quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Cidades: Pensar em primeiro lugar nas pessoas

Especialista em criar cidades melhores, o arquiteto Jan Gehl, (foto), responsável por mudar a cara de Copenhague, nos anos 1960, mostra que as cidades têm solução e dá a receita: pensar, em primeiro lugar, nas pessoas.
Natália Garcia*
É clichê e piegas, mas é preciso dizer: por trás - e ao lado - de todo homem há, sim, uma grande mulher. No caso do planejador urbano dinamarquês Jan Gehl, que se formou arquiteto em 1960 na Royal Danish Academy of Fine Arts, foi a esposa psicóloga que o impediu de se tornar mais um "obcecado pela forma, sem pensar na funcionalidade", como ele descreve a maioria dos colegas. "Ela me provocava perguntando por que nós nunca pensávamos nos aspectos humanos na hora de criar projetos para a cidade", conta. Gehl e a esposa organizavam reuniões semanais em sua casa com outros colegas para discutir as fronteiras (e possíveis ligações) entre sociologia, psicologia, arquitetura e planejamento. Esses encontros foram o começo do que mais tarde se tornaria o assunto da vida de Jan Gehl: como criar cidades melhores para as pessoas. Em 1971 ele publicou seu primeiro livro, Life Between Buldings ("A vida entre os prédios", em tradução livre, sem versão em português), em que se debruça sobre o comportamento das pessoas nos espaços públicos e utiliza a Strøget, a primeira rua de pedestres de Copenhague, como laboratório para mostrar que priorizar as pessoas era o melhor para criar boas cidades. A Strøget era uma importante avenida comercial e o anúncio de seu fechamento para virar um calçadão em 1962 causou reações negativas. "Não somos italianos", diziam os jornais para argumentar que o clima gélido da Dinamarca impossibilitava uma vida ativa nos espaços públicos. "Um ano depois, todos os comerciantes reconheciam: eles estavam errados", conta Gehl. As vendas triplicaram e esse calçadão de quase 1 quilômetro passou a ser ocupado pelos habitantes da cidade. Estudar o assunto fez com que Gehl criasse uma metodologia de planejamento que prioriza as pessoas. Seu escritório, o Gehl Architects, é o mais requisitado do mundo e já fez projetos, inclusive, para São Paulo e Rio de Janeiro.
O que significa criar uma cidade para as pessoas?
Você já notou que sabemos tudo sobre o habitat ideal dos gorilas, girafas, leões, mas nada sobre o Homo sapiens? Qual o lugar ideal para essa espécie viver? Infelizmente, sabemos muito pouco. Boa parte dos profissionais que definem o futuro de uma cidade, os arquitetos, urbanistas e políticos, estão preocupados com outras coisas. Eles querem melhorar o trânsito, criar "skylines", monumentos, pontes, mas nenhum deles tem na agenda o item "criar uma cidade melhor para as pessoas viverem".
E qual seria o lugar ideal para o homem viver?
Certamente não é uma cidade em que se precise passar três horas por dia dentro de um carro preso no congestionamento. Mas uma das coisas que descobri em todos esses anos de trabalho é que precisamos respeitar a escala humana. Em meu livro Cities for People ("Cidades para pessoas") eu falo, por exemplo, sobre a síndrome de Brasília, uma prática repetida em várias cidades do mundo. Brasília nasceu para ser uma cidade planejada, certo? Pois bem, quando a olhamos do céu, ela é incrível, mas quando a olhamos do chão, parece que estamos em uma maquete fora de escala. É tudo grande demais, as distâncias são impossíveis de serem percorridas pelo corpo humano e os monumentos são grandes demais para apreciarmos a partir de nossa altura. Isso sem contar a falta de calçadas e ciclovias. Se você não tem um carro em Brasília, fica impossível se locomover.
A escala humana, então, é a chave para planejar cidades para pessoas?
É uma das chaves. Temos que criar uma mudança de paradigma aqui. Antes de pensar em mais ruas, ciclovias, transporte público ou mesmo na escala humana, é preciso pensar: que cidade queremos? E aí, o que importa não são os elementos do planejamento urbano, mas as coisas que nos fazem viver melhor. Quando os planejadores quiserem chegar aí e não, por exemplo, ao melhor sistema de mobilidade possível, aí sim estaremos em um caminho interessante para melhorar as cidades. (Conheça os principais projetos da Gehl Architects)
O senhor fala em trânsito, problema grave no Brasil. Quais as soluções para essa questão?
O congestionamento é, sem dúvida, um dos maiores problemas das grandes cidades do mundo. E a chave para resolvê-lo é entender que a demanda correta não deve ser por mais transporte público ou ciclovias ou calçadas. Deve ser por mais opções, por mais liberdade de escolha de meios de se locomover do ponto A ao ponto B. Só ciclovias ou só transporte público não resolvem, mas uma combinação dos dois com boas calçadas e vias exclusivas de pedestres começam a deixar a cidade mais interessante e a dependência que se desenvolveu do carro começa a diminuir. Mas, ainda assim, muita gente vai continuar se locomovendo de carro, por comodidade. Então, junto com o aumento de opções de locomoção, é preciso diminuir o uso dos carros, dando menos lugar a eles. Quanto mais ruas, mais carros, quanto menos ruas, menos carros. Se você oferecer infraestrutura, a sociedade vai utilizá-la. Então, tirar espaço dos carros, ou proibir que estacionem nas ruas, são algumas das formas de garantir que eles sejam menos usados, em especial em curtos trajetos. E aí, as pessoas que realmente precisem de um veículo para se locomover, seja porque a distância é longa demais, seja porque é uma emergência, terão espaço para dirigir.
Parece tão difícil e tão longe da nossa realidade...
Sim, é um processo complicado. Hoje Copenhague é um exemplo mundial de uma cidade boa para se viver, mas começamos nossa mudança de paradigma 50 anos atrás. A chave para que tenhamos chegado até aqui foi dar um passo de cada vez. Não dá para, de uma hora para outra, proibir os carros de estacionarem nas ruas. Mas que tal proibir em um bairro? Ou em apenas uma avenida? E, no lugar onde os carros estacionariam, criar uma ciclovia? Esse acaba sendo um projeto piloto, as pessoas teriam tempo para se acostumar. E, quando começar a dar certo, fazemos isso em outro ponto. Pouco a pouco a população vai entendendo como a cidade pode melhorar. Eu tenho muito orgulho de dizer que moro em uma cidade que todos os dias é um pouco melhor do que era no dia anterior.
Em Copenhague, um terço das pessoas usa a bicicleta como transporte todo dia. As bicicletas devem ser pensadas como solução em cidades grandes como São Paulo?
Certamente sim. A bicicleta é um meio de transporte ágil que não polui e faz as pessoas se exercitarem. A chave para integrar a bicicleta à mobilidade urbana de uma cidade muito grande é não pressupor que as pessoas vão fazer todo o trajeto pedalando. Pedalar 20 quilômetros pode ser ok para quem é jovem e tem condicionamento físico, mas certamente não é uma prática para todos. Então a bicicleta precisa estar integrada a outros meios de transporte. Bicicletários deveriam existir na maioria absoluta dos pontos de ônibus, trens e metrô, para que as pessoas possam fazer parte do trajeto pedalando e parte de metrô, por exemplo. Bicicletas de aluguel que sigam os exemplos de Paris, Barcelona e Lyon, onde as pessoas podem retirá-las e devolvê-las em diferentes pontos da cidade, são ideais. Mas é fundamental que haja infraestrutura para pedalar. Se as pessoas não se sentirem seguras, bicicleta continuará sendo um meio restrito para se transportar.
Como a população deve participar do processo da criação de cidades para pessoas?
É preciso que as pessoas exijam as coisas certas. Se você, por exemplo, perguntar a uma criança o que ela quer de natal, ela vai te responder uma lista de coisas que já conhece. Uma criança nunca pediria algo de que nunca ouviu falar. O mesmo vale para as demandas das pessoas em relação às cidades. É fundamental que haja informação sobre como uma cidade pode ser melhor para que a sociedade exija as coisas certas. Enquanto exigirem mais ruas para dirigirem seus carros, as cidades vão continuar crescendo do jeito errado. Quando passarem a exigir mais liberdade de locomoção, daí o governo terá que fazer algo a respeito. Em Copenhague foi assim. Na década de 1970 a cidade estava tomada pelos carros. Com a crise do petróleo, dirigir ficou muito caro e as pessoas começaram a exigir infraestrutura para pedalarem em segurança. E as ciclovias foram, pouco a pouco, tomando o lugar dos carros.
O planejamento urbano pode fazer as pessoas mais felizes?

Planejamento urbano não garante a felicidade. Mas mau planejamento urbano definitivamente impede a felicidade. A pior coisa para a felicidade das pessoas é perder tempo paradas no congestionamento. Se a cidade conseguir diminuir o tempo que você fica parado no trânsito e lhe oferecer áreas de lazer para aproveitar com seus amigos e sua família, ela lhe dará mais condições de ter uma vida melhor. O planejamento urbano é uma plataforma para as pessoas que vivem e trabalham nas cidades sejam felizes. *Natália Garcia além de jornalista é criadora e editora do blog "Cidade para as Pessoas" . **Jan Gehl é arquiteto e professor de planejamento urbano. Sócio da Gehl Architecs.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Entidades apoiam Metrô em corredor estruturante

Nota Pública – Mobilidade Urbana
Após análise das propostas apresentadas para o transporte público metropolitano a ser adotado entre os Municípios de Salvador e Lauro de Freitas, tendo como corredor estruturante a Avenida Paralela, as Entidades abaixo vêm se manifestar publicamente em defesa da proposta escolhida pelo Governo Estadual na PMI da Mobilidade, por entenderem que, para aquele trecho, a solução através de veículo sobre trilhos é a mais adequada sob o ponto de vista técnico, econômico e ambiental, senão vejamos:
1 – Possui condições técnicas e operacionais, atingindo níveis de serviço que resulta na possibilidade de transferência de modo, reduzindo a quantidade de veículos que transitam diariamente naquele corredor;
2 - O subsistema metroviário contempla transporte de alta capacidade, sendo o mais apropriado para corredores troncais como o da Paralela, representando uma solução de longo prazo, consequentemente, melhor legado para a cidade;
3 - Da forma como proposto na PMI, promoverá uma integração física e operacional com a Linha 1 do Metrô e com as linhas de ônibus, garantindo o atendimento das necessidades dos deslocamentos cotidianos realizados pela população, com abrangência metropolitana, alem de homogeneizar tecnologias, proporcionando desoneração de custos de manutenção;
4 – Contempla a criação de linhas alimentadoras metropolitanas de ônibus, visto que o Metrô funcionará como eixo troncal do sistema de transporte de massa;
5 – A proposta condiciona o ressarcimento do investimento publico à concessionária, após a conclusão das obras e inicio da operação, o que garante sua conclusão;
6 - Em termos ambientais, a implantação de um modelo tecnológico de transporte sobre trilhos é mais vantajoso que modelos que se utilizam de combustíveis originados de fontes não renováveis e sobre pneus.
Isto representará uma diminuição relevante na emissão de gás carbônico (CO2), consequentemente, em menor impacto ao meio ambiente.
7 – Possibilidade de reestruturação da RMS, criando um sistema estruturante sobre trilhos, desde que se implante a interligação da via férrea suburbana existente ao Metrô em implantação, através da extensão do trem suburbano de Lobato a Pirajá, ou Juá, ou Retiro, para o qual se direcionarão os outros modais alimentadores de forma capilar no tecido urbano, inclusive proporcionando uma expansão urbana nos vetores criados pelo prolongamento dessas vias estruturantes, desadensando a cidade de Salvador com a melhor ocupação do solo do território.
Ademais esta proposta atende ao que dispõe o artigo 201 do PDDU/2008 de Salvador, que estabelece a implantação de linhas de transporte de alta capacidade, assegurando, a priorização da conclusão da Linha 1 do metrô no PAC Mobilidade Grandes Cidades - trecho Lapa/Pirajá – integrando, na Estação do Acesso Norte, com o modo a ser implantado, objeto do PMI.
Ressaltam também a necessidade de elaboração e implementação de um Plano Diretor de Transportes Urbano de Passageiros para Salvador e Região Metropolitana, conforme inciso “I” do Art. 200 do PDDU, que defina as diretrizes, alternativas e programas de investimentos para implantação de um sistema de transporte estruturado, integrado, racional, justo e eficaz, vez que há distorção no aproveitamento das tecnologias específicas para o transporte de massa, com o modo rodoviário exercendo o papel de principal transportador em detrimento daqueles de maior capacidade e potencial.
Reforçando ainda que o atual sistema de transporte da RMS não contempla o transporte intermodal e intermunicipal, há que se adotar políticas focadas na racionalização e na complementaridade dos modos de transporte, no sentido de reverter as descontinuidades e indefinições que os próprios modelos institucional, financeiro e organizacional geraram, retomando o planejamento e a programação de investimentos para o setor.
Por todo o exposto, as Entidades requerem que se adote a proposta escolhida pelo Governo na PMI, contemplando a integração entre os diversos sistemas previstos no programa de mobilidade para Salvador, através de uma abordagem sistêmica, em que todos os modos sejam contemplados no programa, seja o modo a pé, integração da bicicleta, ônibus alimentadores, BRT, VLT e metrô e que se atenda ao PDDU.
Salvador, de agosto de 2011.
Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia da Bahia – CREA-BA
Associação dos Engenheiros Ferroviários da Leste Brasileiro – AELB
Associação Brasileira dos Engenheiros Civis – ABENC/BA
Instituto dos Arquitetos do Brasil, Dept.º da Bahia – IAB/BA
Clube de Engenharia da Bahia – CEB
Escola Politécnica da UFBA – Departamento de Transportes

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

A Revolução Urbana

Klaus Toepfer*
Neste novo milênio, uma revolução urbana começou a acontecer: pela primeira vez na história da humanidade, metade da população mundial é urbana.
Esta revolução urbana será escalonada para as próximas duas décadas, quando então a população urbana será duas vezes maior que a população rural. O grande volume desta nova população urbana estará concentrada na África e a Ásia, juntando-se à vasta massa de cidadãos urbanos da Europa, América do Norte e América Latina, onde três quartos da população já são urbanos. A África, atualmente o último continente urbanizado, terá três terços da sua população vivendo em cidades no ano de 2020. E as maiores e mais densamente povoadas megacidades, com população de mais de 10 milhões de pessoas, estarão localizadas no hemisfério Sul, e não no Norte.
Embora as cidades sejam — e permanecerão sendo — os centros financeiros, industriais e de comunicação globais, assim como o lar de uma rica diversidade cultural e dinamismo político, imensamente produtivas, criativas e inovativas, também se tornaram um solo fértil para a pobreza, violência, poluição e congestionamentos. Padrões insustentáveis de consumo, concentração de indústrias, intensa atividade econômica, aumento da motorização e administração ineficiente sugerem que os maiores problemas ambientais do futuro serão gerados pelas cidades.
Pelo menos 600 milhões de moradores urbanos nos países desenvolvidos _ e este número ainda está crescendo – já vivem em casas de qualidade tão pobre e com tão inadequadas condições de saneamento, como a qualidade da água e a precária rede de esgoto, que suas vidas e saúde estão sob contínua ameaça Para milhões de pessoas ao redor do mundo, a vida urbana se tornou um pesadelo, muito distante do sonho de segurança e prosperidade prometidas pelos visionários, principalmente para os jovens, que herdarão o novo milênio.
Não só estamos vivendo num mundo urbanizado, mas estamos também experimentando uma urbanização da pobreza sem precedentes. Em muitas cidades do mundo desenvolvido, mais da metade da população urbana habita moradias “informais”, favelas e assentamentos precários que, por não serem legalmente reconhecidos, não são assistidos pelas autoridades locais. O lado “informal” das cidades não desfruta dos benefícios da vida urbana, incluindo o acesso aos serviços básicos, como tratamento de saúde e água potável. Os moradores vivem em constante estado de medo e muitos não têm acesso ao sistema financeiro formal, que poderia habilitá-los a melhorar a sua condição de vida. Esta maioria invisível é indispensável para a economia das cidades.
As cidades ditas “formais”, em contrapartida, desfrutam das vantagens que a vida nas cidades oferece, geralmente à expensas da maioria chamada “informal”. Este conto moderno de duas cidades representa uma das grandes falhas da revolução urbana, uma vez que aliena e marginaliza uma parte da população urbana em prol da outra.
A despeito de todos esses problemas e desafios, as cidades continuam a crescer. A história tem mostrado que todas as tentativas de limitar o processo de urbanização fracassaram. Agora é amplamente aceitável o fato de que a urbanização é não só inevitável, como trata-se de um fenômeno positivo. As cidades existem porque elas oferecem oportunidades e a promessa de uma vida melhor. Nas cidades é possível a integração entre os seres humanos, assim como entre os recursos econômicos e tecnológicos, no intuito de obter o máximo resultado. As cidades funcionais são também um pré-requisito para o sucesso do desenvolvimento rural.
No entanto, maus governantes e políticas ruins levam a uma severa degradação ambiental e conseqüente degradação da qualidade de vida em muitas cidades ao redor do mundo. Não há dúvida de que as cidades dispõem do potencial necessário para serem seguras e saudáveis, para todos os seus moradores. O grande desafio reside em focar na dimensão social da pobreza urbana, em projetar novas estratégias e contornos no gerenciamento das áreas urbanas, assim como em propor métodos inovativos capazes de melhorar o ambiente físico, gerando infra-estrutura.
Como demonstrou a Conferência de Istambul, os cidadãos das cidades estão demandando serem vistos e ouvidos e serem autorizados a tomar decisões sobre o local onde vivem. Os moradores mais pobres, que constituem a maioria da população urbana, deveriam ter voz e escolha sobre onde e como morar.
Embora muitos países não disponham dos recursos financeiros e da estrutura legal e institucional necessárias para responder à rápida urbanização, muitas das autoridades locais já começaram a adotar novas soluções, utilizando sistemas mais abertos e transparentes de governar.
Esses processos têm-se intensificado pela tendência crescente rumo à descentralização, que tem alterado, dramaticamente, o papel e os métodos de trabalho das autoridades locais. O debate democrático e a tomada de decisão participativa da população já transformaram a forma como o conselho e a municipalidade de algumas cidades planejam e administram essas cidades. Envolvendo todos os moradores, tanto ricos como pobres, mulheres e homens, nos processos de ajuste das cidades, as autoridades locais podem criar um senso de posse e responsabilidade entre todos os habitantes. Através desse processo as cidades do futuro podem verdadeiramente se tornar cidades de todos.
O futuro da humanidade reside nas cidades. Se começarmos a tomar providências agora, as cidades do desespero poderão se transformar nas cidades da esperança e da alegria.

*Klaus Töpfer, Diretor Executivo do Instituto de Estudos Avançados sobre Sustentabilidade. Foi Ministro do Meio Ambiente da Alemanha.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Pelo futuro de Salvador

José de Freitas Mascarenhas*
Nada expressa melhor a qualidade da inteligência do homem do que sua capacidade de pensar e planejar para melhorar a sua condição terrena. Esse atributo que nos foi doado pela Natureza está sendo urgentemente solicitado para uso em Salvador. Estamos hoje condenando com veemência os nossos ascendentes porque não tiveram suficiente visão nem cuidaram adequadamente do planejamento de Salvador. No entanto, estamos incidindo no mesmo pecado, desleixando o cumprimento das nossas responsabilidades com o futuro dos nossos descendentes, que habitarão a nossa tão estimada cidade. Não fosse ainda o compromisso devido a nossa própria geração.
Complexa e caótica, a mobilidade urbana em Salvador e região metropolitana é um problema que se agrava exponencialmente pela falta de planejamento estratégico de longo prazo. Nos últimos anos, a população viu aumentar a restrição a sua capacidade de deslocamento dentro da cidade e no entorno. As pessoas passaram, involuntariamente, a produzir menos no mesmo espaço de tempo.
Todos conhecem os vários fatores que contribuem para esse cenário: infraestrutura viária saturada, expansão urbana desordenada, gestão ineficiente do sistema de transporte urbano. Mas, a ausência de um planejamento metropolitano é o fator preponderante por trás do conjunto das deficiências. Sem que houvesse um planejamento sólido no passado, a urbe sofre em agonia por um futuro incerto. E não adianta colocar esparadrapo nas feridas porque elas reabrirão adiante. Cuidar de uma ou duas pistas novas é bom para dar sobrevida à cidade, mas, em seguida, tudo voltará ao que era.
Proposições apressadas tentam compensar o atraso e prover soluções que aliviem o problema, até porque teremos eventos a agravar o quadro, como a Copa do Mundo de 2014 e a Copa das Confederações em 2013. BRTs, VLTs, metrôs, pontes, viadutos e pistas são soluções para o transporte, sim, mas quando partes de um sistema e não como simples ligação de um ponto A para outro B. Como se diz, é preciso cuidar do conjunto da floresta e não apenas de uma árvore.
Os terrenos infraestruturados a preços acessíveis se esgotam com rapidez, novamente empurrando a população de média e baixa renda para as moradias na periferia desassistida. A solução está na antecipação do futuro, planejando-o para a próxima geração, executando-o em partes. Há que se pensar em um planejamento integrado que, no mínimo, inclua Salvador, Lauro de Freitas, Camaçari, Simões Filho e Itaparica. Para tanto, é preciso buscar, por meio de uma concorrência, empresas internacionais com obrigação de associarem-se a consultorias nacionais, para executar esse planejamento, discutindo-o com a sociedade. Empresa internacional para que não venha impregnada da aceitação pacífica das nossas deficiências como se fossem atropelos naturais do nosso destino.
Esse plano vai custar muito? Certamente. Mas, quanto custarão as desapropriações para as pistas do sistema de transporte em áreas que não foram reservadas e são parte do mercado de preço livre? Este é exatamente um dos objetivos do plano: a marcação dos espaços non edificandi para uso futuro. Resultados dessa política podem ser vistos nas áreas industriais de Camaçari e do Centro Industrial de Aratu, que reservam terrenos para instalação de indústrias e outras atividades socialmente importantes. Foram planejadas.
O planejamento metropolitano que se tem em conta não é focado apenas no sistema físico dos transportes ainda que esta seja uma função básica, incluindo sua autoridade reguladora e seus mecanismos de controles eletrônicos de tráfego. Cuidará da seleção, especialização e reservas de áreas para as diversas funções urbanas especialmente a habitação buscando, no possível, o estabelecimento de zonas de sobrevivência autônomas para proporcionar melhor qualidade de vida aos futuros habitantes e menor pressão sobre o sistema de transporte.
Diz-se que as grandes decisões são sempre tomadas em momentos de crises. Entendo que este momento já começou a existir em Salvador.
* José de Freitas Mascarenhas é presidente da Federação das Indústrias do Estado da Bahia
- Artigo publicado no jornal A Tarde.

Ojó-ibaré - Dia da amizade

Maria Stella de Azevedo Santos *
Vinte de julho – Dia Internacional da Amizade. Substantivo tão cantado e contado, mas dificilmente encontrado. Milton Nascimento canta: “Amigo é coisa para se guardar no lado esquerdo do peito”. Roberto Carlos diz que quer ter um milhão de amigos, para que mais forte possa cantar.
Impossível falar da amizade sem o substantivo correlato – amigo. Roberto Carlos pede um milhão, mas se conseguirmos apenas um já é bom demais, principalmente se este substantivo vier acompanhado de um adjetivo imprescindível: sincero. Na verdade, é impossível considerar alguém amigo, se ele não for sincero. Uma amizade assim sugere compreensão, perdão, capacidade de dizer não nas horas precisas, coragem de mostrar o que não se deseja ver. Amigo é aquele que entende o que o outro quer fazer, mas não necessariamente apoia: orienta e torce para que o caminho certo seja encontrado.
Pois não são apenas as opiniões semelhantes que fazem com que duas pessoas encontrem a amizade.
Um exemplo disso é a grande afinidade que une dois orixás de temperamentos opostos: Orumilá, que através da calma ajuda os homens a “aplainarem” seus destinos, e Exu que “quente como o fogo” auxilia criando confusões. A amizade tão cantada é agora contada: Orumilá viajava em comitiva e todos queriam ajudá-lo carregando sua sacola de divinação. Os “amigos” terminaram brigando entre si, fazendo com que Orumilá optasse por carregar seus apetrechos.
Orumilá não conseguia tirar aquele assunto da cabeça. Ele estava confuso a respeito de quem entre todos os que queriam ajudar-lhe era seu amigo de verdade e, por isso, resolveu fazer um teste. Mandou espalhar um falso boato de que ele tinha morrido. Muitos “amigos” apareceram para demonstrar o pesar à esposa de Orumilá. Cada um dizia que o referido orixá lhe devia dinheiro, o qual tinha que ser pago com o recebimento da sacola de divinação.
Escondido, Orumilá ouvia tudo aquilo com uma profunda dor. Foi quando apareceu Exu, tão pesaroso quanto os outros. A mulher de Orumilá lhe perguntou, então, o que seu marido devia para ele. Exu respondeu que simplesmente nada. Percebendo que a dor de Exu era verdadeira e desinteressada, Orumilá apareceu e disse: “Quando a afinidade com um amigo é grande, ele é considerado mais que um parente”.
Se não é fácil encontrar um amigo sincero, mais difícil ainda é ser um deles. Afinal, a arte da amizade implica que a índole seja pura, que já se tenha adquirido uma mente despoluída, onde não há lugar para a ambição, a mentira, a falsidade e outros pensamentos e atitudes dúbios.
É muito comum a amizade, que geralmente vem acompanhada de benevolência, aparecer nos momentos adversos. Nas tragédias que acontecem vemos pelos meios de comunicação brotar, momentaneamente, uma intensa e coletiva generosidade que, com a mesma intensidade que aparece, some. Pergunto-me: é generosidade real ou uma necessidade de acreditar que existe em si uma fagulha que seja de nobres sentimentos, que encubram tantos outros, como egoísmo, hipocrisia, hostilidade, inveja, indiferença? Muitos dizem que é na tristeza que se conhece um grande amigo. Será?
É para que nunca nos esqueçamos de cultivar o sentimento fiel de afeição e ternura para com os outros que foi instituído o Dia Internacional da Amizade. Esse dia foi escolhido por Enrique Ernesto Febbraro, que compreendeu o fato da chegada do homem à Lua, ocorrido em 20/7/1969, como uma prova significativa de que, quando as pessoas se unem, não existem obstáculos intransponíveis. Antes disso, esse argentino já havia divulgado o seguinte lema, enviando diversas cartas para diferentes países: “Meu amigo é meu mestre, meu discípulo e meu companheiro”.
Volto ao passado e lembro-me de uma antiga canção que diz: “Amigo, palavra fácil de pronunciar. Amigo, coisa difícil de se encontrar. Por isso se diz na frase tão usada: venha a nós e ao vosso reino nada”. Então vamos aproveitar este vinte de julho para refletirmos sobre maneiras saudáveis de construir e manter relacionamentos amigáveis com nossos semelhantes, é o que se diz em yorubá: baré.
*Maria Stella de Azevedo Santos é Iyalorixá do Ilê Axé Opô Afonjá

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Wagner confirma Metrô na Paralela

A escolha do metrô como modal de transporte para a Copa 2014 em Salvador foi o tema principal do governador Jaques Wagner em seu programa semanal de rádio desta terça-feira (9). Wagner afirma que o intermodal que integra os sistemas da Avenida Paralela até a Rótula do Abacaxi resolve os problemas de trânsito na cidade e melhora o transporte na região metropolitana. “Finalmente estamos ultimando os preparativos para fazer a licitação e começar as obras desse canal de tráfego”, afirma o governador, que deve apresenta, com o prefeito João Henrique, até a próxima quinta-feira, o projeto do sistema completo de mobilidade urbana da capital.
Segundo o governador, a estimativa inicial do custo da construção do metrô está em torno de R$ 1,6 bilhão e a previsão é que o edital de licitação saia entre 35 e 40 dias. As obras devem ser iniciadas ainda este ano. Segundo Wagner, o governo do estado e a prefeitura iniciarão os estudos necessários à integração do sistema de transporte de massa até o bairro de Cajazeiras, que concentra mais de 750 mil habitantes. A ampliação da linha 1 do Metrô até os bairros de Pirajá e Cajazeira aumentaria a viabilidade econômica do sistema de transportes. Leia íntegra do Parecer Final do Grupo de Trabalho GTE_PMI

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Bahia, cidade e integração

Antônio Risério*

É coisa relativamente rara, mas parece que estamos mesmo caminhando para um consenso. Nossa questão maior, hoje, é intensificar a integração espacial, econômica, social e cultural da Bahia. Outro dia, aqui neste jornal, Armando Avena escreveu sobre integração espacial, do ponto de vista econômico. É por aí. Para a Bahia se projetar em direção ao futuro, será necessário articular, no território estadual, uma nova rede infraestrutural e uma rede de cidades estratégicas, capazes de mobilizar e dinamizar a vida baiana, a partir de suas regiões.
No plano da logística, os projetos centrais do governo já estão devidamente definidos.
Quanto ao plano das cidades, o que se impõe é a qualificação de núcleos urbanos vitais para o sucesso no enfrentamento das novas realidades e de seus desafios. Ou seja: as realizações no campo da logística exigem a realização simultânea de uma ampla e criativa ação urbanística, operando sobre polos urbanos previamente definidos, dentro de critérios claros de desenvolvimento.
É na convergência de uma nova infraestrutura e de uma rede urbana renovada (em termos físicos e culturais) que está a chave para o êxito baiano.
A Ferrovia Oeste-Leste tem de acontecer já.
Assim como é indispensável dar outra vida ao Porto de Aratu (o Porto de Salvador – deixando de parte a ficção burocrática de que as unidades de Aratu e da capital formam um só complexo portuário – deve se voltar para cruzeiros e passageiros, em tempos de democratização do turismo e com vistas à Copa do Mundo). Construir o Porto Sul. Impulsionar o estaleiro do Paraguaçu, retomando, em outro patamar tecnológico, a tradição baiana de construção naval. Etc.
Mas os entraves ao desenvolvimento não estão somente aí. Estão, em grande parte, nos núcleos sociais dinamizadores, que são as cidades. A começar por Salvador. Mas se estendendo a todas as regiões baianas. Daí que o governo estadual esteja na obrigação de formular e executar uma política de intervenções urbanístico-culturais estratégicas, definindo polos articuladores regionais, a partir de suas condições atuais de existência.
Para dar um exemplo, o eixo Ilhéus-Itabuna tem de ser reativado. Precisa do porto, de equipamentos culturais, de novos estímulos, de novas direções. Tanto Ilhéus quanto Itabuna precisam ser repaginadas, em termos urbanísticos e culturais.
Não só Ilhéus e Itabuna, é claro. Precisamos definir aí por volta de umas nove cidades estratégicas (uma no semiárido, obviamente) e fazer com que elas funcionem bem e de forma articulada, na sua região e entre regiões. Estas cidades necessitam de realizações na educação, na saúde, na segurança, etc. Mas é necessário ir além disso.
Elas precisam de uma ação reconfiguradora para sacudir a poeira e ativar energias criadoras.
De uma investida assentada, sempre que possível, num tripé: urbanismo, cultura e turismo.
Com isso, teremos uma intervenção que se vai dar, de forma simultânea e complementar, tanto no corpo físico quanto na dimensão simbólica da cidade. Ela será repensada, em seus aspectos mais fundamentais, de uma perspectiva urbanística. Mas será encarada, acima de tudo, pelo que é: um fato de cultura, no sentido antropológico da expressão. Terá ampliado o seu acesso aos bens culturais e viabilizada sua própria produção nesse campo. Coma perspectiva turística se abrindo para a tornar mais visível, no espectro de suas realidades e manifestações.
Mas vamos, enfim, atar os fios dessa meada.
Falei que é necessário articular a implantação de uma nova malha infraestrutural e a energização urbanístico-cultural de um elenco de cidades estratégicas, cuja definição se impõe de modo lógico (Salvador, Feira, Conquista, Ilhéus-Itabuna, Juazeiro, etc.). Por esse caminho, poderemos ter novidade logística, novidade citadina e novidade cultural, convergindo, em ações exemplares, para situar a Bahia na linha de frente do avanço brasileiro. Mas, para isso, é preciso romper com a rotina, a timidez e o provincianismo. É preciso não ter medo de fazer. É preciso ousar.
*Antônio Risério é poeta, antropólogo e escritor.

Artigo publicado originalmente no jornal A Tarde

Coritiba também adota o Metrô e ciclovias

Canaletas onde atualmente circulam os biarticulados, serão revitalizadas para abrigar ciclovias
Ao que tudo indica, o metrô curitibano está próximo de sair do papel e se tornar realidade. Em última visita ao Paraná, no último mês de julho, a presidente Dilma Rousseff declarou que Curitiba está muito bem cotada para receber recursos do Governo Federal para a construção do metrô. O anúncio do PAC da Mobilidade, que estava previsto para acontecer nas últimas semanas de agosto, foi prorrogado e deve acontecer ainda em 2011. Além da verba federal, o metrô curitibano contará ainda com recursos do governo estadual, da prefeitura municipal e de um investidor privado, que será escolhido através de licitação.
Todo o planejamento e a captação de verba junto ao governo federal estão sendo feitos para a construção da primeira fase do metrô curitibano, e a capital sai na frente pelo fato dos estudos técnicos e ambientais já estarem prontos. “Curitiba tem o melhor e mais adiantado projeto e também temos pouquíssimos casos para desapropriação de terrenos. Tudo isso nos coloca em vantagem em relação às demais cidades que disputam recursos do governo federal”, afirmou o prefeito Luciano Ducci, durante apresentação do projeto em reunião Sinduscon-PR (Sindicato da Indústria da Construção Civil no Paraná).
Diante esse cenário, o assunto voltou à tona e o os curitibanos já querem saber o que de fato o novo meio de transporte da capital irá mudar em suas vidas durante e após as obras de construção. Para o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC), a capital não irá sofrer grandes mudanças durante os quatro anos de obras da primeira fase do metrô.
Segundo o presidente da instituição, Cléver de Almeida, o fato de o metrô ser construído exatamente abaixo traçado das canaletas dos biarticulados faz com que as obras gerem pouco impacto no dia a dia da cidade. “Como há espaço nas canaletas e ainda temos as vias marginais, quase não teremos grandes interferências no trânsito. Nos pontos de cruzamentos será possível a colocação de lajes sob as obras para que o trânsito flua normalmente. As canaletas nos dão uma grande vantagem“, diz.
Pouco impacto
Em relação ao fornecimento de água, luz e gás nas regiões próximas à linha de metrô, Almeida afirma que haverá poucas interrupções nesses serviços. De acordo com ele, qualquer obra de grande porte exige planejamento das fornecedoras. “Empresas como a Copel e Sanepar estão acostumadas a fazer intervenções para que seus serviços não sejam interrompidos nas proximidades de qualquer obra. Além disso, elas já estão com o projeto do metrô em mãos. Então, creio que não teremos problemas neste sentido”, confirma.
Sistema integrado
Apesar das grandes mudanças que causará na cidade, o Metrô será integrado ao atual sistema de transporte da capital. Desta maneira, o usuário continuará podendo se utilizar dos outros meios de transporte através dos terminais e pagando uma única passagem. Segundo o IPPUC, é impossível tentar determinar hoje o preço que será cobrado pela passagem do metrô, já que o valor depende de uma série de fatores, como inflação, preço de combustível e energia, além do custo operacional.

Acorda Bahia

Paulo Villa*
"Indignai-vos!" é o título de um livro dirigido aos jovens, de autoria de Stéphane Hessel, de 93 anos. Trata-se de um chamamento a comprometer-se, resistir ao que é inaceitável e a favor da insurreição pacífica. O que motivou o único redator vivo da Declaração Universal dos Direitos Humanos a escrever o livro, fenômeno de vendas, foi a acomodação e indiferença das pessoas ante a perda de princípios e valores, associadas à ditadura do capital e ao retorno de um feudalismo econômico financeiro. Embora tenha uma visão global, o seu conteúdo cai como uma luva ao momento brasileiro, em que existe um silêncio incomodante. Portanto, cabe à sociedade se manifestar.
Não foi difícil trazer o pensamento de Hessel para a realidade portuária da Bahia, onde os portos de Aratu e de Salvador enfrentam um processo de estagnação, com suas capacidades de movimentar cargas saturadas há catorze e sete anos, respectivamente. Ambos freiam o crescimento econômico do estado, na medida em que reduzem as possibilidades de novos negócios, impedem as expansões dos existentes e, o que é pior, comprometem a competitividade dos setores produtivos.
Desde 2005, a Associação de Usuários dos Portos da Bahia - Usuport denuncia esta situação, mas as autoridades a ignoram ou apresentam propostas que não solucionam os problemas. Não dá mais para continuar em silêncio. O aditivo ao contrato de arrendamento do terminal de contêiner no Porto de Salvador não passa de paliativo. Havia dois berços de atracação de navios e assim permanecerá, já que, na realidade, apenas um deles será ampliado, o que permitirá receber navios de maior porte, mas ainda insuficiente para o número de linhas de navegação regulares de que a Bahia necessita. Como efeito, 80% do mercado de transporte marítimo de cargas estão hoje, somente, com dois armadores, quando Salvador já teve mais de doze, entre 1980 e 2002, em conexão direta com todos os continentes.
Em 2009, a Secretaria Especial de Portos anunciou a privatização do Porto de Aratu, para ampliar a sua capacidade, inclusive com a implantação de um novo terminal de contêiner, para atender a Bahia. O anúncio só serviu para atrapalhar e postergar decisões, pois, nada aconteceu até agora. Todos parecem continuar indiferentes às limitações que possam estar sendo impostas à economia regional.
A Bahia deve mudar sua atitude, para que o porto de Salvador tenha o segundo terminal de contêiner e se planejem novos terminais em Aratu ou outro local adequado. A discussão mais substantiva é a forma do estado se beneficiar com o alargamento do Canal do Panamá, a partir de 2015, tendo a visão estratégica para novas rotas marítimas. Para isto, devemos chegar a 2020 com um mínimo de oito berços de atracação de navios na Baía de Todos os Santos.
Enquanto nada se faz, perdemos a oportunidade de crescer de forma mais sustentável, diversificando negócios, criando chances de empreendimentos e empregos para os baianos. Situação inversa ocorre nos estados do Ceará, Pernambuco, Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina, que aproveitam oportunidades e desenvolvem seus portos, com novos terminais de contêiner. Se olharmos para fora, por exemplo, a Europa - um continente pronto, para não mencionar a China - são raros os portos que não estão se expandindo de forma arrojada em serviços de contêiner, a exemplo do porto de Marselha, que está construindo três novos terminais simultaneamente.
Impossível continuar com nossos portos combalidos por uma infraestrutura defasada, custos elevados, produtividade baixa e capacidade limitada. A única certeza que temos hoje é a continuidade das limitações portuárias baianas, ao menos, nos próximos três anos, em razão de não haver sido tomada nenhuma atitude até o momento. Não existem razões lógicas que justifiquem a continuidade desse caótico cenário, a não ser o feudalismo citado por Hessel. Portanto, é impossível não se indignar. Acorda Bahia.
*Paulo Roberto Batista Villa, Engenheiro, é Diretor Executivo da Associação de Usuários dos Portos da Bahia - Usuport
Artigo publicado originalmente no jornal A Tarde

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Salvador: Desafios de infraestrutura de transportes

Sérgio Faria*
Longe de defender o investimento para atender, pura e simplesmente, às necessidades pontuais de um mega evento esportivo, a realização da Copa do Mundo no Brasil em 2014 poderá representar um excelente balizador, nos impondo disciplina e objetividade para que possamos cumprir a agenda de investimentos que a sociedade há muito já reclama, sobretudo se considerados os efeitos cruéis da explosão demográfica e da concentração da população nos grandes centros urbanos.
Essa realidade é comum a todas as grandes capitais que foram selecionadas para sediar jogos da Copa e, evidentemente, Salvador não fugirá à regra, ainda que seja possível a identificação de problemas específicos e particularidades que individualizam as avaliações.
Para a recepção dos turistas, sem sombra de dúvida, o maior gargalo de Salvador é o Aeroporto Internacional Deputado Luís Eduardo Magalhães, inicialmente projetado para uma demanda de 4 milhões de passageiros/ano e já tendo atingido em 2009, não obstante a crise econômica internacional, o patamar de 7 milhões de passageiros/ano. Impõe-se a necessidade de construção de uma segunda pista de pouso e decolagem, o que permitiria a realização de operações simultâneas, ampliando a capacidade de tráfego local. Além dos investimentos em infraestrutura operacional, há que se pensar, também, na ampliação das suas facilidades, como área para estacionamento, lojas e serviços em geral.
Outra possibilidade de atendimento ao fluxo de turistas remete à infraestrutura portuária. Neste particular, diferentemente do que se tem especulado, não se deve esperar grande contribuição do modelo que se convencionou chamar navios-hotéis, até porque o evento ocorrerá em período de alta estação no hemisfério norte e, portanto, o deslocamento do roteiro de grandes embarcações seria economicamente improvável. Ainda assim, Salvador já reclama uma estação de passageiros minimamente adequada para atender ao crescente fluxo de turistas que, anualmente, visitam a capital baiana.
Aliás, no tocante ao porto de Salvador, a exemplo do que se observa na imensa maioria dos portos urbanos, o crescimento da cidade sentenciou o confinamento do porto, dificultando a necessária adaptação às exigências decorrentes da evolução histórica das técnicas de manuseio de carga. Neste contexto, a revitalização da área portuária deve ser compreendida como algo inexorável, conseqüência de um fenômeno de natureza histórica que se processou em todo o mundo.
Por fim, a circulação de pessoas dentro do perímetro urbano da capital baiana durante o evento da Copa do Mundo encontra a solução ideal no projeto do BRT (Bus Rapid Transit), um sistema de corredores exclusivos para ônibus, com 21 km de extensão, promovendo a integração da linha do metrô (ainda em fase de construção) com o lado Norte, principal vetor de tráfego local, para onde parece a cidade ter encontrado o caminho da expansão.
Traçados as linhas mestras desse plano de investimentos, há que se ressaltar que, apesar da exiguidade de tempo, ainda é perfeitamente possível cumprir as diretrizes aqui esboçadas, para tanto necessitando, apenas, disciplina, objetividade e muita determinação.
Mãos à obra.
*Sérgio Fraga Santos Faria, Engenheiro, é vice-presidente do Grupo TPC, empresa de soluções logísticas

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Crescimento das periferias impacta o transporte urbano

O crescimento mais acelerado das periferias das regiões metropolitanas brasileiras tem agravado as condições de mobilidade no país. Essa constatação está no Comunicado do Ipea nº 102 – Dinâmica populacional e sistema de mobilidade nas metrópoles brasileiras, divulgado durante coletiva pública na sede do Instituto de Pesquisas Econômica Aplicada (Ipea), em Brasília.
A pesquisa analisou dados do Censo Demográfico de 2010, do IBGE, que mostram uma taxa de crescimento populacional maior nas cidades do entorno das principais regiões metropolitanas (RMs) brasileiras. Em nenhuma das nove maiores metrópoles (Belém, Recife, Fortaleza, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre) a cidade principal foi a que mais cresceu desde o último censo. Apenas o município do Rio de Janeiro teve índice acima da média da sua RM.
As vagas de trabalho, no entanto, permaneceram concentradas nas cidades centrais, o que gerou um aumento nos deslocamentos de pessoas pelos sistemas metropolitanos de transportes. Na Grande São Paulo, por exemplo, o número de pessoas que se deslocam para trabalhar em outro município cresceu 55% em 10 anos (1997-2007), revelam os dados de uma pesquisa de origem e destino do metrô de São Paulo, apresentados no Comunicado.
Como consequência, as viagens ficaram mais longas e mais caras. Entre 1992 e 2008, segundo a Pnad/IBGE, os deslocamentos casa-trabalho com mais de uma hora passaram de 15,7% para 19%. Já o preço das passagens do transporte coletivo subiu, nos últimos dez anos, cerca de 30% acima da inflação.
“Os empregos continuam concentrados na parte central da RM, isso gera mais pendularidade e concentra as viagens no período de pico, isso é oneroso. Nos demais horários o sistema fica ocioso e os custos são transferidos para as tarifas”, explicou Carlos Henrique Ribeiro de Carvalho, técnico de planejamento e pesquisa do Ipea e um dos autores do estudo.
O Comunicado ressalta que há necessidade de investimentos da União para lidar com a questão da mobilidade nas regiões metropolitanas. “Os municípios se preocupam mais com o transporte local e não o metropolitano. A União precisa se comprometer com os grandes investimentos, com recurso do orçamento e não apenas financiamento. Os municípios não têm condições de arcar com os custos”, afirmou o pesquisador.
Leia a íntegra do Comunicado do Ipea nº 102

Outro estudo sobre Mobilidade Urbana no Brasil foi lançado em maio, O Comunicado IPEA Nº 94. A pesquisa tem três eixos. O primeiro é um diagnóstico da mobilidade urbana no Brasil. O trabalho constata a tendência do crescimento do transporte individual (automóvel), que traz diversas consequências no sentido de inviabilizar a vida nas metrópoles, como problemas de congestionamento e poluição. O segundo eixo trata das políticas federais que vêm afetando o padrão de mobilidade nos centros urbanos brasileiros. Por fim, o terceiro eixo discute alguns cenários futuros e os grandes desafios para a melhoria das condições de mobilidade urbana.
O estudo faz parte do livro Infraestrutura Social e Urbana no Brasil: subsídios para uma agenda de pesquisa e formulação de políticas públicas, e pode ser acessado no link:
Comunicado IPEA 94

Mario e oposição contra o resto?

Samuel Celestino*

O processo sucessório municipal de Salvador, já em fase avançada, ganha tintura que pressupõe muita emoção. Nota-se a aglutinação das forças oposicionistas do Estado para lançar um só candidato, o apresentador e ex-prefeito Mário Kertész, contra os situacionistas que orbitam, por ora, em torno de Nelson Pelegrino. O próprio petista, na sua quarta tentativa de chegar à prefeitura, está convencido de que o cenário parece sinalizar para um plebiscito que seria travado entre ele e Mário. Seria um fato inédito na recente política baiana.
O novo quadro partiu da movimentação do PMDB, essencialmente de Geddel Vieira Lima, que estruturou a idéia, mapeou todas as possibilidades e, a partir daí, deu início a uma série de reuniões com os partidos de oposição ao governo do Estado, basicamente o PSDB e o DEM, que parecem estar plenamente de acordo. Os encontros são constantes. Se, no início do processo Kertész negava a candidatura, agora não nega (nem afirma), mas aquiesce o seu acordo à estratégia apenas sorrindo. Evita falar sobre a questão até por não ser o momento adequado. Nem ele é tolo para se precipitar.
O movimento surpreendeu os governistas. O PMDB, leia-se Geddel Vieira Lima, tem certeza de que o governador Jaques Wagner não esperava pela manobra política. Pelo contrário, imaginava (e até poderá vir a acontecer) uma fragmentação de candidaturas o que favoreceria o PT e seus aliados. Seria, no entanto, necessário que a fragmentação ocorresse também entre os oposicionistas na medida em que num plebiscito a eleição terá apenas um turno.
Interessante é que a tese plebiscitária é vista por Nelson Pelegrino, mas não pela oposição que prefere se unir e observar seus adversários divididos, o que certamente acontecerá, na opinião de Geddel Vieira Lima. O seu raciocínio estriba-se na lógica segundo a qual alguns dos partidos hoje aliados ao governador Wagner (é um imenso arco) teriam que apresentar candidatos, sob pena de perder espaços políticos futuros em Salvador e no Estado. Essa perda daria um ganho para o PT, não para a oposição. Anota o peemedebista que se observa um esforço do PT para se transformar em legenda hegemônica na Bahia, transformando-se numa espécie de PFL à moda ACM, naturalmente com mudanças determinadas pelos novos tempos.
Portanto, de largada, há dois cenários vistos por um lado e pelo outro: Nelson Pelegrino observa um movimento na direção de um plebiscito, com dois candidatos em confronto. Os oposicionistas estão erigindo uma unidade de modo a apresentar Mário Kertész, nome que se consolida. Já os governistas tenderiam a se dividir.
Ainda acompanhando o raciocínio de Geddel, o político comprova a tese do divisionismo governista com a necessidade de o PCdoB lançar candidato (a deputada Alice Portugal), e o PP, que em sua opinião seguramente apresentará um nome pela necessidade de a legenda crescer na Bahia, onde cresce a olhos vistos. Não se deve esquecer o PSB. A senadora Lídice da Mata pensa na candidatura, assim como o presidente nacional da legenda, o governador pernambucano Eduardo Campos, pensa no Palácio do Planalto.
No final da semana, num acontecimento social muitíssimo concorrido, um bom observador notaria um fato político não explícito, mais visível: oposicionistas de diversos partidos se movimentavam praticamente juntos e se aglutinavam em conversas, aqui e ali. Claro que os assuntos estavam diversificados, até porque não cabia exclusividade à sucessão municipal, que, indiretamente, centralizava. Mário Kertész sequer conseguia permanecer sentado, conversava e ria.
Muito provavelmente, quando seu nome aflorou a partir de uma idéia do PMDB com Geddel à frente, o ex-prefeito e comunicador de início recusou a idéia. Mas, no decorrer de vários encontros, construiu-se a tese da aglutinação oposicionista tornando o panorama francamente favorável a ele. Já o PT terá dificuldades de fazer o mesmo.
E não pode fazer porque se, no momento, o governador Jaques Wagner controla e comando um extraordinário arco de apoio, o arco não é definitivo. Quem une (é sempre assim) é o poder, detentor do imã, da atração, da adesão interesseira. Isso é comum no sistema partidário brasileiro. O adesismo sobrevive porque, sem ele, os partidos pequenos que não têm princípios dogmáticos, muito menos ideologias (aliás, a ideologia da novíssima política brasileira é o poder, não as idéias. Todos são iguais perante a lei, o povo e, de resto, com aquilo que vocês, leitores, certamente estão pensando).
Para que se tenha uma exata noção dessa realidade, basta constatar que Wagner não fez esforço nenhum para atrair partidos, a não os que o acompanharam na campanha eleitoral. Os demais se aproximaram, após a vitória, como mariposas rodopiando em torno da lâmpada, apenas para lembrar de um verso do diferenciado sambista paulista (para mim o único), Adoniram Barbosa.
Enfim, para a oposição é mais indicado o processo aglutinador para que não seja dilacerada nas eleições de 2012 e a de 2014. Já o governo terá que convencer alguns partidos para que não lancem nomes à prefeitura de Salvador. É difícil. O futuro político, para me fixar no óbvio, será diferente do presente. Pelo menos essa é a lógica.
*Samuel Celestino é jornalista e articulista do jornal A TARDE, que originalmente publicou este artigo.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

O urbanismo depois da crise

Mário Chaves*
Crise, qual crise? Escolha-se uma. A crise maior do urbanismo parece provir do imobiliário onde, na sociedade da super abundância e do hiper consumo, há também maior oferta desajustada que procura. O desajuste advém do urbanismo estar preso a modelos do passado onde a expansão territorial era prioritária, o automóvel nas suas vias imperialistas dominou toda a política imobiliária e onde os edifícios seguem ainda o arquétipo falhado do condomínio plurifamiliar e plurifuncional de crescimento em altura. Como se em 30 anos a burótica, a informativa, o teletrabalho não tivessem mudado nada na vida produtiva das sociedades. O mundo em progresso agarra-se ainda desesperadamente às rotinas passadas; todos trabalham nos mesmos horários, todos habitam nas mesmas tipologias, todos se movem e estão parados nos mesmos automóveis. A crise não lhes parece ter ensinado nada. Veja-se o imaginário dos filmes de animação com acção passada nas cidades, americanas de facto. Todas iguais a Metropolis. Ainda o Super-Homem a comandar o ideal de cidade, de arranha-céus e de artéria cheias de automóveis e os cidadãos cheios de sacos. Já vimos isto muitas vezes, talvez vezes de mais.

*Arquiteto e escritor

**Alain Bourdin é diretor do Instituto Frances de Urbanismo

O Urbanismo liberal e financeiro

Nuno André Patrício*

Depois da cidade pós-medieval ou cidade renascentista, e depois da cidade pós-industrial ou cidade modernista, chegamos hoje a uma cidade que entrou numa fase de modernização que acompanhou as alterações ao sistema económico. Se a cidade moderna se desenvolveu acompanhando o capitalismo industrial por um lado e os sistemas socialistas por outro, quando estes dois sistemas económicos deram lugar, a partir dos anos 70, a modelos de urbanização que acompanharam o capitalismo financeiro. A a cidade assistiu ao longo das últimas décadas à emergência, consolidação e globalização de um modelo de urbanização que Alain Bourdain denomina de “Urbanismo Liberal”.
Bourdin, em “Urbanismo depois da crise” , vai mais longe na sua análise estabelecendo uma correlação directa entre a falência do modelo económico Neoliberal e o comprovado esgotamento do modelo de urbanização que denomina de “Urbanismo Liberal”, dando como exemplo o caso do Dubai.
“O Dubai coleccionava recordes: o maior hotel do mundo, a maior torre, a maior concentração de gruas... No fim de 2009, o Dubai e a sua jóia da coroa, a sociedade pública Dubai World dificilmente escaparam à falência com uma dívida estimada em 59 mil milhões de dólares! Esta queda simbolizou o fim de um ciclo no desenvolvimento urbano e na forma de” fazer cidade” (Alain Bourdin).
Poder-se-á ir mais longe fazendo um paralelismo entre os resgates do Sistema Financeiro pelos Estados e a forma como se pede a estes que resolvam o problema das periferias resultante das bolhas imobiliárias. No fundo, as bolhas imobiliárias não são mais que a materialização na cidade deste sistema neoliberal onde se privatiza o lucro e se nacionaliza o prejuízo.
Ao longo das últimas décadas, produziu-se cidade para o mercado financeiro e não para as populações. Estes empreendimentos que recorrem ao crédito para construir, têm como público-alvo o mercado imobiliário e não os seus utilizadores finais. Exemplos disto são os casos em que a propriedade é consequentemente vendida a especuladores, não chegando nunca a ser utilizada para a função que foi projectada. (“Real-Estate Flipping”)
Este tipo de empreendimentos são na maioria das vezes consequência de acções urbanísticas muito pouco transparentes de passagem de solo rural para solo urbano, onde os promotores imobiliários não pagam mais-valias urbanísticas fruto de uma decisão do Estado, privatizando-se assim o lucro. A Nacionalização dos prejuízos vem com a factura da infrastruturação de equipamentos e redes públicas que é necessário fazer após estas operações. Mais uma vez cabe ao Estado pagar a conta da construção e manutenção dos Sistemas de Transporte, Equipamentos de Saúde e Escolares, Redes de Esgotos etc., para servir uma população que não tem outro remédio se não habitar neste “lixo tóxico” resultante do “urbanismo liberal”.
Nas várias fases de modernização emergiram dois modelos clássicos de urbanização (Philipp Oswalt). Se o primeiro incumbia o Estado enquanto legislador, planeador e executor "welfare state", O segundo, a chamada "entrepreneurial city", divide a tarefa com diversos actores privados e públicos, sendo que esta relação de forças entre públicos e privados é variável dependendo da ideologia dos governantes. Existiu sempre um terceiro modelo tradicionalmente marginalizado pelos técnicos, a cidade informal não planificada onde os executores são normalmente os utilizadores finais.
Hoje, a chamada "entrepreneurial city" expandiu-se para além do mundo ocidental e com a queda do sistema socialista passou ser o modelo de urbanização dominante. Este modelo de urbanização liberal atribui aos Estados o dever de regulamentação, infrastruturação e equipamentos públicos deixando para os privados o terreno fértil para os lucros.
No entanto, onde não existe potencial de lucro elevado, os privados têm relutância em investir. Os benefícios económicos do investimento na cidade não são contabilizados colectivamente. Em particular nas áreas de requalificação urbana, preservação do património, sistemas de mobilidade colectiva, equipamentos públicos e sistema de produção primário.
No fundo, o Urbanismo Liberal converteu o solo numa “commodity” desligando a formação de preços do solo da utilização que este poderia ter. O Ordenamento do Território e as Políticas Urbanas deixaram assim de desempenhar um papel na coesão social para serem a materialização no território dos sistemas financeiros vigentes.
*Nuno André Patrício é urbanista