segunda-feira, 27 de outubro de 2025

Da Castelo de Areia à Lava Jato: como a impunidade alimentou a corrupção

Osvaldo Campos Magalhaes*

A Operação Castelo de Areia, deflagrada em 2009, revelou o conluio entre grandes empreiteiras, como Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez e Odebrecht, e políticos ligados a obras de metrôs e trens urbanos. Entre as obras citadas nos relatórios da Polícia Federal estava o Metrô de Salvador, executado por consórcios dessas empresas, que apresentava indícios de superfaturamento, repasses irregulares e formação de cartel. Documentos e planilhas apontavam também pagamentos a campanhas políticas, incluindo aliados do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, embora nenhuma denúncia formal tenha avançado.

O advogado Márcio Thomas Bastos atuou na defesa de executivos e empreiteiras, contestando provas obtidas através de denúncias anônimas, que foram posteriormente anuladas pelo STJ em 2011, criando um vácuo de impunidade.

Com a nulidade, as práticas ilícitas se consolidaram e se expandiram para setores estratégicos, como a Petrobras, onde gerentes e diretores recebiam propinas e favoreciam contratos superfaturados de empreiteiras. A ausência de punição permitiu que o modelo de cartelização se ampliasse, mantendo esquemas que financiavam políticos e perpetuavam o desvio de recursos públicos. Essa engrenagem só começou a ser desarticulada com a Operação Lava Jato, que prendeu executivos como Marcelo Odebrecht e diversos funcionários da estatal, enquanto Lula foi condenado em processos posteriormente anulados pelo Supremo Tribunal Federal.

Mesmo com a anulação de condenações, a Lava Jato trouxe benefícios concretos ao Brasil. A operação recuperou bilhões de reais desviados, por meio de acordos de leniência e delações premiadas, forçando empresas como Odebrecht e Camargo Corrêa a ressarcirem os cofres públicos. Além disso, impulsionou reformas institucionais e culturais: empresas criaram departamentos de compliance, contratos públicos passaram a ter maior rastreabilidade e transparência, e órgãos de controle do governo ganharam mais força para fiscalizar obras e licitações. A operação também estabeleceu um novo paradigma de responsabilização, mostrando que corrupção sistêmica pode ser investigada e punida, ainda que judicialmente haja limitações e recursos.

A trajetória entre Castelo de Areia e Lava Jato evidencia que a impunidade inicial fortaleceu a corrupção sistêmica, permitindo que cartéis, superfaturamento e repasses ilícitos prosperassem. Ao mesmo tempo, a Lava Jato, apesar de falhas processuais e anulações, deixou um legado claro: mudou a percepção social sobre a impunidade, recuperou recursos públicos e criou um padrão mais rigoroso de fiscalização e integridade. O Brasil aprendeu que, mesmo quando o sistema falha, a atuação firme de instituições de controle pode gerar efeitos estruturais duradouros.

*Engenheiro, Mestre em Administração, foi Superintendente de Transportes do Governo da Bahia e membro do Conselho de Infraestrutura da FIEB (2002 a 2013),

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