de CAROLINA MENDONÇA
Criado por uma família que sempre valorizou o livro e a cultura, o francês nascido no Marrocos Dimitri Ganzelevitch (foto) 73, escolheu a arte como forma de vida. Aos 5 anos, desejava ter um museu. Aos 14, passou a colecionar peças. Estudou em escolas de arte de Marrocos, Lisboa, Paris e Londres e chegou a vender peças da sua obra como pintor, mas seu olhar crítico fez com que ele abandonasse os pinceis e passasse para o outro lado do negócio, tornando-se marchand. Desde 1975, quando se mudou para a Bahia, vem apostando no trabalho de novos talentos e na valorização da cultura popular. O fundador da Associação Viva Salvador, que desenvolve ações de educação para a arte, teve seu acervo particular reconhecido pelo Ministério da Cultura, o que transformou sua residência na Casa Museu Solar Santo Antônio. Duro nas críticas às políticas públicas culturais praticadas no Estado, acredita que Salvador está perdendo sua identidade.
Criado por uma família que sempre valorizou o livro e a cultura, o francês nascido no Marrocos Dimitri Ganzelevitch (foto) 73, escolheu a arte como forma de vida. Aos 5 anos, desejava ter um museu. Aos 14, passou a colecionar peças. Estudou em escolas de arte de Marrocos, Lisboa, Paris e Londres e chegou a vender peças da sua obra como pintor, mas seu olhar crítico fez com que ele abandonasse os pinceis e passasse para o outro lado do negócio, tornando-se marchand. Desde 1975, quando se mudou para a Bahia, vem apostando no trabalho de novos talentos e na valorização da cultura popular. O fundador da Associação Viva Salvador, que desenvolve ações de educação para a arte, teve seu acervo particular reconhecido pelo Ministério da Cultura, o que transformou sua residência na Casa Museu Solar Santo Antônio. Duro nas críticas às políticas públicas culturais praticadas no Estado, acredita que Salvador está perdendo sua identidade.
Um dos motivos da sua vinda à Bahia foi a música de Dorival Caymmi?
Com certeza. Quando eu morava em Portugal, tínhamos, em casa, muitos discos de música popular brasileira. Tinha Noel Rosa, Orlando Silva, Dick Farney e Dorival Caymmi, que me encantava. Quando ouvia Maracangalha, eu viajava! Um dia, um tio me convidou para conhecer o Carnaval do Rio, vim imediatamente. No Rio, eu tinha uma carta de apresentação para o escritor Orígenes Lessa. Ele me convidou para vir com ele à Bahia, para o casamento do filho de Jorge Amado. Entrei pela porta certa, não é? Fui recebido pelo Jorge, Carybé nos levou no Axé Opô Afonjá, Ildásio Tavares nos apresentou a Lagoa do Abaeté. Era maravilhosa. Fazíamos buracos na areia para colocar velas, havia sempre alguém com um violão, uma delícia. Claro que havia furtos, assaltos, mas era seguro, não se sabia o que era matar, como hoje. Tudo isso criou uma imagem de encantamento. Voltei várias vezes até que vim para ficar de vez.
Como marchand, o senhor sempre teve interesse pela cultura popular?
Sempre tive um olhar eclético. Morei em vários lugares diferentes e me familiarizei com muitas culturas. Diria que tenho um pé no acadêmico, um no contemporâneo e outro nas imagens do inconsciente. E gosto de apostar no novo. Dei um empurrão a artistas brasileiros que, depois tiveram reconhecimento. Tive a primeira galeria do Pelourinho. Quando dizia que morava no Centro Histórico, me olhavam como se eu fosse louco.
Esse interesse está também nos concursos que organizou para premiar os melhores carrinhos de café e barracas de festa de largo?
Quando a Lídice da Mata acabou com as barracas das festas de largo, sofri muito. Conheci as barracas quando tive uma loja no Mercado Modelo e fiquei maravilhado. Depois de um ou dois anos participando da festa da Nossa Senhora da Conceição, percebi que alguns barraqueiros já estavam colocando anúncios de refrigerantes, isso me deixou em alerta. Com medo de que aquilo desaparecesse, organizei, junto com Goya Lopes, Murilo e outros amigos, um concurso para a valorização da cultura das festas de largo. Premiávamos os bancos, fachadas, a comida, a higienização, eram várias categorias. Durou alguns anos até que o patrocinador, o dono de uma marca de tintas, faleceu. Pouco depois, assistimos à substituição das barracas por estruturas de metal, lona e plástico. Foi trágico, um erro total de leitura. O Instituto do Patrimônio Histórico e artístico (Iphan) chegou a fazer uma lei para proteger aquele patrimônio imaterial, mas já era tarde. Defendo, no entanto, que é possível recuperar essa cultura.
Com certeza. Quando eu morava em Portugal, tínhamos, em casa, muitos discos de música popular brasileira. Tinha Noel Rosa, Orlando Silva, Dick Farney e Dorival Caymmi, que me encantava. Quando ouvia Maracangalha, eu viajava! Um dia, um tio me convidou para conhecer o Carnaval do Rio, vim imediatamente. No Rio, eu tinha uma carta de apresentação para o escritor Orígenes Lessa. Ele me convidou para vir com ele à Bahia, para o casamento do filho de Jorge Amado. Entrei pela porta certa, não é? Fui recebido pelo Jorge, Carybé nos levou no Axé Opô Afonjá, Ildásio Tavares nos apresentou a Lagoa do Abaeté. Era maravilhosa. Fazíamos buracos na areia para colocar velas, havia sempre alguém com um violão, uma delícia. Claro que havia furtos, assaltos, mas era seguro, não se sabia o que era matar, como hoje. Tudo isso criou uma imagem de encantamento. Voltei várias vezes até que vim para ficar de vez.
Como marchand, o senhor sempre teve interesse pela cultura popular?
Sempre tive um olhar eclético. Morei em vários lugares diferentes e me familiarizei com muitas culturas. Diria que tenho um pé no acadêmico, um no contemporâneo e outro nas imagens do inconsciente. E gosto de apostar no novo. Dei um empurrão a artistas brasileiros que, depois tiveram reconhecimento. Tive a primeira galeria do Pelourinho. Quando dizia que morava no Centro Histórico, me olhavam como se eu fosse louco.
Esse interesse está também nos concursos que organizou para premiar os melhores carrinhos de café e barracas de festa de largo?
Quando a Lídice da Mata acabou com as barracas das festas de largo, sofri muito. Conheci as barracas quando tive uma loja no Mercado Modelo e fiquei maravilhado. Depois de um ou dois anos participando da festa da Nossa Senhora da Conceição, percebi que alguns barraqueiros já estavam colocando anúncios de refrigerantes, isso me deixou em alerta. Com medo de que aquilo desaparecesse, organizei, junto com Goya Lopes, Murilo e outros amigos, um concurso para a valorização da cultura das festas de largo. Premiávamos os bancos, fachadas, a comida, a higienização, eram várias categorias. Durou alguns anos até que o patrocinador, o dono de uma marca de tintas, faleceu. Pouco depois, assistimos à substituição das barracas por estruturas de metal, lona e plástico. Foi trágico, um erro total de leitura. O Instituto do Patrimônio Histórico e artístico (Iphan) chegou a fazer uma lei para proteger aquele patrimônio imaterial, mas já era tarde. Defendo, no entanto, que é possível recuperar essa cultura.
Barraca de Festa de Largo - 1986 - Foto:Adenor Godim
Salvador vem perdendo sua identidade?
Muitíssimo. Estão derrubando todas as construções históricas, estão depredando a cidade. Tudo está virando espigão. Aquilo que fizeram atrás da casa dos cardeais é um assassinato estético! Agora querem descaracterizar a Praça Cayru. Não se tem um projeto de desenvolvimento. Tudo depende da exploração imobiliária.
É considerado crítico?
Venho de uma cultura onde a crítica faz parte das discussões. Aqui, com a herança escravagista, uma república mais ou menos democrática e, depois, a Ditadura Militar, se perdeu o direito de criticar. Por isso, escrevo minhas crônicas, protesto. É justamente porque gosto da Bahia que faço críticas. Estou escrevendo sobre o abandono do Santo Antônio Além do Carmo, que está ameaçada por essa mocinha, a Luciana Rique, que está abocanhando parte do bairro. E as famílias que moravam naquelas casas? Vai ser a mesma burrice que se fez no Pelourinho.
Muitíssimo. Estão derrubando todas as construções históricas, estão depredando a cidade. Tudo está virando espigão. Aquilo que fizeram atrás da casa dos cardeais é um assassinato estético! Agora querem descaracterizar a Praça Cayru. Não se tem um projeto de desenvolvimento. Tudo depende da exploração imobiliária.
É considerado crítico?
Venho de uma cultura onde a crítica faz parte das discussões. Aqui, com a herança escravagista, uma república mais ou menos democrática e, depois, a Ditadura Militar, se perdeu o direito de criticar. Por isso, escrevo minhas crônicas, protesto. É justamente porque gosto da Bahia que faço críticas. Estou escrevendo sobre o abandono do Santo Antônio Além do Carmo, que está ameaçada por essa mocinha, a Luciana Rique, que está abocanhando parte do bairro. E as famílias que moravam naquelas casas? Vai ser a mesma burrice que se fez no Pelourinho.
Entrevista publicada originalmente no jornal A Tarde
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