Maria da Conceição Paranhos*
Jesus, ao lançar a execração sobre Jerusalém lançava-a simultaneamente sobre a Cidade de Todos os Santos. Nós ainda não sabíamos. Mas estamos aprendendo depressa.
Observe-se o crescente desmonte da estrutura de uma cidade ameaçada diante de nossa impotência, a impotência já crônica do cidadão brasileiro. Devastam nosso passado e se ergue um presente ambíguo, sob o pretexto ralo de um progresso tanto ou mais impreciso quanto é mentirosa a conhecida expressão “para o bem da cidade”.
Ninguém diz nada, como naquele poema atribuído a Maiakowsky cujo autor eu não conheço, mas sei que existe.
Às portas desse silêncio, embuçados no poder, bárbaros vão arrebentando a cidade toda, casa por casa, árvore por árvore, pedra por pedra.
Comento com meu amigo – interlocutor maravilhoso, a diferença brutal da Salvador de hoje para a do tempo em que eu era adolescente. Andávamos numa cidade serena, arborizada, deleitosa, de temperatura grata. Então nos deparávamos com monumentos arquitetônicos, um deslumbre. Nossos monumentos estão sendo abatidos dia após dia, em crimes contra o patrimônio histórico.
Claro. Tudo a serviço do capital, nesse triste sistema econômico-financeiro nos quais nos empurraram desde após a suplantação do mercantilismo em nossa pátria.
Outro dia, minha mãe lembrou a destruição da Igreja da Sé, que não conheci. Para deixar passar o bonde. O bonde também se foi e levou consigo as ruínas de nossa história. O mais pungente é que nos subtraem do que há de melhor na cidade. Não se nos devolvem nada que nos restaure a saudade e a alma.
De modo geral, salvas as exceções, o novo é medíocre e antiecológico, são os carimbos dos que se nos apõem em lugar da beleza.
Fosse eu prefeita dessa cidade (nunca o desejei de fato, mas sonhar com a cidade levanta esses arroubos)!
Meditaria sobre seu passado, consultaria cada um de seus recantos e mistérios. Retiraria o pó dos olhos afogados de tanta coisa feia para enxergar essa monumental cidade.
Medite-se sobre a arquitetura colonial. Beleza e praticidade, prédios com aeração ideal, construídos em favor da luz, pois sabiamente orientados, a deixar fluir as dádivas que nossa natureza privilegiada nos oferece.
Não falo em nome de um passadismo piegas nem nostalgia vã. Nossos antepassados respeitavam a natureza. Compreendiam os trópicos melhor que o capital selvagem a quem não importa o que vai se perder em termos de cultura e bem-estar. É a garra do lucro. Sempre. O lucro fecunda todos os argumentos do mundo. O lucro compra tudo e a tudo prostitui. A cidade que se dane e seus moradores que se lixem. Dinheiro é a única cultura. Ars is pecunia.
Tem gente ganhando muito dinheiro nesse lance.
Jesus, ao lançar a execração sobre Jerusalém lançava-a simultaneamente sobre a Cidade de Todos os Santos. Nós ainda não sabíamos. Mas estamos aprendendo depressa.
Observe-se o crescente desmonte da estrutura de uma cidade ameaçada diante de nossa impotência, a impotência já crônica do cidadão brasileiro. Devastam nosso passado e se ergue um presente ambíguo, sob o pretexto ralo de um progresso tanto ou mais impreciso quanto é mentirosa a conhecida expressão “para o bem da cidade”.
Ninguém diz nada, como naquele poema atribuído a Maiakowsky cujo autor eu não conheço, mas sei que existe.
Às portas desse silêncio, embuçados no poder, bárbaros vão arrebentando a cidade toda, casa por casa, árvore por árvore, pedra por pedra.
Comento com meu amigo – interlocutor maravilhoso, a diferença brutal da Salvador de hoje para a do tempo em que eu era adolescente. Andávamos numa cidade serena, arborizada, deleitosa, de temperatura grata. Então nos deparávamos com monumentos arquitetônicos, um deslumbre. Nossos monumentos estão sendo abatidos dia após dia, em crimes contra o patrimônio histórico.
Claro. Tudo a serviço do capital, nesse triste sistema econômico-financeiro nos quais nos empurraram desde após a suplantação do mercantilismo em nossa pátria.
Outro dia, minha mãe lembrou a destruição da Igreja da Sé, que não conheci. Para deixar passar o bonde. O bonde também se foi e levou consigo as ruínas de nossa história. O mais pungente é que nos subtraem do que há de melhor na cidade. Não se nos devolvem nada que nos restaure a saudade e a alma.
De modo geral, salvas as exceções, o novo é medíocre e antiecológico, são os carimbos dos que se nos apõem em lugar da beleza.
Fosse eu prefeita dessa cidade (nunca o desejei de fato, mas sonhar com a cidade levanta esses arroubos)!
Meditaria sobre seu passado, consultaria cada um de seus recantos e mistérios. Retiraria o pó dos olhos afogados de tanta coisa feia para enxergar essa monumental cidade.
Medite-se sobre a arquitetura colonial. Beleza e praticidade, prédios com aeração ideal, construídos em favor da luz, pois sabiamente orientados, a deixar fluir as dádivas que nossa natureza privilegiada nos oferece.
Não falo em nome de um passadismo piegas nem nostalgia vã. Nossos antepassados respeitavam a natureza. Compreendiam os trópicos melhor que o capital selvagem a quem não importa o que vai se perder em termos de cultura e bem-estar. É a garra do lucro. Sempre. O lucro fecunda todos os argumentos do mundo. O lucro compra tudo e a tudo prostitui. A cidade que se dane e seus moradores que se lixem. Dinheiro é a única cultura. Ars is pecunia.
Tem gente ganhando muito dinheiro nesse lance.
* Poeta, escritora e professora da Ufba
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