Antônio Risério
Gostei muito – muito mesmo – do artigo que Paulo Ormindo publicou , no dia 23 de julho. Paulo Ormindo é sério, sabe do que está falando e apresenta dados numéricos para comprovar suas afirmações. Bem que podia ser nosso prefeito. Mesmo porque o que temos hoje, em tal cargo, é um sonâmbulo que mal tem alguma ideia de si mesmo. Da cidade, não entende nada. Em vez de encarar seus problemas, brinca de fincar postezinhos azuis. Como se isso aqui fosse um joguinho qualquer. E nós fôssemos idiotas.
Quando Paulo Ormindo diz que, hoje, temos mais de quatro mil habitantes por km², me fez lembrar do Mike Davis de Planet of Slums. Porque a grande densidade demográfica de Salvador está nas favelas (já não distingo hoje, praticamente, entre favela e bairro popular – e a favelização dos conjuntos habitacionais é evidente), com casas enganchadas umas nas outras. E a verticalização, que substituiu o “puxadinho” pela laje. Enquanto isso, os mais ricos se esparramam em seus condomínios. Basta comparar o fim de linha de Pernambués com o Encontro das Águas, por exemplo (e nem venham me falar que este condomínio fica em Lauro de Freitas: precisamos, hoje, de uma autoridade metropolitana).
O que Mike Davis faz é uma previsão lógica. Ele indica ou descortina, nas favelas, a característica dominante do futuro urbano no hemisfério sul – no mundo externo ao círculo das democracias ricas do Atlântico Norte. Nas cidades e megacidades dos países pobres ou em desenvolvimento, as invasões de terras para autoconstrução de moradias, os assentamentos informais da “urbanização pirata”, cresceram, crescem e estão crescendo a uma velocidade estonteante. Mike Davis lembra que, desde 1970, o crescimento das favelas tem ultrapassado a urbanização “per se”. Não sei os dados exatos de Salvador. Gostaria de saber. Mas basta olhar em volta.
Sei, o problema não é somente nosso. Na Índia e na China, o crescimento das favelas é espantoso. Na África, a situação é extrema: as favelas crescem duas vezes mais rápido do que as cidades do continente. Luanda e Lagos são, sem tirar nem pôr, dois grandes favelões.
Mas aqui mesmo, no Brasil, vejam os casos de São Paulo e da Amazônia. Até a década de 1970, a população favelada de São Paulo era pouco mais do que estacionária, crescendo vegetativamente. De lá para cá, a coisa disparou. Na Amazônia, urbanização e favelização são sinônimos. E nada disso livra a cara da gente. Salvador poderia ter crescido de um modo harmônico. O problema é que a cidade está entregue, há anos, a quem não sabe como administrá-la e a quem só pensa em lucrar com a nossa degringolada urbana.
Isso aqui, hoje, é uma vergonha. E é muita cara-de-pau alguém ter a coragem de dizer que é o seu prefeito. Prefeito de que? Lídice deixou que fizessem aquela porcaria do Aeroclube (e havia um projeto maravilhoso de Lelé para o local, uma espécie de duna “high-tech”). Já Imbassahy só se empenhou em fazer coisitas de fachada. Colocava papel de parede em muros rachados. E, com esse cara que está aí, a coisa só fez piorar. Contamos, hoje, com o pior prefeito que esta cidade já teve. Se vocês o elegeram, problema vosso. O diabo é que eu e Paulo Ormindo também moramos aqui, nesse arremedo encalacrado de região metropolitana.
As favelas proliferam, com a sua “arquitetura possível” (Ermínia Maricato), configurada em situação de dominação social e opressão cultural. Tomam a parte baixa do Bonfim (olhem desde a igreja, por favor), ocupam expansivamente o Calabar, estiram-se por Pernambués, avançam pela Avenida Paralela. Diz Paulo Ormindo que a nossa carência habitacional é de cem mil moradias. A prefeitura tem algum projeto para isso? Não. Nem a prefeitura, nem os nossos (vossos) vereadores. Longe estão, ambos, de ter vergonha na cara. Se um brinca de pauzinhos azuis, a outra entrega a cidade à especulação imobiliária.
Pelo andar da carruagem social e política, só nos vai restar cumprir a antevisão de Mike Davis. Hoje, Bombaim (Mumbai) é a capital mundial das favelas. Salvador, com suas ruas esburacadas, desfazendo-se a cada chuva, corre atrás. Vamos mesmo de mal a pior. Sem prefeito que saiba ser prefeito e sem vereadores que mereçam esse título. Sem cidadãos?
Transcrito do Blog Jeito de Viver- artigo publicado na página de Opinião do jornal A Tarde de 1.8.2009. O texto de Paulo Ormindo a que Risério se refere, “Salvemos Salvador, enquanto é tempo”, foi publicado também neste blog.
Gostei muito – muito mesmo – do artigo que Paulo Ormindo publicou , no dia 23 de julho. Paulo Ormindo é sério, sabe do que está falando e apresenta dados numéricos para comprovar suas afirmações. Bem que podia ser nosso prefeito. Mesmo porque o que temos hoje, em tal cargo, é um sonâmbulo que mal tem alguma ideia de si mesmo. Da cidade, não entende nada. Em vez de encarar seus problemas, brinca de fincar postezinhos azuis. Como se isso aqui fosse um joguinho qualquer. E nós fôssemos idiotas.
Quando Paulo Ormindo diz que, hoje, temos mais de quatro mil habitantes por km², me fez lembrar do Mike Davis de Planet of Slums. Porque a grande densidade demográfica de Salvador está nas favelas (já não distingo hoje, praticamente, entre favela e bairro popular – e a favelização dos conjuntos habitacionais é evidente), com casas enganchadas umas nas outras. E a verticalização, que substituiu o “puxadinho” pela laje. Enquanto isso, os mais ricos se esparramam em seus condomínios. Basta comparar o fim de linha de Pernambués com o Encontro das Águas, por exemplo (e nem venham me falar que este condomínio fica em Lauro de Freitas: precisamos, hoje, de uma autoridade metropolitana).
O que Mike Davis faz é uma previsão lógica. Ele indica ou descortina, nas favelas, a característica dominante do futuro urbano no hemisfério sul – no mundo externo ao círculo das democracias ricas do Atlântico Norte. Nas cidades e megacidades dos países pobres ou em desenvolvimento, as invasões de terras para autoconstrução de moradias, os assentamentos informais da “urbanização pirata”, cresceram, crescem e estão crescendo a uma velocidade estonteante. Mike Davis lembra que, desde 1970, o crescimento das favelas tem ultrapassado a urbanização “per se”. Não sei os dados exatos de Salvador. Gostaria de saber. Mas basta olhar em volta.
Sei, o problema não é somente nosso. Na Índia e na China, o crescimento das favelas é espantoso. Na África, a situação é extrema: as favelas crescem duas vezes mais rápido do que as cidades do continente. Luanda e Lagos são, sem tirar nem pôr, dois grandes favelões.
Mas aqui mesmo, no Brasil, vejam os casos de São Paulo e da Amazônia. Até a década de 1970, a população favelada de São Paulo era pouco mais do que estacionária, crescendo vegetativamente. De lá para cá, a coisa disparou. Na Amazônia, urbanização e favelização são sinônimos. E nada disso livra a cara da gente. Salvador poderia ter crescido de um modo harmônico. O problema é que a cidade está entregue, há anos, a quem não sabe como administrá-la e a quem só pensa em lucrar com a nossa degringolada urbana.
Isso aqui, hoje, é uma vergonha. E é muita cara-de-pau alguém ter a coragem de dizer que é o seu prefeito. Prefeito de que? Lídice deixou que fizessem aquela porcaria do Aeroclube (e havia um projeto maravilhoso de Lelé para o local, uma espécie de duna “high-tech”). Já Imbassahy só se empenhou em fazer coisitas de fachada. Colocava papel de parede em muros rachados. E, com esse cara que está aí, a coisa só fez piorar. Contamos, hoje, com o pior prefeito que esta cidade já teve. Se vocês o elegeram, problema vosso. O diabo é que eu e Paulo Ormindo também moramos aqui, nesse arremedo encalacrado de região metropolitana.
As favelas proliferam, com a sua “arquitetura possível” (Ermínia Maricato), configurada em situação de dominação social e opressão cultural. Tomam a parte baixa do Bonfim (olhem desde a igreja, por favor), ocupam expansivamente o Calabar, estiram-se por Pernambués, avançam pela Avenida Paralela. Diz Paulo Ormindo que a nossa carência habitacional é de cem mil moradias. A prefeitura tem algum projeto para isso? Não. Nem a prefeitura, nem os nossos (vossos) vereadores. Longe estão, ambos, de ter vergonha na cara. Se um brinca de pauzinhos azuis, a outra entrega a cidade à especulação imobiliária.
Pelo andar da carruagem social e política, só nos vai restar cumprir a antevisão de Mike Davis. Hoje, Bombaim (Mumbai) é a capital mundial das favelas. Salvador, com suas ruas esburacadas, desfazendo-se a cada chuva, corre atrás. Vamos mesmo de mal a pior. Sem prefeito que saiba ser prefeito e sem vereadores que mereçam esse título. Sem cidadãos?
Transcrito do Blog Jeito de Viver- artigo publicado na página de Opinião do jornal A Tarde de 1.8.2009. O texto de Paulo Ormindo a que Risério se refere, “Salvemos Salvador, enquanto é tempo”, foi publicado também neste blog.
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