Paulo Ormindo de Azevedo*
Estou na Espanha participando da reunião do Comitê Cientifico da Rede Patrimônio Histórico Ibero-Americano, da Universidade Politécnica de Madri. No ano passado, na Guatemala, propus como tema deste seminário “Habitar o patrimônio” e os colegas ibero-americanos acataram, sem pestanejar, a proposta. A ideia é analisar os problemas que enfrentam os moradores dos Centros Históricos, geralmente pouco considerados por seus administradores. Na Espanha e na maioria dos países latino americanos, os CH são levados a sério.
Para mostrar o que ocorreu no nosso CH, nos 58 anos em que está tombado, foi criado no Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da UFBA o subgrupo Observatório do Centro Antigo de Salvador, que reúne professores e pós-graduandos do programa, coordenado por este escriba e pela Profa. Márcia Sant’Anna. Reunimos um grande número de dados dispersos em repartições federais, estaduais e municipais sobre investimentos públicos e privados, propriedade e uso do solo e aplicamos 11 questionários em associações de moradores, além de entrevistas com os principais protagonistas do CH.
Os algarismos são alarmantes. De meados de 1970 até hoje foram investidos no CH – pasmem - cerca de USD$ 255 milhões. Apesar disso, a população local foi reduzida à metade. Em 1991, eram de 11.947 pessoas, e em 2010 baixou para 5.985. A Defesa Civil contabiliza, hoje, 1400 imóveis em estado de risco. A diretoria do IPAC diz que 40 de seus imóveis estão desocupados e 300 inquilinos são inadimplentes, com uma dívida de R$13 milhões (A Tarde, 09/09/17). Outros tantos são devidos de impostos pelos comerciantes. Muitos estudos foram feitos, mas as decisões políticas não se basearam em estudos. Alguns dos erros mais gritantes foram: a retirada das atividades centrais, a exclusão dos moradores, em 1992, a estatização do estoque habitacional e a precarização da infraestrutura de mobilidade e acesso. Um imóvel só é conservado se seu ocupante for o dono. Cerca de 511 sobrados estão na mão do estado (307) e de irmandades religiosas (204). As reivindicações corretas da comunidade são: moradia e requalificação profissional.
A Prefeitura, sempre ausente desse processo, anuncia agora uma série de investimentos. A melhor proposta é a instalação de sua administração em edifícios desocupados do Comercio. O Estado, por seu turno, anuncia a criação de um distrito criativo no CH, como fez Recife há 40 anos. Mas perdura a desarticulação das políticas dos governos federal, estadual e municipal e a não participação da comunidade. Vamos cotejar nossos dados com os de outros de países, como Peru, Colômbia e Equador, que enfrentaram com sucesso esse desafio, e buscar apoio para os movimentos sociais que lutam pela requalificação do CH, nosso maior ativo.
* Professor Titular da Escola de Arquitetura e Urbanismo da UFBa
SSA: A Tarde, 8/10/17
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