da diabete, não costuma abusar na alimentação. Mas sempre que pode não dispensa uma balinha ou lascas de rapadura, pacientemente cortadas por Cristiane, que trabalha na casa há anos, e colocadas num vidro que fica em seu escritório. Disciplinado, não comete extravagâncias. Sabe se conter. É metódico. Gosta de se aproximar da janela a qualquer hora do dia – critica muito quem encosta móvel interditando o livre acesso a ela. Se está em Minas, onde tem passado longas temporadas, abre a janela de manhã e enche os pulmões com o ar puro da montanha. Se passa alguém, apressa-se em acenar e recebe um alegre “Bom-dia, seu Dorival”, do primeiro passante do dia. Responde com alegria. É bom estar vivo. É uma bonita caminhada desde o mar até a montanha. Um caminho de sabedoria. As músicas que canta para os montes de Minas só ele sabe. Costuma ler. A última vez que eu perguntei, tinha relido as obras completas de Machado de Assis. À sua maneira, é tão sábio quanto o Conselheiro Ayres. Ou mais, pois não se afastou das mulheres. Observa a vida que corre. Aceita cada um como é. Nada exige. Nada impõe. É a favor da liberdade total. Perguntem a Denise, João, Juliana, João Victor, Gabriel ou Alice. Só sabe o que lhe contam. Não faz da vida alheia um alimento da sua curiosidade. Invadir, jamais. Conversa com criança pequena como se fosse gente grande. Ele as respeita. Elas o amam. Não existe melhor ombro para chorar. Eu mesma já chorei ali muitas vezes e saí consolada. Deitei, mesmo depois de adulta, na sua barriga – quando ela era grande, era ainda melhor. É um ser compreensivo. Jamais reclama. Tem um humor manso, para ser ouvido como quem escuta João Gilberto sussurrar ao violão, ou a mulher amada, como diria Vinicius. “Necessariamente, para viver feliz tem que ter o ingrediente mais sério: humor. Consulte Millôr Fernandes, que é o definitivo” – explica. Suas tiradas são inteligentíssimas. Outro dia disse: “Gostar é um fenômeno da hora”. Enxuto. Não é à toa que lê, apaixonado, a poesia dos Manuéis, o Bandeira e o de Barros. Adélia Prado é poupada, para não acabar. A Bíblia, Dom Quixote, de Cervantes, e Cândido, ou O Otimismo, de Voltaire, ordenadamente dispostos na sua mesinha de cabeceira, são sempre revisitados, fertilizando sua imaginação. “Eu sou escravo de um personagem, eu sou escravo de Dom Quixote de la Mancha” – confidenciou-me certa vez. Como Millôr gosta de dicionários, ele gosta de enciclopédias. As lê, de A a Z. Cultiva a memória. Faz palavras cruzadas. E descreve seu dia em agendas há quase quarenta anos (eu que o diga!). É um profundo admirador da tecnologia, mas não chegou ao computador. Tem preguiça. Deixa para os mais jovens. Seu ídolo é Thomas Alva Edison, o inventor da lâmpada incandescente e precursor do cinematógrafo. Conversar com Caymmi é uma arte. E quando isso acontece exige sua total atenção. É detalhista. Cinematográfico. Pinta o cenário antes de desencadear a ação no imaginário do seu interlocutor. É plástico. É um homem informado. Sabe tudo o que está acontecendo, lê jornais, revistas e assiste à televisão. Mesmo que para ler tenha de usar, além dos óculos, duas lentes de aumento, por causa de uma catarata que não pode mais ser operada. Não desgruda de Stella. Quando cochila – ele sempre cochilou – na hora da novela, Stella repete “Caymmi, vá se deitar”. Não adianta nada, ele fica ali sentadinho, até ela ir junto. Sonha em reunir a família completa para um longo fim de semana. Infelizmente isso nem sempre é possível para as agendas dos filhos, netos e bisnetos. Gosta do movimento da mulher com as amigas e colaboradoras no zelo com a casa. Alda, Cristiane, Telma, Elaine, Sonia, Celena, Mara e Vandréia lembram-lhe as mulheres de saia de sua infância. Vive rodeado de mulheres. Ainda tem Maryara, que é sua amiga que há anos, mas que só se conhecem por telefone. Uma amiga virtual. Batem longos papos. A vida para ele não teria a menor graça sem a mulher.Às vezes fica longos períodos em silêncio, com os olhos no longe. Tem uma vida interior impossível de ser comunicada. Ninguém o incomoda quando está quieto. Stella, que vive com ele há mais de 60 anos instruiu a todos da casa que quando fosse assim não o interrompessem. “Sem a ação contemplativa você não consegue reunir a capacidade de absorção. Você larga os olhos no espaço e a memória, aí, tem mais atividade” – ensina. Sobre a música, disse certa vez que “o artista não deve morrer de amor pela primeira coisa que faz”. Quando escuta Bach, seu compositor favorito, atinge regiões impensáveis para a maioria de nós. Sobre a morte, costuma dizer que já está no lucro. Tem muita consciência de si. Quem se aproxima dele percebe que está diante de um homem realizado. Ele é irresistível. Vê beleza onde as pessoas menos desconfiam. Interessa-se por pequenas coisas como a trajetória da formiga até o formigueiro carregando uma folha três vezes maior que o seu tamanho, ou com a visita do beija-flor, que costuma pousar em seus cabelos brancos. Você não sabia? Caymmi conversa com os pássaros. 16 de dezembro de 2000
Stella Caymmi - Escritora, jornalista e doutoranda em Literatura Brasileira. Autora de “Dorival Caymmi – O Mar e o Tempo” e “Caymmi e a Bossa Nova”

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Cravo Neto transgrediu códigos da fotografia

Eder Chiodetto
Artista, que morreu domingo, buscava manifestações cósmicas no cotidiano
Um momento de beleza é um momento de encontro", escreveu o artista Mario Cravo Neto, morto no último domingo em Salvador, aos 62 anos. E a beleza de sua arte, de fato, se explica em boa parte pela criação de um espaço simbólico de celebração de encontros. Sua fotografia promove de forma singular a junção entre realidades visíveis e as fronteiras do ficcional, entre mito, vida e arte. Sua percepção aguçada o levou a perceber, nos gestos cotidianos, manifestações cósmicas onde se podia entrever a origem do universo. O ancestral embutido no banal.Esse caráter metafísico de seu trabalho foi gestado, não há como negar, pelo ambiente artístico e sincrético de Salvador, na Bahia, onde nasceu, foi criado, viveu e, por fim, transformou no pano de fundo de sua obra. "Na Bahia encontra-se o que a gente tem carinhosamente em comum e não agressivamente o que tem de diferente", escreveu nos agradecimentos do livro "Laróyè" (Áries Editora, 2000), sem dúvida, um dos mais belos, importantes e vigorosos livros de fotografia já editado no Brasil. "Laróyè" é uma saudação em iorubá para o exu, entidade controversa adorada por Cravo Neto.Além do cenário, havia a família e seu entorno a contribuir. O escultor Mario Cravo Junior, seu pai, ao saber naquele abril de 1947 que sua mulher estava em trabalho de parto no hospital, optou por ficar em casa, de frente para o mar, ouvindo "Prélude à l'Après-midi d'un Faune", de Claude Debussy. Depois, levaria seu pequeno "fauno" para conviver com artistas e intelectuais de sua geração como Jorge Amado, Pierre Verger, Carybé e Pietro e Lina Bo Bardi, entre outros tantos.Trabalhando em paralelo com a escultura e a fotografia desde os 17 anos, Mariozinho, como seria sempre chamado pelos mais íntimos, aprimorou seus estudos após morar em Berlim com o pai e rodar a Europa. Estudou com o fotógrafo Max Jacob e com o pintor modernista italiano Emilio Vedova (1919-2006). Em 1968, estudou na Arts Students League, em Nova York.Num dado momento da carreira, percebeu que seria impossível manter em paralelo as atividades de escultor e fotógrafo. Optou pela segunda. "Jorge Amado, assim como outros, gostavam de minhas fotos e diziam que eu devia me dedicar só a ela", contou.Um sério acidente de carro em 1975 o deixou com as duas pernas quebradas e sobre uma cama por cerca de um ano, levando-o à fotografia de estúdio. Iniciou assim as séries em preto e branco "O Fundo Neutro" e "Meus Personagens", as mais conhecidas de sua trajetória e que constam nas mais prestigiadas coleções particulares e públicas do mundo como a do MoMA (Museu de Arte Moderna de Nova York), a do Tokyo Institute of Polytechnics, a da Fundação Cartier (Paris), entre muitas outras.Arte colecionávelNo contexto da fotografia de arte brasileira, Cravo Neto tem uma importância fundamental: foi um dos primeiros a ter sua obra valorizada pelo mercado de arte internacional, a introduzir no Brasil a ideia da fotografia como objeto de arte colecionável, a discutir tiragem, qualidade de cópia etc.Para além desse aspecto, a obra de Cravo Neto continuará a ser uma chave fundamental para se discutir um tipo de arte que utiliza elementos mínimos para expressar a ancestralidade do homem, seu lugar no universo, a poética que envolve a noção de passado e futuro etc.Foi assim, por exemplo, que se deu sua incursão no candomblé. Ao fotografar os ícones ritualísticos da religião afro-brasileira, Cravo Neto buscava de forma muito peculiar conectar objetos, pessoas, atmosfera, símbolos e mitos organizados em sua beleza escultórica para celebrar a pulsão de vida da matéria. A morte como parte dessa pulsão, um ciclo que não cessa.Com Cravo Neto, a fotografia transgrediu códigos e ampliou suas possibilidades de representação. São raros os artistas que conseguem ampliar o repertório de sua arte dessa maneira. E raros artistas não morrem jamais. Laróyè!
Publicado na Folha de São paulo , em 11/08/09

Música Falada terá Gil em setembro

Show intimista em linguagem teatral. Assim é o Música Falada. O projeto que já contou com a participação de Ivete Sangalo, Durval Lelys, Carlinhos Brown, entre outros, ganha novo cenário na sua terceira edição, mas arrojado e confortável, com uma arquibancada de estrutura tubular e capacidade para 100 pessoas. Em 2009 o palco do Música Falada já recebeu Margareth Menezes (04 de agosto), e terá ainda, Gilberto Gil (01 de setembro)e Marcelo Nova (06 de outubro). O evento acontece a partir das 21h no Teatro Castro Alves e os ingressos custam R$ 60,00 (inteira) e R$ 30,00 (meia).
O projeto que leva a assinatura de Fernando Guerreiro, direção artística, Jonga Cunha, na direção musical e André Simões, na direção executiva, pretende levar 1500 pessoas ao Teatro Castro Alves, em Salvador. A estrutura será a mesma, os artistas se apresentam com uma banda reduzida, conversando com o público, cenas que, muitas vezes, passam despercebidas nas mega-estruturas montadas para esses artistas.
No palco, uma arquibancada recebe convidados, parentes e amigos da atração da noite. Os artistas que são acostumados a shows para multidões, em cima de trios elétricos ou em grandes casas pelo mundo afora, terão a oportunidade de cantar e contar suas histórias, para uma platéia menor, além de apresentar músicas que marcaram as suas vidas.

Livro define diretrizes para o turismo em Salvador e entorno

“Pretendemos que este seja um documento de posicionamento do setor privado sobre as necessidades imperiosas do turismo e de diálogo aberto com o poder público e a sociedade. Mais do que isso, esperamos conscientizar sobre a necessidade da preparação de um poderoso Plano de Marketing de Destino de Salvador e entorno que culmine na criação de uma eficiente entidade de gestão público-privada do turismo em um futuro próximo”, afirma Xavier Veciana, presidente do Cluster de Entretenimento, Cultura e Turismo da Bahia , que lançou o livro Diretrizes Estratégicas para a Promoção de Salvador e Entorno. Editado pelo Sebrae, a publicação traz as diretrizes estratégicas desenvolvidas pelas lideranças do turismo da Bahia, associadas do Cluster, para a gestão público-privada de um novo modelo de turismo sustentável para a Bahia, permitindo assim melhorar de forma permanente a competitividade do destino, a satisfação dos visitantes e os resultados econômicos do setor no Estado.As diretrizes são: atratividade, marketing, produtividade e gestão, acompanhadas de oito macroestratégias .
De acordo com o livro, a Bahia se posicionou como o destino turístico litorâneo de maior crescimento e notoriedade do Brasil. Desenvolveu um forte planejamento e promoção de “primeira geração”, que consistiu em definir os pólos de desenvolvimento turístico do Estado e promover a demanda indiscriminada de visitantes e investidores. “A história da baianidade, do seu pluralismo étnico, da sua diversidade cultural, da sua flexibilidade humana e criatividade popular formam hoje um patrimônio único e vivo que posicionam a Bahia como um destino privilegiado para o desenvolvimento do turismo, da cultura e do entretenimento como meios de gerar riqueza e equilibrar a distribuição econômica futura em benefício de todo seu povo”, observa Xavier Veciana. Porém, segundo a publicação, o atual modelo de crescimento econômico é obsoleto, pois, assistindo passivamente ao surgimento de impactos positivos (como melhoria na qualidade de produtos turísticos e crescente número de visitantes, receitas e rendas), deixa que uma quantidade superior de impactos negativos se multiplique (como oferta turística superior à demanda, cidade em processo de deterioração e baixa ou negativa rentabilidade das empresas turísticas). O livro aponta ainda que algumas barreiras têm impedido o crescimento sustentável e o desenvolvimento da competitividade do turismo baiano, cuja origem está na falta de integração dos empresários, do setor privado com o público, dos produtos oferecidos com a demanda do mercado e das estratégias com as ações. E um agravante: a estratégia de crescimento do setor não está alimentada e dirigida por indicadores de rentabilidade, produtividade e satisfação. O livro sugere então que Salvador precisa com urgência de um plano de turismo moderno e de uma entidade de turismo eficiente e focada nos resultados. Sugere ainda serem necessárias políticas e investimentos públicos que saibam controlar e transformar as grandes forças do crescimento em um desenvolvimento sustentável que favoreça a qualidade de vida do cidadão e a qualidade da experiência dos visitantes. Segundo Xavier Veciana, os papéis e responsabilidades da sociedade civil, do Estado e do empresariado mudaram radicalmente nos últimos 20 anos. O setor de turismo na Bahia precisa de uma verdadeira mudança de paradigma para concorrer com sucesso nos mercados mundiais. Para isso é necessário desenvolver em Salvador uma estratégia inovadora de gestão público-privada. “Mostrando a realidade dos desafios enfrentados, identificando as necessidades e propondo soluções específicas, estas diretrizes traçam o caminho necessário para o sucesso do destino. Pretendem servir de base para interlocução entre os atores de turismo da Bahia para provocar uma autêntica mudança de paradigma com respeito aos modelos antigos ou de ‘primeira geração’ na gestão do turismo. Esta mudança de rumo é necessária para dirigir o desenvolvimento sustentável do turismo no Estado, a rentabilidade das empresas, a satisfação dos visitantes e a qualidade de vida do cidadão, no lugar de sofrer passivamente as conseqüências de um crescimento desordenado e perverso”, afirma Xavier Veciana.
O Cluster de Turismo, Entretenimento e Cultura da Bahia, uma associação que une os lideres empresariais com o poder publico, também foi um dos articuladores da criação dos Sete Pontos Mágicos da Bahia em parceria com o Sebrae, Prefeitura de Salvador, através da Saltur – Empresa Salvador Turismo, Secretaria Estadual de Turismo, Bahiatursa e Conselho Baiano de Turismo e Câmara de Turismo da Baía de Todos os Santos. Centro Histórico, Península de Itapagipe (Bonfim-Ribeira), Contorno-Comércio, Barra, Itapuã, Dique do Tororó e Baía de Todos os Santos foram os Sete Pontos Mágicos, eleitos por mais de 35 mil internautas de todo o mundo. O primeiro passo, participativo e proativo, para melhorar os serviços turísticos de Salvador já foi dado pelo Conselho Baiano de Turismo (CBTUR), na realização de um fam tour interno da cidade de Salvador, com a participação de diversas entidades envolvidas no setor. O resultado desta inspeção foi o levantamento das necessidades atuais para fazer de Salvador um destino mais competitivo e para alcançar sua atratividade potencial, nas áreas de:
• Infra-estrutura adequada para receber os visitantes;
• Sinalização dos atrativos;
• Segurança efetiva nas áreas turísticas;
• Fiscalização dos prestadores de serviços de turismo;
• Ordenamento da cidade referente ao fluxo turístico;
• Manutenção e limpeza do patrimônio da cidade;
• Atrativos existentes que precisam de atenção e outros sugeridos

terça-feira, 11 de agosto de 2009

11 DE AGOSTO, DIA DO GARÇOM

Almir Santos
Ele cada dia que passa, mais faz parte da vida do habitante da cidade grande.
O ritual de almoçar em casa é uma coisa que está acabando. Hoje, quando muito, reúne-se a família para o jantar, somente aos domingos ou em eventos especiais, o que é uma pena. Marido e mulher trabalham, filhos estudam, os horários são desencontrados. Durante a semana há uma grande necessidade da utilização de restaurantes e lanchonetes porque não há tempo e a correria é grande.
Não se pode, pois prescindir dos serviços do garçom. O executivo, o trabalhador o estudante, todos usam seus serviços. Também o boêmio, e como!
Faz parte de uma classe numerosa onde se reúnem os mais variados tipos.
Usam-se também muito os seus serviços no lazer, especialmente à noite. É nesse segmento que se reúnem os tipos mais engraçados, mais curiosos, mais folclóricos. Por que não dizer? Os mais espertos.
São incansáveis. Há garçons excelentes, bem qualificados, educados, mas há também outros que muito deixam a desejar.
Há os discretos e os indiscretos.
O garçom tem de falar o mínimo possível com o cliente, para não se trair, principalmente se o cliente estiver acompanhado.
"- Vai comer o Filé a Parmigiana, doutor?"
Isso não se faz. Espera–se que o cliente tome a iniciativa.
Já pensou?
"- Alô. É a esposa de Dr. João? É do restaurante que senhora esteve ontem. Ele deixou cair o talão de cheque, está aqui guardado".
Não foi com ela que ele estava.
Há os desligados. O cliente pede um bife acebolado e o garçom traz um bife à milanesa.
Outro traz um churrasco bem passado em lugar de mal passado ou uma cerveja Caracu em vez de Skol. Vinho suave em lugar de seco.
Há os que ficam de costas para o cliente, assistindo o jogo de futebol ou conversando com o colega.
Há os que erram a conta. E como... sempre para mais, é claro. Somam até a data com as demais parcelas. Incluem cuba-libre na conta de quem só consumiu chopp.
Há os que adulteram a conta.
E os discutidos 10%?
É sempre constrangedor, discutir-se se são ou não devidos.
Muitos restaurantes têm em seus cardápios em lugar bem visível. Não cobramos 10% ou Não cobramos taxa de serviço.
Nesses mesmos restaurantes, a conta emitida impressa, muito bem apresentada, vem incluída a caneta a maldita taxa.
Há ainda os caras-de-pau que ainda têm coragem de contar suas malandragens.
" Imagine, doutor. Fui garçom do Clube Harmonia de Tênis em São Paulo ".
" Trabalhei em Caldas Novas em Goiás. Me armei".
Principalmente na noite vivi muitas histórias.
Uma aconteceu na tranqüila Salvador dos anos 70, em frente à Lanches Bahia, esquina do Politeama de Cima e a Avenida Sete.
Era um lugar muito freqüentado por mim e meus amigos. Todos os garçons nos conheciam pelo nome e vice- versa.
Lá, como também faziam Helinho e o Gordo, deixávamos nossos recados e informávamos a nossa direção por intermédio de Ailton, Barbosa, Crush, Lourival e outros. O advento do celular ainda não tinha chegado.
Nesse dia estava sendo atendido dentro do carro, ao lado de uma linda jovem de olhos azuis, por Lourival, que a meu ver, era o mais simpático e o mais atencioso.
Quando me trouxe a conta senti que havia na mesma um erro grosseiro.
Delicadamente, falei com o Lourival sobre a minha observação, que não questionou em corrigir o erro, pedindo-me desculpas pelo incidente.
No dia seguinte, sozinho, voltei à lanchonete, lembrei-me do ocorrido e perguntei ao Lourival: - rapaz, você, meu amigo, ontem queria me roubar, não foi?
Ele deu uma risadinha sem vergonha e respondeu: - o senhor estava tão empolgado, com uma namorada nova, com cara de americana, pensei que não ia conferir a conta.
Para esse fato só tinha uma única resposta: - você é um bom....
Com tudo isso, pela sua franqueza, simpatia e competência, continuou sendo o meu garçom preferido

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Indicação do blog: Escândalo - A comédia da mulher só

Uma mulher de mais de 30, bonita, independente, interessante e… só. Acompanhada de suas muitas histórias, de fantasmas sentimentais e de uma vontade imensa de amar e ser amada, essa mulher e sua solidão escolhida é a personagem que traz Cristiane Mendonça aos palcos, ao lado do diretor Fernando Guerreiro e do autor Elisio Lopes Jr., parceiros de longas datas da atriz. O espetáculo Escândalo – A comédia da mulher só, estreiou no dia 24 , reinaugurando o Goethe Café, no pátio do ICBA, espaço que já foi um dos principais cenários culturais da Bahia na década de 70 e agora volta revigorado. De sexta a domingo às 20:00 horas.
Segundo Fernando Guerreiro, responsável pela direção geral,"... o amor sempre me interessou enquanto prática e enquanto assunto. Terreno movediço, seara pantanosa, região indecifrável, o coração dos amantes debocha da lógica e do sentido. Escândalo é uma investigação teatral da solidão, da ausência do amor, dos desencontros e tentativas de encontros e de como isto inspira poetas, compositores desde que o homem se entende como tal."
Para Elísio Lopes Jr," ... o texto que escreví fala de mulheres que existem que trabalham em bancos, são professoras, mães, solteiras ou divorciadas. Para falar das mulheres de hoje só misturando amor, poesia e música. Não tinha outro caminho...
A direção do espetáculo é de Fernando Guerreiro. O gênio mais caótico que conheço. Meu mestre! ..."

domingo, 9 de agosto de 2009

Morre em Salvador Mario Cravo Neto

Faleceu hoje, o fotógrafo e escultor baiano Mario Cravo Neto, vítima de câncer, no Hospital Aliança em Salvador. Nascido em 1947 na cidade de Salvador, onde viveu e trabalhava, foi criado no ambiente artístico de sua cidade natal, onde iniciou suas primeiras experiências em escultura e fotografia aos dezoito anos de idade. Nesta época, o seu pai o escultor Mario Cravo Júnior, tendo sido convidado para tomar parte no programa "Artists in Residence" patrocinado pela "Ford Foundation" e o Senado de Berlim Ocidental, viaja para a Alemanha com toda a família. É em Berlim que Mario Cravo Neto, além de dedicar a maior parte do seu tempo ao trabalho criativo, experimenta o contato com artistas e intelectuais vindos de outras partes do mundo. As viagens à Espanha e à Itália empreendidas por sua família e o contato direto com os artistas Emilio Vedova e o fotógrafo Max Jakob, tambem residentes em Berlim, alargam os horizontes do jovem Mario Cravo Neto. Retorna ao Brasil em 1965 e finaliza seus estudos secundários. Em 1968, muda-se para New York para estudar na Art Student League sob a orientação do artista plástico Jack Krueger, um dos precursores da arte conceitual em New York. Este período de dois anos foi de importância fundamental para o delineamento de sua vida futura como homem e artista. São desta época, as séries de fotografias em cores intituladas "On the Subway" e as fotografias em preto e branco relacionadas ao aspecto da solidão humana na grande metrópole. É em seu estúdio no Soho que desenvolveu, paralelo à fotografia, as esculturas em acrílico, baseadas no processo do "terrarium" que envolve o crescimento de plantas vivas em ambientes fechados. Retorna ao Brasil em 1970, vítima de um esgotamento nervoso e pela primeira vez mostra na IX Bienal Internacional de São Paulo a instalação das esculturas vivas realizados em New York. Devido ao acidente automobilístico no dia 31 de março de 1975 Mario Cravo Neto interrompe a sua atividade profissional e é forçado a permanecer na cama com ambas as pernas quebradas. Após o período de um ano de convalescença e, impedido de dar continuidade às suas pesquisas anteriores, direciona a sua atenção para a fotografia de estúdio e começa a utilizar nas suas instalações os objetos achados, íntimos do seu cotidiano. São desta fase a continuidade do trabalho que o artista vem mostrando no Brasil e no exterior. Fora seu trabalho fotográfico em preto e branco, Mario Cravo Neto publica seus dois livros mais recentes: SALVADOR, com cento e oitenta fotografias coloridas de página inteira, e texto de Jorge Amado, Padre Antônio Vieira e Wilson Rocha. LARÓYÈ , com cento e quarenta fotografias em cores de pagina inteira e texto de Edward Leffingwell e Mario Cravo Júnior. The Eternal Now (2002) é a mais completa monografia da obra em preto e branco do artista, com 136 fotografias em preto e branco e texto de Edward Leffingwell. Na Terra sob Meus Pés (2003), com 55 imagens digitais, em cores e em preto e branco, e texto de Ligia Canongia, direciona o trabalho do artista a uma perspectiva ainda mais abrangente. Trance-Territories (2004) contém 88 fotografias realizadas no Axé Opó Aganju e textos de Ildásio Tavares e do autor. O Tigre do Dahomey – A Serpente de Whydah (2004) traz 59 fotografias sobre a temática mencionada, com textos de Mario Cravo Junior, escultor e pai do fotógrafo, Ildásio Tavares, poeta e Otun Oba Aré do Axé Opô Afonjá, e do próprio autor.
Na obra do artista baiano, há uma cumplicidade afetiva com o objeto fotografado. É o profundo conhecimento do universo que retrata que permite a ele criar imagens que combinam rigor técnico e formal a uma forte carga emocional. Cravo Neto era conhecido pelo olhar único com que retratava a religiosidade afro-brasileira. “A fotografia de Mario Cravo Neto não pode jamais ser pensada como um exercício de maestria técnica. É o veículo utilizado para materializar idéias, visões e arranjos da realidade. Não devemos nos prender a princípios formais para apreciar sua obra, apesar da destreza com que cria imagens que nos seduzem, ora por uma sensualidade que as torna deliciosamente táteis, ora por uma solenidade particular do objeto retratado”, diz a curadora Solange Farkas.

sábado, 8 de agosto de 2009

Hora de estadualizar os portos

LUIZ WALTER COELHO FILHO*
Em 1808, nos idos da Colônia, a Bahia foi precursora da abertura dos portos brasileiros às nações amigas com a Carta Régia assinada por dom João VI. Hoje, quando o sistema portuário responde pela quase totalidade do comércio exterior brasileiro, o desafio que se impõe é controlar os próprios portos – Salvador, Aratu e Ilhéus – para que possa ter nas mãos as rédeas do desenvolvimento.
Quando se deu a privatização dos portos, há cerca de 15 anos, a expectativa era que o regime de concorrência modernizasse e ampliasse a competitividade dos portos. Na Bahia, houve evoluções, mas os investimentos não foram suficientes para neutralizar a crescente evasão de cargas. Perderam-se posições para os portos tradicionais, como Santos e Rio de Janeiro, mas sobretudo para Suape, em Pernambuco, e Pecém, no Ceará, ambos portos controlados pelos governos estaduais.
Essa nuança, o controle do Estado, não pode ser ignorada. Em parte, porque o ministro Pedro Brito, da Secretaria Especial de Portos, tem expressado que os portos concentradores de cargas no Nordeste serão Suape e Pecém.
Aparentemente considera os portos baianos de escassas dimensões, portanto, secundários.
Por outro lado, os conflitos entre a administração federal, materializados na Codeba, e o governo do Estado, a despeito das pressões do empresariado pelo investimento em infraestrutura, vêm impedindo a duplicação do Porto de Salvador e a modernização dos outros portos. Afigura-se indispensável a unidade de gestão.
Há ainda um terceiro aspecto. O centro econômico da Bahia está localizado no contorno da Baía de Todos-os-Santos. As zonas de influência dos portos de Salvador e Aratu praticamente coincidem com a geografia do centro econômico, variando em função da competitividade relativa com os portos de Suape, Pecém, Vitória e Santos. Como o interesse do Estado é não perder a movimentação portuária, precisa atrair rotas, navios e cargas para os seus portos, o que pode ser fortalecido pelo controle dos portos. Caso contrário, a tendência a perder posições será inevitável e, com isso, perdem a economia baiana, a sociedade, o empresariado e o governo.
Trata-se de um tema de relevância estratégica.
Além da ampliação do Porto de Salvador, da necessidade imperativa da concorrência e da questão legal, respaldada pela legislação portuária, há uma questão política mais ampla. O desenvolvimento da Bahia não pode ficar encalhado numa trama em que os portos do Estado são controlados por um ente federal que tende para a acomodação regional de interesses.
Por esta razão, precisam ser controlados pelas autoridades estaduais. É uma forma concreta, e segura, de contornar o atual impasse da ampliação dos portos e, ao mesmo tempo, de assegurar à economia baiana, como um todo, a infraestrutura para continuar a crescer. É hora de trabalhar pela mudança.
*Luiz Walter é sócio do escritório MMC&Z, é advogado especialista em legislação portuária, coautor do livro Abertura dos Portos 200 Anos - Artigo publicado no Jornal A Tarde

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Fonte Nova ficará pronta em 2012

A construção do novo estádio da Fonte Nova, interditado desde a tragédia de 2007 quando parte da arquibancada ruiu e matou sete torcedores, custará R$ 550 milhões e terá financiamento do BNDES. O edital para consulta pública, com prazo de 30 dias, será publicado na próxima semana, já que a obra será conduzida através de uma parceria público-privada (PPP). O edital de licitação sai em setembro, que é o prazo exigido pela Federação Internacional de Futebol (Fifa).
A cobertura do estádio, estimada em R$ 100 milhões, será feita com base no Estádio de Hanover, na Alemanha. Em relação ao aproveitamento de 40% do estádio original, estudos feitos demonstraram que isso não será possível, e a demolição derá de 100%. A Fifa exige que também seja retirada a pista de atletismo, para que as arquibancadas fiquem mais próximas do campo. Outra exigência da nova Fonte Nova, é que o estádio terá cerca de 55 mil assentos., com uma distância de 50 a 60 cm entre cada torcedor.
O vencedor da licitação deverá arcar com a demolição, com o projeto executivo e com os estudos de impacto ambiental. O estádio estará pronto em dezembro de 2012.

Arquiteto cria projeto ousado para o novo estádio do Barcelona

O arquiteto e também sócio do Barcelona, Emili Vidal, é autor do projeto de um novo estádio para o clube erguido em uma ilha artificial na costa da capital da Catalunha. A nova arena foi proposta à diretoria do clube e teria capacidade para aproximadamente 150 mil torcedores.
O estádio, além de ficar no meio do mar, será ligado ao continente por meio de uma ponte, possui formas arredondadas e uma fachada de vidro.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Chegou a hora

Samuel Celestino
Está chegando a hora. Acabou, antes de terminar, o diálogo político dos aliados PMDB e PT. Como fim de caso amoroso, resta a entrega das alianças (os cargos públicos) e cada um –Wagner e Geddel – vai cuidar das suas respectivas candidaturas ao governo baiano. E, naturalmente, das gestões do governo da Bahia e do Ministério da Integração Nacional. Há de se encontrar uma boa solução para a bancada peemedebista na Assembleia Legislativa. Há radicais, como a deputada Maria Luíza, que já tem assento na bancada de oposição, e os que bancam o bombeiro, como o deputado líder do partido, Leur Lomanto Jr. Não é que Leur ainda imagine que o seu pai, o ex-deputado federal Leur Lomanto, seja presenteado, como se cogitou, com um cargo de conselheiro no Tribunal de Contas do Estado. Este sonho acabou.
Nesta sexta-feira, ou na segunda, a bancada na Assembleia decide como é que fica. O civilizado é prevalecer uma postura comedida, sem oposicionismo tenaz, e, sim, votando-se os projetos de interesse do Estado e da população baiana, e recusando aqueles considerados como “bondades”. Tudo faz crer que o caminho seja este.

Texto publicado no jornal A Tarde de 06/08/09

Entre os nomes falados para integrarem o secretariado baiano, Nestor Duarte Neto na , Seinfra, indicação de Marcelo Nilo e Jabes Ribeiro (PP)na Sicm, indicação de Mario Negromonte.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

GP da Bahia de Stock Car ganhará selo "Carbono Zero"

A primeira etapa de rua da Stock Car, que acontece no próximo domingo (09), no CAB – Centro Administrativo da Bahia –, marcará o automobilismo nacional. O evento receberá o certificado de “Corrida Verde”, pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema), por meio do programa Floresta Bahia Global. Esta iniciativa tem como objetivo recuperar florestas e reduzir a emissão de gás carbônico no meio ambiente.
De acordo com os organizadores do evento, os 30 pilotos da categoria utilizarão cerca de 20 mil litros de combustível durante a corrida, o equivalente a 45 toneladas de gás carbônico. Para anular o efeito dessa emissão no meio ambiente, serão plantadas, no Parque Metropolitano de Pituaçu, em Salvador, mais de 1,5 mil mudas de espécies nativas da Mata Atlântica.
O secretário do Meio Ambiente, Juliano Matos, afirmou que essa iniciativa inédita do Governo da Bahia passa a encorajar a adoção de mecanismos de desenvolvimento limpo (MDLs), buscando reduzir a emissão de gases que ocasionam o perigoso ‘efeito estufa’. “A ideia não é apenas contribuir para a redução de emissão de gás carbônico, mas principalmente recuperar áreas degradadas dos principais parques do Estado”, explicou.

Incremento ao turismo na baixa temporada
O Secretário de Turismo da Bahia Domingos Leonelli destaca a importância do evento a ser realizado no próximo domingo na geração de emprego, cerca de dois mil postos temporários, e o incremento do turismo durante a baixa temporada. A taxa de ocupação dos hoteis deverá atingir 100%, sendo que somente os integrantes das equipes já ocuparam dois mil leitos. As provas deverão ocorrer em Salvador nos próximos cinco anos, em função de contrato assinado entre o Governo da Bahia e a Vicar promoções, empresa que promove a corrida.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

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Salvador, a ti tocou-te a máquina mercante

Emiliano José
"Triste Bahia, oh quão desemelhante..."
Não há desordem em Salvador. Há uma ordem, uma diretriz - política - emanada do poder municipal. O prefeito e seus auxiliares sabem o que querem. Defendem uma política. Não há inocência. "A ti tocou-te a máquina mercante, que em tua larga barra tem entrado..."
E uma impressionante explosão habitacional na chamada área de expansão, a Paralela, com a conseqüente destruição de boa parte da área verde que ainda existia na região. "Tanto negócio e tanto negociante..."
Nos dias 28 e 29 de maio deste ano, um seminário promovido pelo Fórum A cidade Também é Nossa e pelo Movimento Vozes de Salvador apontou a "natureza inepta e perversa dos dispositivos do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU) no tocante à Orla Atlântica": despreocupação com a defesa do patrimônio ambiental, paisagístico e histórico-cultural, atenção exclusiva das grandes imobiliárias, desconsideração com os aspectos sociais, omissão diante do severo impacto da verticalização, permitida sem maiores estudos. "Triste, triste Bahia..Oh quão desemelhante..."
Trecho de artigo de Emiliano José no Terra Magazine
*A mudança na logomarca da Prefeitura de Salvador, saindo a "Prefeitura de Participação Popular, trabalhando para melhorar a vida das pessoas" substituida por "Prefeitura de um Novo Tempo" e logomarca que insinua a verticalização da cidade, mostra a nova diretriz do alcaide e do seu patrono. (Osvaldo Campos)

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Transformar Salvador em uma cidade justa e sustentável

Osvaldo Campos Magalhães*
Inspiradas no modelo do movimento Bogotá Como Vamos, diversas organizações da sociedade civil brasileira vem estruturando movimentos sociais voltados para a transformação e sustentabilidade das cidades onde atuam.
Principal responsável pela revitalização da capital colombiana, este movimento social esteve à frente das transformações pelas quais passou a cidade desde o início da década de 90, mudando para melhor a vida dos habitantes de Bogotá.
Entre as principais iniciativas podemos destacar o sistema de transportes Transmilênio, as redes de bibliotecas e ciclovias, os parques, além da implementação de programas sociais e de fomento à cultura. Os projetos que promoveram as mudanças em Bogotá lhe renderam o prêmio de Leão de Ouro na Bienal de Arquitetura de Veneza, em 2006.
No Brasil, é em São Paulo que se estruturou o mais avançado movimento social urbano. Integrado por cerca de 550 organizações da sociedade civil, o Movimento Nossa São Paulo, criado em 2007, vem servindo de inspiração para diversas cidades brasileiras. O movimento social da capital paulista tem como principal objetivo a construção de uma força política, social e econômica capaz de comprometer a sociedade e sucessivos governos com uma agenda e um conjunto de metas a fim de oferecer melhor qualidade de vida para todos os habitantes da cidade, recuperando para a sociedade os valores do desenvolvimento sustentável, da ética e da democracia participativa.
Em 2008, em Belo Horizonte, foi fundada a Rede Social Brasileira por Cidades Justas e Sustentáveis. Formada por movimentos de 21 municípios, entre eles Ilhéus na Bahia, a rede é integrada por organizações plurais e apartidárias que aglutinam vários atores sociais de cada localidade. Além da troca de experiências, a rede vem contribuindo para o fortalecimento do movimento em cada município. Os principais focos de intercâmbio estão centrados na metodologia de construção e acompanhamento de indicadores; ampliação do conhecimento sobre o Plano Plurianual e o Programa de Metas dos municípios, bem como a reflexão sobre instrumentos de democracia participativa.
Uma das principais iniciativas da Rede foi o estabelecimento de Programa de Metas em cada cidade, que obriga os prefeitos a divulgarem um plano de governo adequado ao Plano Plurianual em até 90 dias após assumirem o cargo e prestarem contas à população a cada seis meses. Em São Paulo e outras seis cidades o programa já é lei municipal.
Em Salvador, cidade com graves problemas sociais e administrativos ainda não foi estruturado um movimento social similar.
Tendo sido realizado em maio, na Reitoria da UFBA, uma reunião inicial para criação do movimento Nossa Salvador, com palestra do intelectual colombiano Bernardo Toro, aguarda-se que as organizações da sociedade civil soteropolitana consigam estruturar um movimento capaz de liderar e promover as transformações sociais, econômicas e culturais que nossa capital tanto demanda, tornando Salvador uma cidade socialmente mais justa e ecologica e econômicamente sustentável.
*Osvaldo Campos Magalhães – Engeheiro e Meste em Administração (UFBa), foi candidato a vereador em Salvador pelo PSB. Membro do Conselho de Infra-estrutura da Fieb, coordena o Núcleo de Estudos em Logística, Transportes e Tecnologias Sustentáveis (Nelt). E-mail:nelt.oscip@gmail.com, Blog- http://www.osvaldocampos.blogspot.com

domingo, 2 de agosto de 2009

Um Tema , uma grande obra. Memorial de Canudos

Como reproduzir em imagens fatos que ocorreram há 100 anos e dos quais só restaram umas poucas e precárias fotografias? Esse foi o desafio enfrentado pelo artista plástico baiano Tripoli Gaudenzi.
Nascido em Salvador, em 1939, Gaudenzi chegou a se formar em medicina pela Faculdade de Medicina e Saúde Pública da Bahia. Mas desde criança se dedicou ao desenho e à pintura. Autodidata, nos anos 60 integrou em sua cidade o Grupo Bazarte de jovens artistas e freqüentou o ateliê de pintores amigos no Brasil e na Europa. Na década seguinte, fez várias exposições individuais. A partir de 1990, depois de anos de pesquisa, achou o seu tema por excelência e a ele se dedicou: Canudos. O assunto o fascinava desde a juventude, quando leu Os Sertões, de Euclides da Cunha.
Gaudenzi é talvez quem melhor reproduziu em papel e tela aquilo que Euclides narrou com tanto vigor. "Meu objetivo era mostrar às pessoas a importância e a beleza do tema", diz o artista. Depois de uma pesquisa bibliográfica em que selecionou cerca de 600 passagens descritas nos doze melhores livros sobre o assunto, o pintor chegou a 450 cenas tecnicamente viáveis. Destas, 400 se tornaram desenhos, aquarelas e óleos. Gaudenzi fez também pesquisa de campo em Belo Monte, local onde no final do século passado se ergueu o império de Antônio Conselheiro, e registrou a vegetação e o relevo. A partir disso, "deixei minha imaginação viajar, mas
sem trair a História", afirma ele. O projeto resultou numa exposição com 113 obras, Canudos Rediviva, inaugurada em 1991, na Primeira Semana Cultural de Canudos, e no livro Memorial de Canudos. Texto publicado originalmente na Revista Veja em 03/09/1997.

sábado, 1 de agosto de 2009

Vamos mostrar ao prefeito a saída

Antônio Risério
Gostei muito – muito mesmo – do artigo que Paulo Ormindo publicou , no dia 23 de julho. Paulo Ormindo é sério, sabe do que está falando e apresenta dados numéricos para comprovar suas afirmações. Bem que podia ser nosso prefeito. Mesmo porque o que temos hoje, em tal cargo, é um sonâmbulo que mal tem alguma ideia de si mesmo. Da cidade, não entende nada. Em vez de encarar seus problemas, brinca de fincar postezinhos azuis. Como se isso aqui fosse um joguinho qualquer. E nós fôssemos idiotas.
Quando Paulo Ormindo diz que, hoje, temos mais de quatro mil habitantes por km², me fez lembrar do Mike Davis de Planet of Slums. Porque a grande densidade demográfica de Salvador está nas favelas (já não distingo hoje, praticamente, entre favela e bairro popular – e a favelização dos conjuntos habitacionais é evidente), com casas enganchadas umas nas outras. E a verticalização, que substituiu o “puxadinho” pela laje. Enquanto isso, os mais ricos se esparramam em seus condomínios. Basta comparar o fim de linha de Pernambués com o Encontro das Águas, por exemplo (e nem venham me falar que este condomínio fica em Lauro de Freitas: precisamos, hoje, de uma autoridade metropolitana).
O que Mike Davis faz é uma previsão lógica. Ele indica ou descortina, nas favelas, a característica dominante do futuro urbano no hemisfério sul – no mundo externo ao círculo das democracias ricas do Atlântico Norte. Nas cidades e megacidades dos países pobres ou em desenvolvimento, as invasões de terras para autoconstrução de moradias, os assentamentos informais da “urbanização pirata”, cresceram, crescem e estão crescendo a uma velocidade estonteante. Mike Davis lembra que, desde 1970, o crescimento das favelas tem ultrapassado a urbanização “per se”. Não sei os dados exatos de Salvador. Gostaria de saber. Mas basta olhar em volta.
Sei, o problema não é somente nosso. Na Índia e na China, o crescimento das favelas é espantoso. Na África, a situação é extrema: as favelas crescem duas vezes mais rápido do que as cidades do continente. Luanda e Lagos são, sem tirar nem pôr, dois grandes favelões.
Mas aqui mesmo, no Brasil, vejam os casos de São Paulo e da Amazônia. Até a década de 1970, a população favelada de São Paulo era pouco mais do que estacionária, crescendo vegetativamente. De lá para cá, a coisa disparou. Na Amazônia, urbanização e favelização são sinônimos. E nada disso livra a cara da gente. Salvador poderia ter crescido de um modo harmônico. O problema é que a cidade está entregue, há anos, a quem não sabe como administrá-la e a quem só pensa em lucrar com a nossa degringolada urbana.
Isso aqui, hoje, é uma vergonha. E é muita cara-de-pau alguém ter a coragem de dizer que é o seu prefeito. Prefeito de que? Lídice deixou que fizessem aquela porcaria do Aeroclube (e havia um projeto maravilhoso de Lelé para o local, uma espécie de duna “high-tech”). Já Imbassahy só se empenhou em fazer coisitas de fachada. Colocava papel de parede em muros rachados. E, com esse cara que está aí, a coisa só fez piorar. Contamos, hoje, com o pior prefeito que esta cidade já teve. Se vocês o elegeram, problema vosso. O diabo é que eu e Paulo Ormindo também moramos aqui, nesse arremedo encalacrado de região metropolitana.
As favelas proliferam, com a sua “arquitetura possível” (Ermínia Maricato), configurada em situação de dominação social e opressão cultural. Tomam a parte baixa do Bonfim (olhem desde a igreja, por favor), ocupam expansivamente o Calabar, estiram-se por Pernambués, avançam pela Avenida Paralela. Diz Paulo Ormindo que a nossa carência habitacional é de cem mil moradias. A prefeitura tem algum projeto para isso? Não. Nem a prefeitura, nem os nossos (vossos) vereadores. Longe estão, ambos, de ter vergonha na cara. Se um brinca de pauzinhos azuis, a outra entrega a cidade à especulação imobiliária.
Pelo andar da carruagem social e política, só nos vai restar cumprir a antevisão de Mike Davis. Hoje, Bombaim (Mumbai) é a capital mundial das favelas. Salvador, com suas ruas esburacadas, desfazendo-se a cada chuva, corre atrás. Vamos mesmo de mal a pior. Sem prefeito que saiba ser prefeito e sem vereadores que mereçam esse título. Sem cidadãos?
Transcrito do Blog Jeito de Viver- artigo publicado na página de Opinião do jornal A Tarde de 1.8.2009. O texto de Paulo Ormindo a que Risério se refere, “Salvemos Salvador, enquanto é tempo”, foi publicado também neste blog.