quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

O desafio da maresia


Na elaboração do PDDU, o lobby imobiliário apostou suas fichas na Orla imaginando que ela seria uma nova Barra da Tijuca. Os pontos em comuns desses dois bairros são a praia e a falta de infraestrutura sanitária e viária compatível com a sua densidade. Mas as diferenças são gritantes. A Barra teve um plano urbanístico de Lucio Costa e a nossa Orla não tem nenhum. Na Barra da Tijuca, entre a praia e a área urbanizada existe o Parque Natural e a lagoa de Marapedi. Na Orla, a urbanização começa praticamente na faixa de arrebentação das ondas. Para piorar o grau de salinidade do mar na costa baiana é dos mais elevados do país. 
O plano da Barra foi alterado a partir de 1981 pelos agentes imobiliários, aumentando os gabaritos, reduzindo o verde e o traçado viário. Mas muita coisa restou. Manguezais, restingas e lagoas foram preservadas, embora poluídas. Junto à praia só hotéis. Os edifícios residenciais estão protegidos pelo parque natural e os melhores são baixos em grandes lotes. As torres de apart-hotéis estão espaçadas permitindo a franca ventilação e a vista para o mar. 
No nosso caso, os lotes são diminutos, e as torres deixarão apenas frestas entre si provocando ilhas de calor. O escalonamento dos gabaritos só privilegia as coberturas. O coqueiral e a restinga ciliar foram dizimados. Aquela área nunca foi ocupada porque não há eletrodoméstico ou aparelho eletrônico que resista mais de três anos. As vidraças embaçadas precisam ser mantidas fechadas para os móveis não ficarem pegajentos. 
Se o setor imobiliário fosse mais esperto teria pressionado para a criação de um parque costeiro restaurando a vegetação de restinga e o coqueiral capazes de filtrar a salmoura aspergida pela arrebentação das ondas. Na sua parte anterior a norma deveria favorecer a aglutinação de lotes para formação de glebas maiores cujas construções não impedissem a ventilação e a visão do mar. Com a legislação vigente, só surgirão ali condomínios de quarto-e-sala para casais novos, que logo procurarão localizações menos agressivas para viver e procriar. 
SSA: A Tarde, 4/12/16

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