segunda-feira, 26 de março de 2012

Um olho no passado e outro no futuro


Paulo Ormindo Azevedo*
No próximo dia 29, Salvador completará 463 anos. Passado de glórias e futuro de incertezas. Haverá festas, mas sem muito brilho diante da crise que vivemos. Crise cujas raízes são profundas e antigas, mas que entrou em parafuso, sem nenhum controle, na presente administração. Não adianta chorar o leite derramado, temos é que construir o futuro. E as crises tem um lado positivo, na medida em que ensejam a reflexão e a rotina de velhos paradigmas para a criação de novos.
Há muitos anos não se discutia tanto Salvador na mídia, nos colégios profissionais e associações de bairros, como agora. Renasceram movimentos como “A Cidade Também é Nossa”, e surgem novos, como “Vozes da Cidade”e Sabatina dos prefeituráveis” com o apoio da ABI , do Crea-BA, do IAB-BA e da Fabs. Movimentos que gestam na sede dessas instituições, no Teatro dos Novos e em casas particulares, para ganhar as ruas com marchas como o “Desocupa Salvador”.
Movimento que só tende a crescer com as novas redes sociais e proximidade das eleições. Vamos convir que o problema não é só local. A RMS, que representa metade do PIB estadual, apresenta enormes desníveis socioeconômicos e demográficos, com 80% de sua população vivendo em Salvador, que provê tudo a ela para gerar riqueza em municípios vizinhos. Sem planejamento, Salvador se transformou em uma cidade dormitório insustentável. Crise que é também estadual e de quadros qualificados, como vimos na greve da polícia e na queda de quatro ministros baianos pelo baixo desempenho de suas pastas.
Mas não pense que esta situação será superada pela eleição de um superprefeito.  Aliás, nenhum dos pré-candidatos apresenta qualquer traço de liderança ou programa de governo. Não podemos esperar um messias capaz de libertar nosso povo da escravidão da liberdade e das sete pragas do desgoverno. Sem o fortalecimento das instituições civis e uma nova Câmara de Vereadores realmente representativa, qualificada e íntegra, não se pode esperar nenhuma mudança em Salvador. Mas estarão os prefeituráveis interessados nisto ou em eleger uma Câmara dócil, capaz de respaldar suas manobras eleitoreiras?
Não basta uma Câmara renovada, é preciso que as instituições civis, como a academia, as associações patronais e movimentos populares abandonem o “silêncio  obsequioso” em que tem se mantido e se posicionem sobre os problemas da cidade e do Estado, forçando o diálogo com os gestores encastelados em seus palácios indevassáveis e denunciando as investidas dos cartéis que se tornaram sócios da nossa cidade. Temos que cobrar dos candidatos, já agora, compromissos e planos de governos para que possamos exigir mais tarde seu cumprimento. A Constituição de 88 deu ao habitante e à sociedade novos instrumentos de defesa de seus direitos cidadãos, como a ação popular e a ação civil pública, que podem e devem ser acionadas contra o mau administrador.
Outro efeito positivo da crise  é a reação que começa a se esboçar no seio da sociedade com cidadãos politicamente conscientes, embora desvinculados da militância partidária, se candidatando a postos eletivos, visando mudar esta situação. Este é o caso de Waldir Pires, ex-governador e duas vezes ministro que teve a humildade de se candidatar à vereança de Salvador para brigar pela cidade, conforme intenção declarada aos jornais. Esperamos que outros cidadãos competentes e íntegros sigam seu exemplo e possamos contar com um grupo majoritário de representantes independentes na nossa Câmara de Vereadores.
Refundar Salvador requer também, como na sua fundação, a vontade política do poder central e do Estado, que não pode seguir se omitindo como vem ocorrendo desde a sua criação, na década de 1960. Salvador não é apenas passado, tem futuro e ele depende apenas de nós.
* Arquiteto e Professor. Foi presidente do CREA -BA

Um comentário:

  1. Caro professor Paulo fiquei imensamente feliz ao ler o seu comentário, que cheio de propriedade me tocou bem fundo. Aguardo anciosamente a hora de poder gritar um brado retumbande, cái fora João Henrique e Jaques Vagner. Desejo que como sociedade Baiana, nos tornemos mais politizados, mais questionadores e que saiamos definitivamente da inércia que vivemos.

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