segunda-feira, 11 de maio de 2009

Caymmi e o trabalho

Oliveiros Guanais
Trabalhar é criar, destruir ou transformar alguma coisa, pela inteligência, pela inspiração, pelo conhecimento ou pela força. Acho que esta definição é razoável. É indecência justificar a exagerada riqueza de uns dizendo que trabalham muito, como se o operário em construção não trabalhasse nada. A riqueza nada tem a ver com trabalho, mas com esperteza. Também é parvoíce ou má-fé considerar preguiçoso um homem de gênio e talento, como Dorival Caymmi, que produziu uma das mais belas obras musicais e poéticas do Brasil, tendo por alvo e beneficiária, quase sempre, a Bahia, a Bahia em que viveu a mocidade e guardou no coração. Caymmi, em sua fase ativa, cantou as baianas, Itapoã, a Lagoa do Abaeté, os coqueiros, o mar e os pescadores, colocando esta terra como fonte permanente de beleza e inspiração. Caymmi não foi vencedor quantitativo de criação, mas, de qualidade, sim. Foi o expoente da obra-síntese, pouca mas perfeita. Que Caymmi virou o símbolo nacional do charme e do dengo, vá lá, porque, afinal, ele era um artista. Mas que era o símbolo da preguiça é transferir para ele o que os paulistas dizem de todos os baianos, e isso parece coisa de meninos que procuram eximir-se de culpas transferindo para outros os defeitos ou erros que lhes são atribuídos. (Argumento da delação). Caymmi compôs pouco porque não trabalhou por encomenda, nem para atender aos pedidos do momento, nem pensou em ganhar dinheiro fazendo música. Para ele, “a gente faz [apenas] o que o coração dita”. Caymmi há de ser lembrado sempre, enquanto houver memória e sensibilidade para apreciação da beleza.(E, de sobra, deixou também para os seus filhos o dom divino da música)

Um comentário:

  1. AINDA CAYMMI E O TRABALHO

    Como amante da música, vide o perfil, tinha de comentar a brilhante crônica de Oliveiros sobre o nosso Dorival Caymmi. Concordo com tudo que ele diz.

    De fato, Caymmi consegue transportar para a nossa mente pessoas e lugares. Quando canta “ASSIM ADORMECE ESTE HOMEM QUE NUNCA PRECISA DORMIR PRA SONHAR, PORQUE NÃO HÁ SONHO MAIS LINDO DO QUE SUA TERRA, NÃO HÁ...” a gente vê Itapuã, ainda sem asfalto, a lua, o mar... A gente se sente na areia, Até quando canta outras terras, como Sábado em Copacabana, Dora... a gente se coloca naqueles cenários.

    E as mulheres? Ah, as mulheres! Marina, Anália, Morena Rosa, Maria Amélia, (Eu Cheguei Lá), Adalgisa, A Preta do Acarajé, Mãe Menininha, Doralice, Francisca Santos das Flores, Tia Nastácia, Gabriela...

    A gente consegue vê-las, como consigo ver Dona Valdete, a vizinha da minha infância, quando ouço A VIZINHA DO LADO. Eu tinha uns 12 anos e ela uns 30, mas já era esperto. Até hoje a vejo quando ouço.

    Caymmi não merece, pois, as injustiças dos paulistas e cariocas.

    Parabéns, Oliveiros.

    Almir Santos

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