sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

Minha primeira caminhada

*
Roberto Gazzi*
As nuvens ajudaram ontem os que têm fé. Pois se à Lavagem do Bonfim “quem tem fé vai a pé”, elas ajudaram até os menos fiéis como eu a vencer os 8 quilômetros entre a Igreja da Conceição da Praia e a Colina Sagrada do Bonfim. Até umas gotas de chuva ajudaram a aliviar o calor em alguns trechos. O mormaço, esse não teve como contornar. Mas a caminhada não é nada difícil. Ao menos fora da procissão oficial. Como bom paulista, cheguei cedo à Praça Cayru, que começava a receber os muitos grupos que se reúnem ali para a caminhada. E lá vem descendo povo à Cidade Baixa, seja pela Avenida  Contorno ou pelo Elevador Lacerda. Parece um Réveillon diurno, quase todos de branco.Quando estoura a primeira queima de fogos, às 8h08, caem umas gotas de chuva. Que é fraca e para logo. Às 8h48, o segundo foguetório anuncia o início da caminhada do prefeito. E não é que caem umas gotas de novo? Quem para um pouco na calçada pode ver o movimento do cortejo. A maioria é de grupos vestidos com camisetas iguais. Aqui e ali aparece um que chama mais a atenção, como os de mamelucos, ou o Pierrô de Plataforma, de nove integrantes, que mantém uma tradição carnavalesca que vem da mortalha, de muitas décadas atrás. No meio do circuito, de repente se misturam o cheiro do perfume das jarras de flores das baianas, o cheiro da comida feita nas centenas de barraquinhas e o fedor de mijo, que em Salvador, infelizmente, parece onipresente.A massa vai seguindo até chegar ao início da colina. A coluna com a multidão de branco já pertinho da igreja impressiona. Como impressiona descobrir que, de repente, você está ao lado da igreja, algo que parecia impossível visto lá de baixo. E começa a missa. Fiéis rezam e saúdam o santo. Muitos choram. E numa ruazinha na lateral da igreja, a 10 metros do Bonfim, um bar liga um som altíssimo com músicas de pagode. Uma pequena multidão se forma em minutos, muitos deles sambando no meio da rua. Missa e samba se misturam. A Bahia, religiosa e profana, como sempre imaginei lendo Jorge Amado e vendo aquelas fotos em preto e branco. Oito quilômetros depois pude conferir isso, agora ao vivo e em algumas poucas cores além do branco.
* Roberto Gazzi é jornalista e diretor-executivo do CORREIO DA BAHIA

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