Maria Stella de Azevedo Santos*
No Dia da Libertação dos Escravos, 13 de maio, a comunidade negra comemora de diferentes formas: uns protestam dizendo que este dia foi um engodo e que os negros ainda são escravos sociais; outros há que comemoram os ganhos obtidos através da conhecida resistência sem perderem a consciência que muito ainda precisa ser feito. Observando a fala dos que vêm até o Terreiro, percebo que todos pensam na liberdade e a desejam. Fico a perguntar-me: de que liberdade eles estão falando? E, preocupada, os alerto que muitas vezes o que desejamos como liberdade é exatamente aquilo que nos escravizará. E me ponho a refletir: a liberdade tão sonhada existe mesmo?
O candomblé tem em sua filosofia símbolos cujos significados são bastante expressivos. Um destes símbolos é o fio de contas que todo iniciado usa para estabelecer um contato com o divino, informando-Lhe seu grau espiritual e a consequente responsabilidade que suporta exercer. Exemplificando, para que fique melhor entendido, explico: um recém-iniciado usa um fio composto por contas muito fininhas; já uma pessoa com muitos anos de iniciação tem o direito e o dever de usar contas grossas, indicando o nível de responsabilidade que suporta assumir. Além do referido significado, cada fio de contas nos representa enquanto elos de uma grande corrente – outro símbolo de nossa religião que mostra o quanto estamos vinculados uns aos outros. Sendo assim, pergunta-se: podemos ou não ser livres?
Muita gente fala: “Quero ganhar mais dinheiro para poder ser independente e ter minha liberdade”. Porém, o mesmo dinheiro que favorece a independência pode ser aquele que escraviza. Além do mais, o conceito de independência varia de época para época. Há tempos atrás, todo jovem queria ter condição de morar sozinho, acreditando que com isso poderia fazer tudo que quisesse, principalmente no que dizia respeito à sexualidade. Hoje a situação mudou. Os jovens, e nem tão jovens assim, preferem ficar morando com os pais para poderem ter facilidade de estudar mais, ou até por simples comodismo, aproveitando a educação sexual e a abertura, em todos os níveis, dadas pelos adultos a seus filhos.
É bom lembrar que independência só é sinônimo de liberdade no dicionário. Podemos e devemos nos tornar independentes de nossos pais, mas estaremos sempre vinculados a eles. Aliás, estamos todos vinculados uns aos outros, mesmo os que não se dão conta desta condição. Com a globalização do mundo esta situação ficou visível, pois uma tragédia que acontece no Japão, localizado no outro lado do mundo, atinge emocionalmente a todos. Energeticamente este vínculo sempre esteve presente na humanidade. Queiramos ou não somos todos irmãos, nascidos de uma única Essência.
Pode até parecer que estou afirmando que a liberdade não existe. Em primeiro lugar, ninguém deve afirmar nada para o outro, pois cada um tem sua verdade. Em segundo, penso que se todos creem em uma mesma coisa, com certeza é porque ela deve existir. Sendo assim, liberdade?… Liberdade! Contanto que ela venha acompanhada de responsabilidade, ética moral, hábitos saudáveis e ações equilibradas. Afinal, liberdade não pode ser confundida com libertinagem, que leva a sociedade a um estado de desarmonia.
Mas, então, o que é a tão chamada e desejada liberdade? Nada preciso dizer, pois a sabedoria de Aurélio Buarque de Holanda fez o favor de dizer por mim. Liberdade é: “Faculdade de cada um se decidir ou agir segundo a própria determinação”; “Poder de agir, no seio de uma sociedade organizada, segundo a própria determinação, dentro dos limites impostos por normas definidas”; “Caráter ou condição de um ser que não está impedido de expressar, ou que efetivamente expressa, algum aspecto de sua essência ou natureza”. Livre, então, é aquele que age de acordo com sua natureza divina, respeitando seus próprios limites e os de seus irmãos, de modo que a corrente sagrada que une o Òrun (Céu) ao Àiyé (Terra) não perca nenhum de seus elos, pois só assim a comunicação entre o humano e o divino não será perdida.
*Maria Stella de Azevedo Santos é Iyalorixá do Ilê Axé Opô Afonjá
No Dia da Libertação dos Escravos, 13 de maio, a comunidade negra comemora de diferentes formas: uns protestam dizendo que este dia foi um engodo e que os negros ainda são escravos sociais; outros há que comemoram os ganhos obtidos através da conhecida resistência sem perderem a consciência que muito ainda precisa ser feito. Observando a fala dos que vêm até o Terreiro, percebo que todos pensam na liberdade e a desejam. Fico a perguntar-me: de que liberdade eles estão falando? E, preocupada, os alerto que muitas vezes o que desejamos como liberdade é exatamente aquilo que nos escravizará. E me ponho a refletir: a liberdade tão sonhada existe mesmo?
O candomblé tem em sua filosofia símbolos cujos significados são bastante expressivos. Um destes símbolos é o fio de contas que todo iniciado usa para estabelecer um contato com o divino, informando-Lhe seu grau espiritual e a consequente responsabilidade que suporta exercer. Exemplificando, para que fique melhor entendido, explico: um recém-iniciado usa um fio composto por contas muito fininhas; já uma pessoa com muitos anos de iniciação tem o direito e o dever de usar contas grossas, indicando o nível de responsabilidade que suporta assumir. Além do referido significado, cada fio de contas nos representa enquanto elos de uma grande corrente – outro símbolo de nossa religião que mostra o quanto estamos vinculados uns aos outros. Sendo assim, pergunta-se: podemos ou não ser livres?
Muita gente fala: “Quero ganhar mais dinheiro para poder ser independente e ter minha liberdade”. Porém, o mesmo dinheiro que favorece a independência pode ser aquele que escraviza. Além do mais, o conceito de independência varia de época para época. Há tempos atrás, todo jovem queria ter condição de morar sozinho, acreditando que com isso poderia fazer tudo que quisesse, principalmente no que dizia respeito à sexualidade. Hoje a situação mudou. Os jovens, e nem tão jovens assim, preferem ficar morando com os pais para poderem ter facilidade de estudar mais, ou até por simples comodismo, aproveitando a educação sexual e a abertura, em todos os níveis, dadas pelos adultos a seus filhos.
É bom lembrar que independência só é sinônimo de liberdade no dicionário. Podemos e devemos nos tornar independentes de nossos pais, mas estaremos sempre vinculados a eles. Aliás, estamos todos vinculados uns aos outros, mesmo os que não se dão conta desta condição. Com a globalização do mundo esta situação ficou visível, pois uma tragédia que acontece no Japão, localizado no outro lado do mundo, atinge emocionalmente a todos. Energeticamente este vínculo sempre esteve presente na humanidade. Queiramos ou não somos todos irmãos, nascidos de uma única Essência.
Pode até parecer que estou afirmando que a liberdade não existe. Em primeiro lugar, ninguém deve afirmar nada para o outro, pois cada um tem sua verdade. Em segundo, penso que se todos creem em uma mesma coisa, com certeza é porque ela deve existir. Sendo assim, liberdade?… Liberdade! Contanto que ela venha acompanhada de responsabilidade, ética moral, hábitos saudáveis e ações equilibradas. Afinal, liberdade não pode ser confundida com libertinagem, que leva a sociedade a um estado de desarmonia.
Mas, então, o que é a tão chamada e desejada liberdade? Nada preciso dizer, pois a sabedoria de Aurélio Buarque de Holanda fez o favor de dizer por mim. Liberdade é: “Faculdade de cada um se decidir ou agir segundo a própria determinação”; “Poder de agir, no seio de uma sociedade organizada, segundo a própria determinação, dentro dos limites impostos por normas definidas”; “Caráter ou condição de um ser que não está impedido de expressar, ou que efetivamente expressa, algum aspecto de sua essência ou natureza”. Livre, então, é aquele que age de acordo com sua natureza divina, respeitando seus próprios limites e os de seus irmãos, de modo que a corrente sagrada que une o Òrun (Céu) ao Àiyé (Terra) não perca nenhum de seus elos, pois só assim a comunicação entre o humano e o divino não será perdida.
*Maria Stella de Azevedo Santos é Iyalorixá do Ilê Axé Opô Afonjá
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