Introdução / Contextualização
As
entidades responsáveis pela elaboração do presente documento, ante as
circunstâncias adversas resultantes da falta de planejamento sistêmico, apoiaram
a decisão do governo estadual de realizar um PMI para a escolha modal de
transporte para a Avenida Luiz Viana Filho (Paralela), que resultou na
definição do Sistema Metroviário Salvador-Lauro de Freitas.
Embora
recorrentes, nas manifestações das entidades, as queixas quanto à falta de um
planejamento sistêmico e participativo continuam sendo pertinentes; pois os
governos continuam sem oferecer um processo de planejamento regional e muito
menos sustentado na participação social na definição das linhas mestras que se
desejam para o desenvolvimento, neste caso, da RMS e da BTS. E é neste vácuo de
planejamento que surge a necessidade de se improvisar com alternativas como
PMI, com prazos curtíssimos para a captação de recurso discussão e pactuação de
boas propostas.
Porém,
os prejuízos dessas políticas de improviso, para a cidade e seus habitantes,
não são passíveis de remediação por decreto. Portanto, para diminuir os
impactos negativos, faz-se necessário que a condução do processo daqui em
diante respeite e acolha as contribuições que estão sendo oferecidas pela
sociedade civil através da Consulta Pública para a formatação final da Parceria
Público-Privada – PPP.
Todos
sabem que a consulta pública numa fase tão avançada do processo, neste caso já
com o modal definido, não é a melhor maneira de se exercer o controle social do
processo, conforme estabelecido no Estatuto da Cidade. Manifestação neste
sentido foi feita por Conselheiro do CONCIDADES-BA, registrando a necessidade
do governo interagir com Conselho desde o início do processo e não somente na
fase de consulta pública; quando o tempo hábil para opinar e interferir mais
profundamente no processo é sempre mais restrito.
È
importante destacar o cenário atual, no qual observamos uma aparente fragilidade
no processo de gestão que deverá concluir com a implementação do sistema
metropolitano de transporte para a RMS, devemos ter clareza em relação ao papel
futuro que terá o metrô. O fato de termos dois processos de licitação
paralelos, um relacionado com as linhas de ônibus em Salvador e outro relativo
à construção e operação do metrô, condicionará fortemente a construção de rede
de transporte realmente integrada que a metrópole necessita, a simples
coordenação de ambos os processos, como se pretende, não garante a melhor
solução institucional.
Evidencia-se
ambiguidade no relativo à definição e composição da futura Entidade Gestora do
“Sistema Metroviário de Salvador e Lauro de Freitas – SMSL”, a qual deveria ter
abrangência metropolitana e não limitar-se apenas a dois municípios. A
experiência revela um conjunto de conflitos e desavenças entre os operadores de
ônibus municipais e intermunicipais na RMS, razão que fundamenta amplamente uma
gestão integrada, conciliadora e com visão de planejamento metropolitano.
No modelo
institucional, uma definição clara da Entidade Gestora possibilitará: a)
garantir a defesa do interesse público e dos usuários; b) estabelecer e gerir
eficazmente todos os parâmetros que possibilitam a integração modal; c) promover
a integração do sistema metroviário com as atividades urbanas, viabilizando as
demandas futuras. Entretanto, observamos que o município de Salvador planeja
criar um consórcio operacional para coordenar a operação integrada do sistema
de transporte coletivo por ônibus (apenas em Salvador), o modelo institucional
não contempla esta possibilidade, nem como será a integração institucional com
o metrô, neste cenário. A simples agregação de um grande número de instancias
de gestão, como num grande conselho, comprometerá a integração,
fundamentalmente técnica.
Identificamos
falta de clareza necessária por parte do Estado e municípios quanto à
necessidade de uma entidade gestora, da mobilidade urbana, com visão
metropolitana, assim como, na própria concepção da Rede de Transporte
Metropolitana. Por exemplo, no anexo VIII, no item Serviços correlatos, observamos, “São
todos os demais serviços de transporte urbano ou metropolitano, fora do
controle da Entidade Gestora do Sistema Metroviário, mas que afetam o sistema
metroviário apenas de forma indireta ou quantitativamente irrelevante. Sistema
ferroviário suburbano; Ferry boat e
balsas; Ascensores”.
Considerar
irrelevantes o Sistema ferroviário suburbano, o Ferry boat e os Ascensores é simplesmente não considerar uma grande
parcela da nossa cidade, esquecida e excluída permanentemente de qualquer
política de transporte público. Uma das regiões mais densas e pobres da cidade,
que necessita de alguma solução de mobilidade urbana. Não existe qualquer
proposta de integração do trem de subúrbio com o metrô, além da linha 1 não
atingir o centro histórico. Temos um sistema financiado com recursos públicos e
projeções até 2040 e não temos qualquer proposta de integração física deste
sistema com a região do Subúrbio Ferroviário?
Entendemos
que na conjuntura atual, estas questões entre Prefeitura Municipal e Governo do
Estado, não são de fácil negociação o que dificulta o processo de
integração.
O item 3.2 do
anexo VIII, Serviços
vinculados (escopo indireto da PPP), também necessita de maiores
esclarecimentos: “São os serviços que, embora não sejam escopo direto da
PPP, afetam sua receita, devendo estar sob competência direta da Entidade
Gestora, e acompanhados pela Concessionária do Metrô para eventual regulação
operacional ou econômica. As linhas alimentadoras serão estabelecidas
explicitamente, com gestão vinculada ao Sistema Metroviário. Possuirão
remuneração própria, podendo ser objeto de licitações municipais
específicas. Estas linhas configuram serviço distinto das demais linhas
convencionais urbanas integradas, operadas em âmbito municipal, sob gestão dos
municípios de Salvador ou Lauro de Freitas”. Parece que serão linhas
alimentadoras, vinculadas ao metrô, que originarão novas licitações, por fora
do Consorcio Operacional Municipal, em andamento, se configuram um serviço
distinto quais serão os seus parâmetros operacionais? Como se dará a
integração?
2. Aspectos operacionais
Consideramos que o item 2.4 do anexo 8, “Características operacionais
consideradas” (características operacionais das linhas do metrô) deve ser
estendido e especificado também para todas as linhas alimentadoras do metrô, ou
seja, deve ser estudado e divulgado o nível de serviço que será ofertado por
estas linhas, para a população.
Por exemplo, o item 14.7 do anexo V, especifica “A Concessionária deverá
operar o Ramal Aeroporto, com a utilização de ônibus especiais, climatizados,
ambas sem tarifação adicional. A linha deverá fazer a ligação do Aeroporto
Internacional de Salvador à Estação Aeroporto, sem paradas. O tempo de
espera máximo de 10 minutos, no horário do Pico do sistema metroviário”.
Portanto, consideramos pertinente também definir claramente quais serão os
tempos de espera máximos, frequências, velocidades medias, conforto e
segurança, de todas as outras linhas alimentadoras do sistema metrô, na cidade,
assim como as demandas potenciais que serão atendidas, por cada bacia
operacional.
Consideramos também necessária a extensão dos
“Indicadores de Desempenho” para toda a Rede na sua totalidade (ver item 14.8 do anexo V),
não apenas para a rede metroviária. Deve ser estudado um sistema de avaliação do
desempenho integrado, tanto para as linhas alimentadoras (rodoviárias) como
para as linhas de metrô, avaliando a qualidade do serviço no trajeto como um
todo, o qual se ajusta mais a experiência da mobilidade. Os deslocamentos
cicloviários e a pé, também poderão ser incorporados neste sistema, posteriormente.
Inserção urbana
Um problema fundamental para
viabilizar a demanda do metrô, objetivando a sua sustentabilidade econômica é
criar as condições espaciais para que este modo de transporte sustentável
estruture realmente a cidade.
Observamos a carência de um anexo ou apêndice que fale do
metrô em escala urbana, detalhando com cartografia adequada as atividades
urbanas atuais e futuras, assim como, os índices urbanísticos e densidades, que
serão promovidos, no eixo. Estas informações são fundamentais, não somente para
a empresa, mais também para a gestão urbana, como um todo, ou seja, para a
Entidade Gestora. Necessitamos urgentemente estudos e ações de planejamento
integrado de transporte e uso do solo, na cidade e na RMS, visando mitigar as
viagens feitas atualmente por modos de transporte insustentáveis tais como, o
automóvel e a motocicleta, criando demandas para o metrô.
No edital metrô, a inserção urbana
das Estações não está claramente especificada nos documentos, apêndices e
anexos, sendo este aspecto tratado como um tema arquitetônico, sendo
entretanto, um tema fundamentalmente urbanístico. Deve ser definido claramente
um raio de influencia entre 500 e 800 metros , a roda das estações, portanto na
escala do pedestre, no qual mediante uma rede capilar de vias, passeios,
passarelas, etc., sejam criadas condições favoráveis para os deslocamentos dos
pedestres e ciclistas, na procura do metrô, seguindo os trajetos mais lógicos,
ou seja, condições de microacessibilidade favoráveis. Verificamos que as
propostas são muito simplistas neste aspecto, devendo-se realizar estudos
específicos, considerando principalmente a topografia difícil da nossa cidade.
As estações devem estar integradas com o tecido urbano, portanto, deve se ter
uma planta ou mapa, baseado no cadastro da cidade, que especifique claramente
como serão esses percursos.
Por exemplo, quando se analisa a Estação da lapa, no documento técnico L2
Justificativa Terminais, no item Acessibilidade Lindeira (Pedestres e
Ciclistas), podemos ler “Não foi identificada nenhuma necessidade de
complemento à atual infraestrutura para os pedestres, sendo porem necessária
uma completa revisão e manutenção das escadas rolantes existentes. Para o caso
dos ciclistas, deve-se enfatizar a previsão de um posto para estacionamento e
guarda de bicicletas conjugado a esta estação, como já prevê o Plano Cidade
Bicicleta da CONDER”. Esta argumentação se repete na avaliação da maioria das
estações em ambas as linhas.
O conceito acessibilidade lindeira
é por demais ambíguo e parece que não foi estudado qualquer fator atrelado à
microacessibilidade em áreas urbanas. Será que foi realmente avaliado o estado
de conservação, superfície, largura, segurança, declividade, etc., dos passeios
e escadarias que dão acesso ao maior terminal da cidade? Em que condições
chegarão os pedestres para pegar o metrô na lapa? Isto irá favorecer a demanda?
O problema é grave e existem dissertações e artigos científicos que avaliam a
problemática desta estação, entretanto, segundo o edital parece que não foi
identificada nenhuma necessidade de complemento à atual infraestrutura para os
pedestres.
A preocupação
da integração dos ciclistas com o sistema é mínima, sendo tudo relegado ao
projeto Cidade bicicleta. Entretanto é importante destacar que Cidade bicicleta
propõe apenas uma rede estrutural, principalmente nas avenidas de
vale
da cidade, fora de escala em relação ao projeto da estação, se necessita,
portanto, um maior detalhamento, um posto para estacionamento e guarda de
bicicletas conjugado a esta estação, não basta, devem ser especificados
projetos de ciclofaixas e de sinalização adequada, na área de influencia,
preservando o ciclista, com medidas de segurança para o transito. Em que
condições chegaram os ciclistas para pegar o metrô na lapa? ... e nas outras estações? As recomendações
do plano denominado interpenetração modal, está sendo incorporada no edital
permitindo o transporte de bicicletas em áreas específicas dos vagões?
O
dimensionamento das estações não pode ser observado apenas como um problema
arquitetônico, mais também como um problema da engenharia dos transportes,
sendo uma área de pesquisa consolidada nesta engenharia. Este dimensionamento
corresponde principalmente a estudos de demanda: a) de fluxos de pedestres na hora
pico, considerando inclusive situações de emergência, b) de demanda por vagas
de estacionamento, visando à integração “park
and ride”, e c) de demanda por vagas de estacionamento para ciclistas
(numero de paraciclos), visando a integração “bike and ride”. As passarelas de
conexão com as estações nas avenidas de vale devem ser dimensionadas, tanto em
numero, como em termos de capacidade. Sugerimos, portanto, que os documentos
técnicos, elementos do projeto básico_ARQ, o apêndice 8 e o documento técnico L2 Justificativa Terminais,
sejam revisados.
O edital contém especificações importantes para a realização dos
estudos e projetos de engenharia civil, eletromecânica, etc. e de arquitetura,
porem, necessita uma maior especificação no relativo aos estudos de
planejamento urbano e engenharia dos transportes, como área do conhecimento,
que deveriam ser realizados, o qual destaquei nas minhas observações.
O tratamento oportuno das questões urbanísticas será fundamental
para viabilizar a demanda do metrô, objetivando a sua sustentabilidade
econômica e com ela a sua ampliação e crescimento. Portanto devemos observar
para que sejam criadas as condições espaciais (atividades, intensidades de uso,
densidades, conexões, etc.) para que este modo de transporte sustentável
estruture realmente a cidade. A entidade gestora deverá atingir dois objetivos
estratégicos para a consolidação deste modo de transporte, no tempo: a) criar
demandas para o metrô, e b) captar as mais-valias produzidas pela intervenção
pública, ou seja, pelos ganhos de tempo e valorização imobiliária. Não
pensarmos isto, seria irresponsável, pois deixaríamos uma ampla margem de
manobra para o capital incorporador.
Estes
estudos, a serem realizados, devem ser especificados mediante um anexo que fale
do metrô em escala urbana, detalhando com cartografia adequada, a área de
influência imediata das linhas e estações, definindo programa de poligonal de
áreas necessárias para o funcionamento de atividades complementares procurando
detalhar: as atividades urbanas, ou seja, o uso do solo atual; o uso do solo
futuro; os índices urbanísticos atuais e propostos; as densidades
propostas no eixo; como estas serão promovidas; a capacidade das redes técnicas
e os impactos. Tendo como referencia o PDDU atual, deve-se detalhar a proposta
urbanística para este eixo, num processo transparente que explore o potencial
urbano, verdadeiras âncoras, especialmente nas estações de integração.
Logo após termos uma visão clara do desenvolvimento urbano nestes
eixos, a área de influência imediata das linhas e estações do metrô, poderá vir
a se constituir em corredores especializados, nos quais, será possível aplicar
eficazmente os instrumentos do estatuto da cidade, visando densificar e
diversificar as atividades urbanas onde seja conveniente, para a cidade.
Isto fornecerá a equidade espacial que a nossa cidade necessita e deve ser
estudado, com transparência. Os instrumentos do estatuto da cidade, também
foram pensados para promover a mobilidade sustentável, sendo política nacional
da SEMOB – MC e estão embasados na atual Lei da mobilidade. Os instrumentos
(IPTU progressivo, direito de preempção, outorga onerosa, etc.) e a delimitação
espacial da sua aplicação deverão ser regulamentados, pelos municípios. Por
tudo isso é importante à integração estado – município.
O Brasil implantou nesta década os principais marcos regulatórios
da política urbana e regiões metropolitanas, Lei 10.251/2001 - Estatuto da
Cidade com seus planos diretores municipais, Lei 11.445/2007 - do Saneamento
Básico com seus planos municipais, e Lei 12.587/2010 - Plano de Mobilidade
Urbana com seus planos municipais, todos com prazos para ser implantados nos
municípios. Os Planos Municipais de Mobilidade e Transporte com prazo até abril
2015. Estes inclusive vinculam explicitamente a liberação de recursos públicos
e as contratações de concessões, com base nas definições destes planos. Considerando que, no mais tardar daqui a 2,5
anos, todos os municípios da RMS e BTS terão seus Planos Municipais de
Mobilidade e Transporte, e a RMS seu Plano de Mobilidade Regional instituídos,
os quais definirão a grande maioria dos elementos questionados pela sociedade e
pelas entidades aqui representadas, ressaltamos que, uma
concessão contratada na “véspera” da institucionalização destes marcos
regulatórios, seria uma garantia de conflitos contratuais, institucionais,
econômico-financeiros e operacionais. Para evitar que ocorra tais conflitos é
essencial exigir das partes da PPP e região que:
- Todos os municípios e a RMS como
região integrada, tenham garantido nos seus respectivos orçamento de 2013
os recursos de elaboração dos seus Planos Diretores de Mobilidade e
Transporte – PDMT, inclusive os do governo do Estado;
- Todos os municípios e a RMS
tenham um termo de referencia e cronograma sincronizado da elaboração
destes planos PDMT;
- Todos os municípios junto com o
governo do estado criem imediatamente uma entidade coordenadora deste
processo de geração e institucionalização concentrada dos planos PDMT;
- Nos PDMT de Salvador, Lauro de
Freitas e da RMS sejam tratados os trechos objetos desta concessão, numa
forma que os mesmos se integrem aos sistemas municipais e regionais dos
PDMT e que a concessionária tenha seus contratos adaptados aos novos
marcos normativos institucionalizados até 2015.
- As partes dos convênios, base
desta PPP, se comprometam alterar os mesmos na forma de se integrar
perfeitamente aos conceitos e normas dos PDMT municipais e regionais.
Por conseguinte, estas informações e instrumentos
técnico-normativos, serão fundamentais, não somente para a empresa
concessionária, mais também para a gestão urbana, como um todo, ou seja, para a
Entidade Gestora. Necessitamos urgentemente estudos e ações de planejamento
integrado de transporte e uso do solo, na cidade e na RMS, visando mitigar as
viagens feitas atualmente por modos de transporte insustentáveis tais como, o
automóvel e a motocicleta, criando demandas para o metrô. Se a sociedade não
defender os objetivos estratégicos para a cidade (não para as empresas), ou
seja, criação de demandas para o metrô e apropriação de mais-valias, o metrô
não se consolidará e teremos apenas um magnífico projeto de construção civil.
Salvador, 17 de setembro de 2012
Conselho Regional de
Engenharia e Agronomia – CREA-BA
Conselho de Arquitetura e
Urbanismo – CAU-BA
Associação Brasileira de Engenheiros
Civis – Departamento da Bahia - ABENC/BA
Associação dos Engenheiros
Agrimensores do Estado da Bahia - ASEAB
Clube
de Engenharia da Bahia – CEB
Instituto
de Arquitetos do Brasil, Departamento da Bahia - IAB-BA
Sindicato
de Arquitetos e Urbanistas da Bahia - SINARQ
Sindicato
dos Engenheiros da Bahia - SENGE
Associação
Baiana de Engenharia de Segurança - ABESE
Instituto Brasileiro de Avaliações e
Perícias de Engenharia da Bahia - IBAPE/BA
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