Marco Aurélio Luz *
Em 1974 o Ilê Aiyê trouxe o "mundo negro" para o carnaval transformando-o num turbilhão dos blocos afro. Com ele vieram posteriormente outros tantos: Olodum, Muzenza, Malê de Balê, Araketu, Badauê, Oba Dudu, Oba L'aiyê, Oju Oba, Bankoma etc. Com eles, a expressão da afirmação existencial da comunidade negra apoiada pelos valores do riquíssimo legado da civilização negro africana.
O Ilê Aiyê manteve-se como "o mais belo dos belos", pelo conjunto de beleza desfilando com impávido orgulho de sabedoria negro africana encantando a todos.
A presença da Iyalorixá Gitolú D. Hilda, mãe do líder fundador Antônio Carlos Vovô, gerou um calendário de atividades culturais destacando-se "A Noite da Beleza Negra". Nessa atmosfera, foi constituída toda uma original e criativa linguagem própria, na música, na bateria, nas danças, nas roupas e suas estampas, nos penteados, turbantes etc.
Em 1979 foi fundado o Olodum. Depois de Petu e Jair chegou João Jorge vindo do Ilê Aiyê e juntamente com Neguinho do Samba e Lazinho, proporcionaram um calendário de atividades, como o Festival Femadun, e um mar de criatividade musical.
A genialidade de Neguinho do Samba proporcionou a criação do gênero samba reggae e implantou a forma orquestral do Olodum, constituindo sua principal identidade.
As interpretações intensas e originais do canto de Lazinho combinaram com a excelência das músicas e das letras dos compositores do Olodum, de temáticas variadas.
A letra do clássico "Revolta Olodum", de autoria de José Olissam e Domingos Sérgio, revela de forma magnífica uma condensação das revoltas contra as injustiças perpetradas contra o povo do Nordeste. O panorama histórico abrange o Palmares de Zumbi que comandou "exército de ideais, libertador", passando pela Balaiada, Revolta Malê, Canudos de Antônio Conselheiro, o sertão de Lampião, Maria Bonita e Corisco... com música pertinente encerrando com a onomatopeia do som das metralhadoras.
A obra de Cheikh Anta Diop revelando o Egito Negro Faraônico repercutiu em toda comunidade afro descendente. O Egito, antigo berço da civilização, é negro africano.
O Olodum celebrou e divulgou na Bahia e no Brasil a temática que envolveu o desfile "Faraó". A excelente composição de Luciano Gomes fez de "Faraó" um clássico que atravessou fronteiras. Na letra, dimensões civilizatórias se apresentam: religião, mitologia, arquitetura das poderosas pirâmides, a esfinge de Gizé... Tornou-se a principal música e a essência original do Olodum.
"E a terra tremeu e o céu mudou de cor" anunciou o bloco afro Muzenza, investindo num sonho de liberdade, vulcão de criatividade, beleza, alegria e sabedoria que abalou as ruas de Salvador carnavais afora.
* Doutor em Comunicação, licenciado em Filosofia, professor, escritor, escultor | maolluz@terra.com.br
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