quarta-feira, 22 de março de 2017

Waze vai lançar sistema de carona no Brasil até o final do ano

Claudia Tozetto - O Estado de São Paulo
O aplicativo de navegação em mapas Waze vai lançar no Brasil, até o final do ano, seu serviço de caronas.
A ideia é conectar os motoristas que dirigem com o carro vazio todos os dias com passageiros em busca de transporte para as mesmas localidades. O lançamento do novo serviço vai acontecer no Brasil até o final do ano, anunciou a diretora global do Waze, Di-Ann Eisner, durante o evento Google for Brasil realizado pelo gigante das buscas no Auditório do Ibirapuera, em São Paulo.
A empresa não divulgou a data exata de estreia do serviço. Ao contrário do Uber, em que motoristas cobram por viagens como um táxi, o Waze Carpool deixará seus usuários apenas dividirem o custo da viagem: um motorista que anda com o carro vazio poderá pegar passageiros pelo caminho e rachar com eles gastos com gasolina e pedágio, por exemplo.
O Google não é o primeiro a fazer isso: o francês BlaBlaCar aposta nisso, apenas para viagens intermunicipais, enquanto o aplicativo de rotas de transporte público Moovit tem testado sistema semelhante em Israel e na Itália.
 Até agora, o novo serviço do Waze passou por testes em Telavive, Israel, cidade-sede do Waze, e na cidade de San Francisco, nos Estados Unidos. São Paulo deve ser a primeira cidade brasileira onde o serviço será lançado, já que, segundo Di-Ann, é cidade com maior número de usuários do Waze em todo o mundo -- o Brasil é o segundo maior país no aplicativo de navegação em mapas. "Vamos ajudar as pessoas a economizar dinheiro e vamos ajudar a retirar carros das ruas", diz Di-Ann. "São Paulo pode ter metade dos carros nas ruas e a velocidade do trânsito vai melhorar."
 Como funciona.
O Waze Carpool funciona de forma diferente de aplicativos de carona paga, como Uber ou Cabify. A ideia é que os passageiros compartilhem suas principais viagens do dia, como o caminho de casa para o trabalho e vice-versa. Além disso, os motoristas que oferecem a carona não podem lucrar com as caronas: o valor pago pelo passageiro deverá cobrir apenas os custos com combustível e manutenção do veículo.

terça-feira, 21 de março de 2017

NEOJIBA lança série no TCA para celebrar 10 anos de atuação na Bahia

Em 2017, o NEOJIBA – Programa prioritário do Governo da Bahia, vinculado à Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social – completa 10 anos de dedicação à infância e à juventude da Bahia. Para abrir o calendário de atividades comemorativas, seis formações musicais se apresentam no palco do Teatro Castro Alves (TCA) no dia 23 de março (quinta-feira), às 19h30, no primeiro concerto da série NEOJIBA no TCA. 
Orquestra Juvenil da Bahia, Orquestra Castro Alves (OCA), Coro Juvenil, Coro Infantil, Coro Sinfônico e Quinteto de Cordas Dedilhadas apresentam o concerto Alma Brasileira, dedicado aos 130 anos de Heitor Villa-Lobos. A regência fica a cargo de Ligia Amadio, Ricardo Castro, Eduardo Torres e Moises Honto. O pianista Marcelo Bratke e os jovens multiplicadores do NEOJIBA, Clara Letícia Nascimento (flauta) e Esdras Santos (fagote), atuam como solistas.
No programa, apenas composições do homenageado. O Trenzinho do Caipira e quatro canções do Guia Prático – material didático para educação musical criado por Villa-Lobos – serão executadas pelo Coro Infantil, acompanhado por Marcelo Bratke, Quinteto de Cordas Dedilhadas e Grupo Instrumental, sob a regência de Ricardo Castro – diretor fundador do NEOJIBA. 
As obras Rosa Amarela e Ave Maria serão cantadas pelo Coro Juvenil, com a regência de Moises Honto, monitor do Coro Juvenil, e de Eduardo Torres, diretor musical do NEOJIBA. Bachianas Brasileiras nº 6, escrita originalmente para flauta e fagote, contará com a participação do dueto, Clara Letícia Nascimento e Esdras Santos.
As orquestras estarão sob a regência da maestrina convidada, Ligia Amadio. A Orquestra Juvenil da Bahia toca Momoprecoce, junto com o solista convidado Marcelo Bratke. Já Bachianas Brasileiras nº 4 coloca no palco duas importantes formações musicais do Programa: a Juvenil da Bahia e a Orquestra Castro Alves. Para encerrar, os Coros Juvenil e Sinfônico se juntam às orquestras para apresentar Chôros nº 10.
Villa-Lobos
Heitor Villa-Lobos é o compositor erudito brasileiro de maior projeção internacional. Depois de viver em Paris no final dos anos de 1920, se consolidou como representante no mundo da música de concerto brasileira. A partir de elementos do folclore e da música popular do Brasil, Villa-Lobos construiu uma obra de caráter universal. Produziu para diversas formações, desde orquestra sinfônica, coro e grupos de câmara até peças para instrumento solo.
Uma das grandes referências do compositor foi Johann Sebastian Bach, que o influenciou na composição da série Bachianas Brasileiras. No concerto do dia 23, o público terá a oportunidade de ouvir as Bachianas Brasileiras nº 4 e 6. Já Momoprecoce mostra a faceta alegre e festiva de Villa-Lobos. Esta obra é uma reelaboração de O Carnaval das Crianças, uma coleção de peças para piano solo de 1919, que estreou em Paris no dia 23 de fevereiro de 1930. Chôros nº10 encerra o programa da noite. Conhecida com o subtítulo de Rasga Coração, a obra é uma das peças sinfônico-corais brasileiras mais conhecidas no mundo.
Além de maestro, compositor e instrumentista, Villa-Lobos também foi o responsável, a convite de Anísio Teixeira, por um dos maiores programas de Educação Musical da História do Brasil. Durante as décadas de 1930 e 40, ele foi diretor da instituição pública SEMA (Superintendência de Educação Musical e Artística) na área da educação musical e pôde desenvolver um programa fundamentado na composição, arranjo e organização de canções folclóricas brasileiras. Um ponto alto do seu projeto foi a apresentação de um coro com 40 mil vozes regidas pelo próprio Villa-Lobos, no estádio de São Januário, no Rio de Janeiro, em 7 de setembro de 1940. O Coro Infantil do NEOJIBA apresentará no concerto do dia 23 algumas das canções do Guia Prático - material didático do programa dirigido por Villa-Lobos.
Ricardo Castro
Nascido em Vitória da Conquista, Bahia, Ricardo Castro é o criador e Diretor-Fundador do NEOJIBA – Núcleos Estaduais de Orquestras Juvenis e Infantis da Bahia. Estabeleceu-se na Europa em 1984, onde estudou piano com Maria Tipo e Dominique Merlet e regência com Arpad Gerecz. Premiado no Concurso da ARD de Munique em 1987 e Geza Anda de Zurique em 1988, tornou-se um pianista de renome internacional ao receber o primeiro lugar no Leeds International Piano Competition na Inglaterra, em 1993.
Regente Titular e Diretor Artístico da Orquestra Juvenil da Bahia desde sua fundação em 2007, Ricardo Castro tornou-se em 2013 o primeiro brasileiro a receber o Honorary Memberships of the Royal Philharmonic Society, titulação iniciada em 1826 e concedida apenas 131 vezes em reconhecimento a importantes serviços prestados à Música. Foram celebrados entre outros grandes nomes da música Brahms, Wagner, Tchaikovsky, Stravinsky e Aaron Copland.
Ligia Amadio
Atual regente titular e diretora artística da Orquestra Filarmônica de Montevidéu (Uruguai), cargo que assumiu recentemente, Ligia Amadio é uma das mais destacadas regentes brasileiras da atualidade. Notabilizou-se internacionalmente por sua reconhecida exigência artística, seu carisma e suas vibrantes performances. Premiada no célebre Concurso Internacional de Tóquio (1997) e no II Concurso Latino-Americano para Regentes de Orquestra em Santiago do Chile (1998), em 2001 recebeu o prêmio Melhor Regente do Ano no Brasil, outorgado pela Associação Paulista de Críticos de Arte.
Ligia Amadio esteve à frente de diversas formações, como a Orquestra Sinfônica Nacional (Niterói), Orquestra Sinfônica da Universidade Nacional de Cuyo (Argentina), Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas, Orquestra Sinfônica da Universidade de São Paulo (OSUSP), Orquestra Filarmônica de Bogotá (Colômbia), Orquestra Sinfônica de Santa Fé (Argentina), entre outras. É idealizadora, junto com as também regentes Cláudia Feres, Érica Hindrikson e Vânia Pajares, do Simpósio Internacional Mulheres Regentes/ Mujeres Directoras/ Women Conductors, que busca criar um espaço de permanente reflexão sobre a atuação da mulher regente no cenário profissional em toda a América.
Marcelo Bratke
Durante a última década, Marcelo Bratke, um dos mais celebrados pianistas brasileiros, tem se apresentado nas mais prestigiadas salas de concerto do mundo, como o Carnegie Hall, o Festival de Salzburg, o Queen Elizabeth, entre outros. O músico é um profundo conhecedor da obra de Villa-Lobos. Além de já ter gravado a obra para piano do compositor, acaba de dirigir um documentário em oito partes sobre a vida e a obra de Villa-Lobos. Bratke também está em consonância com a proposta do NEOJIBA de utilizar a música como ferramenta de desenvolvimento social. Em 2007, mesmo ano de fundação do NEOJIBA, ele criou a Camerata Vale Música, uma orquestra formada pela fusão entre jovens músicos brasileiros eruditos e populares oriundos de regiões de vulnerabilidade social.

Série NEOJIBA NO TCA
A Série NEOJIBA no TCA oferece ao público a oportunidade de desfrutar obras de diferentes gêneros e conhecer uma diversidade de grupos musicais do Programa, em uma única apresentação. Cada concerto terá um tema central que será o fio condutor para a escolha das obras e das formações musicais que fazem parte dos 12 Núcleos do NEOJIBA.
Programa NEOJIBA
Criado em 2007 como um dos programas prioritários do Governo do Estado da Bahia, o NEOJIBA (Núcleos Estaduais de Orquestras Juvenis e Infantis da Bahia) tem por objetivo promover na Bahia o desenvolvimento e a integração social, prioritariamente de crianças, adolescentes e jovens em situações de vulnerabilidade, por meio do ensino e da prática musical coletivos. O NEOJIBA beneficia cerca de 4.600 crianças, adolescentes e jovens em todo o estado da Bahia. É uma ação da Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social (SJDHDS) e seu diretor fundador é o maestro e pianista Ricardo Castro. 
* Matéria publicada originalmentge no site da Secretaria da Cultura do Estado da Bahia - SECULT


quinta-feira, 16 de março de 2017

Aeroporto de Salvador terá a francesa Vince AirPorts como concessionária por 35 anos

Osvaldo  Campos*
Em leilão realizado na manhã desta quinta-feira, 16, na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), no centro da capital paulista, o consórcio francês Vinci Airports, representada pela corretora BTG Pactual, fez a única oferta pelo aeroporto de Salvador e venceu a disputa. A oferta inicial do leilão para o aeroporto baiano, ou seja, o valor mínimo que as empresas precisam pagar ao governo para ter o direito de exploração da área era de R$ 310 milhões. A empresa vencedora ofereceu o lance de R$ 660 milhões. O investimento mínimo a ser realizado no aeroporto é de 2,35 bilhões.
Esse valor, que representa 25% do valor total, deve ser pago à vista. O restante será dividido em parcelas anuais que terão o valor determinado em contrato. Durante os primeiros 5 anos não haverá o pagamento de outorga, já que o investimento em obras é maior nesse período. Do 6º ao 10º ano o pagamento será feito com valores crescentes. Uma cláusula do edital de concessão também prevê uma contribuição variável anual de 5% das receitas geradas pelo aeroporto adquirido.
A concessão tem duração de até 30 anos, e pode ser prorrogada por mais 5 anos. A prioridade da empresa Vinci Airports para o Aeroporto Internacional Deputado Luís Eduardo Magalhães será construir uma nova pista de pouso e decolagem para melhorar o fluxo de aeronaves no local. Está previsto também a construção de um novo terminal internacional dentro do horizonte da concessão.
Com a segunda pista, que permitirá pousos e decolagens simultâneas, e o novo terminal internacional, o aeroporto de Salvador poderá se converter num "hub airport", centralizando os voos do Nordeste brasileiro para a Europa. A proximidade com Lisboa e Madrid, cerca de 9 horas de voo é uma vantagem comparativa em relação aos voos saindo do Rio de Janeiro e São Paulo, com cerca de 11 horas para a Europa.
A segunda pista, paralela à atual e com cerca de 3.200 metros, poderá ser implantada no local onde hoje funciona a Base Aérea de Salvador, que seria transferida para o aeroporto de Feira de Santana, atualmente desativado. Outra alternativa seria a utilização parcial de área atualmente ocupada pelo Parque das Dunas.
A empresa Vinci Airports administra importantes aeroportos na França (nas fotos Orly) e o de Santiago, no Chile.
Avaliação
O aeroporto de Salvador recebe 21 mil passageiros todos os dias e, em recente pesquisa feita Secretaria da Aviação Civil foi apontado como o segundo pior do país. Em uma escala de 1 a 5, o aeroporto recebeu a nota 3,67. Entre os itens pesquisados, as piores avaliações foram para limpeza, conforto e custos de alimentação e estacionamento.
*Editor do Blog
** Fotos: Aeroporto de Orly, concessionado à Vinci Airports

quarta-feira, 15 de março de 2017

André Fraga eleito coordenador do Fórum dos Secretários de Meio Ambiente das Capitais Brasileiras

Osvaldo Campos Magalhaes*
O secretário da Cidade Sustentável e Inovação de Salvador, André Fraga, foi eleito o novo coordenador nacional do Fórum dos Secretários de Meio Ambiente das Capitais Brasileiras – CB27. 
A eleição ocorreu na tarde de ontem, terça-feira (14), durante o IX Encontro Nacional do CB27, que ocorre no Hotel Sheraton da Bahia desde segunda-feira (13).
Na manhã desta quarta-feira, os Secretários e os representantes das organizações farão uma visita técnica ao Centro de Monitoramento e Alerta da Defesa Civil de Salvador (Cemadec), que na segunda feira recebeu a visita do cientista e presidente do Conselho Diretor do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas, Carlos Nobre, que elogiou o Prefeito de Salvador por dotar a cidade de um centro de monitoramento próprio. “Um centro desse é de fundamental importância porque é muito difícil que um centro nacional tenha conhecimento de especificidades locais que sejam úteis para emitir um alerta em tempo hábil. Aqui há pessoas que têm conhecimento da geologia, meteorologia e hidrografia local, o que ajuda a adotar medidas acertadas. É uma estrutura bem equipada, um modelo perfeito”, afirmou.
Com o novo  cargo, André Fraga passa a representar o CB27, que tem o importante papel de promover a articulação política e cooperação entre as capitais brasileiras para o enfrentamento das mudanças climáticas. 
O Encontro dos Secretários, CB27 está sendo realizado pela primeira vez em Salvador e é realizado com o apoio de importantes organizações internacionais, como a Fundação Konrad Adenauer, ICLEI América do Sul, Fundação Rockefelleer  (Programa 100 Cidades Resilientes), C40 - Cities Climate Leadership Group.
Segundo André Fraga, uma das missões do seu novo cargo "será captar recursos para a implementação de projetos relacionados aos temas de gestão ambiental e mudança climática para as capitais”. 
O IX Encontro Nacional também promoveu importantes mudanças no Estatuto do CB27, como a redefinição de prazo para a gestão dos coordenadores e secretário executivo, que antes era bienal e passou a ser anual. A tarde ainda contou com a apresentação dos novos secretários das pastas de meio ambiente ao Fórum, visto que, esse ano, apenas quatro secretários municipais de meio ambiente das capitais permaneceram nos cargos. 
Histórico 
O Fórum de Secretários de Meio Ambiente das Capitais Brasileiras, CB27, foi criado em maio de 2012, durante a preparação das cidades para a Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável (Rio+20). 
Esse ano, durante o IX Encontro Nacional do CB27, as capitais brasileiras entregaram as suas contribuições de ações de sustentabilidade e prevenção ao meio ambiente à estratégia de implementação da Contribuição Nacional Determinada (CDC) do Brasil à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, que tem como principal objetivo a redução da emissão de carbono. 
O próximo encontro terá como tema Financiamento e Governança e será realizado em Brasília, entre os dias 24 e 28 de abril desse ano. 
* Editor do Blog
Na foto, André Fraga ao lado de Marina Caetano  e Alexandra Steinmeyer​, da Fundação Konrad Adenauer
** Foto: Osvaldo Campos Magalhaes

domingo, 12 de março de 2017

Quem se lembra dos espaços de socialidade?

Paulo Ormindo de Azevedo*
Ha alguns anos não vou a Europa, onde morei. Mas o recebimento de um vídeo de Montmartre, em Paris, me provocou uma catarse. 
As calçadas estavam cheias de mesas e seus usuários conversavam com moradores, tocadores de realejos e músicos. 
Poderia citar muitos exemplos europeus, mas prefiro os nacionais, como os calçadões de Copacabana, as vilas Madalena e Olímpia, em São Paulo, as orlas de Maceió e João Pessoa. 
Os nossos passeios são mesquinhos, mas tínhamos ruas comerciais de muita interação social e política, como a Rua Chile, e vias simples, mas integradoras, como a Baixa dos Sapateiros, cantada por Ary Barroso. 
Na Barra se fazia um animado footing e nos bairros as famílias colocavam cadeiras nos passeios para fofocarem e jogarem dominó. Tínhamos o ciclo das festas de largos e ruas, que começavam na Conceição e seguiam pela Boa Viagem, Lapinha, Ribeira, Rio Vermelho, Pituba e Itapuã. 
Nelas se encontravam os amigos para conversarem, comer, beber, batucar e cantar. Ali nasciam namoros, casamentos e separações. 
Havia também as feiras de bairros, onde se encontravam os vizinhos, consumidores e vendedores e se provava a farinha, o camarão seco, a cachaça de rolha e as frutas. Essas seguiam o roteiro dos pequenos portos de saveiros: Ribeira, Lenha, Agua de Meninos, Rampa do Mercado, Preguiça, Barra, Rio Vermelho e Itapuã. 
Ainda recentemente grupos de músicos se reuniam aos domingos nas praças de Nazaré e da Madragoa para tocarem reunindo um grande número de vizinhos. Não cobravam nada, mas pelo que me informaram, a Prefeitura queria cobrar pela ocupação do espaço público. 
Nos países desenvolvidos, as municipalidades pagam e esses músicos que animam estações de metrô e praças. 
Quando defendo a humanização de nossa cidade, os cultores do concreto e dos viadutos me acusam de saudosista. Eles provavelmente não conhecem as feiras e mafuás de Nova York, Paris, Roma e Londres. 
Em São Paulo e no Rio continuam existindo feiras rotativas diárias e agora de charangas locais com apoio da prefeitura que fecha ruas para a sua realização. Por que esses espaços acabaram em Salvador? 
Pela falta de sensibilidade dos nossos edis, pela priorização do carro sobre o cidadão, pelo abandono das calçadas e shoppings excludentes. 
Desses espaços de socialidade apenas as praias, objeto de estudo de Thales de Azevedo, persistem, mas desprovidas de banheiros, chuveiros, sombreiros e quiosques de venda de agua, refrigerantes e acarajés. 
Em todo o mundo, faixas de rolamento estão sendo transformadas em ciclovias e calçadões arborizados, incrementando a vida social, o comercio e os serviços. Aqui a “desurbanização” se faz com superfaturados e inúteis viadutos e elevados excludentes de pedestres, bicicletas e do verde. 
SSA: A Tarde, 12/01/2017 
*Arquiteto e professor catedrático da UFBA
P.S. – Estou aniversariando neste mês e a Academia de Letras da Bahia, a UFBA, o Dep. Ba do IAB e o CAU/BA resolveram me fazer uma homenagem, quando lanço o livro “A Memória da Pedras”, de contos e crônicas sobre arquitetura e urbanismo. Terei o maior prazer em receber os meus leitores de Salvador. Dia 16/03, às 18 hs, na ALB, Palacete Góes Calmon, na Av. Joana Angélica, defronte do Ministério Público da Bahia.

sábado, 11 de março de 2017

Carnaval sem cordas e axé music

Marcelo Dantas*
Diferentemente das escolas de samba do Carnaval do Rio, que se consolidaram no modelo de um desfile, sustentado na beleza do espetáculo, permanecendo atrativo mesmo quando durante anos nenhum samba se tornou imortal ou sequer tocou nas rádios do Brasil, o Carnaval da Bahia, que tem o modelo de participação de rua, tem sua atratividade relacionada ao sucesso dos seus artistas e das músicas. Isso é muito claro historicamente nas últimas cinco décadas.
Apesar de o trio elétrico ter sido inventado nos anos 1950, foi o sucesso da música Atrás do Trio Elétrico, de Caetano Veloso, em 1969, que despertou o interesse dos brasileiros pelo Carnaval de rua de Salvador, assim como revalorizou o Carnaval para os próprios baianos, levando-o a um patamar estimado de um milhão de pessoas participando da festa nos anos 1970.
Esse padrão de participação só começaria a se ampliar a partir dos anos 1990, quando a axé music se tornou um ritmo local de sucesso, que começou a interessar ao Brasil. 
É a primeira fase de Luís Caldas, com o Fricote (1985), e do bloco afro Olodum, com o sucesso de Faraó (1987). Mas somente em 1992, quando pela primeira vez o samba-reggae se torna a musica mais tocada do Brasil, com o Canto da Cidade, e o sucesso de Daniela Mercury, com o CD mais vendido do ano no país, a axé music começa a se tornar uma usina de sucessos em todo Brasil. Em público de shows e vendagens de discos, a axé music será o maior sucesso da música brasileira dos anos 1990 e o Carnaval da Bahia dobra de tamanho: passa a ter uma participação estimada de dois milhões de pessoas, padrão que se mantém até hoje.
O impacto de Daniela Mercury não se resumiria ao sucesso da sua música e performance admirada nos palcos. Típica empreendedora, a artista abriria sua própria empresa, que registrou como Canto da Cidade, para administrar a sua carreira com total independência. Em seguida, abriu sua editora musical, a Páginas do Mar, para controlar o uso de suas obras, assim como assumiu a gestão do Bloco Crocodilo para garantir sua autonomia artística no Carnaval.
Esse modelo de artista-empresário-empreendedor cultural, que usa os rendimentos do sucesso para investir na própria carreira e no mercado da música, se tornou generalizado na axé music. 
No Carnaval, esse impacto seria gigantesco: dezenas de artistas de sucesso começaram a criar suas produtoras e editoras, além de se tornarem sócios ou proprietários dos blocos, enquanto os empresários de música que não eram artistas começaram a procurar e lançar novas bandas e artistas como seu produto.
Mercado autônomo
Esse empreendedorismo cultural de sucesso fez com que a Bahia se tornasse a terceira cidade do país em quantidade de produtoras da área musical, editoras de música e estúdios de gravação, atrás apenas de São Paulo e Rio de Janeiro, que historicamente concentram a indústria cultural e os meios de comunicação mais importantes do Brasil. Com isso, Salvador reverteu a lógica de exportação de artistas para o sul maravilha – praticada por todo Brasil- para se tornar um mercado próprio, autônomo, poderoso e de repercussão nacional.
Foi essa geração que criou a axé music e desenvolveu ao longo de mais de 30 anos um modelo flexível de negócios e criativo de gestão, que tornou os blocos de trio a maior força de atração de público do Carnaval de Salvador. Esses blocos se formaram com um caráter associativo, com turma de amigos de bairro ou de escolas da cidade e, com o tempo e o espírito empreendedor dos seus administradores, e mais tarde dos artistas que os assumiram, essas organizações se transformaram em empresas, gerando emprego e renda para milhares de pessoas.
Para desenvolver o negócio, construíram um marketing poderoso a partir dos artistas e do sucesso das músicas, profissionalizaram suas equipes e estruturas, conseguiram expandir as atividades por todo o país, através dos carnavais fora de época, viabilizando seus eventos e produtos com a venda ao consumidor – abadás, ingressos para shows e festas – e o patrocínio de marcas cada vez mais interessadas em associar o seu marketing à alegria e celebração que caracterizam esses eventos.

É essa riqueza concreta e processo de desenvolvimento econômico através da cultura que Salvador desdenha, quando as vozes de formadores de opinião, autoridades públicas, governantes, acadêmicos defensores da pureza cultural e nostálgicos de um Carnaval espontâneo que nunca existiu, se erguem num consenso em alto e bom som para atacar a axé music, demonizando as cordas dos blocos e, na verdade, condenando todo o lado comercial do Carnaval.
Surpreendente é que os nossos governos municipal e estadual, em que pesem as suas diferenças ideológicas, se expressam de modo parecido nas suas propagandas para o Carnaval de 2017, com a mensagem de que derrubar as cordas é a grande contribuição deles para o Carnaval.
A verdadeira contribuição é quando os governos – como tem sido especialmente feito nos últimos quatro anos pela prefeitura de Salvador – se empenham em contribuir para ampliar os dias de festa, em criar novos eventos para incrementar a programação, melhorar a segurança, aprimorar cada vez mais as condições de mobilidade urbana, e difundir largamente pelo Brasil a grandiosidade do nosso carnaval.
Equívoco estratégico
Mas se para fazer tudo isso o governo precisa competir com a iniciativa privada, blocos, camarotes, artistas e empresários, que criaram esse maercado, alguma coisa está errada.
Todo esse equívoco estratégico começou há muito tempo e tem se agravado nos últimos anos. Os três últimos prefeitos, Antônio Imbassahy, João Henrique e agora ACM Neto, o que equivale a um período de quase 20 anos, passaram a seguir um raciocínio aparentemente inteligentíssimo: como a prefeitura de Salvador gasta anualmente R$ 50 milhões com o Carnaval, e como os empresários mostraram capacidade para captar milhões em patrocínio, a prefeitura, que detém o direito de publicidade de rua, teria todas as armas para atrair patrocinadores para a cidade. Mas a que custo?
Que cidade no mundo teria a visão de investir R$ 50 milhões para fazer circular na sua economia um total de R$ 1,5 bilhão é um mau negócio?
Ao conquistar R$35 milhões em patrocínio, a prefeitura retirou esse mesmo valor do que estaria disponível no mercado para financiar os blocos e camarotes, Com isso, o governo municipal amplia e melhora a sua performance no Carnaval enquanto os blocos e camarotes, com a redução drástica do patrocínio disponível, começam a entrar em crise a ponto de muitos deles estarem pouco a pouco cancelando suas apresentações no Carnaval, ameaçando fazer desaparecer, num futuro próximo, a maior parte dos 250 mil empregos diretos e indiretos gerados pela festa.

Essa visão que condena o sucesso econômico dos empreendedores do Carnaval ameaça destruir uma das mais sólidas cadeias de economia criativa do Brasil e do mundo – o mercado da música e o Carnaval de Salvador – contribuindo para o enfraquecimento de empresas, produtoras, editoras de música, estúdios, equipamentos, trios elétricos, empresas de sonorização, de montagem de palcos, e artistas e profissionais da área, como cantores, compositores, músicos, artistas plásticos, cenógrafos, figurinistas, maquiadores, técnicos de som, e técnicos de palco, produtores executivos, produtores musicais e todos os produtos e serviços relacionados à musica.
De resto, podem acabar com os lucros dos setores culturais que lucram com a festa: os hotéis, as companhias aéreas, transporte, hospedagem, vendedores ambulantes, aluguéis de temporada, negócios na área de alimentação e bebidas, entre outros.
Se a crise da axé music se tornar o fim desse empreendedorismo cultural, ou da cadeia produtiva da música que inclui o Carnaval, poderemos ter no futuro um Carnaval espontâneo – o que de fato significa isso? – com a queda do turismo, a queda dos negócios, a queda do emprego e renda, o fechamento das produtoras de música, o exílio dos artistas para morar em outras cidades menos hostis à sua atividade.
Estamos todos querendo nos tornar espontâneos, gratuitos e mais pobres? E assumir, nós mesmos, o papel daquele que matou a galinha dos ovos de ouro e ainda ficou surpreso porque não teria mais ovos nem renovação da riqueza? E ainda queremos ser considerados heróis da luta pela pureza das nossas manifestações culturais?

*Marcelo Dantas, Doutor em Sociologia pela Universidade de Paris, Jornalista e pesquisador em Economia da Cultura - Mestre em Administaração - NPGA/UFBA 
** Artigo originalmente publicado no jornal A Tarde, 27/02/2017 - Caderno 2 , pg.4

sexta-feira, 10 de março de 2017

Por uma Nova Cidade Baixa

GIOVANNY GEROLLI

Colaboração para o UOL
Salvador começou voltada para a Baía de Todos os Santos. Ali, no que viria a ser o centro da cidade, a faixa ao nível da praia foi chamada Cidade Baixa. Acima, a conhecida Cidade Alta integra outra parte do coração da capital baiana. Hoje, já bastante deteriorada e completamente sufocada pelo trânsito de veículos, a Cidade Baixa recebeu um plano para revitalização urbana - o Projeto Nova Cidade Baixa, assinado pelo Brasil Arquitetura, escritório paulista que contou com o apoio de arquitetos locais da A&P Arquitetura e Urbanismo.
O projeto visa remodelar o centro com requalificação urbana, ambiental e paisagística, desde o bairro de Campo Grande até a Ribeira, abrangendo toda a extensão da baía, incluindo as famosas praias do Cantagalo e de Boa Viagem. Segundo as diretrizes do projeto, a orla deverá receber ampla área de novos espaços públicos qualificados para uso e lazer de pedestres, com ciclovias, novas linhas de transporte público (veículo leve sobre trilhos, ou VLT), além de moradias em edifícios residenciais baixos (para não esconder o horizonte), com serviços para seus moradores. Planeja-se ainda desviar o tráfego intenso para túneis e estacionamentos subterrâneos.
O plano dos arquitetos também prevê equipamentos de grande porte para a cultura e o desenvolvimento socioeconômico, como escolas profissionalizantes.
A atual concentração demográfica da região não é homogênea, apresentando pontos mais densos (caso da região do Comércio), e outros mais esparsos, a exemplo dos pavilhões militares ou lotes com edifícios industriais degradados e subutilizados, juntos à orla. “A intenção principal é reaproveitar esse espaço urbano que tem forte apelo histórico e turístico, homogeneizando sua ocupação, ao gerar novas moradias e desviar veículos para que o uso do espaço seja público, com horizonte aberto para o mar”, conta Cícero Ferraz Cruz, do Brasil Arquitetura.
Como se trata de um masterplan, ou seja, uma plano geral, sem detalhamento, o projeto não está pronto para ser executado. Assim, como recurso de planejamento, a equipe de arquitetos dividiu a Cidade Baixa em cinco grandes áreas - Campo Grande/Praça Cayru; Comércio/Fuzileiros Navais; Jequitaia; Cantagalo/Boa Viagem e Mont-Serrat-Tainheiros/Uruguai -, com inúmeras obras previstas para cada uma delas.
Todas as cinco áreas seriam assim beneficiadas por novos sistemas de transporte coletivo, como o VLT circular interligado com a linha suburbana de trem, e novos teleféricos para passageiros transitarem entre Cidade Alta e Cidade Baixa. Largos espaços para circulação de pedestres, ciclovias e uma linha regular de transporte náutico também seriam disponibilizados à população.
No Campo Grande, pontos como Passeio Público, Parque da Aclamação e Forte de São Pedro serão requalificados, enquanto a Avenida Contorno deverá ganhar outro passeio anexo. O projeto prevê também a construção de um teleférico entre o Largo dos Aflitos e o Solar do Unhão, onde fica o Museu de Arte Moderna.
Um túnel, chamado Mergulhão, desafogaria o tráfego afunilado na junção da Avenida Contorno com a Avenida da França. A Praça Cayru, por sua vez, seria assim liberada da atual função viária para receber edificações de fins culturais, além de esconder, sob sua nova esplanada, um estacionamento subterrâneo de 400 vagas.
Para o Comércio, a ideia é reestruturar – ou limpar – suas vias internas, totalmente encobertas por veículos e edifícios comerciais. “Propomos a priorização do fluxo de pedestres sobre o de automóveis, com novos passeios, estacionamentos, e a transformação da Avenida da França, principal, em via de mão dupla”, conta Cruz
Surgiria também uma nova Esplanada do Porto, espaço sem os armazéns portuários que hoje ocupam grande área, para que viesse a ter uso público, contínuo e aberto para a baía, com pontos comerciais de médio porte interligados por marquise, além de uma passarela elevada para conectar o Porto a um novo Terminal Internacional de Passageiros – onde fica ainda hoje o Instituto do Cacau.
O Moinho da Bahia e o Moinho Salvador receberiam escritórios, salas de cinema e mais comércio. Ainda na área identificada como Fuzileiros Navais, torres hoteleiras supririam a demanda de turistas que chegam à cidade nos cruzeiros; um Terminal Intermodal faria conexão entre VLT, teleférico, ônibus e metrô, e o também chamado Novo Comércio receberia edifício-garagem para mil vagas e um centro de convenções.
Por fim, dentre os projetos mais importantes e previstos no masterplan, a equipe do Brasil Arquitetura repensou a praia de Boa Viagem como um dos cartões postais mais importantes da cidade, e propõe sua revitalização desde a Ponta de Humaitá. Um novo parque, identificado como Parque Metropolitano de Itapagipe, trará verde e mais vida à área entre a Avenida Suburbana e a linha férrea.
Polêmica
O projeto Nova Cidade Baixa, apesar de prever melhorias para o espaço urbano de Salvador, não foi encomendado pelo poder público baiano. Segundo os arquitetos da Brasil Arquitetura, foi a Fundação Baía Viva, privada, quem o encomendou e o doou ao Estado da Bahia. A Fundação Baía Viva foi fundada em 1999 por um grupo de empresários baianos "preocupados com a preservação do maior cartão postal da Bahia e marco representativo da História do Brasil: a Baía de Todos os Santos", conforme o site da entidade.
A doação foi questionada pelo jornal baiano "A Tarde", que publicou em 27 de fevereiro de 2010 uma matéria cobrando do então prefeito João Henrique Carneiro (PMDB) a identificação do patrocinador do projeto Salvador Capital Mundial, do qual a proposta Nova Cidade Baixa faz parte. Na reportagem o jornal levanta a suspeita de que por trás da doação estariam interesses econômicos do próprio grupo diretor da fundação, que conta com empresários do mercado imobiliário entre seus membros - caso de Carlos Seabra Suarez.
O arquiteto Marcelo Ferraz garante, no entanto, que não sofreu qualquer tipo de pressão para o desenvolvimento do projeto. “Fizemos aquilo que achávamos melhor para a cidade do ponto de vista urbanístico; inclusive com apoio de profissionais locais conceituados.”
A reação lenta da prefeitura municipal em responder às críticas ressentiu o doador do projeto, que desfez a doação, retirando o projeto das mãos do poder público. “Esperamos agora que o novo prefeito, que se demonstrou muito interessado, possa reverter esta delicada situação, para que pelo menos parte do Nova Cidade Baixa possa vir um dia a tramitar nos órgãos legislativos, ser aprovado e finalmente executado”, declara Marcelo Ferraz.
Será que na nova gestão iniciada pelo prefeito Antonio Carlos Magalhães Neto serão viabilizados alguns dos projetos?
*Master in Philosophie/ Journalismus pela Universidade de Viena(2005

sexta-feira, 3 de março de 2017

Carnaval sem cordas e Axé Music - Parte I

Marcelo Dantas*
Diferentemente das escolas de samba do Carnaval do Rio, que se consolidaram no modelo de um desfile, sustentado na beleza do espetáculo, permanecendo atrativo mesmo quando durante anos nenhum samba se tornou imortal ou sequer tocou nas rádios do Brasil, o Carnaval da Bahia, que tem o modelo de participação de rua, tem sua atratividade relacionada ao sucesso dos seus artistas e das músicas. Isso é muito claro historicamente nas últimas cinco décadas.
Apesar de o trio elétricoter sido inventado nos anos 1950, foi o sucesso da música Atrás do Trio Elétrico,de Caetano Veloso, em 1969, que despertou o interesse dos brasileiros pelo Carnaval de rua de Salvador, assim como revalorizou o Carnaval para os próprios baianos, levando-o a um patamar estimado de um milhão de pessoas participando da festa nos anos 1970.
Esse padrão de participação só começaria a se ampliar a partir dos anos 1990, quando a axé music se tornou um ritmo local de sucesso, que começou a interessar ao Brasil. É a primeira fase de Luis Caldas, com o Fricote (1985), e do bloco afro Olodum, com o sucesso de Faraó (1987). Mas somente em 1992, quando pela primeira vez o samba-reggae se torna a m,usic mais tocada do Brasil, com o Canto da Cidade, e o sucesso de Daniela Mercury, com o CD mais vendido do ano no país, a axé music começa a se tornar uma usina de sucessos em todo Brasil. Em público de shows e vendagens de discos, a axé music será o maior sucesso da música brasileira dos anos 1990 e o Carnaval da Bahia dobra de tamanho: passa a ter uma participação estimada de dois milhões de pessoas, padrão que se mantém até hoje.
O impacto de Daniela Mercury não se resumiria ao sucesso da sua música e performance admirada nos palcos. Típica empreendedora, a artista abriria sua própria empresa, que registrou como Canto da Cidade, para administrar a sua carreira com total independência. Em seguida, abriu sua editora musical, a Páginas do Mar, para controlar o uso de suas obras, assim como assumiu a gestão do Bloco Crocodilo para garantir sua autonomia artística no Carnaval.
Esse modelo de artista-empresário-empreendedor cultural, que usa os rendimentos do sucesso para investir na própria carreira e no mercado da música, se tornou generalizado na axé music. No Carnaval, esse impacto seria gigantesco: dezenas de artistas de sucesso começaram a criar suas produtoras e editoras, além de se tornarem sócios ou proprietários dos blocos, enquanto os empresários de música que não eram artistas começaram a procurar e lançar novas bandas e artistas como seu produto.
Mercado autônomo
Esse empreendedorismo cultural de sucesso fez com que a Bahia se tornasse a terceira cidade do país em quantidade de produtoras da área musical, editoras de música e estúdios de gravação, atrás apenas de São Paulo e Rio de Janeiro, que historicamente concentram a indústria cultural e os meios de comunicação mais importantes do Brasil. Com isso, Salvador reverteu a lógica de exportação de artistas para o sul maravilha – praticada por todo Brasil- para se tornar um mercado próprio, autônomo, poderoso e de repercussão nacional.
Foi essa geração que criou a axé music e desenvolveu ao longo de mais de 30 anos um modelo flexível de negócios e criativo de gestão, que tornou os blocos de trio a maior força de atração de público do Carnaval de Salvador. Esses blocos se formaram com um caráter associativo, com turma de amigos de bairro ou de escolas da cidade e, com o tempo e o espírito empreendedor dos seus administradores, e mais tarde dos artistas que os assumiram, essas organizações se transformaram em empresas, gerando emprego e renda para milhares de pessoas.
Para desenvolver o negócio, construíram um marketing poderoso a partir dos artistas e do sucesso das músicas, profissionalizaram suas equipes e estruturas, conseguiram expandir as atividades por todo o país, através dos carnavais fora de época, viabilizando seus eventos e produtos com a venda ao consumidor – abadás, ingressos para shows e festas – e o patrocínio de marcas cada vez mais interessadas em associar o seu marketing à alegria e celebtração que caracterizam esses eventos.
É essa riqueza concreta e processo de desenvolvimento econômico através da cultura que Salvador desdenha, quando as vozes de formadores de opinião, autoridades públicas, governantes, acadêmicos defensores da pureza cultural e nostálgicos de um Carnaval espontâneo que nunca existiu, se erguem num consenso em alto e bom som para atacar a axé musicdemonizando as cordas dos blocos e, na verdade, condenando todo o lado comercial do Carnaval.
Surpreendente é que os nossos governos municipal e estadual, em que pesem as suas  ideológicas, se expressam de modo parecido nas suas propagandas para o Carnaval de 2017, com a mensagem de que derrubar as cordas é a grande contribuição deles para o Carnaval.
* Marcelo Dantas - Meste e Doutor, é Pesquisador e professor
Cultura, Economia Criativa

quinta-feira, 2 de março de 2017

Ivete, a amiga que todo mundo quer ter



Ivete se fantasia de palhaça e curte Carnaval de rua em Salvador

Ivete se fantasia de palhaça e curte Carnaval de rua em Salvador
Tenho alguns poucos crushes de amizade. Aquelas relações platônicas que a gente cultiva à distância e que se confirmam a cada declaração, a cada atitude. A pessoa solta um pum e a gente aplaude porque admira. Aquele tipo de gente que, se tivesse sete anos, eu aproveitaria a hora do recreio da escola para perguntar singelamente: "você quer ser meu amigo". Nós, então, dividiríamos o lanche e seríamos cúmplices para sempre.
Já quis ser amiga do Woody Allen. Diante da impossibilidade, vi quase todos os seus filmes, li tudo sobre ele. Praticamente seduzi o maître do bar Carlyle, em Nova York (EUA), onde Allen toca clarinete numa banca de jazz, toda as segundas. Os ingressos estavam esgotados, mas consegui um lugar no cantinho, em pé, piscando meus olhos bem devagarinho, olhando bem fundo nos olhos do maître com cara de mafioso, como se fosse uma das personagens, digamos, excêntricas, de um filme do diretor. Colou.
Depois que consegui me acomodar com o Martini mais caro que já paguei na vida, e girava minha azeitona para disfarçar o nervosismo, Allen subiu ao palco. Me sentia como se tivesse encontrado o Ryan Gosling. Como pode aquele senhorzinho, franzino, que parece mal ter forças no pulmão para soprar o instrumento, tão genial, estar a dez metros de distância?
Agnews

Ivete no último carro da Grande Rio com o marido Daniel Cady e o filho Marcelinho
Preciso ao menos dizer "oi". Não, preciso ao menos que ele olhe pra mim. Entrou mudo, saiu calado. No final do show, guardou o clarinete e foi andando no meio das pessoas em direção à saída. Eu estava no caminho da saída. Estava no lugar certo, na hora certa. Ele apenas me olha, como quem diz: vai ficar parada aí como uma múmia ou vai me deixar passar? E assim, a cinderela virou abóbora e eu voltei andando a pé para o hotel pelas ruas de Manhattan, me achando uma idiota.
Rob Lowe foi um crush de verdade. Eu não queria ser amiga do Rob Lowe, queria pegar o Rob Lowe todinho para mim desde que o vi no filme "About Last Night", que ele estrela com uma novinha Demi Moore. Devo ter assistido ao filme umas 30 vezes, sabia os diálogos de trás para frente e guardei durante anos na memória alguns trechos que, tinha certeza, seriam úteis um dia.
No meio da briga com um ex-namorado, safado e imprestável, enquanto eu chorava de raiva, minha memória acessouy o HD e quando me dei conta lá estava eu gritando no meio da sala: "Não diga isto (eu te amo)! Você não sabe o que é amor!". Soou tão falso que quase dei risada e continuei com aquele bosta.
Ivete Sangalo é um dos meus poucos e mais duradouros crushes. Quando se veste de palhaço e vai pular Carnaval com um grupo de amigos, na pipoca dos blocos de Salvador. Quando para o show para dar bronca no marido. Quem é esta aí, papai? Quando dança descalça em cima do trio e na avenida. Quando chora no "The Voice Kids".
"Descobri" Ivete no Carnaval do ano 2000, quando ela assumiu a frente do bloco Cerveja&Cia. Foi amor no primeiro axé. E desde lá, só a vi crescer como artista, como pessoa, como mulher. Ela é forte, autêntica, batalhadora, talentosa.
Mas é mais do que isso. Ivete tem cara de quem coloca um pijama velho para ver filme, comendo pipoca, com as amigas. Ela tem uutodo o jeito de que quando a gente liga para chorar umas pitangas, vai logo dizendo "deixe de ser abestada e vem aqui para eu te dar um colo". Tem pinta de ser aquela amiga para quem você propõe as coisas mais loucas e ela logo diz "bora". Parece de verdade e é esse tipo de gente que a maioria das pessoas quer ter como amiga. Inclusive eu.
absoluta, no Carnaval e no resto do ano










mariliz pereira jorge
É jornalista e roteirista. 
Escreve às quintas e sábados.

quarta-feira, 1 de março de 2017

Impressões e expressões do carnaval da soteropolis

Fernando Guerreiro*
Apesar dos vaticínios e pragas das trombetas da derrota, o Carnaval desta cidade continua vivo, vibrante e deliciosamente contraditório. 


Considerações  de um humilde folião que adora observar a folia:
1. A personalidade deste Carnaval foi Gilberto Gil. Onipresente, esteve no camarote, nos palcos, nos trios, esbanjando vitalidade e sabedoria. Falou o necessário e funcionou como uma espécie de embaixador da paz.
2. Falar o necessário não foi o caso de nosso vereador Igor Kannário. Um festival de bobagens, comprometendo meio mundo, se transformando no maior mico carnavalesco da década. Um terror!
3. Terror apostar em celebridades na folia. Elas estão em extinção, não causam mais impacto, e a proliferação de ex-BBBs destruiu a categoria. Poucos globais nos camarotes, com impacto zero na mídia.
4. A mídia e o público se deliciaram com a nossa rainha da comunicação, Ivete Sangalo. Deu um banho no desfile do Rio e provou que é imbatível no quesito carisma. Sambou no asfalto, aprendeu coreografias e ainda protagonizou o primeiro cooper do Sambódromo, para chegar no carro destaque. Deliciosa!
5. Delícia poder voltar a pular no chão. O folião pipoca volta a dominar o Carnaval e junto com ele a sensação de que blocos de corda que não dependem de um artista de nome e tem identidade vão continuar na folia: Muquiranas é o maior exemplo. Existe espaço para tudo, desde que equilibrando as demandas. 
6. Demanda para ser resolvida com urgência: crianças querem mais espaço na folia. Onde estiveram, cantaram e encantaram, e são os foliões do futuro. Depende deles a sobrevivência da festa.
7. Festa para Bell que vendeu todos os abadás e provou que continua imbatível como puxador. Festa para Daniela, que apesar do ego nos infernos continua provocadora e polêmica, trazendo movimento para a folia. Festa para Tomate com sua loucura e Márcio Victor que apareceu com a melhor música, colado com Léo Santanna que fez o melhor Carnaval de sua vida. Festa para o Cortejo Afro, Olodum, Gandhy, Ilê e todas as agremiações que mantêm vivas as nossas tradições, apesar da dificuldade eterna de colocar o bloco na rua.
8. Falar em rua, a tradição de falar nos trios está matando os desfiles. Ninguém aguenta mais a conversa interminável dos artistas com emissoras de TV no circuito. Um poooorrrre e um desrespeito ao folião.  
9. Que o folião volte a reinar no Carnaval e seja o principal elemento e o protagonista de uma deliciosa esbórnia que todo ano se reinventa e surpreende. Que o Carnaval seja discutido o ano inteiro em fóruns representativos e eficientes e que possamos construir ações que extrapolem os 12 (!) dias da festa e durem o ano inteiro. Paro por aqui que o arrastão me espera!
Fernando Guerreiro é presidente da Fundação gregório de Matos