sábado, 16 de julho de 2016

A Baia de Todos os Santos à luz da ciência

Adinoel da Mota Maia*
Ainda repercutindo a realização do II Fórum Internacional Sobre Gestão de Baías, na Associação Comercial da Bahia, no último dia 8 - tão largas foram as perspectivas suscitadas pelos diversos oradores referentes à Baía de Todos os Santos como sede da Amazônia Azul - não resistimos ao apelo da razão para fazer questionamentos básicos sobre falsas premissas que precisam ser afastadas, sob pena de se construir sobre terreno. 
Parece-nos evidente que é necessário rever a aceitação, oficial, de que a barra da BTS seja a reta que liga a Ponta de Santo Antônio (Farol da Barra) à Ponta do Garcez, ao sul da ilha de Itaparica. Os portugueses que a descobriram determinaram o hoje rio Una – antigo Tiñaré, para os índios de então – como limite entre as capitanias de Ilhéus e da BTS, assim defininido sua barra entre a foz daquele rio e a Ponta de Santo Antonio (Salvador). Protegeram essa barra com a construção de fortalezas no Morro de São Paulo e na Ponta de Santo Antonio (Farol da Barra), como sempre o faziam para defender a boca das baías e a foz dos rios. Outra observação revela o hábito de se considerar os sacos ou portos naturais de Aratu e de Iguape, dentro da BTS, como sendo baías dentro de uma baía (assim está em muitos mapas). É evidente que não se pode ter uma ou mais baías dentro de uma baía. 
Pode-se ter, sim, baías dentro de um golfo, mas a BTS não é um golfo. Em verdade, temos um golfo, sim – propomos que seja chamado de Golfo da Bahia - formado pelas baías de Todos os Santos, de Cairu e de Camamu – resultante de um afundamento, único, desse maciço geológico, há milhões de anos, e jamais analisado como tal pelos nossos geógrafos. Um golfo tem sua boca bem maior que sua dimensão frente-a-fundo, de modo que jamais deve ser dito que a BTS é um.
Finalmente, temos de rever a data da descoberta da BTS, hoje oficialmente aceita como em 1° de novembro de 1501, por Gonçalo Coelho, como capitão-mór, à frente do navegador contratado Amerigo Vespucci no comando de outra nau e de um desconhecido na terceira nau. Não se tem relacionado essa descoberta com a do Brasil, em 1500. Parece-nos evidente que Gaspar de Lemos, enviado por Cabral, em Porto Seguro, de volta a Portugal, tinha duas missões: a de informar ao Rei da descoberta de uma “ilha” (Vera Cruz) e a de determinar o seu tamanho, medindo, no regresso a Lisboa, as latitudes do que fosse visto e anotado, principalmente a do lugar da extremidade norte daquela terra. Para isso, teria de bordejar a costa.
Com esse procedimento, inevitável, Gaspar de Lemos foi descobrindo muitos acidentes geográficos, entre os quais, poucos dias após deixar Porto Seguro, a Baía de Todos os Santos. Onde hoje está o Rio Grande do Norte, anotou ser o fim da “ilha” e tomou rumo direto para Lisboa. O rei D. Manuel determinou a volta imediata com uma expedição, exploratória, sendo, provavelmente, Gaspar de Lemos o seu capitão-mór. Assim, em verdade, quem descobriu a BTS, o Rio São Francisco e tudo mais entre Porto Seguro e o Rio Grande do Norte foi ele, em maio de 1500. A expedição de 1501 apenas deu-lhes nome, conforme o santo do dia em que passava por tais acidentes geográficos.
*Adinoel Mota Maia é professor do Departamento de Transportes da Escola Politécnica da Ufba e membro do Instituto Politécnico da Bahia, do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia e do Gabinete Português de Leitura. Autor, entre outras obras, de A Cruz dos Mares do Mundo

domingo, 3 de julho de 2016

Para construir o futuro de Salvador

O novo PDDU foi fruto de intensos debates que envolveram desde especialistas internacionais no desenvolvimento das cidades como de associações de moradores de comunidades de todas as partes de Salvador. Na Câmara, novas audiências públicas e o debate conduzido pelos vereadores vão, certamente, contribuir para a melhor compreensão dos objetivos do PDDU e para possíveis aperfeiçoamentos.
O eixo central do novo plano  é a descentralização do desenvolvimento da cidade, invertendo a tendência dos últimos anos, que concentrou empregos e oportunidades em apenas duas áreas: no Centro de Salvador e na região do Iguatemi. Enquanto a população da capital baiana crescia até chegar a ser a terceira maior do país, a ocupação desordenada dos espaços foi criando enormes distâncias entre os locais de moradia e as áreas de concentração de trabalho. A mobilidade urbana transformou-se num dos maiores - se não o maior - problema  de Salvador; os engarrafamentos tornaram-se rotina.
O novo PDDU prevê dois novos polos econômicos - um logístico, outro educacional - no miolo da cidade e na região das avenidas Orlando Gomes e Paralela. Também incentiva investimentos em serviços, comércio e turismo no Subúrbio e em toda a borda da Baía de Todos os Santos, na Orla Atlântica da Cidade e na área central. No Centro Antigo, particularmente, o PDDU estabelece estímulos para desenvolver o turismo, a cultura e a economia criativa e também para atrair habitações, respeitando o patrimônio histórico da região.
Esse desenvolvimento descentralizado passa por outros pontos importantes estabelecidos pelo plano. A duplicação das zonas de interesse social inclui áreas populares no planejamento da cidade e combate a informalidade, criando estímulos e facilidades para os pequenos negócios. A ampliação das áreas de proteção ambiental e a criação de novos parques apontam para uma cidade ambientalmente equilibrada que preserva sua cobertura verde. E, finalmente, a meta de aproximar os locais de moradia e trabalho, de descentralizar as oportunidades é buscada nos próprios edifícios, pois o PDDU incentiva, nos prédios para moradia, o aproveitamento do térreo para estabelecimentos de comércio e serviços, que, em outras capitais, no Brasil e no exterior, mostrou ser um caminho para revitalizar os bairros com mais comodidade e segurança para seus moradores.
O PDDU será um instrumento decisivo para a construção do futuro de Salvador, mas a Câmara Municipal estará diante de mais uma tarefa para a adaptação da primeira capital do Brasil aos desafios do Século 21. A Prefeitura enviou ao Legislativo seu projeto para a nova Louos - Lei de Ordenamento do Uso e da Ocupação do Solo, que, certamente, incluirá ferramentas para a implantação do PDDU. A administração municipal foi prudente ao enviar os projetos separadamente para que os vereadores possam analisá-los com mais calma e profundidade. A confusão entre artigos do PDDU e da Louos foi o pivô para a suspensão, pelo Judiciário, dos projetos anteriores para o desenvolvimento urbano de Salvador.
Marcos legais claros vão estabelecer as bases para uma cidade mais democrática, com mais oportunidades para moradores de todas as áreas. O novo PDDU e a nova Louos indicam ainda o caminho para que, no futuro, Salvador avance a partir das bases estabelecidas no presente, com a valorização dos espaços públicos, com mais áreas de convívio social e com a marca de uma cidade voltada para 

as pessoas e sua qualidade de vida.
*Editorial do jornal Correio da Bahia