quarta-feira, 10 de julho de 2019

A cidade porto


Osvaldo Campos Magalhães*
Quando os portugueses localizaram no dia primeiro de novembro de 1501 a enorme ‘Kirimurê’, ou grande mar, na língua tupinambá, com águas profundas e abrigadas e 233 quilômetros de litoral, logo escolheram o local como porto natural e local adequado para a construção da primeira grande metrópole lusitana no novo continente.
O porto cresceu e antes do surgimento dos navios a vapor e da construção do Canal de Suez chegou a ser o mais movimentado do Hemisfério Sul. A cidade do Salvador, acompanhando o crescimento do seu porto, também cresceu e se desenvolveu como grande centro logístico, comercial e político, tornando-se a primeira capital do Brasil.
O porto natural se constituiu em porto organizado e, através de concessão pública datada do final do século XIX, foi ampliado com o aterro de extensa área que ampliou o bairro do Comércio e possibilitou a construção de armazéns e retro áreas para armazenagem de cargas.
A modernização das embarcações, a transferência da capital para o Rio de Janeiro e as construções dos canais do Suez e Panamá contribuíram para a perda de importância econômica e comercial do porto e da cidade, que passa a crescer em direção ao litoral norte e, literalmente, dá as costas para seu porto.
Apesar de representar uma das principais atividades econômicas e geradoras de emprego numa cidade sem atividades industriais relevantes, o porto nunca recebeu a importância que merece por parte das administrações municipais e estaduais que se sucederam nos últimos 50 anos, chegando-se ao absurdo de se propor a desativação do porto para a movimentação de cargas, proposta seguidamente apresentada por Secretários da Prefeitura de Salvador. Ainda em 18 de junho, as obras de ampliação do Terminal de Conteineres do porto de Salvador foram novamente embargadas pela Prefeitura de Salvador.
A desativação do Porto de Salvador, não leva em conta a enorme importância econômica do porto para a cidade e todo o estado da Bahia e que é perfeitamente conciliável a manutenção da atividade operacional no porto, com ênfase nas operações de contêineres, equipamentos, trigo e navios de cruzeiros marítimos. Desconhece que o porto de Salvador possui os melhores acessos terrestre e marítimo entre todos os portos brasileiros e também a existência de um contrato de concessão recentemente prorrogado, entre o porto e a empresa Tecon, responsável pela operação de contêineres, que tem longo prazo de vigência, com vultosos investimentos em execução e enorme relevância econômica.
Quem conhece algumas cidades portuárias e turísticas como Barcelona, Buenos Aires e Hamburgo sabe que a atividade portuária é vital para a economia dessas cidades e que é perfeitamente conciliável com a atividade turística em áreas do porto, que foram revitalizadas e expandidas. 
Lembremos que a atual legislação portuária brasileira permite ao município assumir a gestão do porto, como se verifica nos principais portos europeus e que já ocorre com sucesso no Brasil, mais especificamente em Itajaí, Santa Catarina.
Um dos principais entraves ao crescimento do Porto de Salvador está justamente no desconhecimento por parte do governo da Bahia e da prefeitura de Salvador do enorme potencial econômico representado pela atividade portuária. 
Enquanto a administração dos  portos públicos baianos está ainda vinculada à administração federal e subordinada ao loteamento político dos cargos de direção da Codeba, os estados de Pernambuco e Ceará colocaram a atividade portuária como estratégica para o desenvolvimento, constituíram enxutas e eficientes empresas estatais que construíram os complexos portuários de Suape e Pecém, fatores de atração de novos empreendimentos industriais para aqueles estados e importantes vetores do crescimento da economia nordestina.
Em vez  de propor a desativação do porto, a prefeitura de Salvador deveria reivindicar e assumir a concessão do mesmo, colocando a atividade portuária como estratégica para o desenvolvimento econômico da cidade.
* Osvaldo Campos Magalhães  é engenheiro e Mestre em Administração. Membro do Conselho de Infraestrutura da Fieb e do Conselho de Administração da Codeba, escreveu a Tese "Portos & Competitividade", NPGA/Ufba, 1994.

 ** Artigo também publicado no jornal Correio da Bahia


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