terça-feira, 12 de maio de 2015

Acrópole e suas Atalaias


Paulo Ormindo* 

No último dia 20 participei conjuntamente com a Profa. Elizabete Pereira dos Santos e do consultor Pedro Bettencourt Correia do seminário “Ambiente e Cultura Soteropolitana” dentro do programa Salvador 500 da Prefeitura Municipal. Para ligar estes dois temas fui buscar inspiração em Atenas, na acrópole. São poucas no mundo e Salvador foi uma das mais belas. Ambas nasceram como fortaleza e se transformaram em sede do poder político, religioso e cultural de seus países. Impossível separar o acidente natural da construção cultural. 
Todos os viajantes que por aqui passaram desde o século XVI se encantaram com a implantação de Salvador no bordo de uma falha geológica e a exuberante vegetação de sua encosta. Prova disto são os numerosos prospectos da cidade vistos da Baia de Todos os Santos de gravadores holandeses no século XVII, de José Antonio Caldas um século depois, de Vilhena no início do XIX e dos fotógrafos do final do mesmo século que retrataram Salvador. Não menos abundantes são os depoimentos escritos de viajantes, especialmente no século XIX. 
Ha também registros da visão da Bahia de Todos os Santos desde a acrópole. São panorâmicas das ladeiras da Barra, Gamboa, Pau da Bandeira, Montanha, Conceição e São Caetano e de atalaias como as das praças Municipal, da Sé e Santo Antonio, dos largos da Vitória, Aflitos, do Teatro e da Lapinha, do Passeio Público, Convento de Santa Tereza, Colina do Bonfim e Mont’Serrat que controlavam as interações marítimas, comerciais e culturais de Salvador com o mundo e as cidades do Recôncavo, antes da hegemonia do automóvel e do avião. Dentre os depoimentos escritos destaca-se o dos naturalistas Spix e Martius sobre o Passeio Público deslumbrados com sua vegetação e beleza. 
A paisagem cultural é hoje uma das categorias de bens incluídos na Lista do Patrimônio Mundial da Unesco e a cidade do Rio de Janeiro foi considerada como tal em 2012. Poderíamos ter sido também, se a especulação imobiliária, com a conivência das autoridades municipais, não tivesse destruído esta relação a partir da década de 60 e transformado a Vitória em uma paliçada de concreto. 
Lembro-me da baia com suas velas estufadas vista do Corredor da Vitória, através dos jardins de suas viletas. Hoje quando vou ao apartamento de alguns amigos já não vejo o mar e me pergunto se não estou em São Paulo ou Belo Horizonte. Emparedaram a Vitoria e estão acabando com a mata de sua encosta com planos inclinados e teleféricos de uso bissexto na ganancia de privatizar a paisagem e o verde de marinha. Emparedaram também o Passeio Público e a Lapinha. Para se ver a Baia de Todos os Santos restam poucos logradouros. Mas não podemos permitir que acabem com tudo. 
Mais um desses mirantes está sendo emparedado, o da Rua Aloisio de Carvalho, transversal do Corredor da Vitória. Sobre o status desse terreno há dúvidas, mas mesmo que seja privado caberia ao poder público desapropria-lo ou fazer a transferência do direito de construir, como prevê o Estatuto da Cidade nesses casos. Urge que a Prefeitura tome uma providência, como fez o IPHAN, no caso da Mansão Wildberguer, exigindo a preservação do mirante da Vitória
* Arquiteto. 
SSA: A Tarde, 10/05/15

segunda-feira, 11 de maio de 2015

Mais que nunca, pais precisa de reformas


Marcelo Bahia Odebrecht*
O Valor, com sua cobertura equilibrada, tornou-se nos últimos 15 anos termômetro de referência e leitura obrigatória para o empresariado, contribuindo para a consciência do quão desafiador é o contexto atual, mas também de que os desafios atuais não são maiores do que os do passado.
Em 2000, quando foi criado o Valor, a Odebrecht sofria com a crise dos países emergentes. Éramos pouco mais de 20 mil integrantes, e faturávamos R$ 8 bilhões. O Brasil, por sua vez, tinha uma projeção econômica e geopolítica limitada. Estávamos, contudo, sem saber, no início de um virtuoso ciclo de crescimento. A Odebrecht, com uma sólida cultura empresarial e pessoas integradas e motivadas, estava posicionada para capturar os ganhos do crescimento que viria. O Brasil, por sua vez, tinha feito o dever de casa, com instituições e indicadores macroeconômicos sólidos.
O Brasil de hoje, que acompanhamos pelas páginas do Valor, tem outro porte, e melhores indicadores sociais. E nós fomos juntos. Atuamos em vários setores como infraestrutura, petroquímica, ambiental, óleo e gás, agroindustrial, defesa e transportes, em 21 países. Somos quase 200 mil integrantes, faturamos mais de R$ 100 bilhões, e temos mais de 20 milhões de usuários/dia em nossas concessões.
Tornamo-nos referência em sustentabilidade com a inovação do plástico verde, com a maior operação de água de reúso da América Latina, e com projetos reconhecidos como modelos de responsabilidade social e ambiental. E, com forte presença em Miami e Cuba, nos sentimos até partícipes dos novos rumos da geopolítica mundial.
Por outro lado, nunca vivenciamos dores do crescimento tão fortes. O Brasil precisa mais que nunca fazer suas reformas estruturais (Política, Trabalhista, Tributária e Previdenciária). Reformas, que precisam ser feitas olhando o futuro, que devem ser influenciadas, mas não definidas, pelos fatos e desejos do presente.
Precisamos focar no nosso capital humano - educação - e físico - logística, energia, água, saneamento e mobilidade urbana. Nosso mercado de capitais também precisa se fortalecer para permitir investimentos de longo prazo. Precisamos dar um salto em nossa competitividade. E o Valor e seus leitores devem ter um papel ativo nessas mudanças.
Não importam as indefinições. Nossa confiança no futuro continua inabalável, como demonstra o investimento de R$ 11 bilhões que faremos em 2015. Nossa organização e seus integrantes, dos quais muito me orgulho, continuarão perseverando para entregar os resultados esperados, sempre sonhando o sonho de nossos clientes.
*Engenheiro Civil, 44 anos. Nascido em Salvador, preside a Odebrecht S/A

sábado, 9 de maio de 2015

Bahia perde filho ilustre. Rodolpho Tourinho morre aos 73 anos


Daniel Rittner | Valor
O ex-ministro e ex-senador Rodolpho Tourinho Neto morreu quinta-feira, aos 73 anos, no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, onde estava internado para tratamento médico.
Economista, especializado em administração de empresas, Tourinho seguiu extensa carreira nos setores público e privado, com forte atuação também na função de liderança empresarial de importantes setores econômicos. Foi secretário estadual de Fazenda da Bahia (1991-1998), ministro de Minas e Energia (1999-2001) e senador (2003-2007).
Um dos mais fortes representantes do “carlismo” — corrente política ligada ao ex-governador baiano Antônio Carlos Magalhães —, Tourinho construiu sua carreira política no antigo PFL, depois transformado em DEM. Sempre manteve, no entanto, boa interlocução com adversários que militavam em campos opostos.
Graças ao conhecimento técnico, na área de infraestrutura, aproximou-se da presidente Dilma Rousseff nos últimos anos e foi peça-chave no diálogo entre governo e empresariado para os últimos leilões de concessão de rodovias e aeroportos. Ele vinha exercendo a presidência-executiva da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), cargo que ocupava até agora.
No setor privado, também havia sido vice-presidente do Banco Econômico, diretor da construtora OAS e gerente-geral da Bahema. Foi ainda presidente-executivo do Sindicato Nacional da Indústria da Construção Pesada (Sinicon) e membro do Conselho Superior Estratégico e do Conselho de Infraestrutura da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
Rodolpho Tourinho deixa esposa, filhos e netos.

terça-feira, 5 de maio de 2015

Salvador



José de Freitas Mascarenhas*
A cidade de Salvador que tanto amamos é uma cidade estruturalmente pobre: 74,9% da população da sua Região Metropolitana recebia em 2013 até 2 salários mínimos, segundo o IBGE. A cidade ocupava a 17ª posição na classificação das capitais nacionais por rendimento domiciliar médio per capita.
Consequentemente carrega as mazelas da pobreza: em 2012 registrou 16.93 óbitos de suas crianças com até 12 meses de idade por mil nascidos, deixando-a em 24º lugar entre as capitais brasileiras. Florianópolis obteve o primeiro lugar com a metade (8,27) deste valor.
Na área educacional, no mesmo ano, ficou em último lugar entre as capitais com 45,9% dos alunos apresentando idade superior em mais de dois anos em relação à idade ideal para cursar o ensino fundamental da rede pública, segundo o censo escolar do Inep/MEC. No ensino médio este percentual se agrava alcançando 56,1%. O diagnóstico do recente Planejamento Estratégico do Município reconhece esta situação da educação quando aponta que a cidade ocupa o terceiro pior desempenho entre as capitais brasileiras no ensino fundamental com nota 4 no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) de 2011 e o segundo pior desempenho no ensino fundamental II com nota de apenas 2,8.
O Mapa da Violência de 2014 apresenta para todo o Estado da Baia uma taxa de 41,9 homicídios por cem mil habitantes. Salvador apresentou  60,6.
São certamente dados preocupantes para a cidade  que gostaríamos de ter. Por trás disso encontra-se indelével a marca da pobreza: a baixa renda média da sua população e a reduzida atividade de negócios refletida na insuficiente arrecadação municipal.
Quando se compara nos dados da receita municipal, IBGE/2010 último disponível, itens da arrecadação sobre o patrimônio imobiliário (IPTU,ITBI) ou sobre os serviços (ISS) conclui-se pela coerência da posição de Salvador com os valores apresentados por Recife e Fortaleza. Mas quando essa comparação é feita com os valores da atividade econômica (ICMS), Salvador fica atrás das duas em 29,2% e 30,1%. No que diz respeito ao PIB per capita do ano de 2012 novamente Salvador fica atrás delas em 37,9% e 15,3% respectivamente.
Dados da Secretaria do Tesouro Nacional indicam que Salvador investiu em 2012, 4,3% da sua receita, enquanto Recide investiu 8,9% e Fortaleza 7,5%. Naquele ano a média nacional de investimentos públicos municipais superou a marca de 10%.
Fato notório é que Salvador não conta com com receita industrial compatível com a sua expressão econômica, de vez que na sua Região Metropolitana essa atividade está concentrada em municípios como Camaçari, que em 2012 teve renda per capita 238% superior.
Esta situação induz um efeito circular: a população sem renda suficiente não conta com meios para cuidar da sua qualidade de vida principalmente em saúde e educação e sobrecarrega a demanda por assistência social do município que ao atende-la, restringe o investimento que lhe proporcionaria benefícios e conforto. Não há nenhuma solução mágica que possa romper este círculo imediatamente, exceto através de programas de crescimento da renda ou verbas externas para investimentos.
Nada mudando na política fiscal da Federação restam algumas iniciativas a explorar: estimular a realização de investimentos industriais privados e outros negócios nos limites da cidade. Há setores da indústria que podem conviver bem no ambiente urbano sem provocar maiores danos. O correto no entanto seria especializar a área e equipá-la para abriga-los. No possível oferecendo outros incentivos atrativos aos investidores.
Numa segunda linha continuar investindo na qualificação da cidade para o turismo. Salvador tem reconhecidos predicados para desenvolver o setor: sol, geografia, baía com grande potencial de exploração, diversidade cultural, patrimônio histórico e, como marca , um certo misticismo derivado da presença africana que compõe ambiente propício às atividades artísticas.
Mas que não haja ilusão, o turismo de alto padrão não virá para cá sem que estejam resolvidas questões fundamentais como a existência de segurança plena, museus de qualidade, disponibilidade de diversão, bons hotéis e serviços de padrão adequados. Isso tudo não se consegue a curto prazo.
É bem verdade que a cidade está visivelmente melhor e mais bem cuidada. Melhorá-la sempre é crucial. Maior atenção deveria ser dada ao seu planejamento urbano (PDDU) projetando uma cidade atrativa e moderna para seus habitantes. Elevar sua renda vai depender muito do investimento privado. Que certamente fluirá desde que encontre ambiente favorável e gerador de retorno econômico.

*José de Freitas Mascarenhas é Engenheiro Civil e Conselheiro da Odebrecht. Vice presidente da CNI, presidiu a FIEB de 2009 a 2013

segunda-feira, 4 de maio de 2015

A hora e a vez do Plano Metropolitano

Sylvio Bandeira de Mello e Silva* 
Salvador e sua complexa região metropolitana vivem atualmente um grande desafio: o de produzir em três anos um plano metropolitano de desenvolvimento urbano integrado, atendendo ao disposto no recente Estatuto da Metrópole (lei federal nº 13.089 de 12/01/2015). Com efeito, o referido Estatuto dispõe detalhadamente sobre como devem ser as relações interfederativas no contexto de uma região metropolitana brasileira, complementando, em muitas questões, o que estabelece o Estatuto da Cidade.
É evidente que o referido plano metropolitano a ser produzido tem enorme importância, na medida em que irá buscar a solução de muitos problemas que, em conjunto, interessam a todos os municípios metropolitanos (mobilidade, saneamento, segurança, habitação, saúde, educação, lazer, cultura etc.).
Em seu artigo 10º, o Estatuto prevê também que todos os planos diretores dos municípios metropolitanos devem levar em conta o contexto metropolitano, o que já atinge o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU) de Salvador, em processo de elaboração.
Para tanto, temos que resolver antes, na nossa região, um grave problema político e institucional. O Estado da Bahia criou em 13/6/2014 a Entidade Metropolitana da Região Metropolitana de Salvador (lei complementar nº 41), portanto, antes do Estatuto da Metrópole.
O município de Salvador não só não aderiu como entrou, através do DEM/Democrata, o partido do prefeito, com uma ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, alegando violação na autonomia municipal, garantida pela Constituição. Espera-se que o julgamento da ação pelo STF seja feito nos próximos meses.
Assim, é preciso resolver logo a pendência judicial com um acordo de alto nível entre o estado e o município de Salvador, levando em conta a novidade do Estatuto da Metrópole. Uma nova lei estadual poderia ser discutida entre o governo do estado e os municípios metropolitanos, substituindo ou alterando a Lei da Entidade Metropolitana.
Isto permitiria acelerar as atividades de planejamento e de governança metropolitana, priorizando os interesses comuns e visando a necessária melhoria da qualidade de vida da população dos 13 municípios da região metropolitana, hoje com mais de 4 milhões de habitantes.
Em tempo, caso o Plano Diretor não seja produzido em três anos, o governador e o prefeito incorrerão em ato de improbidade administrativa (Art. 19º do Estatuto da Metrópole).
Finalmente, é preciso reconhecer, como o fez David Harvey, que, "numa região metropolitana, devemos considerar a formação da política de coalizão, a formação de uma aliança de classes, como base para algum tipo de empreendedorismo urbano" (A produção capitalista do espaço. São Paulo: Annablume, 2005, p. 171).
E o empreendedorismo urbano, integrado ao processo de planejamento aberto, criativo e participativo, é fundamental para o processo de desenvolvimento metropolitano! Quem dará o primeiro passo entre nós?
|* Doutor em Geografia/Université de Toulouse, professor da Ucsal | sylvioms@ucsal.br

sábado, 2 de maio de 2015

Salve mãe Stella de Oxóssi. 90 anos de sabedoria e fé

O Terreiro Ilê Axé Opô Afonjá, uma das mais importantes casas de candomblé do Brasil, celebra os 90 anos de sua matriarca, Mãe Stella de Oxóssi. Localizado no bairro de São Gonçalo do Retiro, em Salvador, o local recebe a festa, marcada para as 19h deste sábado (2), que contará com a presença de representantes de religiões de matriz africana, além de artistas e autoridades. As homenagens à Ialorixá contam com apoio das Secretarias de Cultura do Estado da Bahia, de Políticas para Mulheres, de Promoção da Igualdade Racial, da Administração e da Casa Civil.
Maria Stella de Azevedo Santos – Iya Odé Kayode – nasceu no dia 2 de maio de 1925, na Ladeira do Ferrão, no Pelourinho, em Salvador. Graduou-se em Enfermagem pela Universidade Federal da Bahia, com especialização em Saúde Pública, Stella exerceu a profissão durante 30 anos. Foi iniciada no candomblé por Mãe Senhora, em setembro de 1939, quando tinha apenas 14 anos. Mãe Stella viajou várias vezes para a África, visando aprofundar os conhecimentos sobre a cultura iorubá e foi a primeira Ialorixá a escrever livros e artigos sobre sua religião. Em 1999, em homenagem aos 70 anos de iniciação de Mãe Stella, o Ilê Axé Opô Afonjá foi declarado patrimônio cultural brasileiro e tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
Já em 2013, a Ialorixá Mãe Stella passou a ocupar o assento de número 33 da Academia de Letras da Bahia, cadeira esta que tem como patrono o poeta Castro Alves, e já foi ocupada por: Francisco Xavier Ferreira Marques, Heitor Praguer Frois, Waldemar Magalhães Mattos, além de Ubiratan, que era presidente da Fundação Pedro Calmon.  Mãe Stella é colunista do jornal A Tarde e autora de livros como “Meu tempo é agora”, “Òsósi – O Caçador de Alegrias” e “Epé Laiyé- terra viva”. Em 2009, recebeu o título de Doutor Honoris Causa da Universidade do Estado da Bahia (Uneb).
Homenagens
Como defensora da cultura negra, Mãe Stella recebeu vários prêmios, homenagens e condecorações, como o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade Federal da Bahia (ao completar 80 anos), o troféu Esso para escritores negros, a comenda Maria Quitéria, o troféu Clementina de Jesus, a comenda da Ordem do Cavaleiro (pelo Governo do Estado da Bahia) e a comenda do Mérito Cultural (pela Presidência da República). Em 2013, foi eleita por unanimidade para a Academia de Letras da Bahia.
*Artigo originalmente publicado no Portal Secult