segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Avant-garde na Bahia - Martim Gonçalves e a escola de teatro

A Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia foi fundada em 1956. Assim como a de dança, foi a primeira escola de teatro em nível universitário no País. Aceitando o convite do reitor Edgar Santos, o médico por formação, artista plástico, cenógrafo e professor-diretor pernambucano Eros Martim Gonçalves influenciou toda uma geração de atores e diretores baianos durante sua permanência no cargo. Seus espetáculos foram marcantes no cenário cultural baiano. O cineasta Glauber Rocha era um dos mais assíduos nas aulas de Martim Gonçalves nesse período. Ele assumiu diversas vezes, ao longo da vida, essa influência em sua obra cinematográfica.
Durante sua estadia na Escola de Teatro (1956-1961), Martim Gonçalves montou diversas peças. Entre elas estavam “Auto da Cananéia”, de Gil Vicente (1955), “Senhorita Julia”, de August Strindberg (1958), “Auto da Compadecida”, de Ariano Suassuna (1959), “Uma véspera de reis”, de Artur Azevedo (1960) e “Calígula”, de Albert Camus (1961). Alguns dos seus alunos se tornaram posteriormente grandes atores, como Othon Bastos, Helena Ignez e Geraldo Del Rey.
Mas foi em 1960, com a montagem da “Ópera dos três tostões”, de Bertold Brecht, no recém-incendiado Teatro Castro Alves, que a nova Escola de Teatro da UFBA atingiu seu ponto mais alto. A encenação, dirigida por Martim Gonçalves, contava com os cenários inovadores da arquiteta e designer italiana Lina Bo Bardi, que era, nesse período, a diretora do Museu de Arte Moderna da Bahia e trabalhava em estreita parceria com os professores e alunos da Universidade. Sua cenografia e o ambiente do teatro davam ao espetáculo do dramaturgo alemão uma força surpreendente para os espectadores.
Martim Gonçalves ainda foi responsável pela introdução dos métodos de Stanislavski entre os atores, criando assim novos parâmetros para o teatro baiano. Incentivando a pesquisa de novos métodos e a expansão da Escola, o reitor Edgar Santos obteve junto à Fundação Rockfeller um convênio em que alunos e professores brasileiros e norte-americanos teriam bolsa de estudo e possibilidades de intercâmbio entre a Universidade Baiana e escolas de teatro norte-americanas. Essa junção de técnicas – Brecht e Stanislavski – foi uma das principais virtudes do diretor, segundo Glauber Rocha. Muitos desses ensinamentos estão presentes na sua direção de atores ao longo de sua filmografia.
Apesar das grandes vantagens do convênio para a Escola de Teatro, o quadro político da época fez com que, após a eleição de Jânio Quadros em 1960, essa e outras ações de Edgar Santos fossem questionadas por movimentos nacionalistas. Após uma série de críticas, Martim Gonçalves deixa a UFBA em 1961 e encerra seu ciclo como diretor da Escola.

Avant-garde na Bahia - Lina Bo Bardi

Ana de Oliveira*
De todos os nomes que fizeram parte da renovação da Universidade Federal da Bahia durante a gestão do reitor Edgard Santos, Lina Bo Bardi foi o mais Marcante.
Italiana de nascimento, a arquiteta e designer chegou à Bahia no final da década de cinqüenta para revolucionar a visão de arquitetura, de espaço, de arte e de cultura em toda região.
Apesar de ter sua trajetória baiana vinculada ao ambiente cultural existente em torno da universidade, Lina foi para Salvador a partir do convite feito pelo então governador Juracy Magalhães. O convite era para a construção e direção do Museu de Arte Moderna da Bahia, tarefa que a arquiteta executou entre 1959 e 1964. Apesar dos percalços, o MAMB foi um espaço até então inédito na vida cultural de Salvador. Suas atividades galvanizavam a vida cultural da cidade e faziam a ponte entre a arte, o Estado e a Universidade.
Enquanto foi diretora-executiva, Lina Bo Bardi implementou parcerias e espaços de reflexão em comum com a gestão de Edgard Santos na UFBA. Citando a própria arquiteta em seu artigo “Cinco anos entre os brancos”, ela afirma que iniciou o trabalho do MAMB “eliminando a ‘cultura estabelecida’ da cidade, procurando o apoio da Universidade e dos estudantes, abrindo o Museu gratuitamente ao povo, procurando desenvolver ao máximo uma atividade didática”.
No dia-a-dia do MAMB, além das exposições, existiam três frentes de atividades: a Escola da Criança, em parceria com o professor de teatro da UFBA Martim Gonçalves; a Escola de Música Infanto-juvenil, com a colaboração do maestro Hans Joachim Koellreuter, também da UFBA; e as atividades do Clube de Cinema de Walter Silveira, famoso crítico e formador de toda uma geração de cinéfilos baianos. Essas atividades, somadas às suas aulas, falas públicas e artigos, fizeram de Lina Bo Bardi uma figura de destaque nesse momento para toda uma geração que, nas palavras de Caetano Veloso, foi “civilizada” pela sua presença em Salvador durante aqueles anos.
É importante ressaltar que essa atmosfera de colaborações fez do MAMB um espaço em que grandes nomes da cultura baiana se articularam em parcerias, troca de idéias e formações intelectuais. Foi durante esse período que Lina Bo conviveu com Glauber Rocha, Calazans Neto, Mario Cravo Junior, Vivaldo da Costa Lima, Jorge Amado, Martim Gonçalves e Rogério Duarte, entre outros.
Lina Bo Bardi foi ainda a responsável pela fundação do Museu de Arte Popular (MAP) e da Escola de Desenho Técnico e Design da UFBA. A Fundação do MAP teve grande importância devido ao seu lugar de instalação: o complexo arquitetônico Solar do Unhão, construído ainda no século XVII. A arquiteta conseguiu financiamento para o restauro e inaugurou o MAP em 1963, com a exposição “Nordeste”.
Assim, Lina Bo Bardi atuava em diferentes frentes de trabalho. Fosse na arte moderna, na arte popular ou no design industrial, sua intenção era justamente pôr em xeque tais definições. O que os seus diferentes trabalhos tinham em comum e deixaram como legado para a cultura baiana e nacional era a vontade de renovação e a quebra de hierarquias estéticas – e sociais.
Lina ainda teve participação decisiva em outras áreas culturais da época, ao atuar como cenógrafa de dois espetáculos montados por Martim Gonçalves e pelos alunos da Escola de Teatro da UFBA. Os Cenários da “Ópera dos três tostões”, de Bertold Brecht (1960), e de “Calígula”, de Albert Camus (1961), são dois marcos da cenografia nacional. As parcerias da avant garde baiana permanecem até hoje influenciando gerações.
* Editora do site Tropicália

Avant-garde na Bahia

Ana Carolina*
No final da década de cinqüenta e início da década de sessenta, a cidade de Salvador passou por uma série de transformações que marcariam definitivamente a sua história cultural e, de forma mais ampla, de todo País. Tais transformações teriam, anos mais tarde, conseqüências diretas em movimentos como o Cinema Novo e o Tropicalismo.
O principal motor dessas transformações foram as experiências revolucionárias ocorridas na Universidade Federal da Bahia (UFBA). A reforma instalada pelo visionário reitor Edgard Santos proporcionou uma renovação profunda na vida cultural da cidade e gerou uma nova leva de intelectuais e criadores, cujas obras permanecem até hoje instigantes e inovadoras. A partir do planejamento e dos esforços de seu reitor, a reforma da UFBA trouxe para os seus estudantes novas perspectivas em áreas como a Música, o Teatro, a Filosofia, a História, as Artes e a Dança.
Com tal proposta de renovação, Edgard Santos conseguiu articular diferentes frentes de pensamento e ação cultural da cidade ao redor da universidade.
Entre os colaboradores e professores da UFBA, destaca-se uma série de artistas e de pensadores internacionais comprometidos com as idéias de vanguarda e experimentação. Seus principais nomes são a arquiteta e designer italiana Lina Bo Bardi (na direção do Museu de Arte Moderna da Bahia, mas trabalhando em sintonia com a Universidade), o diretor de teatro Martim Gonçalves, o músico e artista plástico suíço Walter Smetak, o afamado maestro alemão Hans J. Koellreuter, o historiador português Agostinho da Silva e a polonesa Yanka Rudzka, professora de dança contemporânea.
Além destes, profissionais e amadores como o jornalista João Ubaldo Ribeiro, os jovens Glauber Rocha, Caetano Veloso, Maria Bethânia, Gilberto Gil, Waly Salomão e Tom Zé, o antropólogo Vivaldo da Costa Lima, o filósofo Carlos Nelson Coutinho e muitos outros foram ativos freqüentadores do dia-a-dia da universidade. Seus trabalhos posteriores os colocam como representantes de um meio intelectual baiano, cujas atividades saíram da UFBA e dos circuitos boêmios e culturais de Salvador para o resto do mundo.
Espaços como o Museu de Arte Moderna da Bahia trabalharam em constante parceria com seus alunos, por meio da figura de Lina Bo Bardi. Intelectuais que escreviam para jornais, como o Diário de Notícias, publicavam artigos em revistas como Mapa e Ângulos ou participavam dos cineclubes de críticos, como Walter Silveira, passaram a freqüentar o ambiente universitário, suas aulas e seminários. Por fim, artistas que já dialogavam com as tradições africanas na cultura baiana – entre eles Carybé, Mario Cravo Junior e Pierre Verger – encontram novos espaços de reflexão e debate em iniciativas a exemplo do Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAO), dirigido por Agostinho da Silva.
Esse clima de ação coletiva, com reuniões em livrarias, teatros e cinemas da cidade, ajudou na formação do que mais tarde a crítica cultural brasileira chamaria de “grupo baiano”.
Antonio Risério, outro intelectual desse período, batizou de “Avant Garde na Bahia”.
* Editora do site Tropicalia

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Edgar Santos, o Reitor visionário

Jary Cardoso*
Depois de um período de reciclagem, estou de volta ao blog Jeito Baiano, e recomeço saudando a notícia de que Antonio Risério vai escrever a biografia de Edgard Santos, o fundador da Universidade Federal da Bahia (UFBa), em 1946, e seu primeiro reitor. Durante os 15 anos de seu reitorado, ele abriu as portas e caminhos para um renascimento multicultural na Bahia que se expandiu para São Paulo e Rio e gerou o Cinema Novo e a Tropicália.
Quem deu a notícia dessa biografia foi o editor José Enrique Barreiro em entrevista publicada em 30.1.2011 pela revista Muito (suplemento dominical do jornal A Tarde). Barreiro convidou Risério para tal empreitada certamente levando em conta que o escritor baiano é o autor de Avant-garde na Bahia, editado em 1996 pelo Instituto Lina Bo e P.M. Bardi.
Avant-garde na Bahia, originalmente, a tese apresentada por Risério para a obtenção do grau de Mestre em Sociologia pela UFBa, trata daquele período liderado pelo reitor Edgard Santos, que trouxe para a universidade grandes cabeças de fora da Bahia, como o compositor erudito de vanguarda, maestro, flautista e crítico de arte Hans-Joachim Koellreutter, de origem alemã e que dirigiu os Seminários Livres de Música em Salvador; o filósofo, poeta e ensaísta português Agostinho da Silva, que criou o Centro de Estudos Afro-Orientais (Ceao); a polonesa Yanka Rudzka, diretora da Escola de Dança; e o cenógrafo e diretor de teatro Eros Martins Gonçalves, pernambucano, que dirigia a Escola de Teatro.
A UFBa, sob o comando de Edgard Santos, avançava e fazia convergir os movimentos de arte e cultura existentes na Cidade da Bahia que tinham como protagonistas o crítico de cinema Walter da Silveira, o geógrafo Milton Santos, o arquiteto e urbanista Diógenes Rebouças, o artista plástico Mário Cravo, o antropólogo Vivaldo da Costa Lima, o artista plástico baiano-argentino Carybé, o arquiteto (como fazia questão de ser chamada) Lina Bo Bardi, italiana, que estava à frente do Museu de Arte Moderna da Bahia, o fotógrafo e etnógrafo Pierre Verger, francês, o músico inventor Walter Smetak, suíço, entre outros.
E entre os jovens que despontavam na época, muitos deles alunos da UFBa, figuravam Glauber Rocha, Caetano Veloso, Waly Salomão, João Ubaldo Ribeiro, Rogério Duarte, Roberto Pinho, José Carlos Capinan, Gilberto Gil, Carlos Nelson Coutinho, Duda Machado.
Toda essa gente contribuía para um ambiente de invenção e ousadia cultural, regido pelo visionário Edgard Santos. Sobre ele escreveu Jorge Amado, em Bahia de Todos os Santos – Guia de Ruas e Mistérios (citado por Risério em avant-garde na bahia):
“Mestre Edgard Santos era um fidalgo da Renascença e ao mesmo temo dinâmico cidadão do mundo de hoje… Quando o tiraram de sua Universidade, ou seja do formidável trabalho que estava realizando, já não teve motivos para viver, foi-se embora primeiro para o Rio, depois para sempre. A ele se deve, em grande parte, o atual prestígio cultural da Bahia, o desenvolvimento não apenas dos estudos universitários mas de toda nossa vida intelectual”.
Caetano Veloso dá seu depoimento na apresentação do livro avant-garde na bahia:
“(…) O fato de a Universidade estar tão presente na vida da cidade, com seu programa de formação artística levado a cabo por criadores arrojados chamados à Bahia pelo improvável Reitor Edgard Santos, fazia de minha vida ali um deslumbramento. (…)
O que aconteceu na Bahia do final dos anos cinquentas ao início dos sessentas é ainda um aspecto pouco conhecido – embora determinante – da história recente da cultura brasileira. Este livro vem fazê-lo inteligível. Para mim, Risério revela nele o sentido de minha própria inserção no mundo (…)".
A biografia a ser escrita por Antonio Risério certamente irá contribuir para um melhor conhecimento da “Era Edgard Santos” e nos ajudará a entender e a definir o quanto falta atualmente para haver um novo renascimento civilizatório da Cidade da Bahia.
Entrevista de Barreiro à Muito
José Enrique Barreiro é o criador e CEO (Chief Executive Officer, o mais alto cargo executivo) da Editora Versal, com sede no Rio, mas ele mesmo é gente da Bahia – e de sucesso: começou, aos 16 anos, como jornalista do Jornal da Bahia, comandou a TVE no governo Waldir Pires, coordenou o núcleo de publicações da Odebrecht. Pois as duas respostas finais da entrevista de Barreiro à Muito me interessam em especial como blogger do Jeito Baiano.
Na primeira, José Enrique Barreiro responde à repórter Tatiana Mendonça que entre os futuros lançamentos de suas duas editoras (além da Versal, ele é o novo dono da editora carioca Guarda-Chuva), está prevista a biografia de Edgard Santos.
Na segunda resposta, instigada pela repórter, Barreiro faz coro com os descontentes (todos nós) e reclama de tanta coisa errada na Cidade da Bahia, uma situação que está nas antípodas do tempo em que Edgard Santos, o personagem destacado na pergunta anterior, era o reitor da Universidade Federal da Bahia.
TATIANA – Quais são os próximos lançamentos das suas editoras?
BARREIRO – (…) sobre a Bahia, vamos publicar [pela Versal], dentro do Prêmio Clarival do Prado Valladares, da Odebrecht, um livro de arte sobre o Mosteiro de São Bento. E estou fechando com Antonio Risério uma biografia de Edgard Santos. É uma figura que precisa ser resgatada e conhecida. Se houve Tropicalismo, se houve Cinema Novo, isso deve ser creditado largamente a ele. Foi Edgard Santos quem deu um ambiente cultural a esta cidade, propiciou a circulação de ideias. Porque talento nós temos de sobra. Talvez isso seja até um problema, porque a gente fica acomodado no talento, e aí é pouco rigoroso, pouco estudioso, pouco elaborativo… Porque a Bahia, realmente… Nossa gente é maravilhosa. Estou fazendo 20 anos no Rio. Mas venho sempre a Salvador. Tenho até um apartamento aqui, pago IPTU.
TATIANA – Então tem muito do que reclamar.
BARREIRO – É, a cidade está sem… Tenho visto algumas cidades brasileiras, como o Rio e São Paulo, andando para a frente, tentando resolver seus problemas. E Salvador, se não andou para trás, também não andou para frente. Tem problemas de trânsito, tem a questão da especulação imobiliária fortíssima… Tenho receio de que assim a gente possa vir a perder aquilo que nos é mais especial, nossa hospitalidade, nosso jeito tranquilo de ser, nossa amizade. Tomara que se faça algo nesse sentido, e também no sentido cultural. Alguma coisa precisa acontecer para que a gente dê um salto maior. Nós exportamos o Tropicalismo, foi um feito notável. Mas, depois disso, a gente se concentrou muito no Carnaval. A força desse esquema é tão grande, envolve tanta gente, que acabou tomando conta das nossas possibilidades culturais. Não podemos chegar ao resto do País só com o Rebolation. É muito pouco. Temos capacidade para produzir muito mais.
*Jary Cardoso é editor do Jornal A Tarde e do blog Jeito Baiano
** Artigo publicado originalmente no blog Jeito Baiano

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O metrô de Salvador já custou R$ 1 bilhão e não funciona

Claudio Dantas Sequeira*
O menor e mais caro metrô do mundo está na Bahia. Com apenas 6,5 quilômetros de extensão e custo total de R$ 1 bilhão, ganhou dos baianos indignados o singelo apelido de “autorama”. Só que não funciona.
A construção do metrô de Salvador arrasta-se há uma década, o que também situa a obra entre as mais longas do gênero. É, sem dúvida, a síntese do que há de pior na administração pública brasileira: corrupção, burocracia, incompetência e descaso com o cidadão. O projeto inicial previa 41 quilômetros, só que o investimento foi todo consumido no primeiro trecho, que deveria ser de 12 quilômetros, mas foi reduzido à metade.
Para agravar, um estudo de viabilidade econômica do projeto mostra que, para cobrir os custos de operação, o bilhete do metrô poderá custar entre R$ 10 e R$ 15, seis vezes o preço em São Paulo. Chegou-se à conclusão de que o metrô não se sustenta economicamente, terá de ser subsidiado. É muito curto e ainda por cima foi construído numa área que é bem coberta por outros transportes públicos.
Na primeira gestão do Prefeito João Henrique Carneiro (foto), o projeto do Metrô foi alterado no trecho da Avenida Mário Leal Ferreira. Houve acréscimos de custos, com a construção de um elevado de 3 km. A obra também foi paralizada em decorrência de denúncias do TCU e MPF.
Dirigentes da Companhia de Transporte de Salvador (CTS), que gerencia o andamento das obras, culpam a administração anterior pelo imbróglio. “Tudo começou na licitação feita pelo prefeito Antonio Imbassahy (PSDB)”, diz o diretor da CTS, Hebert Motta.
De fato, foi Imbassahy (1997-2005) quem abriu a concorrência para a construção do metrô em 1999. O exprefeito garantiu à ISTOÉ que todo o processo transcorreu “dentro da lei”. Entretanto, o TCU já determinou a retenção cautelar de R$ 50,5 milhões após encontrar irregularidades na obra e a Corregedoria-Geral da nião finaliza auditoria sobre os preços praticados pelo Consórcio Metrosal. Mais grave: a Justiça Federal da Bahia aceitou denúncia do Ministério Público por suspeita de formação de quadrilha, cartel e fraude na licitação. Foram acusados sete dirigentes das empresas que participaram da concorrência: dois da Camargo Corrêa e dois da Andrade Gutierrez, integrantes do consórcio Metrosal, além de três dirigentes da construtora italiana Impregilo, do consórcio Cigla. Segundo o MPF, as empresas atuaram em conluio. As companhias negam a acusação. Em 2010, os procuradores baianos conseguiram uma ajuda extra do MPF em São Paulo, que confirmaram os indícios de fraude e superfaturamento no metrô baiano. A papelada faz parte do inquérito da Operação Castelo de Areia, que apura o pagamento de propina a políticos e agentes públicos em dezenas de empreendimentos pelo País.
Envolvendo doações a políticos de diversos partidos, o processo foi paralizado no STJ, sob a alegação de que as provas foram obtidas ilegalmente, baseadas em denúncias anônimas.
Pelo visto, o buraco do metrô de Salvador é muito mais profundo.
*Jornalista da Isto É

Governo do Estado vai administrar o metrô de Salvador

Romulo Faro*
O ingresso do prefeito João Henrique no Partido Progressista (PP) abriu as portas para a articulação, no sentido de o governo do Estado assumir a administração do Metrô de Salvador. Conversas de bastidores dão conta de que a demora para tanto era o alcaide integrar um partido da base aliada do governador Jaques Wagner (PT), o que já não é mais problema.
João Henrique deve se filiar oficialmente no PP logo depois do Carnaval, no dia 13 de março. A perspectiva é que o executivo estadual dê largada o quanto antes também às obras do segundo trecho compreendido da Rótula do Abacaxi (Acesso Norte) até Pirajá. Diga-se de passagem, um desejo explícito do governador.
Embora não tenha admitido que exista uma negociação político-partidária, o ministro das Cidades, Mário Negromonte, que também é o presidente do PP na Bahia, confirmou, que o Estado vai, sim, administrar o polêmico metrô de Salvador.
O ministro disse não saber com precisão quando isso acontecerá oficialmente, mas foi enfático ao afirmar que é apenas questão de tempo. “Na época do projeto do metrô de Salvador, por algum motivo, a Prefeitura assumiu a responsabilidade, mas é natural que o governo federal ou o governo estadual administre o sistema. É assim em todo o Brasil. Em lugar nenhum do mundo uma prefeitura administra metrô”, pontuou Negromonte.
As obras do segundo trecho, que completará os 12 quilômetros do percurso, de acordo com Negromonte, pode se iniciar até o final de 2011 e, conforme ele explica, o governo baiano é quem receberá os R$ 480 milhões previstos pela União, através do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), voltado para obras de locomoção e infraestrutura de transportes em grandes municípios brasileiros. O montante será repassado também através do Ministério das Cidades.
De acordo com o ministro, até o final do próximo mês de março a primeira etapa do percurso do metrô já deve estar servindo à população. São os seis quilômetros que vão da Estação da Lapa à Estação Rótula do Abacaxi (Acesso Norte). Para tanto, a pasta das Cidades vai repassar ao cofre municipal R$ 80 milhões, que serão gastos com treinamento para os operários dos trens e com revisão das máquinas.
* Jornalista da Tribuna da Bahia

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Google aposta em nova tecnologia de transportes

Batizado de Shweeb, meio de transporte é composto por cápsulas transparentes com pedais e ligado a monotrilho
Imagine pedalar pelas ruas, sem pegar trânsito e, de quebra, ver o céu? Pois um australiano criou uma “bicicleta voadora”. Trata-se de um sistema de transporte que conta com monotrilhos e cápsulas transparentes com pedais.
Batizada de Shweeb (que vem da palavra alemã “schwebe”, que significa pendurado, pairando ou suspenso, em português), a invenção de Geoffrey Barnett pode chegar a até 45 quilômetros por hora.
A aerodinâmica e os mecanismos da cápsula foram criados pensando em eliminar as fontes de atrito para que ao pedalar as pessoas não façam muito esforço. Para quem desejar, há a alternativa de usar eletricidade para movimentar a cápsula.
A ideia surgiu quando Barnett foi morar no Japão para dar aulas de inglês e se deparava com ruas congestionadas. “Eu queria passar por cima de todas as pessoas”. Ao voltar para Austrália, Barnett se debruçou em pesquisas para conseguir colocar a “bicicleta voadora” em prática. Depois de seis anos, o sistema saiu do papel e ganhou uma versão em um parque de aventura na zona turística da Rotorua, na Nova Zelândia. É lá que os usuários da “bicicleta” podem dar sua opinião para aperfeiçoar o sistema.
A invenção despertou o interesse do todo poderoso Google. Em setembro de 2010, o projeto foi escolhido para receber US$ 1 milhão da companhia como parte do Projeto 10100, que convocou usuários do mundo todo a criarem soluções para os desafios globais.
Diante desta promessa futurista, será o adeus ao trânsito? É aguardar e conferir.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Salvador, o Prefeito e o Governador

Armando Avena*
Salvador precisa de socorro, não de soluções políticas extremadas. Precisa da união das diversas esferas de poder em torno um projeto administrativo mínimo. A cidade tem pouco mais de três anos para se preparar para a Copa de 2014 e não faz sentido perder dois anos discutindo querelas políticas, levantando hipóteses de impeachment ou adubando o terreno político com vistas as eleições de 2012.
Por isso, é preciso que o Prefeito de Salvador, o Governador do Estado (foto) e o Ministro das Cidades , indicado pela Bahia, se unam e estabeleçam um programa mínimo de trabalho que garanta as obras de infraestrutura que vão viabilizar a Salvador da Copa de 2014.
Não cabe aqui discutir os problemas da gestão do Prefeito João Henrique, mas em uma questão específica ele está certo: Salvador não pode ser administrada e preparar-se para a copa de 2014 contando somente com as recitas municipais. Salvador apresenta, entre as 26 capitais do país, a segunda menor receita per capita e isso ocorre por não ter indústrias de porte e por conta dos critérios de distribuição de ICMS, assunto que vale um estudo específico.
E assusta saber que a receita corrente líquida da capital do Estado é inferior ao orçamento de investimento de uma única secretaria do governo, a Secretária de Desenvolvimento Urbano. O governador não está alheio a questão e vale destacar os recursos alocados na construção da Arena Fonte Nova – a obra mais adiantada do país entre os estádios da Copa – que vai dotar a cidade de um equipamento multiuso, com desdobramentos positivos na economia, na reforma urbana da cidade e no mercado de emprego.
Ressalte-se também a construção da Via Expressa e os recursos negociados para o projeto de mobilidade urbana. Mas Salvador é a vitrine da Bahia, é a caixa de ressonância que faz vibrar nosso esporte, nossa cultura, nosso povo (por favor, avisem ao novo secretário de Cultura!) e, por isso, é fundamental que o governo do Estado utilize boa parte dos bilhões da Sedur e do seu orçamento para investir na cidade, melhorando a vida de sua população e preparando-a para a Copa de 2014.
* Economista e escritor, foi Secretário do Planejamento da Bahia
** Artigo publicado originalmente no jornal A Tarde
** Na foto o Prefeito João Henrique e o Governador Jacques Wagner

João Henrique troca Gedell por Negromonte

João Paulo Lima*
Depois de estar muito perto de acertar com o Partido Verde o prefeito de Salvador João Henrique Carneiro acabou se juntando os Partido Progressista(PP). A filiação foi acertada em uma reunião hoje, no Palácio Thomé de Souza onde o prefeito João Henrique recebeu o convite formal para ingresso no partido. O inicio dos trabalhos de João Henrique como membro do PP começará dia no dia 12 de março.
Na reunião estiveram presentes o ministro das Cidades, Mário Negromonte, o deputado federal João Leão, os deputados estaduais Mário Júnior e Cacá Leão e o secretário regional do PP, Jabes Ribeiro, que comentou o ingresso do prefeito. “É um quadro muito importante para o partido, o prefeito da terceira maior cidade do país. Somos o terceiro maior partido em votos da base aliada do governo federal e o segundo da base aliada do governo estadual .
Segundo o Ministro das Cidades Mario Negromonte, O governador Jaques Wagner já está sabendo da filiação e segundo informações está muito contente com a chegada do prefeito ao governo. O prefeito João Henrique também comentou sua entrada no novo partido exaltando suas qualidades.
“É muito importante o entrosamento das três esferas governamentais para as obras necessárias para a Copa do Mundo. Além disso, é uma honra me filiar ao PP, que tem experiências exitosas de administrações municipais”, frisou João Henrique.
Na Bahia, o PP conta com 50 prefeitos e em nível nacional com 44 deputados federais e 5 senadores.

*Reporter
**Na foto Gedell, João Henrique e Mário Negromonte

domingo, 20 de fevereiro de 2011

"Soy Loco por ti Poeta Capinan!!!!

Jorge Portugal*
Poetas são criaturas que conhecem, como ninguém, o endereço do nada. E, quando se lhes dá na telha (ou na pele), vão lá e retiram palavras, imagens e metáforas para falar de mundos que a nossa impotência verbal não traduz. E é dos poetas que tomamos as palavras emprestadas quando sentimos que as nossas não conseguem chegar às estrelas.
Pois bem, neste sábado, dia 19 de fevereiro, estará completando inacreditáveis 70 anos um dos maiores e mais importantes poetas da cultura brasileira contemporânea: José Carlos Capinan.
Foi de Capinan que você, leitor(a), tomou as palavras precisas para expressar aquela alegria indizível de se descobrir vivo e feliz. Ali, você cantou:
cores do mar, festa do sol/
vida é fazer todo sonho brilhar, ser feliz/
em seu colo dormir e depois acordar/
sendo o seu colorido brinquedo de papel machê…”
Lembra?
Ou, no caso de você já ter passado dos trinta (rsrsrs!) e ter vivido com ardor juvenil o sonho de alguma revolução igualitária em que os países não tivessem fronteiras, nem divisões sociais, o seu coração “guevariano” certamente deve ter cantado
“Soy loco por ti, América/ Tenga como dolores a espuma blanca de Latinoamerica/ Y el cielo como bandera”.
Ou, ainda no seu caso, caro leitor, ao despir a mulher amada com olhos de poesia e desejo, e não encontrando palavras à altura para o seu plano de sedução, deve, sim, ter pedido ajuda a Capinan e cantado no ouvido da musa: ”Moça bonita, o seu corpo cheira ao botão de laranjeira/ Eu também não sei se é/ Imagina a minha sina é um cheiro de café/ Ou é só cheiro feminino/ É só cheiro de mulher”.
E assim, dessa maneira, Capinan foi tomando conta de nossas vidas, convidando-nos a “penetrar surdamente” no reino de suas palavras e nos entregando a chave de belas e invulgares emoções. Por isso, onde você estiver neste sábado, agradeça ao deus da poesia por ter nos dado esse “caboco do mato” que vem enchendo nossa vida de palavras, sonhos e luz.
*Poeta e Educador
** Publicado originalmente em A Tarde, 15/02/2011 e no Blog Jeito Baiano - http://www.jeitobaiano.atarde.com.br

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Ao Mestre, com Carinho

Antônio Risério*
Vivaldo da Costa Lima nunca foi meu professor, em curso algum. Mas, entre inícios da década de 1970 e finais da de 1990 – quando compromissos políticos e profissionais foram me afastando fisicamente, sempre mais, da Bahia –, me ensinou muito e sobre os mais variados assuntos. Foram conversas e mais conversas, em algumas reuniões, alguns encontros, algumas festas, mas principalmente circulando pela cidade, entre petiscos e bebidas, do centro histórico a Itapoã, passando, sempre, pelo bairro do Rio Vermelho.
Não quero chorar ou lamentar nada – nem dizer coisas do tipo “a Bahia ficou ainda mais pobre sem ele”. Apenas lembrar uma coisa. Vivaldo foi raro exemplo de homem de pensamento e ação. Era nosso antropólogo maior. E, certamente, um dos maiores antropólogos brasileiros. Mulato culto e sofisticado (no mais das vezes, dizia-se “branco baiano”, citando a classificação de Peirson), leitor de Mauss e Proust, foi, entre outras coisas, uma espécie de “intelectual orgânico” do candomblé. Gostava de beber (em um de nossos últimos encontros, no Gantois, me disse que o médico tinha-lhe proibido o consumo de cerveja – e que, portanto, por recomendação médica, ia passar a beber uísque), ler, conversar e comer, juntando o útil ao agradável em seus estudos de antropologia da alimentação. Era irônico e autoirônico. Para tudo, inclusive para si mesmo, tinha um olhar ao mesmo tempo cortante e generoso.
Como homem de ação, esquerdista em governos carlistas, foi quem de fato meteu a mão na massa em defesa da riqueza histórico-arquitetônica da Cidade da Bahia e do Recôncavo. Claro: antes dele, alguns intelectuais tinham protestado contra a demolição da velha Sé. Em 1935, a Semana de Urbanismo, realizada em Salvador, ressaltou a importância de nosso patrimônio. Caymmi não tomou conhecimento da modernização da cidade, celebrando, antes, as sacadas dos sobrados coloniais ou imperiais. Adiante, Diógenes Rebouças, elegantizando o traçado da Avenida de Contorno, evitou que aquela via destruísse o Solar do Unhão. Etc. Mas foi com Vivaldo à frente que a questão da memória arquitetônica e urbanística ganhou, entre nós, outra densidade e visibilidade. Na época em que ele defendia o patrimônio de Salvador, seu amigo Roberto Pinho fazia um cadastramento, casa por casa, de Cachoeira, que serviu de base para o tombamento da cidade. Foi graças a Vivaldo, enfim, que o Pelourinho foi considerado “patrimônio da humanidade”.
Com todo seu destempero e sarcasmo, era homem fino, educadíssimo. Amante, embora quase nunca o confessasse, da civilidade, do trato gentil, das normas e mesmo da etiqueta (fosse ela “vitoriana” ou candomblezeira – como Verger, aliás, que admirava o sentido hierárquico das relações dentro do terreiro de candomblé). Nunca me esqueço de um encontro nosso, começo de noite, na Cantina da Lua. Quando ele veio em direção à minha mesa, levantei-me para abraçá-lo e beijá-lo. Ele então falou alto, para o bar inteiro ouvir: “Sigam o exemplo! Aqui está uma pessoa educada. Uma pessoa que sabe se levantar para cumprimentar um amigo!”. Fiquei morrendo de vergonha, mas adorei. E, assim como sabia brigar, sabia desfazer brigas. Fez as pazes entre mim e o antropólogo Júlio Braga, por exemplo. Com um argumento sensacional: “Um já mandou o outro à puta que pariu – agora, podem se abraçar”.
Vivaldo não publicou – mas escreveu – muito. Tinha um senso quase destrutivo de autocrítica. Sempre que eu comentava isso, citava uma carta de Saussure, onde o grande linguista confessava “horror à pena”, dizendo que escrever era um “suplício inimaginável”. Vivaldo, não. Curtia escrever. O problema, para ele, era publicar. Vivia retocando e nuançando tudo, sempre em busca do rigor maior. Mas deixou muitos escritos. Sobre candomblé, culinária, questão indígena, etc. Coisas e mais coisas, que seus interesses eram variadíssimos. Devemos ver o que faremos, agora, com todos esses escritos. Com o baú fernandopessoano que Vivaldo nos deixou. É um tesouro que a Bahia tem em mãos. Saberá cuidar dele?
*Antonio Risério – Escritor, poeta e antropólogo
Artigo publicado originalmente no jornal A Tarde

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Em momento de crise na gestão pública, Salvador ganha movimento da sociedade civil

Luan Santos
Em meio a toda a crise de gestão, a cidade de Salvador está prestes a conhecer um novo movimento que pretende mobilizar a população diante dos problemas que afetam a capital baiana. Trata-se do Movimento Nossa Salvador, que visa, como diz seu lema, “trabalhar por uma cidade melhor para se viver”. O movimento será lançado oficialmente no dia 29 de março, quando Salvador sediará o II Encontro da Rede Latino-Americana de Cidades Justas e Sustentáveis.
Este encontro contará com a participação 50 cidades da América Latina que possuem movimentos com objetivos similares aos do Nossa Salvador.
O movimento começou a germinar em 2008, quando um grupo de pessoas teve a idéia inicial, mas só começou a ganhar força em 2009, como afirma Aldo Ramon Almeida, um dos líderes do movimento, “esse movimento teve um grande avanço em maio de 2009, com a vinda à Salvador de Bernardo Toro, que é um filósofo e cientista político colombiano. Ele fez uma palestra na Universidade Federal da Bahia, onde falou sobre o tema das cidades mais sustentáveis. E naquele momento o movimento se tornou mais conhecido para o grande público e muita gente começou a perguntar e a querer participar”.

Ricardo Pessoa, empresário e participante do movimento, comenta a importância do Nossa Salvador em meio à atual crise de gestão na cidade. “O movimento visa levar para as pessoas uma maior consciência de cidadania. Queremos tirar o foco de uma gestão política, partidária, para uma gestão social, sustentável, mais transparente”.
O Movimento Nossa Salvador pretende trazer para público discussões sobre assuntos que são importantes para a população. “É um movimento contributivo. Ele é apartidário, não há nenhum interesse de promoção individual, é interreligioso. É simplesmente um grupo de pessoas que têm contribuições e que querem que essas contribuições ganhem visibilidade, que possam ajudar a sociedade”, assim define Almeida.

O movimento atua com três frentes de trabalho: indicadores sociais, acompanhamento da gestão pública e educação para a cidadania. A partir destas três frentes, os membros do grupo elegeram uma série de eixos temáticos: educação, saúde, saneamento, meio ambiente, planejamento urbano, equidade de gênero e raça, juventude e trabalho e renda. Em relação a estes eixos, Aldo Ramon Almeida comenta que “a organização mínima do movimento consiste em identificar os eixos temáticos, que em nosso caso, elegemos estes. E pretendemos que cada pessoa que se identificar com um ou mais eixos, possa contribuir, possa dar sugestões e isso vai gerar ações que proporcionem o bem-estar da população”. Assim, a partir destes eixos, cada pessoa que quiser participar do movimento, se encaixa em um ou mais temas e começa a criar meios para mobilizar a população e o poder público visando a melhoria das condições de vida na cidade.
A organização do movimento será feita a partir de Grupos de Trabalhos, que serão construídos com base nos eixos temáticos citados. Estes GT’s discutirão os assuntos presentes nestes eixos e com base nisso apresentarão suas visões sobre os temas e buscarão soluções para os problemas sociais.
O Movimento Nossa Salvador foi inspirado por outro ocorrido há dez anos em Bogotá, capital colombiana. O movimento nesta cidade se iniciou com um grupo de intelectuais, acadêmico, empresários e civis se reuniram para discutir maneiras de tornar a cidade mais justa, mais igual, com melhor qualidade de vida. Tal iniciativa pioneira trouxe bons frutos à capital colombiana, de maneira que influenciou outras cidades da America Latina, como La Paz, Santiago, Santa Cruz De La Sierra e as brasileiras São Paulo , Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Ilhéus.
Encontro visando apresentação do movimento
No final de janeiro, o Movimento Nossa Salvador realizou um evento, visando apresentar-se e conseguir pessoas para integrarem a equipe de colaboradores. Em tal evento, estiveram presentes diversas pessoas ligadas a organizações como Fieb e Unicef com o objetivo de colaborar com o Nossa Salvador, todos convidados pelos líderes do movimento. Os participantes do evento foram convidadas com o objetivo de fazerem parte do movimento, colaborando nos eixos temáticos que foram escolhidos pelos líderes.
Nilton José Costa Pereira, que faz parte do Observatório de Segurança do Estado da Bahia e é professor da Unifacs, conta sobre sua motivação em participar do movimento. “Minha grande motivação é a causa pela qual luta o movimento, prova de que a sociedade toda não está apática”. Para ele, o movimento pode trazer grandes e bons frutos para a cidade de Salvador. “O movimento é uma semente que pode germinar. E com certeza a cidade de Salvador será muito beneficiada, pois problemas que estão esquecidos pela gestão pública, serão trazidos para a pauta de discussão da sociedade”.
Ricardo Pessoa, que também participou deste evento, diz que é importante uma grande adesão das pessoas ao movimento, para que haja discussões sobre temas que não são debatidos no espaço público. “Queremos estimular o debate na sociedade. Queremos plantar sementes que possam germinar no futuro, que não sejam ações esquecidas, mas que haja discussão no espaço público”. Ele conta ainda que aqueles que quiserem participar, não podem querê-lo apenas como marketing pessoal. “Ninguém aqui quer fazer movimento para chamar atenção para nós próprios. Queremos apenas que haja debate público sobre temas que interessam a sociedade”.

Encontro da Rede de Cidades será em Salvador
O comitê organizador do segundo Encontro da Rede Latino-Americana por Cidades Justas e Sustentáveis se reuniu em Salvador nos dias 27 e 28 de janeiro para definição de estratégias relacionadas ao Encontro.
A reunião preparatória foi no Hotel Catussaba Bussines, onde foi tratado o avanço dos trabalhos das atuais comissões do evento (Conhecimento, Governança e Conceitual), além de questões ligadas à preparação, tais como definição do programa, orçamento, recursos, convocação e logística.
O segundo Encontro da Rede Latino-Americana de Cidades Justas e Sustentáveis reunirá cerca de 50 cidades que estão implementando iniciativas relacionadas a qualidade de vida urbana por meio do controle público. O objetivo do evento é a troca de informações, com conhecimentos e experiências entre os integrantes para promover o aprendizado mútuo, o apoio e o fortalecimento das experiências locais em toda a America Latina.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Lelé - Um mestre da arquitetura

João da Gama Filgueiras Lima, Lelé, nascido em 10 de janeiro de 1932, no Rio de Janeiro é formado pela Escola de Belas Artes, no Rio de Janeiro em 1955. Iniciou sua carreira durante a construção de Brasília, onde teve participação ativa, colaborando diretamente com Oscar Niemeyer.
Participou da implantação da Universidade de Brasília, onde lecionou e coordenou a Pós-Graduação. Notabilizou-se pelo trabalho com a arquitetura pré-fabricada, realizando diversas obras em diversas capitais como Brasília, Rio de Janeiro e Salvador, transformando-se num dos mais importantes arquitetos do Brasil.
Desenvolveu o projeto da Rede Sarah de Hospitais em todo o país. Recebeu diversos prêmios em sua carreira, dentre eles o Grande Prêmio da Primeira Bienal de Arquitetura e Engenharia de Madrid pelo projeto da unidade do Hospital Sarah em Salvador. Em 2.000 representou o Brasil na Bienal Internacional de Veneza.
Atualmente está à frente do Instituto Brasileiro de Tecnologia do Hábitat (IBTH).
Poucos arquitetos brasileiros possuem tantas obras saídas de sua prancheta como João Filgueiras Lima, o Lelé (2).
Lelé é carioca de nascimento, radicado em Salvador e atuante em todo o país. Participou como protagonista de um dos momentos mais importantes do modernismo brasileiro, o nascimento de Brasília, projetando, construindo e colaborando com outros arquitetos, como Oscar Niemeyer. Ele foi capaz de desenvolver ao longo de sua carreira uma obra única, mesmo no contexto internacional, extremamente ligada a dois aspectos básicos da construção: o clima e a pré-fabricação.
A idéia de concretizar uma arquitetura mais humana, preenchida por luz e ventilação natural, além de racionalizada e economicamente viável, foi a marca de Lelé que tornou a Rede Sarah um símbolo de boa arquitetura (e boa administração) em nosso tropical e carente Brasil. O Centro de Tecnologia fornece hoje peças não só para os hospitais da rede, mas também para outras obras como Escolas, Tribunais de Contas e Tribunais Eleitorais em todo o país, provando seu sucesso.
A força das propostas de Lelé, capazes de romper a descontinuidade das políticas públicas, e penetrarem em grande parte de nosso território, mostra que a arquitetura pode, sim, ter sua parte num mundo e num Brasil melhor.
Mas é preciso quebrar a cabeça.
Afinal, se tem uma coisa que não combina com Lelé é perda de tempo.
A doença e o trabalho
Convivendo com um câncer na próstata há oito anos, o arquiteto não diminuiu o ritmo de trabalho e teve de inventar espaço em sua agenda para conceder esta entrevista em seu escritório em Salvador. João Filgueiras, o Lelé, está agora à frente do Instituto de Brasileiro de Tecnologia e Habitah - IBTH, onde concluiu recentemente o projeto arquitetônico do Tribunal Regional do Trabalho, adotando um inovador conceito de sustentabilidade ambiental e integração da estrutura com a natureza exuberante do terreno.
PSF- Por que escolheu morar aqui em Salvador?
Lelé:
Fui escolhido por Salvador. A vida da gente, no fundo, é movida por questões acidentais. A gente planeja, planeja e tudo sai ao contrário. O segredo é deixar as coisas acontecerem. Essa coisa de eu ter vindo parar em Salvador foi completamente acidental. Assim como foi acidental eu ter virado arquiteto. Toda a minha vida foi acidental. Eu não conheço certas coisas radicais que mudaram minha vida. E não conheço nenhuma delas que eu tenha planejado. Nem a ida pra Brasília, que foi completamente acidental. Nenhum arquiteto queria ir embora pra Brasília. Num almoço um cara perguntou se eu não queria ir pra lá. Aí eu disse: “Eu quero”. E me pegaram pelo pé (risos).
PSF- Uma questão que sempre foi associada à sua obra é a da sustentabilidade. Mas esse conceito virou certo modismo... Isso o incomoda?
Lelé
: Eu detesto, detesto... Mas está dando lucro ser ecologista. E, na verdade, o discurso da sustentabilidade disseminado por aí não está sendo praticado. Porque a gente precisa economizar os recursos naturais e utilizar o que a natureza nos fornece de mais barato. Sempre que eu falo sobre esse tema, uso a imagem da abelha. As abelhas lidam com uma coisa absolutamente sofisticada e escassa, que é o mel. A abelha retira o pólen das flores, faz um sacrifício enorme para transformar isso em mel. E o incrível é que a forma escolhida para fazer a colmeia, em hexágono, é a mais econômica que se tem. Seria mais fácil fazer uma casa redondinha, mas intuitivamente ela tem o cuidado de fazer hexagonal, que é a forma de juntar um casulo com o outro economizando o máximo de material. Então, quer dizer, o que o ser humano tem que fazer daqui pra frente construindo seus casulos, suas casas, suas cidades é usar a abelha como exemplo...

Projeto em Salvador é referência na arquitetura ambiental

Projeto de Lelé harmoniza estrutura e vegetação.
O projeto do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região da Bahia é o primeiro de João Filgueiras Lima (Lelé) à frente do Instituto Brasileiro de Tecnologia do Hábitat (IBTH). Ele simboliza, portanto, uma nova fase na carreira do arquiteto, que em 2009 se desligou profissionalmente do Centro de Tecnologia da Rede Sarah (CTRS), do qual foi fundador e onde atuou por duas décadas. “Os hospitais têm custo alto de manutenção. Não é viável construir mais unidades da Rede Sarah”, observa Lelé.
A nova sede do TRT é um complexo constituído por oito edificações, a serem implantadas em terreno densamente arborizado e cuja topografia, na forma de vale, tem desnivel da ordem de 30 metros em relação à cota da via circundante. Essas características marcantes motivaram a adoção do partido arquitetônico definido pela mínima intervenção no lote.
A proposta de ocupação é pontual: o extenso programa foi setorizado em prédios estanques, dispersos pela área de implantação.
Trata-se de edifícios com, em média, oito pavimentos, quatro deles abaixo e quatro acima da cota pública envoltória, o que permitiu a criação de caminhos suspensos para interligar as construções.
Essas passarelas fechadas e envidraçadas somam cerca de 200 metros lineares de trajeto, de modo a enfatizar a grande escala da intervenção (são 130 mil metros quadrados construídos).
A linearidade do percurso, em contraste com a volumetria circular das edificações, reforça a distinção que o projeto estabelece entre o ambiente natural e o construído.
Os prédios do tribunal foram planejados com estrutura metálica, cujos apoios estarão restritos aos núcleos de circulação vertical, a fim de minimizar as movimentações de terra.
Nesse sentido, a maior intervenção ocorre nas bordas do lote, onde serão criados quatro pavimentos de garagem e estacionamento descoberto através de corte escalonado de 13 metros de altura.
O terreno da nova sede do tribunal fica no Centro Administrativo da Bahia - CAB, próximo ao prédio do Tribunal Regional Eleitoral, também projetado por Lelé no final dos anos 1990.
A equipe do projeto do TRT inclui ainda Beatriz Secco (paisagismo), Audium (acústica e sonorização), Roberto Vitorino (estrutura), Porthos Moreira Gontijo (elétrica), Kouzo Nishiguti (hidráulica) e George Raulino (ar condicionado).
* Matéria publicada originalmente em PROJETODESIGN

O Prefeito, o poste e a muriçoca

Luiz Bassuma*
Existem três tipos fundamentais de governantes. O primeiro (ideal e raríssimo), estilo Rui Barbosa: honesto e competente. O segundo tipo (muito comum), estilo Maluf: rouba, mas faz. O terceiro (o pior dos mundos), estilo Collor: desonesto e incompetente.
A atual administração de Salvador é uma das piores de toda a história da cidade. Não faltam escândalos envolvendo desvios de milhões, em muitas áreas. Salvador é a 3ª capital do país, cidade turística, linda e uma forte inclinação aos serviços. Como estão as praias?
Num momento em que mais de 600 pessoas morreram em conseqüência das fortes chuvas no Rio de Janeiro, nossa cidade tem sol em abundância. E qual é a grande obra estruturante que a prefeitura está executando? Substituindo postes de iluminação. Trocando um poste bom, por outro poste bom e gastando inutilmente e de forma suspeita, milhões, que poderiam ser gastos com obras de engenharia de encostas, evitando deslizamentos e mortes nas próximas chuvas, que certamente virão .
As poucas áreas verdes remanescentes estão sendo dizimadas irresponsavelmente, sem nenhuma preocupação ambiental. Um dos resultados mais imediatos desse desequilíbrio ecológico: a cidade está infestada por muriçoca como nunca visto.
Nosso trânsito é caótico, sem transporte de massa eficiente, seguro e barato, restando os automóveis. Salvador é uma das três capitais do Brasil com menor número de veículos por habitante. Curitiba tem três vezes mais veículos que Salvador, mas não tem congestionamento. Por que será?
O TCM, um tribunal bastante tolerante com a maioria dos maus prefeitos da Bahia, detectou sérias irregularidades na gestão do prefeito João Henrique. A Câmara de vereadores tem poder constitucional e moral de iniciar um processo de cassação, para que Salvador não seja aniquilada completamente em mais dois anos de sofrimento para três milhões de baianos.
*Luiz Bassuma, ex-deputado federal pelo PV foi candidato ao governo baiano em 2010.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Crise Urbana e Crise do Estado

Paulo Ormindo de Azevedo*
O que iguala um operário e um empresário em dia de chuva em Salvador? A incerteza da hora que vai chegar a casa, o medo de um assalto no engarrafamento e a esperança de não encontrar o fogão ou o BMW flutuando na garagem. Esta perda de qualidade de vida é o retrato da desconstrução do setor público na Bahia. O “Estado mínimo” acabou se transformando em “Estado zero”. Com raras exceções não existem mais corpos técnicos na prefeitura e no Estado capazes de formular políticas públicas, redigir termos de referência e programas de obras ou avaliar os presentes de grego das empreiteiras. Os técnicos se aposentaram ou foram demitidos para serem substituídos por gestores partidários. Os poucos que restam são marginalizados.
Por esta razão, não temos políticas de Estado, nem memória institucional, só ações circunstanciais, de curto prazo, eleitoreiras. O vácuo e a desarticulação são os mesmos na economia, infra-estrutura, habitação, educação e saúde. Enquanto o Rio e São Paulo debatem estratégias de desenvolvimento e capacitam seus gestores em fundações como Getúlio Vargas e Casa de Ruy Barbosa; Minas o faz na Fundação João Pinheiro e Pernambuco na Joaquim Nabuco, nós não possuímos centros de pensamento nem capacitação. Criou-se entre os nossos políticos a ideia de que o saber e a técnica só atrapalham, que progresso se conquista com concreto e ferro e o resto é blá-blá-blá. A medida do desapreço dos nossos dirigentes pelo saber se mede pelo fato de só atrairmos duas universidades federais para a Bahia, enquanto Minas Gerais tem nove.
Mas já tivemos políticos mais sensíveis. Salvador teve, no início da década de 1940, o Epucs (Escritório do Plano de Urbanismo da Cidade do Salvador), equivalente do Ippuc de Curitiba, que colocou aquela cidade como referência mundial em gestão urbana. Foram as avenidas de vale do Epucs que catapultaram ACM ao governo do Estado, mas poucos se lembram. Na mesma época, possuíamos um centro de referência de engenharia, o Derba, hoje reduzido a pó. No início da década de 60, tivemos a CPE, de Rômulo Almeida, responsável pelos únicos projetos públicos de industrialização da Bahia, o CIA e o Copec. De lá para cá nada. O ISP-Ufba trabalha hoje mais para outros estados, empresas privadas e municípios que para o governo da Bahia.
Sem planejamento nem projetos, os governos estadual e municipal não têm mando, são meras instâncias reativas, homologadoras de projetos do empresariado, num ritual que passa pela adoção de projetos carimbados, doação de terreno e infra-estrutura, financiamento e isenções fiscais, sem nenhuma discussão com a sociedade ou avaliação do custo/ benefício. O resultado disto é um passivo de custosas obras desarticuladas, sem sustentabilidade, ou paralisadas, como o CAB, Aeroclube, VLT (veículo leve sobre trilhos), Metrô Rótula do Abacaxi, shopping Pelourinho, Via Náutica e viadutos que não levam a nada.
Se a gestão da Bahia e de Salvador estão mal é consequência de uma crise maior. Nosso quadro político atual é formado pelos netos de interventores de Vargas e da ditadura de 64, por emergentes religiosos e sindicais, todos sem projetos, que se odeiam mutuamente, mas estão atados entre si pelas teias do poder. Por falta de entendimento e planejamento não temos uma economia forte, não atraímos investimentos, não potencializamos a RMS (Região Metropolitana de Salvador) ou reduzimos a obesidade mórbida de Salvador. O sintoma mais eloquente dessa doença é a incapacidade do Estado e da prefeitura de elaborarem um projeto urbano para 2014.
Não é, portanto, surpresa que o IBGE constate que Salvador tem o penúltimo PIB (Produto Interno Bruto) per capita do País, perdendo apenas para a pequenina Teresina. Por falta de uma política metropolitana, municípios riquíssimos, como São Francisco do Conde, primeiro no ranking nacional de PIBs, não tenham nada e Candeias seja um favelão. E que um cidadão capixaba tenha seis vezes mais renda que um baiano. Neste ano novo, desejo ao povo baiano que eleja um governo que desprivatize e restaure o setor público, para que possamos voltar a ter um rumo e crescer.
* Arquiteto, é Diretor do CREA e do IAB - Bahia
Arti
**Artigo publicado originalmente no jornal A Tarde

São Paulo lidera ranking mundial de cidade da "ação e oportunidade"

O ranking Zeitgeist é organizado pela Hub Culture e lista as 20 cidades consideradas mais importantes do globo. O tema da edição de 2011 é "ação e oportunidade".
O ranking não se baseia em informações científicas, não envolve dados estatísticos ou econômicos. Mas para o grupo de pessoas conectadas, que viajam facilmente de um ponto a outro do globo, que são empreendedoras e influentes no mundo dos negócios e da cultura, São Paulo é, pela segunda vez consecutiva, a cidade que melhor representa o espírito do tempo em que vivemos.
O chamado Zeitgeist ranking é elaborado há cinco anos pela Hub Culture, uma sociedade fundada em 2002 que conta com mais de 20 mil membros espalhados pelo mundo. São figuras do mundo corporativo que preferem agir no anonimato, e também perfis descolados do cenário cultural que colaboram em diferentes projetos internacionais.
Novo mundo
A capital paulista, que entre os próprios moradores desperta rancor e paixão, é considerada "o lugar para se estar em 2011, onde tudo acontece", segundo a definição de Stan Stalnaker, fundador da Hub Culture.
"Por que São Paulo é a número um em 2011 e teve a mesma posição em 2010? Simplesmente porque há muita coisa acontecendo no Brasil agora, São Paulo é a maior cidade do país, o pólo econômico e representa muito bem o espírito da América do Sul. Há muita atividade e desenvolvimento em São Paulo", argumenta Stalnaker.
A metrópole brasileira, "onde dinheiro não é algo raro", se destaca por liderar em setores como marketing, consumo, mídia, tecnologia e, consequentemente, atrair o progresso. "Quem vai discordar que São Paulo é a terra da oportunidade atualmente?", argumenta a Hub Culture.
O diretor da entidade explica que o ranking leva em consideração a cena mundial, e procura identificar o ponto mais "quente" do globo. "São Paulo, Estocolmo e Sydney, as três primeiras colocadas, são um tipo de novo centro de pensamento, um tipo de novo mundo, com uma mentalidade mais progressista. Essas cidades representam ocasião e ação em 2011", acrescenta Stalnaker.
A fila anda
Estocolmo não é só a maior e mais importante cidade na Suécia. Mas tem sido também fonte de muitas novidades que provocaram mudanças recentes no cenário internacional, acreditam os membros do Hub Culture, que indicaram a capital sueca pela primeira vez.
"As razões que colocam Estocolmo como número dois não são, de fato, as mesmas que colocam São Paulo como número um", comenta Stalnaker. A cidade sueca tem uma forte consciência ambiental, norteia a discussão sobre direitos humanos, compartilhamento de informações – e abriga os servidores do site WikiLeaks.
E Berlim, que em 2010 ocupava o segundo lugar, em 2011 caiu para a quarta posição. Mas isso não quer dizer que a metrópole alemã não seja mais tão interessante, "mas há mais coisas acontecendo em outros lugares do mundo", avalia a Hub Culture.
A capital da Alemanha ainda continua na frente de Londres, Nova York, Los Angeles, Moscou, São Francisco – Paris sequer aparece na lista.
Fonte: http://www.dw-world.de/ - Empresa Oficial de Comunicação Alemã

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

“Envelhecer implica uma outra arte de viver”

Emanuella Sombra*
Sentado à beira da piscina, Gilberto Gil se despede aos poucos da casa onde mora quando está na Bahia. A partir do segundo semestre, a residência do Horto Florestal – das festas e das reuniões de petit-comité promovidas pela esposa Flora – deixará de ser o tranquilo e confortável refúgio em Salvador. A mudança para um apartamento amplo no Corredor da Vitória acompanha o caminho natural de toda e qualquer família. “A casa esvaziou, os meninos já estão grandes, se criaram. Em geral passavam férias aqui, e não mais”, sorri o patriarca, com a leveza e a simplicidade que lhe são característicos. Aos 68 anos, Gilberto Passos Gil Moreira quase nunca sai. Desde o Natal na capital baiana, onde fará show de lançamento do CD e do DVD Fé na Festa, dia 30, na Concha Acústica do TCA, tem uma rotina extremamente caseira. Nas poucas vezes em que põe os pés na rua, vai dirigindo o próprio carro até a Barra Avenida, onde vive a mãe. Se a rotina permite, acorda por volta das dez da manhã, lê os principais jornais do Brasil e do mundo, rende-se ao barulho dos netos pequenos, fala ao telefone. De sandália e bermuda, anuncia que fica aqui até o Carnaval. Foi-se embora a postura formal de ministro da Cultura, cargo exercido de 2003 a 2008, durante o governo Lula. Gil mudou o disco. Ícone da MPB, corresponsável pelo movimento tropicalista e dono de uma carreira antológica, o senhor elegante de cabelos brancos transforma o tempo como na música que empresta título à capa desta edição. Como premonição transformada em melodia em 1984, Tempo Rei nunca foi tão apropriada.
Quando o senhor saiu do MinC, sua mulher, Flora Gil, disse que a política lhe tirava o sono. Já consegue dormir?
Hoje em dia eu já durmo (risos). No tempo do ministério, eu acordava no máximo às sete da manhã e dormia tarde, havia viagens constantes, um tempo que, do ponto de vista físico, já era demasiadamente ocupado. E tinha a questão psíquica mesmo, da preocupação. Mesmo enquanto dormia, permanecia sempre a situação de sobressalto, a prontidão absoluta, a expectativa sobre o dia seguinte, se as coisas iam andar, o que a imprensa ia publicar. Era uma vigília permanente. Agora, não. Com exceção dos períodos de gravação, hoje em dia eu acordo às dez horas da manhã.
O que o senhor faz durante esse tempo?
Raramente saio. Eu leio jornal todo dia. Jornais de São Paulo, jornais daqui, do Rio, do mundo. Com a facilidade da internet, você pode ler El País, Le Monde, The New York Times… Leio tudo, não com a preocupação do acompanhamento da notícia, mas pelo sentido que eles têm, de cobrir o existencial. Tanto que eu leio mais os segundos cadernos, cadernos esportivos. Os primeiros cadernos também, mas não para me referir à notícia de ontem, relacionada à primeira notícia de amanhã.
Então o senhor deve estar acompanhando a crise por que passa hoje a Prefeitura de Salvador.
As administrações municipais são sempre muito cobradas. Elas que cuidam da limpeza pública, do transporte coletivo, da questão urbanística. A questão recente das barracas (de praia), que vários governos adiaram por ser uma decisão complicada, a prefeitura acabou resolvendo. De certa maneira, entra na conta positiva desse governo. Mas há também a diferença de tônus administrativo. Há governos que têm mais tônus, mais força e vibração. Outros são mais claudicantes, e isso vai muito da personalidade dos gestores, da qualidade técnica dos auxiliares, dos secretários. E, num certo sentido, vai cada vez mais do próprio modo de ser da população.
Como assim?
As populações estão cada vez mais responsáveis por uma série de problemas. No caso de Salvador, as encostas, o tratamento das invasões, o modo equivocado com que se trata a questão do lixo e o transporte, essa tentativa de substituição do transporte público pelo automóvel. É um ciclo vicioso, mas aí é que está. Não se pode somente responsabilizar a autoridade. É uma questão cultural, não é uma questão política só.
Mas há problemas que são exclusivamente administrativos, como, por exemplo, a incapacidade de concluir a primeira fase do
metrô.
Tenho impressão de que, se fosse possível uma inversão de cultura em relação a vários desses problemas, se transporte coletivo fosse uma coisa almejada, desejada pela população, ela adquiriria uma capacidade maior de pressão. E quando eu digo a população, eu digo setores que têm capacidade de pressão política. As classes médias – e não é um problema brasileiro, mas mundial – tendem a ser as que mais desprezam o sentido da responsabilidade pública, e por isso estimulam o desprezo, a negligência por parte do poder público. O sonho da classe média é ter o carro, não o metrô. É um sonho fáustico, ligado a uma ideia abstrata de bem-estar. É assim com o transporte e é assim com uma série de coisas, com o consumo, a alimentação…
Houve mudanças na postura da população, como a de eleger, sem que isso fosse uma bandeira, uma mulher presidente.
A eleição impõe respeito nesse sentido. Isso é uma coisa importante, valia tanto para Dilma como para Marina Silva. No caso de Dilma, existe a responsabilidade de prosseguir, deslocar um processo relativamente exitoso do Lula e interesses próprios dela, de afirmação. Existem questões de competência gerencial, de gosto pela tomada de decisão que, embora se alegue que não são conhecidas do grande público, de mim são conhecidas, eu, que convivi com a Dilma seis anos. Eu sei que ela é hábil e preparada.
Dizem que a política envelhece as pessoas. Como ex-ministro, o senhor sentiu este processo?
Eu não sei. As pessoas têm uma espécie de elemento de teste com os cabelos. “Ah, porque o exercício político embranquece os cabelos” (risos). Não sei se foi isso, os meus já estavam ficando brancos. Os governantes estão submetidos a situações aflitivas o tempo todo, a saias justas, potenciais de escândalos, de críticas, de rejeições e menosprezos. É um fator psicossomático muito grande esse peso de reflexos sobre o físico e o psíquico. Por outro lado, o homem público é talhado e vocacionado para isso, o sistema imunológico dele é mais forte. Eu não sou vocacionado, não sou político, não sou nem mesmo um gestor público como outros são. Eles, em geral, têm uma carreira política. Eu não tinha, não tenho e não terei (risos).
* Jornalista

**Foto: Fernando Vivas
Trechos da entrevista publicada na Revista MUITO -Janeiro 2011

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Londres limita trânsito de veículos poluidores

Uma das cidades pioneiras no mundo na cobrança do pedágio urbano, Londres, começa a restringir o trânsito de veículos poluidores em determinadas áreas da cidade.
A criação da Zona de Baixa Emissão de Poluentes ou Low Emission Zone (LEZ, na sigla em inglês) é um projeto que busca limitar o trânsito de veículos poluidores em algumas regiões de Londres, na Inglaterra. Para reforçar a iniciativa, a prefeitura irá aumentar as restrições a partir do próximo ano.
A intenção é tornar o ar da capital mais limpo e desencorajar o uso dos veículos que contribuem com a poluição, bem como melhorar a saúde e a qualidade de vida de todos que visitam, trabalham ou que vivem em Londres.
O programa começou limitando a circulação de caminhões de mais de 3,5 toneladas e ônibus movidos a diesel no centro da cidade. Em 2010, micro-ônibus e furgões de grande porte foram incluídos no programa.
Para entrar nas zonas, os veículos devem atender a determinados padrões de emissão, que limitam a quantidade de partículas provenientes de seus escapamentos. Segundo a prefeitura, essas substâncias contribuem com doenças do coração, asma e doença pulmonar, além de outros problemas respiratórios e até morte precoce.
Para se em enquadrar nas regras, os motoristas precisam registrar seus veículos na prefeitura e respeitar as sinalizações da LEZ. Câmeras vigiam as ruas 24 horas por dia e conferem as placas que circulam nas ruas com o cadastro oficial.
Aqueles que forem pegos de forma irregular devem pagar uma multa de £ 200,00 (cerca de R$ 540,00) por dia de circulação na zona.
Até os veículos de outras cidades devem se enquadrar nas regras e cadastrar seus automóveis na prefeitura para circular livremente pela capital britânica.
Mudanças em 2012
A partir do dia 3 de janeiro do próximo ano, a LEZ vai ficar ainda mais rigorosa. De acordo com os planos da prefeitura, mais veículos serão afetados pelas regras, e aqueles que já se enquadram na lei precisarão atender a critérios mais restritivos de emissões.
Na próxima etapa além dos caminhões, micro-ônibus e furgões, as caminhonetes, carros de passeio e vans também deverão adotar as regras.
As medidas fazem parte de um projeto que pretende transformar a capital britânica na cidade mais limpa do mundo até 2012 – ano em que serão realizadas as Olimpíadas na cidade.
Além da Zona de Baixa Emissão de Poluentes, a prefeitura também investe na instalação de ciclovias por toda a cidade. Uma pesquisa recente feita pelo Conselho de Transporte de Londres mostrou que os 40 km de ciclovias implantados em meados de 2010 já dobraram o número de viagens feitas de bike na capital.
O mesmo programa responsável pelas medidas acima também lançou um sistema público de aluguel de bicicletas. Inaugurado em julho de 2020, o programa já conta com mais de 11 mil registros para usar as cinco mil bicicletas disponíveis para a população.
* Texto publicado originalmente no portal EcoD

sábado, 5 de fevereiro de 2011

O Galícia, Ypiranga e Botafogo

Almir Ferreira Santos*
Três jóias do nosso tesouro esportivo tornam o Campeonato Baiano da Segunda Divisão um museu vivo do nosso futebol.
O Galícia, o Ypiranga e o Botafogo estarão juntos na competição planejada para começar em abril pela Federação Baiana de Futebol. Quando escrevo museu, não é em sentido pejorativo, como nos acostumamos a interpretar, como se a capacidade de armazenar informações e guardar objetos preciosos fosse um demérito. (Na foto, o Botafogo , 1955)
Vi muitos jogos do Botafogo e cheguei a cobrir o Botafogo quando repórter esportivo da Tribuna da Bahia, em 1988, na equipe que tinha Roque Mendes como editor, Luiz Britto e Jorge Allan Vivas, repórteres.
Tinha uma frase que circulava entre os jogadores e dizia bem o que era o futebol baiano:
Pra ganhar títulos, o Bahia. Pra ganhar dinheiro, o Vitória. Pra receber em dia, o Botafogo.
Pois até hoje o Botafogo é uma referência nacional em organização. Wilson Ferreira, prócer do clube, enviou-me uma correspondência, não muito tempo atrás, relatando em detalhes a contabilidade do clube, toda em dia.
Por isso, festejo neste post a volta ao futebol deste clube alvirrubro que fez os primeiros clássicos do futebol da Bahia contra o Ypiranga, ainda nos anos 1920.
Para quem não sabe, o Botafogo tem sete títulos de campeão e alguns de vice, quando vice era considerado título sim.
Só depois que o Vitória passou a dar estes desacertos em finais de campeonato é que o vice passou a ser pejorativo, mais ou menos como ocorreu com ‘museu’, lá do início do post.
Provavelmente, se o Vitória não tivesse dedicido nada e o Bahia tivesse só vices, a valorização do vice ia ser em alta.
Tenho um lápis, sim um lápis, do Botafogo e um caderno também que ganhei de algum botafoguense histórico.
Recebi agora há pouco um texto sobre o Botafogo, escrito em 1995, por Almir Santos, tio de meu querido amigo, Luciano, autor do preciso livro Barradão, emoções e vitórias.
Vamos ler o texto de Almir, escrito em 1995:
MEUS PRIMEIROS JOGOS
Lembro-me como se fosse hoje: meu pai, meu tio Lopes, Seu Arnaldo, Arnaldo de Dona Vitória, ao pé do rádio ouvindo as irradiações (transmissões) dos jogos de futebol.
A Rádio era a Sociedade da Bahia e o speaker (locutor), Ubaldo Câncio de Carvalho.
Ouvia nomes de times como Botafogo, Galícia, Vitória, Ipiranga, Bahia, Guarani, Flamengo, Fluminense, Vasco e jogadores, alguns com apelidos engraçados: Popó, Batatais, Cacuá, Zizinho, Incêndio, Palito, Heleno, Dois Lados, Vareta, Domingos da Guia, Cacetão, Leônidas, Bengalinha, Perácio, Manteiga, Siri e outros (deveria ser Ciri, pois era derivado de Ciridião).
Um dia meu pai resolveu me fazer uma surpresa: levou-me, juntamente com meu irmão Ayrton, para assistir uma partida de futebol no campo da Graça. Fiquei deslumbrado. Para mim o campo da Graça pareceu-me imenso.
As cores alvi-rubra e alvi-azul de Botafogo e Galícia e o verde do gramado, de impacto ,foram um espetáculo para os meus olhos.
A estrutura, toda em madeira, entretanto, balançava com a vibração dos torcedores, assustava-me. Suas acomodações dividiam-se em numeradas, arquibancadas A e B, sombra e geral.
Para evitar confusão, saímos poucos minutos antes do término da partida, que estava 1×1.
Era 15 de agosto de 1943. Tinha oito anos.
À frente do campo, ouvimos num rádio de um carro que estava estacionado, o gol de Da Hora, no último minuto, que deu a vitória ao Botafogo.
Daí a minha simpatia pelo Botafogo, que hoje, infelizmente, não chega nem a pleitear uma vaga na divisão de acesso.
O Botafogo jogou com Severino, Flávio e Rastelli; Manu, Abelardo e Dunga; Manoelito, Da Hora Didi, Inácio e Dino.
O Galícia com Nova, Carapicu e Lusitano; Neversínio, Palmer e Nouca; Louro, Curto, Palito, Novinha e Isaltino.
Vejo freqüentemente Novinha às tardes nos bancos do jardim da Praça da Piedade. Estive com Manoelito que era administrador da colônia de férias do SESC. Tive notícias de Nova, Palmer, Carapicu, Lusitano e Curto por Isaltino, que viria ser mais tarde meu colega de trabalho.
Grande figura. Gozador, contador de piadas, seresteiro e grande tomador de cerveja. Para isso, tem uma conta de poupança secreta para fugir do controle de sua mulher com gastos em bebida.
Sua carreira foi longa e vitoriosa. Aos 17 anos subiu para o time principal em lugar de Reginaldo, que tinha problema de contrato, quando foi tricampeão. Jogava de ponta esquerda e era possuidor de um fortíssimo chute. Logo foi para o Botafogo do Rio, onde teve uma rápida passagem. Retornou para o Bahia, onde encerrou sua carreira e deu muitas alegrias a sua torcida.
Entusiasmei-me com o futebol. O campo da Graça estava se tornando para mim cada vez mais familiar.
Outra surpresa meu pai me proporcionou: permitiu que fosse assistir a um jogo sozinho. Só, isto é, sem a sua companhia, mas com o meu irmão e o primo Hélio.
Senti-me muito importante. Compramos ingressos para a sombra.
Não me lembro bem quais as equipes que jogavam, mas um episódio marcou aquele primeiro jogo a sós. Ensaiava-se um sururu (porrada) entre torcedores perto de nós, quando um, mais exaltado, disse em tom ofensivo e pejorativo: -“torcedor do Bahia é chupador de b_ _ _ _ _”.
Aquilo me deixou confuso, pois não entendi o significado da agressão.
Chupar o que? Chupar por que?
Anos depois vim a entender tudo, não entendendo, entretanto, o porquê da ofensa e do pejorativo.
*Engenheiro, boêmio e escritor

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Salvador, a cidade que nós queremos

Paulo Ormindo Azevedo*
Vi recentemente no Centro Cultural Banco do Brasil, do Rio de Janeiro, um dos mais belos quadros do grande pintor mineiro Guignard. Mostrava Ouro Preto com seu casario chão recoberto pela neblina matutina, enquanto as torres bulbosas de suas igrejas emergiam das brumas com uma força e uma luz impressionante. Era uma exposição sobre o Barroco Mineiro e aquele quadro, de poucas décadas atrás, retratava melhor a cidade barroca que todas as imagens sacras e monumentos centenários expostos. Em Roma são as cúpulas, como em Istambul os minaretes e em Nova York os arranha-céus que dão identidade à urbe.
A identidade de Salvador vem de seus dois andares e do perfil de sua Montanha humanizada. Não é sem razão que os pintores holandeses e os viajantes e fotógrafos do século XIX retrataram tanto Salvador vista da baia. E que como uma cidade barroca Salvador tinha uma organização espacial única. Até 1972, as construções de nossa urbe não podiam exceder a cota da cornija da Catedral. Naquela época ainda se podia ver as torres das igrejas flutuando sobre o mar de telhados e àticos, como as cúpulas em Roma. A partir da lei 2403/72, a altura dos edifícios passou a ser regulado por coeficientes de utilização que privilegia os interesses da indústria imobiliária. É como se pudesse construir na área histórica de Paris ou Roma, como se constrói em sua periferia, por uma suposta isonomia imobiliária. Desde então, a cidade começou a perder sua imagem e característica de dois andares. Vista de Mont Serrat já quase não se distingue as duas cidades.
Uma conseqüência de seus dois andares são os mira-mares e torres mirantes, como os dos conventos da Lapa, Desterro e Soledade, para contemplação da baia. Tais mira-mares estavam geralmente ligados ao átrio de uma igreja, no bordo da Montanha. Preservam-se ainda os de Santo Antonio da Barra, Vitória, Aflitos, Santa Teresa, Santo Antonio Alem do Carmo e Lapinha. Bem ou mal esses belvederes se conservam e ao atravessarmos a Baia de Todos os Santos podemos ainda identifica-los pelas torres das igrejas que lhes dão nome. Outros se perderam, como a tricentenária igreja da Sé vendida por trinta moedas a uma empresa de bondes, que trinta anos mais tarde também viraria sucata. Um dos últimos mirantes privados desapareceu com a construção da Mansão dos Cardeais.
É especialmente por seu valor urbanístico e paisagístico que o tombamento da igreja da Vitória com seu átrio circundante se justifica. Não é demais lembrar que aquela igreja nasceu olhando a baia e só no final do século XIX teve sua fachada voltada para o interior. Sempre defendi mecanismos compensatórios às limitações impostas pelo tombamento em beneficio da sociedade. Infelizmente só em Salvador instrumentos urbanísticos modernos, como a transferência do direito de construir, Transcon, não se aplica aos tombamentos e à criação de praças e áreas verdes, como foi concebido no primeiro mundo.
São essas e outras questões que precisam ser discutidas tematicamente e sem atropelo, para a formulação do novo Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano. A preservação da qualidade de vida de Salvador deve ser a preocupação primeira do PDDU, de tal modo que no futuro não seja necessário a adoção de medidas excepcionais, por uma instancia superior de poder, para assegurar a preservação de valores urbanos que não são apenas locais.
Foi com esta visão que defendi no Conselho Consultivo do IPHAN a manutenção do tombamento provisório do Corredor da Vitória, já descaracterizado, até que se lograsse um compromisso formal da Prefeitura de Salvador de reduzir drasticamente os coeficientes urbanísticos daquela área e frear a destruição continuada da encosta com charriots e piers. Não podia, por outro lado, endossar uma proposta inócua e escapatória, que tombava apenas as árvores da rua e meia dúzia de jardins e edificações públicas, alguns dos quais já tombados, para não enfrentar a pressão do mercado. Isto seria premiar o statu quo forjado pelo mesmo mercado, uma situação antagonicamente diversa a do tombamento dos "jardins" paulistanos.
Como eu previa, tal compromisso, negociado após o arquivamento do processo, nunca foi honrado e os alvarás para construção de novos espigões continuam a ser expedidos. O que o clube dos privilegiados moradores locais não compreende é que a persistirem os coeficientes urbanísticos atuais, com edifícios de 34 andares e seis carros por apartamento, de pouco serve preservar oitiseiros e fachadas empalhadas, pois em pouco tempo o corredor polonês da Vitória entrará em colapso circulatório e ambiental urbano. Em Manhattan, com suas avenidas de seis pistas, já não se permite mais garagens na ilha.
São questões como essas, não só da Vitória, como do Litoral Ferroviário, do Miolo e da Orla Atlântica que precisam ser discutidas em foros temáticos qualificados e não apenas em redundantes assembléias suburbanas. Se o debate técnico do PDDU ainda não foi aberto, a sociedade pode força-lo. Por isto mesmo, atos tresloucados, como o dos herdeiros de Arnold Wildberger e seus sócios, de demolirem sua mansão às escondidas, constituem um tiro no pé e uma grosseria urbana que mancha a memória e a imagem de seus maiores, e destrói um naco da cidade que é de todos nós.
*Paulo Ormindo é arquiteto.

** Tela: Cidade vista do mar - Diógenes Rebouças
Artigo publicado em A TARDE, em 10/02/07