sexta-feira, 7 de junho de 2019

Othon Bastos homenageado em Salvador

O ator baiano Othon Bastos recebeu hoje à noite o título de Cidadão de Salvador, no Plenário Cosme de Farias, na Câmara Municipal de Salvador (CMS).
O título foi proposto pelo vereador Marcos Mendes (Psol), que preside a sessão solene de outorga.
Othon Bastos nasceu em Tucano, no interior do estado, integrou a primeira turma de alunos da Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia (Ufba) 
O ator comemora 86 anos de uma vida quase inteiramente dedicada às artes. São mais de seis décadas interpretando personagens marcantes no teatro, no cinema e na televisão. Uma média de 70 filmes – entre curtas e longas- metragens –, 90 papéis em novelas e seriados, e 20 espetáculos teatrais. 
Othon José de Almeida Bastos nasceu dia 23 de maio de 1933 em Tucano, município no Nordeste da Bahia. Na infância, pensou em ser piloto da Aeronáutica ou dentista; a vocação para as artes só veio bem mais tarde, quase que por acaso. Aos 17 anos, montou um espetáculo de brincadeira no colégio. Nele, Othon servia de "ponto" aos colegas. A peça era uma paródia de “Otelo”, escrita por Ronald Chevalier. Antes de entrar em cena, o ator que interpretaria Iago – ninguém menos que o futuro produtor de TV Walter Clark – desistiu de entrar em cena.
– Roniquito então me pediu para substituí-lo, pois era o único que sabia todas as falas. Eu disse: “Mas não sou ator!”, e ele nem ligou. Acabei fazendo o papel. Na plateia, tinha um rapaz cujo irmão estudava na escola do autor Paschoal Carlos Magno. Ele gostou do meu trabalho e me apresentou ao Paschoal. Entrei na escola como ouvinte e nunca mais deixei de fazer teatro – lembra Othon.
O jovem ator então fixou residência no Rio de Janeiro, onde integrou o grupo Teatro Duse. Seu primeiro espetáculo foi “Terra Queimada” (1951), de Aristóteles Soares. Alguns anos mais tarde, foi estudar teatro em Londres. Quando voltou ao Brasil, em 1956, foi dirigir a recém-fundada Escola de Teatro da Universidade da Bahia. Lá, faz “As Três Irmãs” (1958), de Anton Tchekov; "Um Bonde Chamado Desejo" (1959), de Tennessee Williams; e "Auto da Compadecida" (1959), de Ariano Suassuna.
Em 1960, Othon sai da Escola para fundar – associado ao crítico teatral João Augusto de Azevedo – a Companhia Teatro dos Novos. Integrada por sete artistas, inicialmente se chamaria de Teatro dos Sete, mas o nome foi dado antes ao grupo do diretor Gianni Ratto, formado por nomes como Fernanda Montenegro, Sérgio Britto, Ítalo Rossi e Fernando Torres. A partir daí, o novo grupo baiano empenhou-se durante um longo tempo na construção do Teatro Vila Velha. Nessa época, Bastos conheceu a atriz Martha Overbeck, com quem se casaria.
– Éramos todos novos. Novos de idade, de ideologia de pensamento. Daí o nome do grupo. O Teatro Vila Velha levou quase quatro anos para ser construído. Fazíamos bingos, leilões de quadros de artistas plásticos baianos. O governador da época, Juracy Magalhães, apesar de ser de direita, ajudou muito na construção, oferecendo a estrutura metálica e o telhado. Também tínhamos um prefeito de esquerda, Virgildásio de Senna, que forneceu as cadeiras de um cinema velho que seria demolido. Com o nosso dinheiro, compramos aos poucos luz e cenário. Até que conseguimos construir um teatro de 700 lugares. Naquela época, ninguém ganhava nada. Era mais a dedicação à arte mesmo – destaca o ator, que precisou trabalhar durante três anos no Departamento de Turismo da Prefeitura para se sustentar.
Durante esse processo, o inquieto ator decidiu se aventurar na carreira cinematográfica. Em 1960, atuou como um caminhoneiro em “Sol sobre a Lama”, filme do cineasta e teórico de cinema Alex Viany. No mesmo ano, viveu um jornalista em “O Pagador de Promessas”, de Anselmo Duarte. A consagração, porém, vem com o cangaceiro Corisco, em “Deus e o Diabo na Terra do Sol”. O clássico de Glauber Rocha se transformou no símbolo do Cinema Novo e foi um divisor de águas na carreira de Othon Bastos.
– A migração para o cinema foi uma coisa automática. A grande escola é o teatro, que te dá base para fazer cinema, televisão, circo. Não tenho a menor dúvida que o teatro é minha plataforma preferida. Para mim, a vida é teatro. É ele que te permite fazer tudo. O ator precisa ter todas essas experiências de interpretação, não pode se limitar somente a uma coisa – acredita Othon, que diz aceitar apenas os trabalhos que realmente lhe interessam. – Não faço questão de aumentar meu currículo com números. Faço apenas o que gosto de fazer. Por exemplo, depois de “Deus e o Diabo”, passei mais de três anos sem fazer cinema. Por causa do Corisco, só me chamavam para fazer cangaceiros, assassinos, bandidos, estupradores (risos)... Já tinha feito um e era suficiente para toda a minha vida!
Depois que o Teatro Vila Velha ficou pronto, Othon Bastos trabalhou nele durante dois anos. Em 1967, decidiu voltar para o Sudeste, dessa vez para São Paulo, a convite do Teatro Oficina, de José Celso Martinez Corrêa. Encena os espetáculos “Galileu Galilei” (1968) e “Na Selva das Cidades”, ambos de Bertold Brecht. No cinema, faz o papel de Bentinho, em “Capitu” (1968); é o Professor, em “O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro” (1969); é o Homem, em “Os Deuses e os Mortos” (1970); e Paulo Honório, em “São Bernardo” (1972) – considerado pelo ator o longa metragem mais importante de sua vida.
Ao lado de sua mulher, Martha, funda a Othon Bastos Produções Artísticas em 1972. Ao longo da década de 70, o grupo se empenha na defesa da liberdade de expressão, criando um repertório de resistência. A estreia acontece com “Castro Alves Pede Passagem”, com direção de Gianfrancesco Guarnieri. Depois, Othon encena “Um Grito Parado no Ar” (1973), com a qual é premiado como melhor ator pelo Molière e Associação Brasileira de Críticos Teatrais (ABCT). Em seguida, mais um texto de Guarnieri: “Ponto de Partida” (1976). Além do dramaturgo ítalo-brasileiro, outros grandes nomes se juntam ao grupo, como Renato Borghi, Augusto Boal e Paulo José.
Sua trajetória na televisão também é bastante rica, tendo início na década de 50, quando participou do Grande Teatro Tupi (1956). Depois de diversos papéis na primeira emissora brasileira, entrou na Rede Globo em 1979, quando fez um especial “Vestido de Noiva”, inspirado na obra de Nelson Rodrigues. É bastante lembrado pelo papel de Ronaldo César, de “Roque Santeiro” (1985). Desde 2000, fez quase uma novela ou seriado por ano, sendo a última “Amor Eterno Amor”, em 2012.
– Cada filme ou peça que você faz, há uma entrega grande para os personagens. Todos eles deixam saudade. É uma coleção de lembranças. Vou relembrando como se fosse um álbum. Mas não posso viver dos trabalhos que já fiz. O passado é passado, já ficou. Vivo do que faço hoje e aiOthon Bastos participou de dois longas nacionais que concorreram ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro: “O que é Isso, Companheiro” (1997), de Bruno Barreto; e “Central do Brasil” (1998), de Walter Salles, no qual vivia outro caminhoneiro e contracenou com Fernanda Montenegro. Com uma trajetória tão rica, marcada por tantos tipos diferentes, não há um personagem específico que o ator ainda queira interpretar.
– Todo mundo da minha época já teve vontade de fazer “Hamlet”. Mas sempre pensei muito nos autores e personagens brasileiros. Nunca precisei de personagens fantásticos de outras civilizações. Eu me interesso em fazer tipos brasileiros, representar minha vida e o lugar onde moro. Ao mesmo tempo, este ano fui chamado para fazer duas peças que são muito interessantes. Uma é “Disque M para Matar”, que já virou até filme pelas mãos de Hitchcock, com uma tradução belíssima do Domingos de Oliveira. Outra tem um título fantástico, “O Defunto Comunista”, que traz uma reflexão incrível para os dias de hoje. Na verdade, para me conquistar, o texto tem que ser rico, chamar minha atenção.
Aos 86 anos, o ator não pensa em parar. Integrando o elenco da série "Os Carcereiros", na Rede Globo, já no segundo ano, Othon tem planos para o futuro, um novo filme quem sabe,
– É preciso sempre caminhar em frente. Nestes 86 anos, conheci pessoas maravilhosas, fiz amigos e tive ótimos colegas de profissão. Também cruzei com pessoas insuportáveis. Mas é como dizem: “As amargas, não”. Para que pensar nas coisas ruins? O importante é seguir e esquecer o que te afeta. Quem olha para trás é estátua de sal (risos). O que pensam de você, não é você. Às vezes, nem mesmo o que você pensa é. Você é o agora. Amanhã já será completamente diferente. E o ontem... bem, este já passou.



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