quinta-feira, 7 de abril de 2011

Salvador 462 anos: bela e desigual


Eliane Costa*
Primeira capital do Brasil. Cantada em prosa e versos por suas belezas naturais. Plural e diversa. Desigual acima de tudo. Assim é Salvador, que completou 462 anos nesta terça-feira (29/3), sem muito que comemorar. A terceira maior cidade do Brasil tem sérios problemas de mobilidade urbana, um grande déficit habitacional, um grande contingente de desempregados, sistemas deficientes de educação e saúde, além de passas por uma das maiores crises políticas e administrativas de sua história. Trânsito caótico, transporte público de péssima qualidade, insegurança e vias cheias de buracos fazem parte da realidade da população. Quem tem carro passa longos períodos em congestionamentos e quem não tem, sofre ainda mais para chegar ao trabalho ou retornar para casa no final do expediente. O governo federal até disponibilizou recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para o desenvolvimento de um projeto de mobilidade urbana para a cidade, que será uma das sub-sedes da Copa do Mundo de 2014, mas até o momento os gestores ainda não conseguiram decidir que tipo de projeto será construído. A dificuldade de escolha entre o BRT (Bus rapid transit) e o VLT ( Veículos leves sobre trilhos) emperra os projetos, levando a população a permanecer nas filas, nos congestionamentos e nos ônibus superlotados. Isso sem falar no metrô, que está em construção a mais de dez anos. Outra grande carência de Salvador é de moradia. O déficit gira em torno de 100 mil casas, o que engloba as pessoas que vivem de aluguel ou em moradias precárias. Em 2006 a Prefeitura até elaborou um Plano Municipal de Moradia, mas mudou de idéia em 2008, extinguiu a Secretária de Habitação e engavetou o plano, assim como diversos outros projetos da área. Enquanto isso, as encostas desabam todos os anos, matando pessoas, que sem assistência voltam para o mesmo local após as chuvas e são vitimadas várias vezes pelos mesmos problemas. Tem ainda as cinco mil famílias que vivem nos acampamentos dos sem-tetos pela cidade, a população que vive nas ruas, os que moram de favor e os que moram em outras localidades, por falta de habitação na capital.

Falta tudo A falta de indústrias e grandes pólos de produtivos também dificulta a vida de quem mora em Salvador. A cidade vive essencialmente do comércio e do serviço, que não conseguem gerar os empregos necessários paras os 2,9 milhões de habitantes. O resultado é um índice de desemprego em torno de 10% da população economicamente ativa, uma estimativa de 250 mil trabalhadores sem emprego na Região Metropolitana. Saúde e educação também sofrem com a falta de investimentos. A população é penalizada pelos postos de saúde em condições precárias, profissionais em greve por melhores salários e condições de trabalho e a inexistência de hospitais municipais. Soma-se a isso, a troca constante de comando na Secretaria de Saúde. Na educação, a situação não é muito diferente. Faltam professores, cadeiras para os estudantes, muitas escolas estão mal conservadas e os servidores da área não têm política de valorização do seu trabalho. Como resultado: a evasão e a repetência dos alunos.

Crise geral Todas estas questões têm a mesma causa: a gestão confusa do prefeito João Henrique Carneiro (PP). Eleito em 2004 com a promessa de libertar a cidade do atraso dos governos carlistas. JH mudou de rumo no meio do caminho. Trocou o PDT pelo PMDB, brigou com os partidos que apoiaram a sua eleição e deu uma grande guinada à direita. Mudou projetos, trocou secretários por diversas vezes e aceitou até o apoio do DEM para se reeleger em 2008. No final de 2010, nova mudança. As brigas com a direção do PMDB se tornam pública e João Henrique é convidado a deixar o PMDB. Logo depois se declarou apaixonado pelo PV, mas acabou se filiando ao PP. Neste entremeio, teve suas contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas dos Municípios, enfrentou várias denúncias de corrupção envolvendo membros do seu governo, aprovou um Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU) sem discussão com a população e foi acusado diversas vezes de ter entregue a cidade às grandes construtoras. Em meio à crise política, fez diversas mudanças no secretariado, enfrenta uma crise financeira sem precedentes e corre o risco de ficar inelegível por oito anos, caso a Câmara de Vereadores aprove o relatório do TCM, que reprovou suas contas. Nesta terça-feira, o prefeito João Henrique divulgou uma mensagem comemorando os 462 anos de Salvador. Mas, sinceramente o que a população quer de presente não está mais ao alcance de JH. O povo de Salvador quer um novo projeto de administração da cidade, voltado para todos, sem exceção. Que garanta saúde, moradia, educação, transporte público de qualidade e o direito de ir e vir de toda a população. Ano que vem tem eleição e a expectativa é de que daqui a dois anos, a cidade tenha mais o que comemorar.

* Jornalista e escritora

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