terça-feira, 18 de setembro de 2012

Salvador, São Paulo, Rio e a normalidade


Sérgio Costa*
Em saborosa crônica sobre a informalidade baiana, o jornalista Victor Uchôa fechava com frase ótima para fazer pensar: “Não tenho certeza se é bom ou ruim, mas o baiano acha quase tudo normal”.
Dias depois, num debate na Fieb, o superintendente do Meio Ambiente de Salvador, Luiz Antunes Nery, somou tom indignado à bem-humorada reflexão de Uchoa: “ Aqui, tudo o que é formal acaba na justiça, só a informalidade é inquestionável”.
Nery deu o exemplo das invasões na Gamboa, consideradas ‘normais’, em contraponto às dificuldades para se fazer um empreendimento legal na Cidade Baixa, sempre juridicamente enrolado.
Naquele território – e só para ficar no entorno do Mercado Modelo - , estão dadas todas as condições para a criação de um moderno sítio de ruínas, com toques de zumbilândia, povoada pela apavorante equipe que ajudou o Brasil a conquistar medalha de ouro no Mundial de Crack.
As três maiores cidades do país têm muito a aprender entre si. São Paulo, Rio e Salvador concentram milhões de brasileiros e achegados. São espaços urbanos de convivência em massa, com todos os problemas que isso acarreta.
A menorzinha das três, Salvador, exibe a maior densidade demográfica da turma. Sobra em aglomeração urbana. Não dá para achar tudo “normal” quando se vive amontoado.
A convivência aos milhares e milhões exige – por mais que possamos atribuir à cultura soteropolitana aversão a elas – regras claras e comuns a todos. A maior parte deveria ser filhas do bom senso.
Seria ingênuo e descabido impor a Salvador um modelo urbano paulistano, repleto de interdições em nome de um bem coletivo – que nem funciona tão bem assim. Soaria demais para uma vila onde certa militância da esculhambação é vista com bons olhos e defendida com ardor.
Mas um estágio nos bons serviços prestados por profissionais bem treinados de São Paulo faria bem enorme a uma economia que precisa crescer e tem no item Turismo um dos motores do seu desenvolvimento. Os viajantes, não raramente, comparam locais visitados. E costumam rejeitar experiências negativas.
Evocar um despojamento carioca ao soteropolitano, exigir que ele exerça a democracia social de um domingo de sol na orla do Aterro do Flamengo ao final do Leblon, resultaria igualmente ocioso.
Em Salvador, as diferenças não convivem bem em espaços públicos e comuns – retiradas desta frase todas as exceções de praxe, do Carnaval ao futebol. Há um evidente apartheid social tácito na maior parte do tempo.
Entretanto, um exemplo que deveria ser considerado é o da revitalização da Lapa carioca. No passado, região com ares de decadentes com a Cidade Baixa do Mercado. Hoje, um espaço plural de convivência de tribos urbanas e de pujança econômica que contagiou, com seu sucesso, muitas áreas na redondeza.
Salvador é possível. Claro que é. Ainda é. Mas precisa deixar de achar “normal” muito sintoma do que já é – grave doença urbana. Antes que vire terminal. Aí terá sido tarde parar de generalizar a falta de estranheza com quase tudo.
*Jornalista e diretor de Redação do jornal Correio da Bahia

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