segunda-feira, 20 de junho de 2011

A necessidade de se pensar em redes integradas de transportes e acessibilidade sustentável

Juan Pedro Moreno Delgado*
Redes Integradas de Transporte são o resultado de políticas integradas em diversas escalas. Devemos discutir os projetos ou os princípios por traz dos projetos (os Planos)?
Todo projeto deve responder a um processo de planejamento, aqui estamos fazendo o inverso. Estamos propondo projetos sem termos um plano urbano que os justifique.. Ultimamente muito se pergunta se o projeto a é melhor do que o projeto b, mas isso não agrega nada e desvia a atenção das questões fundamentais. Os aspectos físicos dos projetos são divulgados, porem, ninguém discute os aspectos operacionais, espaciais ou urbanísticos que deverá ter a futura rede integrada, imprescindível para que o todo funcione.
Urge pensar a Região Metropolitana de Salvador, o momento é agora. Os municípios da RMS têm uma grande dependência com relação a Salvador. Estamos falando de um numero crescente de viagens quotidianas, cada vez mais distantes na RMS, as quais só poderão ser atendidas oportunamente pelo transporte de massa. Temos que implementar modos que provoquem agora a migração dos usuários do automóvel para o transporte público, ou seja, recuperar a confiança e as demandas perdidas no setor. Soluções fragmentadas não irão contribuir. Nesse contexto a rede metro-ferroviária é fundamental, a qual deverá ser alimentada por uma estrutura tipo BRT.
Os modos não motorizados deverão ter papel estratégico, pois a topografia configurará diversas barreiras para a demanda (o pedestre) usufruir as vantagens da Rede. Uma rede de transporte diversa, com vários modos, é sustentável; não haveria então uma única solução, um único modo onipresente. Uma rede integrada e eficaz. Fundamental será também implantar uma política de restrição ao uso do automóvel como acontece mundo afora.
A filosofia do projeto pode ser enganosa e ocultar aspectos centrais que somente os Planos Urbanos podem desvendar. Os defensores do BRT divulgam muito o projeto do BRT de Bogotá, TransMilenio, uma referencia extremamente importante e estabelecem analogias com a proposta que poderá ser implantada aqui. Entretanto existem diferenças notáveis.
O sucesso do programa de transporte urbano TransMilenio se deve exclusivamente à implementação de determinada tecnologia - para ser mais exato, rodoviária? Parece que não. Em Bogotá foram implantadas oportunamente um conjunto de Políticas Integradas em diversas escalas territoriais e institucionais, como subsidio ao TransMilenio, tais como: a) Promoção da mobilidade sustentável, b) Transporte e uso do solo, c) Gerenciamento da mobilidade, d) Macro e micro acessibilidades para todos na cidade, e) Habitação, f) Educação ambiental e para o trânsito, g) Meio ambiente etc. Estas políticas integradas tinham por finalidade, entre outros aspectos, consolidar a demanda futura que viabilize o TransMilenio como uma solução BRT, de massa. Não existe transporte sem demanda que o justifique.
Foram implementados programas de restrição ao uso do automóvel; aumento dos impostos aos combustíveis, subsidiando o BRT; programas habitacionais associados ao BRT; urbanismo e coordenação do uso do solo associado ao BRT; rotas para os pedestres e ciclovias em direção ao BRT; reestruturação das áreas de estacionamento no centro de Bogotá; ordenamento dos novos empreendimentos de acordo com o BRT etc. Existe alguma proposta para fazer algo semelhante aqui?
Políticas integradas de sucesso na relação Transporte - Uso do Solo são conhecidas e foram identificadas por projetos europeus, tais como o Transland e o Própolis, entre outros. Considerando este contexto deveríamos provocar duas situações favoráveis para a RMS:
a) Promover uma ótima organização espacial das atividades: a.1 implementando, no tempo, estruturas urbanas policêntricas, conectadas entre si; a.2 promovendo o equilíbrio das densidades residenciais e de emprego entre si, e com os serviços e comércios existentes; e a.3 favorecendo os usos mistos do solo.
b) Promover um sistema balanceado de transporte unindo estas atividades numa maneira eficiente e sustentável: b.1 fornecendo diferentes opções de Transporte Público para todos os níveis socio-econômicos, articuladas com o Transporte Público Intermodal localizado preferencialmente perto dos principais nós urbanos; b.2 formulando políticas de preferência para o uso do transporte público; e b.3 criando uma infra-estrutura de apoio ao transporte não motorizado, preferencialmente perto das estações.
Estas medidas visam gerar viagens mais curtas, econômicas e menos poluentes, portanto sustentáveis, assim como, desconcentrar as áreas saturadas, podendo promover padrões de descentralização. Estamos avançando nesse sentido?
Existe um paradoxo, o Iguatemi é o centro da região metropolitana, é o centro econômico da Bahia. Descentralizar a cidade, para resolver a mobilidade em Salvador parece fundamental. É o principio sustentável e entretanto, está acontecendo o contrário aqui. Temos o projeto de construir (?) um subcentro na região do Retiro a poucos metros desta região problemática para a mobilidade da cidade, ou seja, estender espacialmente o centro da Tancredo Neves – Iguatemi para o Retiro. É como apagar um incêndio com gasolina.
Recentemente surgiu um projeto aparentemente inovador, o aeromóvel (num trecho de 3 km) para a cidade baixa. O projeto pode ser interessante, porém desvia a atenção do funcionamento global da Rede e seus impactos seriam grandes. Por exemplo, um morador de Coutos, estudante ou trabalhador, deverá chegar à estação de trem de micro ônibus ou bicicleta e após esperar o trem realizará a primeira transferência, logo após, desembarcará na estação da Calçada, para realizar a segunda transferência e viajar no aeromóvel proposto, para depois chegar no Comercio e utilizar o elevador ou os planos inclinados (nova transferência), para finalmente, continuar a sua viagem a pé ou de ônibus em direção ao centro funcional (nova transferência), pois o bairro do Comercio não é mais o grande atrator de viagens do passado.
Situação análoga acontecerá com a pretendida ligação Calçada – estação Acesso Norte por BRT, pois dessa forma um morador do subúrbio realizará de 3 a 4 transferências (no mínimo, trem – ônibus – metrô) para um trajeto curto. Está demonstrado cientificamente que os usuários do sistema de transporte são extremamente sensíveis ao número de transferências; em trajetos curtos, no limite duas são aceitáveis, aumentar esse número origina esvaziamento do sistema. O numero elevado de transferências configura uma barreira para a mobilidade, revela a fragmentação da rede, a descontinuidade e novamente a importância do planejamento frente ao projeto.
*Graduado em Arquitetura, Urbanismo e Desenho Industrial, possui doutorado em Engenharia de Transporte pela UFRJ. Atualmente é Professor Auxiliar da Escola de Arquitetura e Urbanismo da UFBa

Nenhum comentário:

Postar um comentário