quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Shoppings versus ruas comerciais

Paulo Ormindo de Azevedo*
Quando foi criado em Salvador o primeiro shopping, no início da década de 1970, muita gente pensou que as ruas comerciais iriam acabar. Mas não é isso o que está ocorrendo nos países desenvolvidos, especialmente nos EE. UU. Cultura, política urbana e preço do solo nunca permitiram a instalação desses vórtices de trafego dentro das cidades ali. Fazer compras na Rua do Ouvidor, no Rio; na Baixa, em Lisboa; no Boulevard Haussmann em Paris; na Via del Corso em Roma, ou na 5ª Avenida em N. York é uma viagem cultural que não se compara à mesmice dos shoppings com lojas, decoração e produtos iguais, em todo o mundo. 
E não se diga que são locais só turísticos. Naquelas cidades há boas zonas de comercio de classe média, como o Bairro Alto de Lisboa, o estudantil Quartier Latin de Paris, o Trastevere de Roma, e o Soho de N. York. Se quiseram centros mais populares, podem ir às feiras da ladra de Paris e Lisboa, a Porta Portese em Roma e a Portobello em Londres. Fui com um colega a um shopping na periferia de Madri e lá os moradores exigiram que fosse feito um mercado integrado ao shopping, onde eles pudessem provar o queijo, a charcutaria e o vinho da casa e não comprar produtos inodoros e envelopados. 
Os malls e outlets americanos estão no campo, à margem de autopistas, e são galpões em que cada loja controla o seu consumo de energia. Os daqui seguem o modelo canadense, com iluminação e aeração artificiais, porque lá eles são subterrâneos, devido ao clima. Com a luz e a paisagem tropical nossos shoppings são uma aberração. (Na foto, Rua Chile após a reforma do Hotel Pálace)
Quando disse que os shoppings estavam em crise, neste jornal, alguns leitores puseram em dúvida a minha afirmação. Mas uma amiga, muito atenta às mudanças culturais, me mandou a referência de dois sítes chocantes:Deadmalls.com e This is Dan Bell, este último um fotografo especializado em edifícios abandonados que reuniu fotos de ruinas de shoppings em Dead mall series. São centenas deles nos EE.UU. e Canadá. Continuei a busca e encontrei farto material em Shoppings abandonados e Defuncted shoppings malls. Num deles há um excelente artigo da BBC/Brasil intitulado “Os shoppings estão fadados a sumir do mapa nos EE.UU.?” 
Seu auge ali foi nos anos 90, quando se abririam 140 por ano. Depois de 2007 não se abriu mais nenhum. O arruinamento do shopping Aeroclube e a decadência do Baixa dos Sapateiros e dos menores não é um acaso. Eles estão sendo abandonados pela concorrência desigual de sites de compras na internet, que cresceram 38% em 2015 no pais, e porque o carro privado está sendo desativado também. O efeito desses dois fenômenos vai mudar as nossas cidades. A USP, FGV e SEBRAE vêm realizado estudos sobre ruas de comercio que estão alimentando políticas urbanas espertas no Sudeste. É o caso do Corredor Cultural do Rio, que inclui a Cinelândia, a Rua 1º de Maio e a Praça 15. 
Por outro lado, os comerciantes dessas ruas estão se organizando. O melhor exemplo é a Sociedade de Amigos das Adjacências da Rua da Alfandega, SAARA, na mesma cidade, que faz promoções e mantêm vigilância privada na área. Essas duas entidades são responsáveis pela vitalidade do centro antigo do Rio. Em São Paulo podemos citar a Associação Viva o Centro. Essas não seriam referencias para Salvador? A crise em curso dos shoppings deve provocar mais atenção das autoridades para os espaços públicos de comercio e diminuição da circulação de carros, o que é muito positivo para as cidades. 
P.S. – Sobre o artigo “Dia do Arquiteto e Urbanista”, o Pres. do Icomos /Br esclarece que o convite do CAU/BA era pessoal e não funcional, para falar sobre “Patrimônio Histórico” e não sobre o Centro Histórico. E que o órgão divulgará, em breve, um parecer sobre as demolições de maio.

*Professor Titular da UFBA
**Publicado em A Tarde de 03/01/16
*** Foto do Meatpacking District 

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