No próximo dia 12, Enrique Alvarez, Quico, arquiteto e artista plástico, formado em 1954 na antiga escola da Rua do Tijolo, completa 100 anos e ainda está projetando e desenhando. Fui contemporâneo de Quico na EBA, mas me formei com a primeira turma da Faculdade de Arquitetura. Tenho boas recordações daquela escola, de seus professores e daquela rua em que se misturavam pacificamente casas com legendas “família” e puteiros ... tão Bahia! E o bar Cavadas, na esquina com a Baixa dos Sapateiros, onde íamos lanchar pão na chapa com mortadela regado por Saborosa, Jacaré ou Laranja Turva.
Quico formou com Rodrigo Pontual o escritório Alvarez e Pontual e juntos realizaram 90 projetos. Depois da morte de Pontual, Quico registrou o escritório como Alvarez e Associados e já totalizou 120 projetos, a maioria de apartamentos, entre os quais a Mansão Costa Pinto, mas também a Biblioteca Central dos Barris e os Clubes Português e Baiano de Ténis.
A berço da EBA era um belo exemplar neoclássico projetado por José F. Albioni, formado na Bélgica, para o médico inglês Jonathas Abbott (1796-1868), colecionador de arte, cujo acervo deu origem ao Museu de Arte da Bahia. Seu último andar era um típico ateliê de arte europeu, com claraboias e cortinas para regular a luz natural. Ateliê que com a morte de Abbott se transformou na Escola de Belas Artes fundada por Miguel Navarro Cañizares em 1877 e federalizada em 1946.
Ali convivemos com pintores clássicos, como Presciliano Silva, Alberto Valença, Mendonça Filho e os modernistas Mario Cravo, Juarez Paraíso, Maria Célia Amado, Henrique e Jacira Oswaldi.
Estudantes de belas artes se misturavam com os de arquitetura, como Quico, Emanuel Berbert, Álvaro Peixoto e Assis Reis, herdeiros do latifúndio de Diógenes Rebouças, no dizer do Prof. Bina Fonyat.
Alguns arquitetos eram também artistas plásticos, como Mendez y Mendez, Quico, Gilberbet Chaves e Amélio Amorim, criador do Carro de Boi e da Boate Jerimum, em Feira de Santana, literalmente sepultados pelo Estado. Quico desenvolveu uma técnica de desenho com esferográficas coloridas criando urdiduras delicadas e desenhos de moçoilas e “putos” barrocos que vão ser agora publicados.
Em 1969 a EBA se juntou a outras unidades da UFBA no Canela e o seu prédio foi trocado com a Prefeitura que ali instalou uma de suas secretarias. Hoje aquele prédio, de tanta história e recordações, está em ruína. Quando vou à Europa, 60 anos depois que a conheci, tudo está no mesmo lugar, o novo é só na periferia. Salvador é hoje uma cidade Frankenstein irreconhecível, cheia de muletas de concreto que ligam um engarrafamento a outro.
São os políticos que estão destruindo Salvador ao abandonar o planejamento, o C.H., e patrocinando, sem nenhum critério, viadutos baldios e espigões de 35 andares para fazer a mágica besta da multiplicação dos IPTUs. Cultura não é só mafuá, é criação e preservação.
*Professor Titular da Escola de Arquitetura da UFBA
SSA: A Tarde, 08/06/2025