sexta-feira, 5 de março de 2010

Em debate na Ufba, representante do governo admite rever a ideia da ponte Salvador - Itaparica

Osvaldo Campos*
O desenvolvimento do Estado a partir da implantação de um novo sistema viário que terá como elemento principal a Ponte Salvador – Ilha de Itaparica foi tema de debate entre governo e sociedade civil, nesta quinta-feira (4), na Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia. O representante do Governo da Bahia, Paulo Henrique Almeida, admitiu a possibilidade do governo mudar de planos, caso a construção da ponte Salvador - Itaparica se mostre inviável ao longo das discussões e estudos ambientais.
Foi apresentado no evento o estudo do Sistema Viário do Oeste, que, além da construção da ponte, pretende estabelecer uma conexão alternativa entre a capital, Recôncavo, Baixo Sul, Sul e Oeste baianos.
“O Estado e a iniciativa privada, ao longo da história, fizeram uma opção pela expansão do eixo norte, com a construção da Avenida Paralela, da Estrada do Coco e da Linha Verde, como local de turismo e moradia. Dessa forma, a Cidade Baixa, o subúrbio ferroviário e as ilhas ficaram completamente abandonados”, afirmou, destacando o estrangulamento turístico e a estagnação da economia nessas áreas.
Foram apresentados pela SEPLAN os números da renda per capita no Estado, comparando a Região Metropolitana de Salvador, com R$ 14.641, às ilhas de Vera Cruz e Itaparica, onde a renda é de, respectivamente, R$ 4.912 e R$ 4.027. “Nas nossas ilhas, 1/3 da população ainda vive de atividades extrativistas, com uma renda per capita inferior à média estadual, de R$ 7.787”, informou.
Antropólogos,sociólogos, arquitetos, engenheiros e urbanistas, professores da Universidade Federal da Bahia, revelaram receio dos impactos que a obra pode trazer para o trânsito e o desenvolvimento social e econômico do Recôncavo baiano. Entre os que se manifestaram favoravelmente à ponte, criticas ao curto prazo para apresentação de propostas, o que favorecerá os estudos da OAS e Odebrecht. Outros reclamavam da falta de divulgação internacional, que pode limitar o número de propostas e sugestões, o que limitará a criatividade das propostas arquitetônicas.
Contrário à construção da ponte, o professor Paulo Ormindo apontou o que para ele é o maior problema do projeto: aumentar a centralidade da capital baiana. Ormindo acredita que a ponte bilionária vai concentrar as atividades econômicas da Bahia em Salvador, "matando os polos que começam a surgir no interior, como a pequena industrialização de Santo Antônio de Jesus" (cidade ao sul, a 100km da capital via ferryboat).
Segundo ele, outro aspecto negativo seria a centralização dos serviços públicos na capital. "Semelhante ao que ocorre hoje: a população da região metropolitana vem a Salvador para ter acesso à saúde e outros serviços. A capital irá bancar os serviços públicos para toda a região, que não têm serviços suficientes, sendo que Salvador também não tem como sustentar serviço para sua população atualmente", afirmou.
Também contrário à ponte, o arquiteto Carl von Hauenschild questionou a necessidade de expansão da RMS no sentido sul. "Nós criaremos um funil ao obrigar todo o transporte sentido sul que sair da cidade a passar pela ponte, quando há espaço à vontade para Salvador crescer nos municípios da Região Metropolitana", afirmou.
Segundo dados do IBGE de 2009, dos 3,86 milhões de habitantes da RMS (77% do total), 3 milhões moram em Salvador, que só tem 707 km² dos 4.375 de toda a região (16% do território)." Acho que a ponte não vai favorecer em nada para os moradores, vai fragilizar polos que se desenvolvem na Bahia e centralizar tudo em Salvador, opinou o arquiteto Paulo Ormindo, diretor do IAB e professor da Ufba.
Paulo Henrique Almeida da SEPLAN apontou a dificuldade de operar o sistema ferryboat após a construção da ponte sobre o Rio de Contas, que tornou o trajeto entre Salvador e Itacaré cerca de 2h mais curto. “O aumento do fluxo agravou os problemas já existentes no sistema. O ferry, quando foi construído, em 1972, não foi pensado para funcionar como vetor de transporte de massa. E o aumento da frota não é uma saída porque o sistema opera com sazonalidade. Durante a baixa estação, as embarcações ficam ociosas”, apontou.
O arquiteto Carl Hauenschild, ressaltou que é preciso pensar em um planejamento para Salvador e região metropolitana. Não temos um plano de desenvolvimento a longo prazo, com acompanhamento. o que temos são projetos pontuais desligados entre si.
Questionado sobre os impactos ambientais, o representantwe da Seplan destacou a migração da demanda para o Litoral Norte, que faz parte de uma Área de Proteção Ambiental que vem sendo destruída. “Quem poderia investir em turismo e moradia nas ilha, acaba investindo no Litoral Norte, que já está saturado de empreendimentos”.
Além de acadêmicos, moradores das ilhas, urbanistas, arquitetos e ambientalistas presentes no evento, participou também das discussões o historiador Ubiratã Castro, diretor geral da Fundação Pedro Calmon ligado ao Governo do Estado da Bahia.
Após intervenções favoráveis e contrárias a diversos aspectos do projeto do complexo rodoviário, o superintendente da Seplan sugeriu aos presentes a leitura do Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI), disponível no site da secretaria (seplan.ba.gov.br).
Paulo Henrique de Almeida informou que as manifestações de interesse podem ser enviadas até o dia 14 deste mês. Após esta data, estudos preliminares serão feitos em 120 dias, seguidos de novos estudos, complementares, que serão realizados por uma consultoria, a partir deste ano. A consolidação das pesquisas será entregue em 2011 para, caso demonstrada a viabilidade, a realização de debates técnicos e audiências públicas que decidirão a conformação final do projeto.
* Editor deste blog

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