Há muito que a Unesco se interessa pelas questões urbanas. Por isso, não é de estranhar que o tema das “cidades criativas”, que casa questões urbanas com questões culturais caras à organização, tenha levado a Unesco a constituir uma Rede de Cidades Criativas.
Ao constituir esta rede, a Unesco reconhece o protagonismo crescente das cidades, mas também a importância que a cultura e as atividades culturais desempenham atualmente, e de forma crescente, na dinamização e transformação urbanas. Por outro lado, como a própria Unesco justifica ao explicar as razões que levaram à criação desta rede, não deixa de ser relevante o facto de a questão da criatividade animar crescentemente as agendas políticas locais e nacionais e de ser vista como um elemento central das estratégias de desenvolvimento econômico. Acresce que a Unesco tem estado, nas últimas décadas, particularmente ativa no domínio da criação e sustentação de redes, reconhecendo, neste caso, que uma rede de cidades criativas é importante na exata medida em que as indústrias criativas constituem hoje a base da estrutura social de muitas cidades, reforçando a diversidade cultural, estimulando a vida quotidiana e contribuindo para a consolidação da identidade local e da autoestima. A Rede das Cidades Criativas resultou da iniciativa “Aliança global em prol da diversidade cultural”, lançada pela Unesco em 2004.
Em termos gerais, a Rede constitui‑se para promover a diversidade cultural e o desenvolvimento urbano sustentável. Aposta, especificamente, no desenvolvimento da cooperação internacional entre cidades, promovendo a constituição de parcerias para o desenvolvimento no contexto das prioridades globais estabelecidas pela Unesco: “cultura e desenvolvimento” e “desenvolvimento sustentável”. As noções de “economia criativa” e “turismo criativo” fundamentam e orientam a existência da Rede, procurando funcionar como eixos estruturantes das ações desenvolvidas no âmbito das parcerias. Estas, disseminando‑se por várias áreas da cultura, visam promover a partilha de experiências e contribuir para a emergência de novas oportunidades de cooperação numa base mundial. As cidades podem aderir à Rede, seja enquanto “centros criativos”, seja enquanto “agrupamentos socioculturais”. Os centros criativos orientam‑se para a promoção do desenvolvimento socioeconómico e cultural, quer nos países desenvolvidos, quer nos países em vias de desenvolvimento, através das indústrias criativas. Os agrupamentos socioculturais pretendem reforçar as relações entre comunidades diferenciadas, no domínio sociocultural, de modo a criar ambientes urbanos equilibrados.
São 34 as cidades que integram atualmente a Rede das Cidades Criativas, repartindo‑se pelas 7 áreas das indústrias criativas fixadas pela Unesco: literatura, cinema, música, artesanato e artes populares, design, artes numéricas e gastronomia. Design, com 11 cidades aderentes, é a área que reúne maior número de membros. Artes numéricas, com um único membro, é a área menos participada. Entre os membros da Rede contam‑se grandes cidades, como Pequim (design), Kobe (design), Shangai (design), Seoul (design); cidades médias, como Lyon (artes numéricas), Sydney (cinema), Buenos Aires (design), Berlim (design); e cidades de menor dimensão, como Edimburgo (literatura), Dublin (literatura), Reykjavik (literatura), Sevilha (música), Bolonha (música). Não há, neste conjunto de cidades, nenhuma que seja originária do universo da lusofonia. Não obstante esta diversidade, a Rede tem um manifesto problema de densidade, havendo áreas, como, por exemplo, artes numéricas e cinema, em que o número de cidades aderentes nem sequer cauciona o princípio da parceria.
O site da Rede disponibiliza formulário e informações de submissão de candidatura. Os procedimentos necessários não deixam de ser um fator de entrave à candidatura e adesão de novas cidades. Em primeiro lugar, a adesão à Rede depende de um filtro político, uma vez que é necessária a autorização do Presidente da Câmara local (ou equivalente). Existindo a missiva oficial de concordância, a cidade submete a candidatura à Unesco. Em seguida, a Unesco confere se a Comissão Nacional da Unesco correspondente reconhece e apoia a candidatura, condição que, na prática, é obrigatória, para o sucesso da candidatura. Segue‑se a avaliação por um grupo de peritos externo, constituído por especialistas de ONGs na área de candidatura. Finalmente, sob recomendação do grupo de peritos, o Diretor Geral da Unesco toma uma decisão final. Ainda que o processo pareça simples e linear, a verdade é que ele é bem mais complexo que aquilo que aparenta ser. O formulário de candidatura obriga, não apenas a uma apresentação detalhada da cidade, que mostre tratar‑se de um candidato ideal para integrar a área criativa a que se candidata, mas exige, igualmente, que a candidatura demonstre que a cidade tem algo de concreto para oferecer e que seja materializada e concretizada a disposição para cooperar com outras cidades. A Unesco exige, por outro lado, que o dossier de candidatura resulte do trabalho de um comité de gestão misto, composto por membros do setor privado, do setor público e da sociedade civil. Com anexos, e a obrigatoriedade de ser redigido em língua inglesa ou francesa, o dossier de candidatura deve incluir 50 a 80 páginas.
Procurando estimular iniciativas no âmbito da Rede, o site divulga algumas oportunidades, tais como o “Fundo Internacional para a promoção da cultura” e as bolsas para artistas Unesco‑Aschberg. Todavia, estes recursos têm um alcance muito limitado em termos de atratividade para cidades que equacionem fazer parte da Rede. A Rede organiza e associa‑se ainda a alguns eventos e publicações, que podem ser consultados na página (se bem que algumas das publicações tenham um alcance comercial). Para uma rede que tem a ambição declarada de criar novas oportunidades de cooperação entre cidades, lançar produtos culturais diversos nos mercados, ou cultivar a inovação através de trocas de saberes‑fazeres, os resultados têm sido, na verdade, muito limitados.
*Paulo Peixoto - Doutorado em Sociologia pela Universidade de Coimbra, é investigador do Centro de Estudos Sociais (CES), integrando e coordenando o Núcleo Cidades, Cultura e Arquitetura. Integra e coordena também o Observatório das Políticas de Educação e Formação. É professor de Sociologia na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC),
Ao constituir esta rede, a Unesco reconhece o protagonismo crescente das cidades, mas também a importância que a cultura e as atividades culturais desempenham atualmente, e de forma crescente, na dinamização e transformação urbanas. Por outro lado, como a própria Unesco justifica ao explicar as razões que levaram à criação desta rede, não deixa de ser relevante o facto de a questão da criatividade animar crescentemente as agendas políticas locais e nacionais e de ser vista como um elemento central das estratégias de desenvolvimento econômico. Acresce que a Unesco tem estado, nas últimas décadas, particularmente ativa no domínio da criação e sustentação de redes, reconhecendo, neste caso, que uma rede de cidades criativas é importante na exata medida em que as indústrias criativas constituem hoje a base da estrutura social de muitas cidades, reforçando a diversidade cultural, estimulando a vida quotidiana e contribuindo para a consolidação da identidade local e da autoestima. A Rede das Cidades Criativas resultou da iniciativa “Aliança global em prol da diversidade cultural”, lançada pela Unesco em 2004.
Em termos gerais, a Rede constitui‑se para promover a diversidade cultural e o desenvolvimento urbano sustentável. Aposta, especificamente, no desenvolvimento da cooperação internacional entre cidades, promovendo a constituição de parcerias para o desenvolvimento no contexto das prioridades globais estabelecidas pela Unesco: “cultura e desenvolvimento” e “desenvolvimento sustentável”. As noções de “economia criativa” e “turismo criativo” fundamentam e orientam a existência da Rede, procurando funcionar como eixos estruturantes das ações desenvolvidas no âmbito das parcerias. Estas, disseminando‑se por várias áreas da cultura, visam promover a partilha de experiências e contribuir para a emergência de novas oportunidades de cooperação numa base mundial. As cidades podem aderir à Rede, seja enquanto “centros criativos”, seja enquanto “agrupamentos socioculturais”. Os centros criativos orientam‑se para a promoção do desenvolvimento socioeconómico e cultural, quer nos países desenvolvidos, quer nos países em vias de desenvolvimento, através das indústrias criativas. Os agrupamentos socioculturais pretendem reforçar as relações entre comunidades diferenciadas, no domínio sociocultural, de modo a criar ambientes urbanos equilibrados.
São 34 as cidades que integram atualmente a Rede das Cidades Criativas, repartindo‑se pelas 7 áreas das indústrias criativas fixadas pela Unesco: literatura, cinema, música, artesanato e artes populares, design, artes numéricas e gastronomia. Design, com 11 cidades aderentes, é a área que reúne maior número de membros. Artes numéricas, com um único membro, é a área menos participada. Entre os membros da Rede contam‑se grandes cidades, como Pequim (design), Kobe (design), Shangai (design), Seoul (design); cidades médias, como Lyon (artes numéricas), Sydney (cinema), Buenos Aires (design), Berlim (design); e cidades de menor dimensão, como Edimburgo (literatura), Dublin (literatura), Reykjavik (literatura), Sevilha (música), Bolonha (música). Não há, neste conjunto de cidades, nenhuma que seja originária do universo da lusofonia. Não obstante esta diversidade, a Rede tem um manifesto problema de densidade, havendo áreas, como, por exemplo, artes numéricas e cinema, em que o número de cidades aderentes nem sequer cauciona o princípio da parceria.
O site da Rede disponibiliza formulário e informações de submissão de candidatura. Os procedimentos necessários não deixam de ser um fator de entrave à candidatura e adesão de novas cidades. Em primeiro lugar, a adesão à Rede depende de um filtro político, uma vez que é necessária a autorização do Presidente da Câmara local (ou equivalente). Existindo a missiva oficial de concordância, a cidade submete a candidatura à Unesco. Em seguida, a Unesco confere se a Comissão Nacional da Unesco correspondente reconhece e apoia a candidatura, condição que, na prática, é obrigatória, para o sucesso da candidatura. Segue‑se a avaliação por um grupo de peritos externo, constituído por especialistas de ONGs na área de candidatura. Finalmente, sob recomendação do grupo de peritos, o Diretor Geral da Unesco toma uma decisão final. Ainda que o processo pareça simples e linear, a verdade é que ele é bem mais complexo que aquilo que aparenta ser. O formulário de candidatura obriga, não apenas a uma apresentação detalhada da cidade, que mostre tratar‑se de um candidato ideal para integrar a área criativa a que se candidata, mas exige, igualmente, que a candidatura demonstre que a cidade tem algo de concreto para oferecer e que seja materializada e concretizada a disposição para cooperar com outras cidades. A Unesco exige, por outro lado, que o dossier de candidatura resulte do trabalho de um comité de gestão misto, composto por membros do setor privado, do setor público e da sociedade civil. Com anexos, e a obrigatoriedade de ser redigido em língua inglesa ou francesa, o dossier de candidatura deve incluir 50 a 80 páginas.
Procurando estimular iniciativas no âmbito da Rede, o site divulga algumas oportunidades, tais como o “Fundo Internacional para a promoção da cultura” e as bolsas para artistas Unesco‑Aschberg. Todavia, estes recursos têm um alcance muito limitado em termos de atratividade para cidades que equacionem fazer parte da Rede. A Rede organiza e associa‑se ainda a alguns eventos e publicações, que podem ser consultados na página (se bem que algumas das publicações tenham um alcance comercial). Para uma rede que tem a ambição declarada de criar novas oportunidades de cooperação entre cidades, lançar produtos culturais diversos nos mercados, ou cultivar a inovação através de trocas de saberes‑fazeres, os resultados têm sido, na verdade, muito limitados.
*Paulo Peixoto - Doutorado em Sociologia pela Universidade de Coimbra, é investigador do Centro de Estudos Sociais (CES), integrando e coordenando o Núcleo Cidades, Cultura e Arquitetura. Integra e coordena também o Observatório das Políticas de Educação e Formação. É professor de Sociologia na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC),
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