Edivaldo M. Boaventura*
Por que o Colégio Antônio Vieira foi criado no começo do século XX? Em 1910, Portugal proclama a república e decreta a expulsão dos jesuítas do território português. E com os jesuítas foram extintas todas as outras ordens religiosas. Explica-se. A grande maioria católica do povo português contrastava com o anticlericalismo da sua elite republicana. A Companhia de Jesus experimentava a terceira extinção. A primeira com o polêmico Marquês de Pombal e a segunda quando da vitória das forças liberais de Dom Pedro IV, o mesmo Dom Pedro I, que abdicara do Brasil.
Tangidos de Portugal, os jesuítas fixam-se, então, na Bahia, com a fundação do Colégio Antônio Vieira. Em 15 de março de 1911, receberam os primeiros 72 alunos. Dentre os que aportaram, encontra-se a figura emblemática do Padre Luiz Gonzaga Cabral, homem de excepcional talento, orador sacro, conhecedor da obra de Antônio Vieira. Aliás, a denominação do estabelecimento com o nome do grande orador confirma e liga a primeira jornada jesuítica, no tempo da Colônia, com a iniciada em 1911.
Aproxima-se o centenário do Colégio em março próximo. Desde o começo os jesuítas firmam um alto padrão de ensino que influenciou a vida intelectual de Salvador, não somente do ponto de vista literário e filosófico, mas também científico com o cultivo das Ciências Naturais. O Vieira passa a ser um pólo de atração para a educação dos jovens baianos, tanto os da capital como das interioridades.
O centenário é para o ex-aluno um tempo privilegiado de recordação positiva. Chegando-se do interior, encontrava-se um colégio com uma rica biblioteca com livros em diversas línguas e com professores de formação européia ensinando no curso secundário, como o padre Torrend com dupla formação missionária e científica. Botânico, estudioso das algas, há uma espécie que em sua homenagem se chama Torrenaceas. Era de uma enorme curiosidade científica, por onde andava recolhia plantas e pedras. Escrevia para A Tarde, lia revistas científicas estrangeiras. Em plena metade do século passado, pregava o ecumenismo, a prática dos exercícios físicos, o saber comer e a autoeducação. Estava além do seu tempo. Pode-se considerar o padre Torrend um pioneiro da ciência na Bahia.
Ao lado da formação humanística e científica que sempre foi o forte dos jesuítas, desenvolviam-se uma série de atividades religiosas, culturais e esportivas. Outras iniciativas entretinham os alunos, como o coral e as competições esportivas com a disputa de jogos entre as séries e com outros colégios soteropolitanos. Além da Academia de Letras dos alunos, a Congregação Mariana e a Juventude Estudantil Católica (JEC) estimulavam a participação. À frente dessas entidades contávamos com a figura culta do padre Mariano Pinho, conhecedor da língua e da literatura portuguesa, que estimulava a leitura de Ferreira de Castro, Guerra Junqueiro, Camões, Vieira e tanto outros.
Na música, o grande destaque era para a Orquestra Sinfônica da Bahia. Em verdade a primeira sinfônica que teve a Bahia, segundo me consta, a cujos ensaios assistíamos no Salão dos Altos. Nas datas festivas, a Orquestra tocava, como também com freqüência dava concertos no Gabinete Português de Leitura. O seu regente era o padre Mariz, músico e compositor, o seu nome constava da Enciclopédia Britânica, a sua criação mais conhecida era Chá das Cinco.
O colégio formou centenas de cidadãs e cidadãos prestantes, úteis à comunidade, possuidores de uma educação que liberta, e que procuram promover a justiça e a paz. A eficácia pode ser exemplificada pelos destacados alunos: Anísio Teixeira, Thales de Azevedo, Jorge Amado, Roberto Santos e tantos outros que contribuíram para uma sociedade mais culta e mais justa.
Recriava-se, assim, a Companhia de Jesus, em Salvador, com um estabelecimento de ensino marcado pela educação religiosa de qualidade. A ausência histórica dos inacianos da Bahia durante um século e meio foi compensada com a fundação do Vieira.
* Educador, escritor, presidente da Academia de Letras da Bahia e diretor geral do jornal A Tarde
Por que o Colégio Antônio Vieira foi criado no começo do século XX? Em 1910, Portugal proclama a república e decreta a expulsão dos jesuítas do território português. E com os jesuítas foram extintas todas as outras ordens religiosas. Explica-se. A grande maioria católica do povo português contrastava com o anticlericalismo da sua elite republicana. A Companhia de Jesus experimentava a terceira extinção. A primeira com o polêmico Marquês de Pombal e a segunda quando da vitória das forças liberais de Dom Pedro IV, o mesmo Dom Pedro I, que abdicara do Brasil.
Tangidos de Portugal, os jesuítas fixam-se, então, na Bahia, com a fundação do Colégio Antônio Vieira. Em 15 de março de 1911, receberam os primeiros 72 alunos. Dentre os que aportaram, encontra-se a figura emblemática do Padre Luiz Gonzaga Cabral, homem de excepcional talento, orador sacro, conhecedor da obra de Antônio Vieira. Aliás, a denominação do estabelecimento com o nome do grande orador confirma e liga a primeira jornada jesuítica, no tempo da Colônia, com a iniciada em 1911.
Aproxima-se o centenário do Colégio em março próximo. Desde o começo os jesuítas firmam um alto padrão de ensino que influenciou a vida intelectual de Salvador, não somente do ponto de vista literário e filosófico, mas também científico com o cultivo das Ciências Naturais. O Vieira passa a ser um pólo de atração para a educação dos jovens baianos, tanto os da capital como das interioridades.
O centenário é para o ex-aluno um tempo privilegiado de recordação positiva. Chegando-se do interior, encontrava-se um colégio com uma rica biblioteca com livros em diversas línguas e com professores de formação européia ensinando no curso secundário, como o padre Torrend com dupla formação missionária e científica. Botânico, estudioso das algas, há uma espécie que em sua homenagem se chama Torrenaceas. Era de uma enorme curiosidade científica, por onde andava recolhia plantas e pedras. Escrevia para A Tarde, lia revistas científicas estrangeiras. Em plena metade do século passado, pregava o ecumenismo, a prática dos exercícios físicos, o saber comer e a autoeducação. Estava além do seu tempo. Pode-se considerar o padre Torrend um pioneiro da ciência na Bahia.
Ao lado da formação humanística e científica que sempre foi o forte dos jesuítas, desenvolviam-se uma série de atividades religiosas, culturais e esportivas. Outras iniciativas entretinham os alunos, como o coral e as competições esportivas com a disputa de jogos entre as séries e com outros colégios soteropolitanos. Além da Academia de Letras dos alunos, a Congregação Mariana e a Juventude Estudantil Católica (JEC) estimulavam a participação. À frente dessas entidades contávamos com a figura culta do padre Mariano Pinho, conhecedor da língua e da literatura portuguesa, que estimulava a leitura de Ferreira de Castro, Guerra Junqueiro, Camões, Vieira e tanto outros.
Na música, o grande destaque era para a Orquestra Sinfônica da Bahia. Em verdade a primeira sinfônica que teve a Bahia, segundo me consta, a cujos ensaios assistíamos no Salão dos Altos. Nas datas festivas, a Orquestra tocava, como também com freqüência dava concertos no Gabinete Português de Leitura. O seu regente era o padre Mariz, músico e compositor, o seu nome constava da Enciclopédia Britânica, a sua criação mais conhecida era Chá das Cinco.
O colégio formou centenas de cidadãs e cidadãos prestantes, úteis à comunidade, possuidores de uma educação que liberta, e que procuram promover a justiça e a paz. A eficácia pode ser exemplificada pelos destacados alunos: Anísio Teixeira, Thales de Azevedo, Jorge Amado, Roberto Santos e tantos outros que contribuíram para uma sociedade mais culta e mais justa.
Recriava-se, assim, a Companhia de Jesus, em Salvador, com um estabelecimento de ensino marcado pela educação religiosa de qualidade. A ausência histórica dos inacianos da Bahia durante um século e meio foi compensada com a fundação do Vieira.
* Educador, escritor, presidente da Academia de Letras da Bahia e diretor geral do jornal A Tarde
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