Paulo Ormindo de Azevedo*
Segundo o discurso oficial, a realização da Copa em Salvador trará visibilidade à cidade, atrairá investidores e deixará como legado melhorias urbanas. Mas a motivação real está ligada a uma corrida pela liderança continental. A Copa é hoje disputada por países emergentes: África do Sul, Brasil e Rússia.
Custo – No Programa Conversa com a Presidenta, do último dia 15/03/11, e reproduzido no site da Copa de 2014, Dilma afirmou que o evento custará R$33 bilhões, dos quais o setor público bancará 68%. O custo/benefício do evento é deficitário. A União Europeia e a FIFA desaconselharam a Europa a arcar com tais custos para não agravar sua crise. Para garantir a Copa, a Rússia se comprometeu a investir 4,46 bilhões de euros, ou cerca de R$ 10,50 bilhões na construção de 13 estádios para 2018, a terça parte do investimento brasileiro. No caso baiano, depois da ampliação do Pituaçu um terceiro estádio para uma cidade que só tem dois grandes clubes é uma desnecessária extravagância.
Quem são os beneficiados? Basicamente a FIFA, que detém os direitos de transmissão, captação de patrocínios e credenciamento de agências de viagem, e as construtoras. Notícias de jornais dão conta que a FIFA tem em caixa 800 milhões de euros. Mas não faz nada pelo futebol amador e educação esportiva. Seus diretores são príncipes viajando em aviões fretados e se hospedando e banqueteando em resorts de luxo.
O espetáculo. A FIFA quer transformar o futebol em um esporte de elite, à semelhança do tênis e do golfe. As chamadas “arenas” devem ser exclusivas desse esporte e terem um número limitado de lugares, 45 mil em media. Devem ter salões e estacionamentos VIPs, camarotes de ópera, restaurantes de luxo, museus, elevadores e escadas rolantes. Dizer que a arena terá outros usos é uma farsa. Sem pista de atletismo, por onde entrem caminhões e gruas para armar palcos e recobrir o gramado, isto é impossível. Os ingressos serão equivalentes aos europeus e mesmo assim essas arenas dependerão de enormes subsídios governamentais. Esta não é a tradição brasileira de jogar o popular futebol.
Evento efêmero. Ao contrario de Exposições Universais, Anos Santos ou Capital Cultural da Europa, que duram um ano, a Copa se restringe a dois ou três jogos em cada cidade-sede. Segundo a Presidenta, a Copa atrairá 600 mil turistas internacionais. Este número equivale ao carnaval baiano e a um terço do carioca. A necessidade de ampliação de aeroportos e do parque hoteleiro é uma pressão das construtoras para obter a toque de caixa contratos sem licitação. Em Salvador e outras sedes estaduais, o máximo de turistas será de 35 mil, considerando a capacidade do estádio e a presença dos locais.
A dupla face. A Copa é uma grande vitrine e por mais dourada que seja, o que vale é o que será exposto. Neste sentido, contam não apenas arenas luxuosas, mas o que se vê nas ruas, nos morros e encostas. Não há como dissimular os terríveis contrastes sociais que perduram neste país emergente. O turista fica fascinado com o desfile das escolas de samba, com o trio elétrico, mas volta falando da insegurança, da prostituição e da mendicância nas ruas.
A Copa como pretexto. Mas o Brasil assumiu este compromisso e cabe aos soteropolitanos lutar por melhorias do lado de fora da arena circense da FIFA. Infelizmente este processo não tem sido compartido com a sociedade, nem é parte de um planejamento integrado. Perigamos assim herdar mais endividamentos que legados, como é o caso da Nova Fonte Nova. Além de trocarmos uma vila olímpica por uma arena mono esportiva, o contribuinte baiano pagará R$107 milhões anuais durante 15 anos ao Consórcio, que recebe financiamento do estado e uma gleba de 12 Ha. para construir escritórios, apartamentos e um shopping center. A troca do metro pelo BRT, inicialmente ligando o aeroporto à rótula do Abacaxi, além de incompatível com a topografia e traçado da cidade tradicional e incapaz de atender à expansão metropolitana, adia sine die a possibilidade de termos um verdadeiro sistema de transporte de massa. Os demais projetos anunciados, as avenidas Atlântica e Linha Viva, cavalo de Troia imobiliário, se executados terão um enorme impacto ambiental. Neste quadro, só nos resta lutarmos pela criação de um sistema de planejamento participativo, técnico e continuado capaz de nos assegurar uma cidade menos vertical, congestionada, segregadora, alagadiça e asfáltica. Queremos, para além da Copa, um futuro para Salvador.
*Paulo Ormindo David de Azevedo
Arquiteto e Professor Titular da Faculdade de Arquitetura da UFBA. É diretor do CREA, do IAB - Bahia e membro do Conselho Estadual de Cultura
Segundo o discurso oficial, a realização da Copa em Salvador trará visibilidade à cidade, atrairá investidores e deixará como legado melhorias urbanas. Mas a motivação real está ligada a uma corrida pela liderança continental. A Copa é hoje disputada por países emergentes: África do Sul, Brasil e Rússia.
Custo – No Programa Conversa com a Presidenta, do último dia 15/03/11, e reproduzido no site da Copa de 2014, Dilma afirmou que o evento custará R$33 bilhões, dos quais o setor público bancará 68%. O custo/benefício do evento é deficitário. A União Europeia e a FIFA desaconselharam a Europa a arcar com tais custos para não agravar sua crise. Para garantir a Copa, a Rússia se comprometeu a investir 4,46 bilhões de euros, ou cerca de R$ 10,50 bilhões na construção de 13 estádios para 2018, a terça parte do investimento brasileiro. No caso baiano, depois da ampliação do Pituaçu um terceiro estádio para uma cidade que só tem dois grandes clubes é uma desnecessária extravagância.
Quem são os beneficiados? Basicamente a FIFA, que detém os direitos de transmissão, captação de patrocínios e credenciamento de agências de viagem, e as construtoras. Notícias de jornais dão conta que a FIFA tem em caixa 800 milhões de euros. Mas não faz nada pelo futebol amador e educação esportiva. Seus diretores são príncipes viajando em aviões fretados e se hospedando e banqueteando em resorts de luxo.
O espetáculo. A FIFA quer transformar o futebol em um esporte de elite, à semelhança do tênis e do golfe. As chamadas “arenas” devem ser exclusivas desse esporte e terem um número limitado de lugares, 45 mil em media. Devem ter salões e estacionamentos VIPs, camarotes de ópera, restaurantes de luxo, museus, elevadores e escadas rolantes. Dizer que a arena terá outros usos é uma farsa. Sem pista de atletismo, por onde entrem caminhões e gruas para armar palcos e recobrir o gramado, isto é impossível. Os ingressos serão equivalentes aos europeus e mesmo assim essas arenas dependerão de enormes subsídios governamentais. Esta não é a tradição brasileira de jogar o popular futebol.
Evento efêmero. Ao contrario de Exposições Universais, Anos Santos ou Capital Cultural da Europa, que duram um ano, a Copa se restringe a dois ou três jogos em cada cidade-sede. Segundo a Presidenta, a Copa atrairá 600 mil turistas internacionais. Este número equivale ao carnaval baiano e a um terço do carioca. A necessidade de ampliação de aeroportos e do parque hoteleiro é uma pressão das construtoras para obter a toque de caixa contratos sem licitação. Em Salvador e outras sedes estaduais, o máximo de turistas será de 35 mil, considerando a capacidade do estádio e a presença dos locais.
A dupla face. A Copa é uma grande vitrine e por mais dourada que seja, o que vale é o que será exposto. Neste sentido, contam não apenas arenas luxuosas, mas o que se vê nas ruas, nos morros e encostas. Não há como dissimular os terríveis contrastes sociais que perduram neste país emergente. O turista fica fascinado com o desfile das escolas de samba, com o trio elétrico, mas volta falando da insegurança, da prostituição e da mendicância nas ruas.
A Copa como pretexto. Mas o Brasil assumiu este compromisso e cabe aos soteropolitanos lutar por melhorias do lado de fora da arena circense da FIFA. Infelizmente este processo não tem sido compartido com a sociedade, nem é parte de um planejamento integrado. Perigamos assim herdar mais endividamentos que legados, como é o caso da Nova Fonte Nova. Além de trocarmos uma vila olímpica por uma arena mono esportiva, o contribuinte baiano pagará R$107 milhões anuais durante 15 anos ao Consórcio, que recebe financiamento do estado e uma gleba de 12 Ha. para construir escritórios, apartamentos e um shopping center. A troca do metro pelo BRT, inicialmente ligando o aeroporto à rótula do Abacaxi, além de incompatível com a topografia e traçado da cidade tradicional e incapaz de atender à expansão metropolitana, adia sine die a possibilidade de termos um verdadeiro sistema de transporte de massa. Os demais projetos anunciados, as avenidas Atlântica e Linha Viva, cavalo de Troia imobiliário, se executados terão um enorme impacto ambiental. Neste quadro, só nos resta lutarmos pela criação de um sistema de planejamento participativo, técnico e continuado capaz de nos assegurar uma cidade menos vertical, congestionada, segregadora, alagadiça e asfáltica. Queremos, para além da Copa, um futuro para Salvador.
*Paulo Ormindo David de Azevedo
Arquiteto e Professor Titular da Faculdade de Arquitetura da UFBA. É diretor do CREA, do IAB - Bahia e membro do Conselho Estadual de Cultura
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