sexta-feira, 31 de julho de 2020

Hidalgo decidida a restringir serviços da Amazon em Paris

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As
autoridades de Paris ameaçaram tomar medidas legais sobre o novo serviço de entrega expressa da Amazon, alegando que isso poderia forçar as lojas locais a fecharem seus negócios. A prefeita socialista Anne Hidalgo prometeu adotar uma abordagem "intransigente" ao serviço Prime Now da Amazon, que oferece entrega em uma hora em uma variedade de produtos, incluindo mantimentos.
As autoridades temem que o serviço, que opera em 40 cidades como Nova York, Londres e Roma, possa perturbar o "equilíbrio comercial" da capital francesa. Eles também afirmam que foram informados sobre o serviço de Paris apenas alguns dias antes de ser lançado na semana passada.
Hidalgo disse que está pedindo aos legisladores que examinem o serviço de entrega da Amazon para ver se podem ser estabelecidas salvaguardas para evitar que isso prejudique comerciantes independentes.
A prefeitura de Paris também disse que vai procurar efeitos colaterais indesejados da operação, incluindo aumento de tráfego e poluição.
Hidalgo disse: “Esta operação corre o risco de afetar seriamente a balança comercial de Paris. Esta grande empresa americana não achou oportuno informar Paris até alguns dias antes do lançamento. ”
Ela disse que havia uma necessidade de “definir por lei, as proteções para impedir que esses serviços se tornem uma concorrência desleal para lojistas e artesãos. Paris será intransigente em relação à Amazônia. ”
A Amazon está se oferecendo para entregar mais de 18.000 produtos, incluindo itens elétricos e frutas e legumes frescos ou congelados, aos assinantes de seu serviço Premium, que custa € 49 (£ 38) por ano e promete chegar dentro de duas horas. Por um custo adicional de € 5,90, as mercadorias serão entregues dentro de uma hora.
Os itens são despachados de um armazém de 4.000 metros quadrados no 18º arrondissement, que foi revelado durante o lançamento de quinta-feira. O armazém emprega 70 funcionários.
Em declarações à rádio francesa, Olivia Polski, uma das vice-prefeitas de Paris, disse que o serviço é uma ameaça direta às lojas locais. "À primeira vista, pode parecer uma notícia muito boa ter um novo serviço de compras, exceto que não é uma loja real e não está sob as mesmas restrições que as empresas", disse ela, acrescentando que o serviço não estava sujeito aos mesmos impostos e regras de competição como lojas físicas. No domingo, a Amazon rejeitou as alegações.
Em uma declaração, dizia: “Refutamos essas informações incorretas, baseadas em muitos erros factuais e especulações infundadas. A Amazon paga todos os impostos necessários na França e em todos os países em que está presente.
"Com mais de 9.300 empregos na França esperados a partir de agora até o final do ano, nos tornamos um grande empregador e nosso" mercado "permitiu a criação de milhares de empregos extras em PMEs que vendem em nosso site".
A Amazon acrescentou que havia criado mais empregos na França entre 2013 e 2016 e disse que qualquer cálculo foi feito a partir de dados fora da Amazon.
Ele também disse que os cálculos de emissões subestimaram o tamanho do setor de computação em nuvem e foram erroneamente baseados em estimativas de servidores muito menos eficientes do que os usados ​​na AWS.

quarta-feira, 1 de julho de 2020

A Morte e a Morte da Democracia

Fernando Gabeira
É preciso  retomar o tema da democracia ameaçada. A prisão de Fabrício Queiroz conteve o avanço da extrema direita. Muitos interpretam o perigo de golpe apenas como um blefe de Bolsonaro, um delírio que agora se dissolve.
São pessoas sensatas que me perguntaram quando soei o alarme se eu não estava exagerando.
De uma certa forma, abordei este tema num artigo de fim de semana. Lembrei a tensão nas democracias europeias dos anos 30 e as pequenas pausas que surgiam entre elas. Muitos as interpretavam como o fim dos problemas, um novo período de paz.
Não tenho nenhuma intenção de comparar a extrema direita brasileira com a Alemanha nazista. Isto serviria apenas para reforçar a ideia de que exagero. Minha preocupação é apenas analisar a pausa. Ela pode ser aproveitada para se avançar na defesa da democracia ou pode ser considerada como o fim de um período de hostilidades.
Muitos imaginam o golpe de estado clássico: tanques saindo dos quartéis e ocupando pontos estratégicos, Congresso e STF fechados. É uma espécie de tiro no coração da democracia. Acontece que, nos últimos anos, cresce o consenso de que a democracia é comida pelas beiradas, como um vírus que invade, gradativamente, seu pulmão até que pare de respirar.
Essa lenta e sistemática derrubada da democracia brasileira está em curso. Não há tanques na rua, nem censores dentro dos jornais.
Mas a informação de qualidade está sob intenso fogo. O IBGE teve contestado seus dados sobre desemprego; a Fiocruz, invalidada uma pesquisa sobre consumo de drogas; o Inpe, decapitado por seus informes sobre o desmatamento na Amazônia. O próprio Bolsonaro tentou, mas não conseguiu, suspender a Lei de Acesso à Informação.
É como se as luzes de um edifício fossem sendo apagadas gradativamente. Na Fundação Palmares já não é possível contestar o racismo. O governo já não defende a diversidade cultural. Somos todos filhos de um mesmo Deus. Nas palavras do Weintraub: “Odeio a expressão povos indígenas.”
Três mil militares ocuparam a administração civil. No Ministério da Saúde desalojaram técnicos num momento em que se luta, e se perde, contra uma pandemia que já levou mais de 50 mil vidas. As armas são vendidas em maior escala, na medida em que cai o controle do Exército.
Na preservação ambiental, as luzes já se apagaram há muito. Na escuridão, crescem o desmatamento, o garimpo ilegal, a grilagem. Não se respeitam as leis, e os funcionários que tentam aplicá-las são demitidos.
O avanço de um golpe clássico foi contido pelo STF. Mas ele foi propagado em faixas que pediam intervenção militar com Bolsonaro na Presidência. Frequentaram essas manifestações, além do presidente, generais no governo e o ministro da Defesa.
Foi preciso prender extremistas e investigar as contas de deputados que financiam as manifestações. O Congresso não se manifesta. Está escondido atrás das togas dos ministros, esperando que canalizem sozinhos a agressividade digital bolsonarista.
Um Congresso que tem medo de tuítes sairia correndo ao ver o primeiro fuzil. Mas é preciso contar com ele.
Felizmente, a sociedade começou a acordar. Manifestos surgiram em vários setores. Esboços de frentes vão se formando aqui e ali. Há sempre quem se ache o rei da cocada e não aceita certos parceiros. Mas o rumo geral é de união.
Apesar da pandemia, surgiram as primeiras manifestações de rua. De um modo geral, pacíficas, um ou outro choque com a polícia, uma solitária faixa pedindo ditadura do proletariado, rompendo o tom.
Seria importante interpretar a pausa apenas como um tempo que se ganha para se organizar, não relaxar, achando que as coisas se resolvem sem nossa intervenção. Uma semana depois da prisão de Queiroz, o TJ do Rio já concedeu foro especial a Flávio Bolsonaro e pode anular não só a prisão, como trazer o processo à estaca zero.
Daqui a pouco, volta toda a onda agressiva e vamos nos perguntar o que fizemos na pausa. As democracias europeias vacilaram inúmeras vezes, mas acabaram vencendo no final. Mas os analistas sempre se perguntam se a vitória não poderia ter vindo mais cedo, poupado mais vidas.
Mesmo em dimensões desarmadas, o preço da vitória depende da maneira como interpretamos as relativas calmarias, se alimentamos ilusões conciliatórias ou compreendemos que, cedo ou tarde, a batalha se dará.
Artigo publicado no jornal O Globo em 29/06/2020