terça-feira, 8 de novembro de 2022

200 ANOS DA BATALHA DE PIRAJÁ



O traço inconfundível do artista plástico Carybé, o mais baiano dos argentinos, apresenta uma luta em tom épico: soldados uniformizados misturados a homens do povo, vaqueiros de gibão e chapéu de couro, cavalos tombados ao chão.

A batalha, que completa 200 anos hoje (8), durou cerca de oito horas, reuniu cerca de 4.000 soldados e foi uma tentativa dos militares fiéis a Lisboa de furar o cerco terrestre que as tropas brasileiras aliadas a dom Pedro 1º impunham a Salvador para consolidar a Independência.

A luta contra o domínio português na Bahia, em diversos episódios, tem forte influência de protagonismo feminino, a exemplo da bravura da freira Joana Angélica, que morreu por resistir à entrada de portugueses no Convento da Lapa, Maria Felipa, por suas estratégias usadas contra os portugueses na Ilha de Itaparica, e Maria Quitéria, que guerreou como parte das tropas independentistas contra as tropas coloniais.

Uma versão da batalha de Pirajá, que ganhou o imaginário popular, veio de um poema de Ladislau dos Santos Titara, responsável pelas correspondências do general Labatut, que alçou à condição de herói o cabo-corneta Luís Lopes.  Diante das dificuldades da batalha, o comandante Barros Falcão teria ordenado que o corneteiro fizesse o toque de retirada, fazendo com que as tropas brasileiras recuassem. Mas ele teria feito o contrário, entoando o toque de "avançar a cavalaria e degolar".  O toque de ataque teria assustado os portugueses que se imaginaram em menor número de soldados e bateram em retirada de forma desordenada.

Embora o 2 de Julho seja a data oficial da Independência do Brasil na Bahia, neste dia, em 1823, não houve uma batalha. A saída dos portugueses da cidade foi o capítulo final de uma história de luta contra os portugueses, mesmo depois do 7 de setembro de 1822, dia oficial da independência do Brasil.

domingo, 6 de novembro de 2022

Incompetência e descaso na Logística Baiana


Osvaldo Campos Magalhaes*
Construída durante o governo Luís Viana Filho, 1967 e 1971,  como estrada de ligação entre a Bahia e Brasília, a BR 242 vai se tornando a “rodovia da morte”. 
Com o desenvolvimento de novas variedades de soja e milho pela Embrapa e a vinda de milhares de produtores de grãos da região sul do Brasil para o Oeste baiano, a produção de grãos e algodão cresceu muito nos últimos 20 anos e já ultrapassa as 7 milhões de toneladas , que são exportadas através de terminal portuário em Salvador. 
Mais de 170 mil carretas bi-trem trafegam anualmente pela BR 242, rodovia que não foi construída para receber tal volume de tráfego nem equipamentos tão pesados. Além de não ter qualquer controle de pesagem dias carretas, a rodovia não possui terceira faixa nas subidas, o que a transformou em armadilha perigosa para as centenas de milhares de carros de passeio e ônibus de turismo expondo as pessoas a riscos graves. 
Refletindo sobre a questão técnicos da Booz Allen durante a elaboração do planejamento estratégico ara a logística baiana no governo Cezar Borges propuseram a concessão da BR 242 , trecho de 89 km da Br 116 e a BR 324 ligando Feira de Santana a Salvador e Terminal de Cotegipe.

Lembrar que o PROGRAMA ESTADUAL DE LOGÍSTICA DE TRANSPORTES - PELTBAHIA, por mim coordenado, foi finalizado no governo Governo Paulo Souto e previa a reconstrução do trecho ferroviário entre o Porto de Aratu e Brumado e a construção da Ferrovia Leste Oeste entre Luiz Eduardo Magalhães e Brumado. O governo Wagner alterou o projeto levando a ferrovia até Ilhéus e prevendo a construção de um porto numa área de proteção ambiental, próximo à Lagoa Encantada. O Porto já mudou de local duas vezes e ainda não foi viabilizado.

A Ferrovia de Integração Leste Oeste, inconclusa, foi alvo da Operação Lava Jato, com envolvimento da OAS, ODEBRECHT, Andrade Guitierez, Queiroz Galvão e outras. As obras do Porto Sul, promessa do governo Rui Costa, não saíram do papel. Triste Bahia Enquanto isso,  o grupo cearense Dias Branco, associado ao grupo baiano TPC, construiu um moderníssimo Terminal de Grãos em Salvador, na baía de Aratu. Que opera com extraordinária eficiência. A soja que antes era movimentada no Porto de Ilhéus em um dia, passou a ser embarcada em menos de 2 Horas no Terminal de Cotegipe.  Esperamos que o governador eleito não cometa os mesmos erros de seus antecessores no que diz respeito à área da Logística de Transportes. Projetos como o Porto Sul e a ponte Salvador Itaparica devem ser reavaliados e discutido com especialistas da Sociedade Civil. São projetos inviáveis sob o ponto de vista ambiental e econômico financeiro. Devemos fortalecer a vocação logística e portuária da Baía  de Todos os Santos e a vocação turística e de preservação ambiental da Costa do Cacau.

Errar é humano mas persistir no erro é desperdiçar o dinheiro público.

*Engenheiro Civil e Mestre em Administração , foi o coordenador do PELTBAHIA. Foi Especialista da FIESP e Membro do Conselho de Infraestrutura da FIEB

quarta-feira, 2 de novembro de 2022

Porque América e não Colômbia?

Américo Vespúcio (1451-1512) foi um mercador, navegador e cartógrafo italiano de grande importância para os descobrimentos, pois escrevia cartas a seus superiores descrevendo os lugares por onde passava. Em sua homenagem, as terras descobertas do Novo Mundo receberam o nome de América. 
Américo Vespúcio nasceu em Florença, na Itália, no dia 9 de março de 1451. Era o terceiro filho de Anastácio Vespúcio e Isabel Mimi. Foi educado por seu tio, o dominicano Jorge Antônio Vespúcio, recebendo educação humanística. Esteve na Itália e na França, onde estudou Geografia, Astronomia e Cosmografia. Em 1949, a serviço dos Médici, Américo Vespúcio foi para Sevilha, na Espanha, para trabalhar na gerência de importante casa comercial, onde passou a auxiliar o armador Juanoto Berardi. Nessa época travou contato com Colombo e outros navegadores. Em 1495, com a morte de Berardi, Vespúcio assumiu a gerência da filial, especializada no abastecimento de navios. Travou contato com as ideias dos conquistadores espanhóis. Primeira viagem de Américo Vespúcio No dia 18 de maio de 1499, Vespúcio partiu de Cádiz, na expedição de Alonso de Hojeda, com uma frota de quatro naus, destinadas a explorar as terras já descobertas por Colombo. Atravessaram o Atlântico e chegaram próximo à costa da atual Guiana Francesa. Após uma desavença, Hojeda e Vespúcio separam-se, ficando cada um no comando de duas naus. Hojeda seguiu para o norte e Vespúcio para o sul, costeando o Brasil. Descobriu o estuário do rio Amazonas e foi até o cabo de São Roque, onde inverteu a rota e chegou até a Venezuela. Os dois navegantes voltaram a se encontrar no Haiti e regressaram à Espanha em junho de 1500. Convencido até então de ter percorrido a península do extremo leste da Ásia, descrita por Ptolomeu, Américo Vespúcio conseguiu que o rei D. Manuel I de Portugal financiasse nova expedição em busca de uma passagem para os mares da China. 
Segunda viagem de Américo Vespúcio 
Em uma segunda viagem, Américo Vespúcio seguiu na expedição comandada por Gonçalo Coelho que partiu de Lisboa no dia 13 de maio de 1501, chegando ao cabo Santo Agostinho em Pernambuco, no final do ano. Velejando para o sul, esteve na foz do São Francisco, na Bahia de Todos os Santos e em outros pontos da costa que foram sendo denominados de acordo com o santo do dia do descobrimento. 
KIRIMURÊ
Era o dia 1 de novembro, Dia de Todos os Santos na tradição da religião católica. Por costume, nomeava-se todos os acidentes geográficos de acordo com os santos dos dias onde os mesmos eram identificados – cabendo à baía, portanto, este nome. A relevância estratégica da Baía de Todos os Santos, associado a existência de colinas e acidentes geográficos à leste (relevo que permitiria o costume medieval de fortificação das cidades), foram decisivos para que Tomé de Sousa mais tarde escolhesse a região para fundar, por ordens do rei de Portugal, a cidade que seria a sede da primeira capital da colônia portuguesa – Salvador. Berço da civilização colonial lusa nas Américas, a Baía de Todos os Santos abrigou no século XVI o maior porto exportador do Hemisfério Sul, de onde eram enviados às metrópoles européias a prata boliviana e o açúcar brasileiro, sendo o porto de Salvador o que mais recebeu escravos africanos do Novo Mundo. Os Tupinambas denominavam a gigantesca baía por Kirimurê, que na língua dos povos originais que habitavam a região significava “ grande mar interior”. No final do mesmo ano avistou a baía de Guanabara e ultrapassou o estuário do rio da Prata. Foi o primeiro navegador a alcançar e registrar a costa meridional da Patagônia.
Américo Vespúcio Gravura do livro Colombo e Vespúcio (1898) Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro Em 1502 regressou a Portugal, convencido que havia percorrido a costa de um novo continente, pois seria impossível que a suposta península asiática se prolongasse de tal forma para o sul.
 Em 1505 regressou para Sevilha
Foi nomeado piloto-mor da corte, ajudando na preparação de mapas oficias e rotas marítimas. Neste mesmo ano recebeu a cidadania espanhola. Cartas de Américo Vespúcio Vespúcio adquiriu fama graças a uma série de documentos a respeito de suas viagens. A primeira consiste em uma carta em italiano, datada de setembro de 1504, procedente de Lisboa, aparentemente endereçada ao magistrado supremo da República Florentina, Pier Soderini. A segunda são duas versões latinas desta carta, publicadas sob os títulos de “Quatuor Americi Navigationes” e “Mundus Novus”. Existem também três cartas particulares dirigidas ao Medicis. Foi essa série de cartas, verdadeiras “crônicas de viagem”, embora cheias de fantasias, que deu maior notoriedade a Vespúcio, que doou seu nome ao Novo Mundo: “América”. Em 1507, o alemão Martin Waldseemüller publicou na França o relato “Quatuor Americi Vesputii Navigationes”, numa “Introdução à Cosmografia” na qual surgiu pela primeira vez o nome de “Terra de América”. Em 1509 o nome aparece no mapa-múndi impresso em Estrasburgo. Américo Vespúcio faleceu em Sevilha, Espanha, no dia 22 de fevereiro de 1512.

terça-feira, 1 de novembro de 2022

Os Europeus chegam a Kirimurê

Após a "descoberta" do Brasil feita por Pedro Álvares Cabral em 1500, o rei de Portugal, D. Manuel I decide averiguar quais as riquezas existentes naquele imenso território tão bem relatado por Pero Vaz de Caminha, participante da expedição cabralina. A primeira expedição exploratória da costa brasileira foi comandada por Gonçalo Coelho que partiu de Lisboa em 10 de maio de 1501. Com isto, a Coroa portuguesa pode ter notícias pioneiras sobre o contato de Cabral e também sobre seus direitos sobre terras brasileiras. Desta expedição participou como cartógrafo o italiano Américo Vespúcio. Nascido em 09 de março de 1454, Américo Vespúcio sempre viveu em meio a um alto estilo de vida, filho de família abastada achegados aos poderosos Médici, que construíram Veneza, política e financeiramente. Após este feito, em 1491 Vespúcio dirige-se à Espanha para trabalhar com Juanoto Berardi, sócio dos Médici. Juanoto era um dos principais financiadores da empresa marítima espanhola, comandada pelos "Reis Católicos". Alguns afirmam ter sido ele o colaborador para a expedição de Cristóvão Colombo quando este descobriu a América em 1492. D. Manuel I, contrata Vespúcio, a admiração da parte do rei de Portugal em relação a este homem culto iniciara com a leitura que o rei realizou de uma carta escrita em 18 de julho de 1500 de Vespúcio destinada a seu patrão Lourenzo de Médici. Em 15 de junho Vespúcio segue rumo ao Brasil, sob comando de Gonçalo Coelho, a esquadra era formada por três caravelas. De acordo com Ricardo Fontana, um dedicado estudioso do assunto, a partir deste momento, o desejo de novas aventuras começara efetivamente para Américo Vespúcio, pilotando uma das embarcações da esquadra..
 O primeiro contato com o Brasil 
 Em agosto de 1501 as 03 caravelas da esquadra ancoram na Praia de Marcos, litoral do atual Rio Grande do Norte. O primeiro contato dos marujos com os nativos do Brasil aconteceu somente após o primeiro dia já em terra firme. Contato este que, na verdade, foi desprezado por parte dos nativos que ignoraram todas as quinquilharias, oferecidas pelos homens de Gonçalo Coelho. 
 A antropofagia dos nativos brasileiros
Gonçalo Coelho concordou em deixar dois cristãos de sua esquadra ir averiguar os nativos por um prazo de 05 dias, visto que não houve uma recepção muito amistosa por parte dos nativos, passados estes dias, exatamente ao 6º dia os cristãos haviam desaparecidos, a esquadra estava prestes a deixar o litoral, Coelho e Vespúcio junto de alguns marujos decidem procurar saber o que houve, foi quando apareceram várias mulheres nativas, sendo que uma delas golpeou um dos homens da esquadra na cabeça, enquanto outras atacaram o restante com flechas. Dois disparos foram dados pelos homens de Gonçalo, com intuito de eliminar o ataque, os nativos correram para um monte alto, levando arrastado um dos marujos, os viajantes seguiram-nos e depararam com um cenário de impacto, o marujo capturado estava em pedaços, parte de seu corpo estava sendo cozinhado em um tipo de caldeirão grande, e outras partes do corpo já sendo mastigadas pelos nativos. O destino dos outros dois cristãos desaparecidos, com certeza fora o mesmo. Diante de tais acontecimentos, Vespúcio narra em sua carta denominada Lettera, o primeiro caso de antropofagia dos nativos da América, incluindo os europeus como vítimas. Tal registro ganhou estrondoso sucesso de publicação, pois esta carta fora enviada a seu amigo Piero Soderini, um dos principais mandatários de Florença. Os comandantes ficaram indignados com os acontecimentos, mas Gonçalo Coelho achou melhor zarpar imediatamente do local, contornando o litoral do Brasil. 
 Vespúcio atribui nomes ao litoral brasileiro por onde passou
Munidos de um calendário Litúrgico, começaram a batizar os lugares onde atracavam, com nome de santos do respectivo dia em cada lugar diferente, como por exemplo, em 28 de agosto com a vista do Cabo de Santo Agostinho, em 01 de novembro de 1501 à baía, denominada Baia de Todos os Santos. A região era chamada pelos tupinambás que habitavam no entorno da baía, chamada por eles de KIRIMURÊ, que significa “grande mar interior”.

terça-feira, 18 de outubro de 2022

Elevador Hidráulico da Conceição - Primeiro e mais alto elevador urbano

O Elevador Lacerda, um dos principais cartões-postais de Salvador, na Bahia, é um meio de transporte que liga pessoas entre as Praça Cairu, na Cidade Baixa, e a Praça Tomé de Sousa, na Cidade Alta. Desde o século XVII o desnível da cidade já gerava um problema de locomoção. No final do século XIX com o crescimento urbano de Salvador se fazia necessária a ligação mais veloz entres as partes Alta e Baixa da cidade. A intensa circulação da população e o comércio seriam facilitados por esta integração, já que eram utilizados guindastes para o transporte de cargas e a população subia ladeiras íngremes e longas escadarias para acessar as partes da cidade. O empresário Antônio Lacerda, planejou a construção do então, Elevador Hidráulico da Conceição, que pretendia facilitar a locomoção entre as partes da cidade e promover a integração com o transporte público. Com destaque para os bondes, em especial, para a parte sul da cidade, que estava em grande crescimento. O plano de construção do empreendimento foi arquitetado em ambiente familiar, no qual integrantes da família Lacerda aprimoraram o projeto. A empresa Antônio de Lacerda & Cia, que mais a frente se tornou a Companhia de Transportes Urbanos, que pertencia à família Lacerda, comprou os direitos de construção de linhas de transporte na encosta. Em outubro de 1869 as obras foram iniciadas e em 1873 o elevador foi inaugurado. O elevador, era popularmente conhecido como “Parafuso”, no entanto, em 1896, seu nome foi alterado para Elevador Lacerda, em homenagem ao idealizador e construtor do empreendimento, Antônio Lacerda. À época em que fora inaugurado o Elevador possuía duas torres e era o primeiro elevador urbano do mundo e o mais alto também, medindo 63m. Foi necessário a perfuraçãode dois túneis na Ladeira da Montanha, um na vertical, para abrigar a torre, e outro na horizontal, para dar o acesso à rua. Embora uma grande inovação, a construção recebeu algumas críticas, em especial, de estrangeiros, pois foram utilizados poucos ferros, que era o símbolo da modernidade na arquitetura do tempo. O elevador funcionava através de uma máquina à vapor e o peso que podia ser transportado era calculado através de uma balança, onde as pessoas se pesavam antes de entrar. Em 1930, o Elevador passou por uma grande reforma, ganhou mais uma torre, mais duas cabines e uma passarela de aço e concreto que conecta todas as estruturas. Ao final das obras a capacidade de transporte aumentou significativamente, ampliando ainda mais a circulação de passageiros. Nas décadas de 50 e 80 o Elevador passou por outras reformas e atualmente continua em pleno funcionamento e é um dos principais pontos turísticos de Salvador. Em 2006 o Elevador Lacerda foi tombado pelo Instituo Histórico e Artístico do Patrimônio Nacional, Iphan. A fotografia, em destaque, custodiada pela Seção de Iconografia, é do fotógrafo Pedro Gonsalves da Silva, e foi capturada entre o período de 1912-1919. Na imagem é possível identificar o Mercado Modelo, o Elevador Lacerda à esquerda e a vista para a Baía

quarta-feira, 28 de setembro de 2022

Conheço as portas do céu

Oliveiros Guanais* Vou começar este relato com algumas considerações preliminares. Há umas centenas de anos atrás, um cara chamado Isaac Newton, preguiçosamente deitado debaixo de uma macieira, recebeu uma maçã na cabeça e só não gritou eureka, como o Arquimedes, porque certamente não o conhecia. Mas, naquele momento, Newton, que foi um dos maiores gênios da ciência de todos os tempos, encontrou inspiração para formular a teoria da gravidade ( a matéria atrai a matéria...). Pois é. A partir de então, ficou-se sabendo que existe uma coisa chamada lei da gravidade, que, entre nós, deste compenetrado planeta, tem a terra como núcleo de atração mais forte. E se pisamos a terra, é porque ela está abaixo de nós. Logo, esse centro de força atrai para baixo todos os corpos, sólidos, líquidos e até gasosos. O homem flutua apenas nas naves espaciais . Aqui, ele está preso a terra, à sua mãe Gaia, à qual retornará como pó que é ( pulvis est ), inevitavelmente. E o próprio corpo humano é estruturado de forma a sentir no seu interior os efeitos da gravidade. Vamos considerar um importante sistema do nosso organismo: o circulatório, que tem, entre os seus componentes, um volume grande de líquido, o sangue. O sangue passeia, indo e voltando por um conjunto tubular ( artéria e veias), impulsionados pela bomba do coração. Além da bomba cardíaca, há um trabalhinho também das artérias, que se dilatam quando recebem um jato de sangue mandado pela bomba cardíaca ( sístole) e se contraem depois, ajudando a empurrar o sangue para a frente, funcionando como uma bomba periférica. Feita a sua viagem de ida pelas artérias, o sangue volta pelas veias em direção ao coração, e não vão para as partes baixas, atraídos pela gravidade, quando a pessoa está em pé, porque as veias têm válvulas que impedem esse retorno. É mais ou menos assim que as coisas funcionam. Há, lembrei-me agora: tem ainda um mecanismo nervoso, chamado neurovegetativo, formado por dois componentes que atuam de modo antagônico, chamado simpático e parassimpático (vagal ). Através do simpático o coração bate acelerado (taquicardia) e com mais força, os vasos se contraem, mecanismos que ocorrem quando há necessidade de mais sangue em certos órgãos. ( O vago atua, como foi dito, em sentido contrário. O seu predomínio faz as coisas andarem de modo inverso: o coração bate devagar ( bradicardia), etc. Existem situações em que o equilíbrio se rompe, e o sistema se desregula, levando a uma predominância do vago, numa reação que é chamada vasovagal. Os vasos se dilatam e os mecanismos compensatórios não dão conta do equilíbrio necessário. Estando o indivíduo em pé, o espectro de Newton aparece, a gravidade marca presença e o sangue vai para as partes baixas, resultando em redução da quantidade destinada ao cérebro, que acusa de imediato a sua falta. Faltando sangue, falta oxigênio, e faltando oxigênio, o cérebro, que só tem metabolismo aeróbico ( feito com oxigênio ) resolve protestar, fazendo greve. Deixa de trabalhar, e o apagão se instala: o sujeito perde os sentidos. É a chamada lipotímia ou síncope, que pode ser provocada também por falta de glicose no cérebro, porque a dieta dos neurônios, células nobres, cheias de realeza, tem que incluir no cardápio glicose regada com o vinho de oxigênio. Exigente, não é? Os desmaios matinais que ocorrem nas igrejas durante o santo ofício da missa, principalmente com pessoas idosas em jejum, tem explicação dessa maneira: baixa de glicose e mecanismos reguladores do sistema circulatório comprometidos pela idade. Será que alguém leu até aqui? Se não leu, está desculpado, porque este lenga-lenga está mesmo muito longo e chato. Mas vamos em frente, para um outro capítulo, que tem eu como personagem. No dia 12 deste mês de março, fui ao lançamento de um livro do filósofo Marcos Bulcão, um jovem talentoso que eu ajudei a nascer, porque anestesiei a mãe no parto e dei assistência neonatal ao recém-nascido, que veio à luz meio perrengue, dando-me susto e trabalhos. Mas recuperou-se logo, tornando-se um brilhante intelectual . Lá estava eu, tive meu autógrafo, fui fotografado em companhia do autor, e comecei a circular cumprimentando amigos de velhas amizades. Mas, ao invés de fazer como muitos fazem e as circunstâncias aconselhavam, ou seja, dar a missão por cumprida e voltar para casa ( à francesa ), fiquei andando pelo ambiente, sentindo um calor imenso e suando muito. Com a sudorese, pensei com meus botões: será que estou infartando? Dúvida posta, comprimido de Isordil posto debaixo da língua. Estava meio afastado do grupo, olhando livros de direito, e logo chegou Carlos Valadares ( um colega estimado, companheiro dos meus tempos de CREMEB ) e ficamos olhando livros. Não se passaram nem dois minutos da administração do Isordil e eu comecei a ficar tonto. Nada falei com meu amigo mas me apoiei na bancada dos livros, e logo não vi mais nada, nem sei de mais nada. Acordei deitado no piso do mezanino da livraria ( Civilização Brasileira ) cercado de parentes, conhecidos e médicos, todos alvoroçados, o que foi, o que foi, você está bem, respire fundo, está se sentindo bem, fique deitado, não levante não, como é seu nome, está sentindo dor de cabeça e etc.. Eu sei lidar com isso muito bem, porque conheço a fisiologia do fenômeno, anestesista que sou. Já presenciei alguns ou muitos casos de lipotimia em pacientes operandos, quando permanecem certo tempo sentados, principalmente à tarde ( por causa do jejum ) e são jovens e do sexo masculino ( que são mais frouxos, louvor às mulheres ). Mas o que acontece? Simplesmente interrompemos o que queríamos fazer e colocamos rapidamente o paciente na posição horizontal, o que facilita a chegada de sangue ao cérebro e poucos minutos depois restaura-se a consciência. ( Aliás, a primeira conseqüência de uma lipotímia- queda – funciona também como corretivo do problema, se, claro, a pessoa não tiver traumatismo de crânio- o que é grave- ou quebra de algum osso periférico. A minha experiência com essa situação levou-me a entender, tardiamente, que nem eu nem ninguém deve tomar Isordil longe de uma cama. Se for necessário o uso dessa droga, que é um potente vasodilatador, deve-se usá-la deitado. Ainda tenho o que contar sob o episódio. Vejamos. Ante o espanto das pessoas mais próximas e o grande susto do meu filho mais novo, carinhoso e preocupado comigo, fui levado ao hospital Português, à minha revelia- mas entendendo a razão dos meus amigos, porque, por trás da síncope, pode haver coisa mais grave. Na assistência entre a livraria e o Português muitos colegas foram solidários, mas Chicão ( Dr. Francisco Sampaio, que muito se preocupa comigo) e Guiga ( Dr. Guilherme Moysés) tiveram papel de comando e no hospital, pouco depois de minha chegada, lá compareceu o Dr. Altamirando Santana, velho amigo (uma ajuda à procura de um necessidade), e as coisas foram se encaminhando. Parei na emergência, e, depois dos exames apropriados, a doutora de plantão falou: seus exames deram normais, tudo indica que o senhor teve uma lipotimia por reação vasovagal. Mas...levando em conta o seu histórico, acho melhor o senhor permanecer na Unidade Coronariana para melhor observação, e certamente amanhã vai para casa. E assim aconteceu. Um de meus filhos, que mora fora, inteirando-se dos fatos, disse: “é, meu pai, com o seu passado, se você se encostar numa emergência não tem escapatória, será internado logo, porque médico nenhum vai liberá-lo, conhecendo o seu histórico ( meu histórico é gloriosamente rico em batalhas e lutas em que muita gente deixou de acreditar na minha vitória). Mas aqui estou, com cicatrizes e condecorações. Um comentário final. Se “o oceano é a única sepultura digna de um almirante batavo”, como disse aquele almirante holandês, uma livraria seria o lugar mais apropriado para eu morrer. Seria uma glória, capaz de causar inveja a Jorge Luis Borges, que via na biblioteca a representação do paraíso. Eu não sou Borges, está-se vendo. E divirjo dele porque troco a biblioteca ( de que não gosto muito) por livrarias e sebos, imagens do meu paraíso. Se eu morresse ali, seria uma despedida apoteótica da vida, porque dulce et decorum est circa libros mori ( é paráfrase de um verso latino: é doce e glorioso morrer cercado de livros). *Oliveiros Guanais de Aguiar foi um médico anestesiologista brasileiro, professor da Faculdade de Medicina da UFBA, ex-presidente da União Nacional dos Estudantes e da seccional baiana da Sociedade Brasileira de Anestesiologia, onde ocupou ainda vários cargos. Faleceu em 21 de novembro de 2010.

sexta-feira, 16 de setembro de 2022

Baía tem biodiversidade ameaçada

A rica biodiversidade marinha da Baía de Todos os Santos está sendo ameaçada. Uma espécie de coral proveniente das águas do Oceano Pacífico, conhecido por sua capacidade de matar outros corais para disputar espaço, foi encontrado pela Organização Socioambientalista PRÓ-MAR na Baía, em uma Área de Proteção Ambiental (APA) localizada na Ilha de Itaparica. Ao ameaçar corais nativos e endêmicos da Baía de Todos os Santos, ecossistemas de grande biodiversidade, a espécie Coral-Sol (Tubastrea tagusensis e Tubastrea coccinea) põe em risco a sobrevivência de 65% dos peixes da Baía, que dependem dos recifes de corais das águas baianas para viver. De acordo com a Organização Internacional Marítima, uma espécie é considerada invasora quando provoca danos ecológicos, econômicos ou para a saúde humana, sendo considerada uma das quatro maiores ameaças a biodiversidade marinha. O Coral-Sol (Tubastrea tagusensis e Tubastrea coccinea) foi encontrado em uma das expedições da PRÓ-MAR, organização que monitora os recifes de coral da Ilha de Itaparica desde 2006, segundo o biólogo da PRÓ-MAR, Ricardo Miranda. “O vimos instalado em um relevante recife da região, onde já é possível ver grande cobertura deste organismo em algumas ‘pedras’, dividindo espaço com importantes corais construtores dos recifes brasileiros, incluindo espécies endêmicas da Bahia”, explicou, em referência às ações do Projeto Maré Global, da ONG, patrocinado pelo Instituto Otaviano Almeida Oliveira (IOAO). É a primeira vez no Brasil que o Coral-Sol é encontrado instalada em recife de coral. O organismo chegou ao país na década de 80, no Rio de Janeiro, incrustado em cascos de navios e plataformas de petróleo, e também já foi encontrado anteriormente em costões rochosos.
“Grande desastre ecológico” A espécie representa uma ameaça por encontrar nas águas da Baía de Todos os Santos um ambiente ideal e sem competidores e por crescer três vezes mais que os corais nativos. Segundo o doutorando em ecologia pela Universidade Federal da Bahia, José Amorim, “estamos diante de um grande desastre ecológico”. O doutorando explica o Coral-Sol é oriundo de uma região na qual competia espaço com mais de 200 espécies para sobreviver. “Aqui, por não haver competitividade, eles superam todos os outros, que até então estavam em harmonia. Além disso, esses organismos apresentam uma taxa de crescimento bem maior em relação as espécies nativas, produzem guerra química com os outros corais e isso, com certeza, leva à devastação dos nossos corais nativos, que juntamente com processos de inibição química, podem causar sérios danos as espécies nativas”, explica Amorim, que preside o Conselho Científico da PRÓ-MAR. ok um O que fazer quando encontrar o Coral-Sol? As colônias do coral invasor não devem ser coletadas nem quebradas ao serem encontradas por mergulhadores, alerta Claudio Sampaio, pioneiro na descoberta deste organismo invasor na Baía de Todos os Santos, doutor em zoologia e professor adjunto do curso de Engenharia de Pesca da Universidade Federal de Alagoas (UFAL). “Pois“Pois, ao manipulá-lo incorretamente, pode-se estimular a desova deste organismo, contribuindo com a amplificação do problema. O correto é comunicar o mais rápido possível a PRÓ-MAR ou algum especialista da área”, explica Sampaio. * Materia publicada no Correio da Bahia

Bahia Terra da Felicidade?

Osvaldo Campos Magalhaes* Segundo dados divulgados no 11º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, o Estado da Bahia registrou 7,1 mil mortes violentas e liderou o ranking nacional em números absolutos, superando os estados do Rio de Janeiro e São Paulo. A violência na Bahia atingiu principalmente os jovens negros do sexo masculino, com idade entre 15 e 21 anos. O Anuário também aponta que cresceu a diferença na expectativa de vida entre homens e mulheres, sendo que a Bahia apresenta uma das maiores amplitudes, com as mulheres vivendo mais de nove anos que os homens, com uma expectativa de vida chegando há 79 anos. A diferença nas expectativas de vida entre homens e mulheres reflete os altos níveis de mortalidade, principalmente de jovens, por causas violentas, que incidem diretamente na esperança de vida ao nascer da população masculina. Para se ter uma real dimensão da violência no Brasil, vale destacar que os 61,5 mil assassinatos cometidos em 2016 equivalem, em números, às mortes provocadas pela explosão da bomba nuclear que dizimou a cidade de Nagasaki, no Japão, em 1945, durante a Segunda Guerra Mundial. No que diz respeito às Unidades da Federação, é possível notar uma grande disparidade: enquanto em São Paulo houve uma redução de 49,4%, nos últimos 10 anos, na Bahia o aumento da taxa de homicídios de jovens superou os 200% no mesmo período. Já a letalidade das polícias nos estados brasileiros aumentou 25,8% em relação a 2015: 4.224 pessoas foram mortas em decorrência de intervenções de policiais civis e militares. Quase a totalidade das vítimas é homem (99,3%), jovem (81,8%), tem entre 12 e 29 anos e é negra (76,2%). O número de policiais mortos também aumentou 17,5% em relação a 2015: 437 policiais civis e militares foram vítimas de homicídio em 2016. O acentuado crescimento da violência e dos assassinatos de jovens baianos assim como a liderança da Bahia, desmente a enganosa propaganda do Governo do Estado e comprovam a falência do nosso sistema educacional público e a deficiência dos programas de inclusão social e de geração de empregos. O governo baiano nos últimos quinze anos equivocadamente priorizou investimentos em mega projetos que não conseguiram se materializar, como o Porto Sul, FIOL, Estaleiro Enseda e a ponte Salvador - Itaparica, que, tendo recebido recursos públicos superiores a R$6.5 bilhões, beneficiariam principalmente as grandes empreiteiras. O governo do Estado da Bahia também relegou a segundo plano a população do semiárido baiano, que não foi beneficiado pela transposição das águas do São Francisco nem pela construção de novos açudes. A migração dos jovens das áreas rurais para as regiões metropolitanas agravaram a questão do desemprego, das drogas e da violência e explicam a liderança da Bahia@. *Engenheiro e Mestre em Administraçáo - UFBA

domingo, 4 de setembro de 2022

7 de Setembro, a independência de Portugal do Brasil

Paulo Ormindo fe Azevedo*>
"Quem foi que inventou o Brasil?/ Foi seu Cabral!/ Foi seu Cabral!/ No dia 21 de abril/ Dois meses depois do carnaval” cantava Lamartine Babo. O 7 de Setembro, como a descoberta do Brasil, foi uma lorota. Quando Dom João VI fugiu para o Rio de Janeiro, em 1808, Portugal virou colônia do Brasil. Manter a burocracia e o exercito de um país de extensão continental como o Brasil era um enorme ônus para Portugal, que havia perdido o quinto, o monopólio do comercio exterior brasileiro com a abertura dos portos e o lucrativo tráfico de escravos promovidos pelos ingleses para beneficiar suas exportações de manufaturados. Portugal entrou em profunda crise. Libertar-se do Brasil era essencial para a sobrevivência de Portugal. Quem primeiro me chamou a atenção para este fato foi meu amigo Helder Carita, historiador de arte português. Dom João VI, que não era tonto, antes de voltar para Portugal, em 1821, onde seu trono desabara com a Revolução Liberal do Porto, instruiu seu filho, Pedro, a fazer a separação dos dois países e salvar a monarquia e a família real no Brasil. Um ano depois, Dão Pedro I promoveu histrionicamente o Grito da Independência ou Morte, sem dar um só tiro de zarabatana. Onde se viu um colonizador promover a independência de sua colônia? Só no país do carnaval. Mas os pseudo-liberais, para pirraçar os antigos monarcas, mandaram reforços para o Gal. Madeira na Bahia para tentar manter a antiga colônia. A independência formal do Brasil só se daria em 2 de julho de 1823 com uma sangrenta luta popular inspirada em ideais democráticos da Constituição Americana (1787), da Revolução Francesa (1792) e dos regimes republicanos nos países vizinhos, recém libertados. A Independência oficial do Brasil foi uma decepção, pois não trouxe nenhum ganho para o povo, escravos e índios, que lutaram bravamente na esperança de democratização, soltura e inclusão. O Império representou um atraso de 66 anos no desenvolvimento do Brasil, sem nenhum avanço nas relações de trabalho e educação. Fomos o último país a libertar os escravos e a criar um mercado interno. Só fomos ter universidade em 1920, com a criação da atual UFRJ, enquanto que no México e Peru elas foram criadas em 1549. A Proclamação da República, em 1889, foi um golpe militar apoiado pelos senhores de engenho em represália à libertação dos escravos sem indenizações. Carregamos ainda hoje o carma da escravatura e do analfabetismo funcional e voltamos a uma economia baseada na exportação de minérios e produção agrícola, como na colônia. Trocamos a exportação de ouro e diamantes pela de minério de ferro como uma commodity barata e do açúcar e do fumo, valorizadíssimo na época, pela soja e o milho sem valor agregado. Não basta ser “independente e republicano” é preciso parecer, como a mulher do César. *Professor Titular da Ufba, Arquiteto e Urbanista Publicado em A Tarde- 04/09/2022

sexta-feira, 2 de setembro de 2022

Portos são Estratégicos para o Estado da Bahia

Roberto Zilteman de Oliva* O recôncavo baiano goza de um privilégio natural difícil de se igualar no mundo. Uma baía imensa, a maior do Atlântico Sul, com águas profundas, abrigadas e cristalinas, rica em flora, em fauna e em paisagens, todas encantadoras. Banhando diversos municípios e mais de cinquenta ilhas, abriga em seu entorno a maior densidade demográfica do Estado, onde moram cerca de 3.7 milhões de pessoas que fazem parte de 520 anos de história. Os portos, a indústria e e o agronegócio são os grandes eixos de desenvolvimento da economia do Estado e neste âmbito o Complexo Portuário da Baía de Todos os Santos vive um momento de retomada de seu crescimento e reafirma sua condição econômica estratégica. Recentemente, os portos e terminais componentes deste complexo receberam investimentos expressivos dos setores públicos e privados. A atividade portuária é em essência o elo das atividades econômicas e o pilar do desenvolvimento destas, não podemos, pois, estancá-la ou relegá-la ao segundo planou. Ao longo dos anos, sucessivas ações equivocadas afrontam este entendimento e hoje raros são os cidadãos baianos que sabem atribuir a verdadeira importância aos portos e terminais da Baia de Todos os Santos. A última vez que a atividade foi pensada e planejada dentro de uma visão de integração e enriquecimento da nossa sociedade foi nos idos anos 60 com o planejamento do Centro Industrial de Aratu integrado ao porto de Aratu. De lá para cá se perdeu o foco e o cuidado com este elemento vital da economia. Por outra via, podemos citar bons exemplos recentes como o Porto de Salvador, comm novos equipamentos de última geração, a ampliação do terminal de contêineres e o aprofundamento dos berços de atracação – estes investimentos recolocarão a Bahia no eixo das principais rotas marítimas dando competitividade ao comércio exterior". A privatizacao dos terminais de graneis solidos no porto de Aratu esta propiciando expressivos investimentos na modernizacao e aumento da eficiencia. A implantação de uma moderna estação de passageiros em Salvador vem oferecendo aos turistas condições de conforto para melhor apreciação de nossas riquezas culturais e artísticas, gerando emprego e renda. A Via Expressa Baía de Todos os Santos, oferece aos usuarios do porto de Salvador o melhor acesso terrestre do Brasil, melhorarando a mobilidade urbana da cidade. O estaleiro de São Roque do Paraguaçu e o Estaleiro Enseada do Paraguaçu, atualmente operando como terminal portuario privado, vem gerando inúmeros empregos e oportunidades para uma população carente e ávida por melhor inserção social. Ampla também em contrastes, a Kirimurê, como dizem que era chamada pelos tupinambás, está longe de ser uma área totalmente degradada como alardeiam alguns. A Baía é ainda depositária de recursos e riquezas fundamentais para toda a economia do Estado. Dada a sua imensidão, o sábio nome de Baia de Todos os Santos sustenta a convivência, sem exclusões, da fauna, da flora, da pesca, do turismo, da náutica, da indústria e, fundamentalmente dos portos. Desde que se cumpra a ocupação ordenada visando o bem comum e a preservação ambiental responsável, sem prejuízo da vital necessidade de retomada do desenvolvimento regional.
*Engenheiro Civil, Presidente do Conselho de Administracao da Intermaritima e do Conselho Gestor do Instituto Brasil Logística

terça-feira, 30 de agosto de 2022

Uma Nova Arquitetura na Bahia


Nivaldo Andrade*

No final da década de 1920 e o início da década seguinte testemunham a chegada, no Brasil e na Bahia, de uma nova arquitetura, que busca romper com o ecletismo então dominante e com o movimento neocolonial surgido alguns anos antes. O final da década de 1920 e o início da década seguinte testemunham a chegada, no Brasil e na Bahia, de uma nova arquitetura, que busca romper com o ecletismo então dominante e com o movimento neocolonial surgido alguns anos antes. A reação ao ecletismo e ao neocolonial se deu por meio de um conjunto de expressões arquitetônicas que se tornou mundialmente conhecido como “arquitetura moderna”, que se apropria dos novos materiais de construção, como o aço, o concreto e o vidro, e da liberdade decorrente da adoção de uma estrutura independente dos elementos de vedação (paredes), abolindo a estrutura mural e promovendo integração visual entre interior e exterior e continuidade espacial no interior das edificações. Também chamada de funcionalista ou racionalista, a arquitetura moderna se caracteriza, ainda, pelas formas geométricas e pela abolição dos ornamentos.

A primeira fase da arquitetura moderna na Bahia se caracteriza pelas influências das vanguardas europeias, como a Bauhaus e o expressionismo alemão. Dentre as obras dessa primeira fase, podemos destacar, em Salvador, o Elevador Lacerda (1930); a sede do Instituto do Cacau da Bahia (1939), no Comércio; a Escola Normal da Bahia (1939), no Barbalho, atual Instituto Central de Educação Isaías Alves - ICEIA; a Estação de Hidroaviões (1939), na Ribeira; e o Sanatório de Tuberculosos Santa Terezinha (1942), na Caixa d’Água. No interior do estado, merecem menção o Instituto Municipal do Ensino (1939) e o estádio atualmente batizado de Mário Pessoa (1942), ambos em Ilhéus. Todas estas obras foram projetadas por profissionais sediados no Rio de Janeiro, muitos deles estrangeiros, como os alemães Alexander Büddeus e Alexander Altberg, o sueco-americano Fleming Thiesen e o húngaro Adalberto Szilard.

Figura 01 - Escola Normal da Bahia, no bairro do Barbalho, em Salvador, atual Instituto Central de Educação Isaías Alves (Fonte: Acervo da Construtora Carioca Christiani-Nielsen)

A partir do início dos anos 1940, a chamada escola carioca, liderada por Lucio Costa e Oscar Niemeyer e fortemente influenciada pelo arquiteto franco-suíço Le Corbusier, ganha reconhecimento internacional. Os ecos da escola carioca na Bahia se farão sentir seja através de obras projetadas por profissionais formados e sediados no Rio de Janeiro, como os arquitetos José Bina Fonyat Filho (Teatro Castro Alves, 1957), Paulo Antunes Ribeiro (edifício Caramuru, 1949; agência do Banco da Bahia em Ilhéus, 1951), Jorge Machado Moreira (Sanatório de Triagem do Parque Sanatorial Santa Terezinha, 1951) e Hélio Uchôa (Conjunto Residencial do IAPI, 1952) e o paisagista Roberto Burle Marx (reforma do Terreiro de Jesus, 1950), seja por meio de profissionais locais, como Diógenes Rebouças (Hotel da Bahia, com Paulo Antunes Ribeiro, 1952; Centro Educacional Carneiro Ribeiro, 1950-1964; Escola Politécnica da UFBA, 1960) e a dupla Antônio Rebouças e Lev Smarcevscki (diversas residências para a burguesia local, construídas no início dos anos 1950).

Figura 02 - Escola Politécnica da UFBA, no bairro da Federação, em Salvador (Fonte: Memorial Arlindo Coelho Fragoso / Escola Politécnica da UFBA)

Como consequência da criação da Universidade da Bahia, em 1946; da incorporação à universidade, dois anos depois, da Escola de Belas Artes (EBA); e da federalização da universidade, rebatizada como UFBA, em 1950, ocorre, nos primeiros anos da década de 1950, a reformulação do curso de arquitetura da EBA. Esse processo, que culminará com a criação da Faculdade de Arquitetura da UFBA, em 1959, transforma um curso incipiente e irregular em um centro de formação de gerações e gerações de arquitetos, tendo Diógenes Rebouças como um dos seus professores mais atuantes.

*Arquiteto e Professor, foi presidente do IAB- Bahia’s

quarta-feira, 10 de agosto de 2022

“Nos tornamos naquilo que nos apegamos”.


Osvaldo Campos Magalhães*
Na língua Tupi-Guarani, existem dois significados para a palavra UBIRAJARA: “Senhor da Lança” e  “Grande Guerreiro”.
Encontrei pela primeira vez o publicitário Ubirajara da Silva Monteiro em 1976, quando fazia estágio numa grande construtora de Salvador e tínhamos frequentes reuniões com a empresa de propaganda contratada, definindo estratégias de lançamento de novos empreendimentos imobiliários.
Nesta época, como prefeito de Salvador, estava o jovem administrador Jorge Hage Sobrinho, e a empresa de Ubirajara, a Denilson Propaganda, era responsável pela publicidade institucional da Prefeitura.  
O ENCONTRO
Dois anos depois, na primeira Praia do Morro de São Paulo, uma família de velejadores, em cinco hobbie kats, escolhem como local de atracação as areias em frente à casa da minha família.
Por coincidência, meu irmão Marcelo, tinha adquirido um hobbie cat, que veio desmontado de Salvador, a bordo da escuna Novo Éolo,  do primo Mauricio Stern.
Os velejadores nos ajudaram a montar o barco e uma garota, Cláudia, da mesma idade de Marcelo, se prontificou a ajudar, nos dando as primeiras noções de como velejar um barco tão ágil e rápido.
Cláudia, era a filha caçula de Ubirajara.
Carioca, nascida no bairro de Santa Tereza, era bem diferente de todas as garotas que tinha conhecido. Alegre, extrovertida e extremamente espontânea, logo cativou minha atenção.
Nunca tinha velejado num barco tão ágil e rápido. O hobbie cat é um pequeno catamarã, muito leve e veloz, e, com qualquer descuido, o barco vira e o mastro fica todo mergulhado, perpendicularmente à lona onde os velejadores se apoiam. Uma das melhores lições que recebemos da jovem velejadora foi justamente a técnica de desvirar o catamarã, colocando o hobbie cat em condição de navegação.
Após 20 dias no Morro de São Paulo, a família Esteves e amigos retornaram a Salvador, deixando saudades, especialmente da jovem velejadora.
A MUDANÇA NA PREFEITURA
Sendo obrigado pelo General Golberry do Couto e Silva a exonerar o Prefeito Jorge Hage, o governador Roberto Santos encaminha alguns nomes à Casa Civil da Presidência da República, visando obter autorização para a nomeação do novo prefeito de Salvador. Vivíamos em plena ditadura militar e tanto o governador da Bahia como o prefeito de Salvador eram escolhidos pelo Presidente da República, na época, o general Ernesto Geisel.
O candidato preferido do governador era o Secretário da Educação, Carlos Santana mas, o escolhido foi o Deputado Federal Fernando Wilson.

Assumindo o cargo de Prefeito de Salvador, o Deputado Fernando Wilson reformulou todo o secretariado, mas, manteve a Denison Propaganda como empresa responsável  pela publicidade institucional da Prefeitura de Salvador.
UBIRAJARA
Nascido no Rio de Janeiro, começou a trabalhar muito cedo, na empresa de publicidade americana MacCann Eriksson.
Criada no ano de 1930 em plena Madison Avenue, Nova York, Estados Unidos, a McCann-Erickson nasceu como fruto da fusão entre duas pequenas agências: a Erickson Company, fundada em 1902, e a HK McAnn Company, de 19121. Chegou ao Brasil em 1935, em pleno Carnaval, no Rio de Janeiro, sob a condição de ser agência que cuidaria da conta da Esso, braço latino-americano do conglomerado Standard Oil, que tinha Nelson Rockfeller como um de seus sócios-proprietários.
Sob a direção de Armando de Moraes Sarmento, a filial brasileira chegou a ser dona de um invejável carteira de clientes, na qual figuravam, para além da Esso, nomes como Coca-Cola, Colgate-Palmolive (antiga American Home), Anderson Clayton, Goodyear, Nestlé, entre outros (RAMOS, 1985). A McCann-Erickson também marcou o desenvolvimento da propaganda no Brasil a partir da introdução de novos instrumentos de análise de audiência, pesquisas de opinião, programas e telejornais patrocinados para o rádio, incluindo o popular “Repórter Esso”, além de no uso de novos veículos de mídia, como o outdoor.
Ubirajara, já com grande conhecimento e experiência, ingressa na Denison Propaganda, fundada em 1957, no Rio, como house-agency da Ducal.
Seus fundadores, foram os  publicitários Jurandir Ulisses Arce e Sepp Baendereck, que estavam na Ás Propaganda, pequena agência fundada no início dos anos 50.
Como agência do Grupo Ducal, cujas empresas eram sempre batizadas com nomes iniciados por "D", a nova agência foi batizada em homenagem ao diretor da J.Walter Thompson no Rio Robert Dennison, que nunca teve nada a ter com ela. 
Chegou a ser uma das mais importantes agencias brasileiras. Teve depois como sócios Oriovaldo Vargas, Sérgio Ferreira, Hector Brenner e Celso Japiassú. Teve escritórios no Rio, São Paulo, Brasilia, Pernambuco e Bahia.
Ubirajara foi o diretor da Denison Propaganda no Nordeste por mais de 15 anos, inicialmente a partir de Recife e depois em Salvador. Nessa época, eram poucas as Agências de Publicidade locais e a Denison detinha uma grande carteira de clientes, entre eles a Prefeitura de Salvador.
MORRO DE SÃO PAULO
Minha família começou a frequentar a ilha de Tinharé, no município de Cairu, na primeira metade da década de cinquenta. Um grupo de moradores da cidade de Cruz das Almas foram os primeiros a construírem casas de veraneio na primeira praia. A irmã de meu pai, Lúcia, era casada com um alemão, Hebert Stern, que trabalhava na fábrica de charutos Suerdick e morava em Cruz das Almas. O tio Estrela, como o chamávamos, era responsável pela compra da matéria prima das fábricas, a folha de fumo, e meu avô Joaquim Santana, possuía um grande armazém de fumo na cidade de Castro Alves, onde nasci em 1955.
Durante nossa infância e adolescência, íamos veranear no Morro, nos meses de janeiro e fevereiro. Nessa época, o turismo de massa ainda não tinha chegado e a ilha, com suas extensas praias repletas de corais, ainda era um paraíso deslumbrante com uma rica diversidade de vida marinha. Nas noites de lua nova, as praias eram invadidas pelas “pata-chocas” (guaiamuns), e durante o dia, com a maré vazia, os pescadores capturavam moluscos para o sustento das famílias.
O REENCONTRO
Voltando das férias de dois meses no Morro de São Paulo, retomei o contato com a jovem velejadora e logo começamos a namorar. Ainda não sabia da relação empresarial de Ubirajara com a Prefeitura, situação que perdurou por vários meses, até que, num belo dia de sol, o prefeito foi à ilha de Maré inaugurar obras de saneamento e iluminação pública. Acompanhei meu pai  no evento. Fomos numa escuna alugada pela prefeitura.  Ubirajara foi um dos precursores da transformação dos grandes Saveiros em escuna e se dirigiu à ilha de Mare com toda família e alguns colaboradores da Denilson na sua escuna, cujo nome era Porreta.  Era grande, toda branca, com dois mastros e bastante veloz.
Nessa época, estaleiros em Valença e Cajaiba eram responsáveis pela construção da maioria das escunas na Bahia. Empresas de turismo como a LR possuíam grandes frotas de barcos que eram alugadas a turistas de outros estados e países.
Ao me encontrar com Cláudia na ilha de Maré, o que era secreto passou a ser do conhecimento das duas famílias, que apoiaram e incentivaram. Apesar de muito jovem, Cláudia era muito madura e confiante.  Passamos a frequentar as casas das duas famílias e ganhamos autorização para viajarmos juntos nos grandes feriados. Além do Morro de São Paulo, viajávamos à Fazenda da família em Castro Alves e ao vilarejo da Mombaça, local onde nasceu minha mãe.
SÃO FRANCISCO DA MOMBAÇA 
Localidade fundada pela família do meu bisavô João Coni, italiano nascido em Rofrano, que veio ao Brasil ainda adolescente com o tio Nicolau disposto a iniciar uma nova vida.
O vilarejo, hoje com cerca de 800 habitantes e pertencente ao município de Conceição do Almeida, conserva seu casario do começo do século passado (parte dele ainda pertencente aos Coni), sua capela, o campinho de futebol e nome da família espalhado nas placas de rua e praça. As casas em estilo colonial grudadas na frente se abrem para os fundos em amplos horizontes verdes, com páteos e jardins. Na frente um enorme quadrado verde que faz lembrar Trancoso pré-turismo predatório. Ali não tem praia por isto não tem pousadas. Mas tem meninos jogando futebol no fim de tarde, muitos canários da terra, sabiás e bem-te-vis.
Adorávamos viajar até a Mombaça, especialmente na Semana Santa e no São João, onde ocorriam festas populares e éramos recebidos pela saudosa avó Belita.
Após seis meses de namoro, e com a minha formatura em julho de 1979, os laços familiares se estreitaram e, com uma oferta de trabalho concretizada na Natron Engenharia e Projetos, já vislumbrava a possibilidade de ter meu próprio apartamento e maior independência da família. Coincidentemente, dois meses depois da minha formatura, Ubirajara me leva a conhecer um apartamento que havia adquirido da Construtora Lebram (um dos clientes da Denison), na avenida Cardeal da Silva, próximo ao Condomínio Pedra da Marca, um dos mais luxuosos e privativos de Salvador.

Dizem que o amor energiza e nos enche de vitalidade e felicidade. Foram meses bastantes especiais, que jamais iríamos esquecer.
A PARTIDA
Quarenta e dois anos depois, me encontro agora em São Pedro da Serra, com Cláudia e sua mãe Maria Luiza. Ubirajara faleceu em 2018, vítima de câncer. Depois de aposentado decidira se mudar do Rio de Janeiro para Nova Friburgo, no distrito de São Pedro da Serra, onde construiu uma bela e aconchegante pousada, a Galo da Serra.
Uma de suas grandes paixões era a literatura e a figura de Dom Quixote era uma presença constante. Colecionava diversas esculturas, em metal e madeira e se identificava muito com o personagem.

“Que a narrativa do engenhoso fidalgo de La Mancha é cativante, todos sabem. O que poucos conhecem, no entanto, são os recursos que a obra detém no sentido de realimentar em seus leitores, em diferentes épocas da história da humanidade, uma verdadeira “paixão” pela história e pelas personagens que empreendem uma longa andança pela Espanha, no limiar dos séculos XVI e XVII. Um cavaleiro e seu escudeiro que, em busca de aventuras, vão travando uma longa amizade pautada pela lealdade entre o louco ou o ingênuo sonhador e seu fiel, desastrado e também perspicaz escudeiro. Amizade esta, considerada como uma das mais bem representadas em toda a literatura.”

Ubirajara sempre foi fascinado pelos saveiros  da Bahia, as escunas e nosso litoral. Para atender o desejo da esposa, Maria Luísa, decidiu, depois de aposentado, viver na serra fluminense. Em São Pedro da Serra, Ubirajara se tornou apicultor, criador de patos (para a alegria dos netos), cafeicultor e fundou a ACISPS, Associação Comercial e Industrial de São Pedro da Serra. Lia diariamente “O Globo” e a “Folha de São Paulo”, que um amigo motorista de ônibus trazia para ele de Nova Friburgo. Gostava de um bom vinho e das deliciosas tilápias produzidas na região serrana. Viveu a vida intensamente, deixando saudades e muitos amigos.

*Osvaldo Campos Magalhães, casado com Cláudia, é pai de Pedro e Mariana, e avô de Letícia e Luca. Terceiro filho de Sônia e Fernando Wilson Magalhães 

** “Nos tornamos naquilo que nos apegamos” - Miguel de Cervantes

Festa da Boa Morte




Eduardo Araujo
*

Festa da Boa Morte, ou Festa de Nossa Senhora da Boa Morte, é uma tradicional comemoração religiosa afro-brasileira, que ocorre anualmente e é organizada pela Irmandade da Boa Morte, ocorre no município de Cachoeira, Bahia. De caráter secular, essa festividade popular se dá no dia 13 de Agosto, inclui missa, samba e serve-se comida. O dia 15 de Agosto é dedicado a Nossa Senhora. A festa se prolonga até o dia 17 de Agosto.

É um patrimônio cultural imaterial estadual, tombado pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC), sob o Decreto Estadual de nº 12.227/2010. É  um evento que envolve o sincretismo entre o catolicismo e o candomblé. É uma festividade de grande relevância para a cidade de Cachoeira e desperta interesse, nacional e internacional.

A Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte, composta por mulheres negras, senhoras, devotas à Nossa Senhora e com ligação ao candomblé, organizam e realizam as festividades em homenagem a Nossa Senhora da Boa Morte e da Glória, desde 1820. O objetivo das integrantes era a compra da liberdade de pessoas escravizadas e organização de funerais dignos, além de ajudarem na fuga desses sujeitos para Quilombos da região.

*Tela do artista baiano Sérgio Amorim.

Aleixo Belov: Navegador dos sete mares


Beto Benjamim e Osvaldo Magalhaes*
Você acredita que esse engenheiro baiano, nascido na Ucrânia, construiu um barco com 11 m de comprimento – o Três Marias – , no quintal de sua casa em Salvador e se lançou ao mar, em 16 de março de 1980, numa aventura que durou quatorze meses, percorreu 26 mil milhas náuticas e visitou dezessete portos, sozinho? Pois bem, Aleixo Belov foi o primeiro velejador brasileiro a completar uma volta ao mundo em solitário, num barco à vela, numa época em que não existia o GPS (Sistema de Posicionamento Global) para navegação. Ele se valeu da navegação astronômica, usando o sextante, se orientando de dia pelo sol e à noite pelos astros. Como se vê não era uma aventura para qualquer um… Navegar é preciso!
Sua primeira volta ao mundo precisou de muito planejamento, organização, experiência mas, sobretudo coragem. Ele mesmo conta que a viagem foi cheia de emoções e muitos riscos. Ao regressar a Salvador 14 meses depois, Aleixo recebeu um Diploma da Marinha brasileira e escreveu A Volta ao Mundo em Solitário, seu primeiro livro, contando com detalhes essa aventura pelos mares do mundo. Tendo apreciado a viagem de barco por tantos portos e mares e, se saído muito bem dessa primeira expedição, Aleixo ainda deu mais duas voltas ao mundo em solitário: uma em 1986 e outra em 2000 que ele descreve nos seus livros. E não parou quieto. Em 2010 surpreendeu novamente, realizando um novo sonho: construiu outro barco, desta vez de aço – o veleiro-escola Fraternidade -, bem maior que o primeiro e, lá se foi para mais uma volta ao mundo, desta vez levando a bordo jovens brasileiros, selecionados num concurso nacional, para ensinar-lhes a arte da navegação e o gosto pelo mar. Aleixo partiu para sua primeira viagem como engenheiro e velejador. Voltou escritor. Foram ao todo seis livros, até agora, narrando suas aventuras, reflexões, encontros, visitas e sobretudo seu diálogo interior, na busca de entender o sentido da vida e seus limites. Em 2013, zarpou mais uma vez de sua amada Salvador para fazer uma viagem de cinco meses à Antártida – a bordo do Fraternidade – acompanhado por nove tripulantes. Uma aventura e tanto, com travessias perigosas e paisagens incríveis daquele mundo gelado, misterioso, belo e pouco conhecido.
 Neste momento, Aleixo Belov, mais uma vez a bordo do veleiro Fraternidade, empreende a mais audaciosa de suas excursões, atravessar o estreito de Bhering e completar o percurso da rota Noroeste, do Alaska, passando pela Groelandia, até a costa leste americana. A Passagem Noroeste consiste numa série de canais profundos entre as ilhas que compõem o Arquipélago Ártico Canadense. Tem cerca de 1450 km de comprimento. Tem-se falado muito na possibilidade da passagem se abrir por causa do efeito de aquecimento global, e consequente degelo, o que diminuiria consideravelmente o trajeto marítimo entre a Europa e a Ásia.
Até recentemente, essa rota só era praticável por navios com potência suficiente para quebrar gelos e durante os meses mais quentes do Verão ártico; no entanto, a ESA [1] (European Space Agency) divulgou recentemente que a passagem está aberta e limpa de gelo, tendo divulgado fotografias de satélite que mostram que o degelo levou à abertura da passagem. O gelo do Ártico derreteu dez vezes mais depressa do que no ano anterior, o que foi decisivo para esta inesperada abertura da Passagem do Noroeste (os cientistas previam que tal só acontecesse algures durante as próximas duas décadas).

Aleixo já percorreu metade do percurso planejado da rota Noroeste,  estando atualmente no Porto de Cambridge Bay, ao norte do Canadá, de onde seguirá até a Groenlândia.
*Engenheiros Civis, ex alunos de Aleixo Belov na Politécnica