terça-feira, 14 de outubro de 2014

Cinco anos de concessão - Hora de revisão

Osvaldo Campos Magalhães*
Com a definição das eleições na Bahia, um importante tema relacionado ao desenvolvimento econômico do estado volta à ordem do dia, a revisão do contrato de concessão das BR’s 324 e 116, ligando Salvador a Feira de Santana e desta a Candido Sales, na fronteira da Bahia com Minas Gerais.
Maior concessão rodoviária do país, integrou a chamada “2ª fase da desestatização”, composta por sete lotes de rodovias, conduzida pela então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. O modelo adotado reduziu a taxa de rentabilidade das concessões e diminuiu o volume de investimentos previstos ao longo do prazo de vigência do contrato.
Com grande viés político, foram obtidos valores muito baixos para as tarifas de pedágio. Na campanha eleitoral de 2010, a comparação das tarifas das rodovias privatizadas por Dilma e das estaduais paulistas, mais caras e parecidas com as da primeira fase do governo federal, foram temas de destaque. 
As grandes empreiteiras brasileiras não se interessaram em participar dos leilões devido à baixa taxa de retorno nas novas concessões. No caso das BR’s 324/116, foi vencedor o consórcio liderado pela empresa espanhola ISOLUX e participação minoritária das empresas brasileiras Engevix e Encalso, que ofereceram deságio de 21% em relação à tarifa teto de R$2,80. Apesar da importância do trecho a ser concessionado, apenas mais um grupo empresarial entrou na disputa, o consórcio formado pelas empresas Heleno e Fonseca Engenharia, LBR e CRA
Sem qualquer experiência anterior em concessões rodoviárias, a Isolux, conhecida por vitórias em licitações de linhas de transmissão, marcou sua entrada no segmento brasileiro de concessões rodoviárias logo no maior trecho rodoviário privatizado, os 680 quilômetros que ligam a divisa de Minas Gerais a Feira de Santana na BR 116 e o trecho da BR 324 até Salvador, incluindo ainda a ligação à base naval de Aratu.
Talvez por desconhecimento do novo setor de atuação ou quem sabe em função dos baixos valores do pedágio, a gestão privada destas rodovias na Bahia vem sendo objeto de severas reclamações por parte dos usuários que convivem diariamente com atrasos nas obras, engarrafamentos e diversos acidentes principalmente no trecho da BR 324.
Estratégica para nossa economia, a ligação rodoviária entre Feira de Santana e Salvador deveria se converter num grande eixo de desenvolvimento, gerando oportunidades de implantação de diversos empreendimentos, com destaque para a transformação de Feira de Santana na grande plataforma logística do Norte Nordeste.
Transcorridos os cinco primeiros anos da concessão, constata-se a necessidade de revisão do contrato ou até mesmo a sua suspensão. Devido à importância estratégica deste corredor rodoviário para a economia baiana, necessário de faz uma nova repactuação dos investimentos a serem realizados, sendo urgente a imediata inclusão da construção da terceira faixa de rodagem entre Salvador e Feira de Santana. A melhoria na prestação dos serviços se faz necessária e o governo do Estado da Bahia não pode mais se omitir em relação a assunto tão estratégico para a economia regional.

*Engenheiro Civil e Mestre em Administração, é membro do Conselho de Infraestrutura da FIEB

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Urbanismo e arquitetura para o século XXI

José da Conceição Afonso*Sensivelmente a partir da década de 80 no séc. XX, a par do fenômeno mundial de concentração das populações em metrópoles e cidades, assistimos a um outro fenômeno chamado de Globalização ou Mundialização, a que os mais entusiastas já consideram caracterizar uma nova era da História da Humanidade. Não existe uma definição de globalização que seja aceite por todos, pois designa muitas coisas ao mesmo tempo. Há a interligação acelerada dos mercados, há a possibilidade de movimentar bilhões de dólares por computador em alguns segundos, como ocorre nas Bolsas de todo o mundo, há a chamada terceira revolução tecnológica (processamento, difusão e transmissão de informações). A globalização está em curso, entre outras coisas, por causa de duas revoluções: a tecnológica e a da informática. É dirigida pelo poder financeiro. Juntas, a tecnologia e a informática e com elas o capital financeiro diminuíram distâncias e romperam fronteiras. Hoje é possível ter informações sobre qualquer parte do mundo, a qualquer momento e de uma forma simultânea. Mas também o dinheiro tem agora o dom da ubiqüidade, move-se de maneira vertiginosa, como se estivesse em todo o lado ao mesmo tempo. E mais, o dinheiro dá uma nova forma ao mundo, a forma de um mercado, de um mega-mercado. A globalização em curso, com fundamento ultra neoliberal, modifica radicalmente o discurso urbanístico e arquitetônico, podendo-se-lhe já constatar, em síntese, as seguintes características relativamente às quais não podemos deixar de refletir e assumir uma posição:
1. Desterritorialização espacial e cultural / Abolição sistemática de fronteiras;
2. Afronta aos contextos e valores históricos, culturais, e patrimoniais pré-existentes / Desmemorialização das comunidades quanto aos referenciais constituintes da sua identidade;
3 Ataque sem limites ao pluralismo cultural e aos valores de identidade nacional, regional e local que não conhece, em favor de valores internacionais, sobretudo americanos, que conhece;
4. Desestruturação dos tecidos urbanos pré-existentes e imposição da estética do caos e dos não-lugares;
5. Promoção do conceito de cidade como um mega-mercado;
6. Promoção do conceito de cidade genérica, igualitarista nos aspectos formais, como resultado dum pensamento internacional, sobretudo americano;
7. Cenário provocatório de uma estética sem ética, como fundamento para o exercício da profissão do arquiteto. Quando o mundo é conquistado pelas multinacionais, as comunicações maximizam-se e as distâncias virtualizam-se, a cultura do não-lugar, do desapego e de uma identidade universal crescem. A arquitetura não respeita fronteiras, nem tradições, nem recursos naturais e surge como resultado de um pensamento internacional (3). Pelo desprezo que revela ter em relação às questões patrimoniais e de identidade cultural pré-existentes, a estética da arquitetura da globalização, uma Estética Sem Ética, pretende que nos tornemos apáticos, acríticos e insensíveis a tudo o que nos surja diante dos olhos. Pelas razões atrás invocadas, afigura-se antes de tudo ser uma questão vital de preservação da nossa identidade, uma identidade que queremos dinâmica e viva, uma identidade que não podemos deixar que morra às mãos do passadismo ou do ultravanguardismo neo-liberal, saber-se como lidar com essa nova corrente econômica e de pensamento, a da Globalização e Super-modernidade, este novo problema dos nossos dias como muito bem refere Mário Soares num artigo publicado recentemente no semanário Expresso.
Um outro tipo de globalização é possível e desejável!
Globalizar ou glocalizar?
A nossa principal crítica não é contra a globalização, mas sim contra este tipo de globalização, pois, negá-la ou querermos sair dela, seria inútil porque como diz Rosa Montero num artigo do diário el país .... se nos opusermos à onda em vez de a cavalgar, estaremos desaproveitando um momento crucial e facilitando que as multinacionais assumam o controle do novo mundo. Não há que rechaçar a globalização mas sim tomá-la (4). Mas, a nossa crítica relaciona-se não só com o fenômeno da globalização mas também, muitas vezes, com uma total falta de idéias quanto à concepção de muitos dos edifícios anônimos existentes. Refira-se que muitos dos edifícios e conjuntos urbanos que constituem a melhor arquitetura das nossas cidades encontram-se em deprimente e total abandono, quando não à espera da buldozer, sem que isso tenha alguma coisa a ver com o fenômeno da globalização. Porque não aproveitar a quantidade de informação e a velocidade a que circula para conhecer projetos, novas tecnologias, materiais, sua aplicação adequada; estudá-los e ver de que modo seriam úteis em cada lugar, em vez de tomar edifícios, copiá-los textualmente, ou demolir tantas e tantas vezes obras excepcionais que deveriam ser recuperadas e valorizadas?
Porque não aproveitar os recursos do lugar, porque não pensar um pouco, porque não estudar o movimento do sol, as chuvas e o vento no seu relacionamento com o urbanismo e a arquitetura? Porque não pensar numa arquitetura global dentro do local e local dentro do global. Uma arquitetura única para cada lugar dentro do pensamento universal. Uma arquitetura de idéias que tenha que ver com a sua implantação, que não contribua para o esgotamento dos recursos naturais, mas que ajude a conservá-los; isto sem deixar de ser parte deste mundo globalizado.
“Que o genius loci seja o sustentáculo desta arquitetura ecológica” (5).
No fundo, como contraponto à globalização, o que é possível ser feito em relação à arquitetura e urbanismo, julgo ser aquilo que os economistas já designam por globalização, uma síntese de Global com Local, articulando e integrando no mesmo processo valores locais e regionais com valores universais. Com o século XXI, o futuro surge incerto mas também com novas oportunidades a exigir novas atitudes; hoje temos que refletir e agir não só em relação ao adro da nossa igreja mas também à nossa casa de todos, o planeta Terra. O olhar global, em extensão, é tão necessário, fascinante e importante como o olhar local, em profundidade. Ambos estes olhares ajudam-nos a perceber melhor a condição do Homem neste planeta.
*José da Conceição Afonso é arquiteto e atua em Portugal