Paulo Ormindo de Azevedo*
Continuo pensando que a ponte de passeios Salvador-Itaparica é um estrupo ambiental e urbano. Além de marginalizar o Recôncavo com seu rico potencial turístico/esportivo, comprometer o estaleiro de São Roque e um hub-porto em águas abrigadas com 23 m de calado em Salinas da Margarida que pode ser um dos terminais marítimos e ferroviários transcontinentais mais importantes da América do Sul, com a saída de minérios e grãos dos países andinos e do Planalto Central para a rica costa leste dos EUA e Europa. A ponte vai duplicar a área metropolitana de Salvador desidratando o oeste da BTS e duplicando a função dormitório da capital.
Já que há compromissos do estado com os chineses que são irreversíveis, que se busque ao menos amenizar seus efeitos mais danosos. Sua trajetória atual em gancho é da década de 1970, como se a cidade e a engenharia tivessem parado há meio século. Com essa trajetória a Marinha exige que seja dragado um canal para permitir o acostamento seguro de navios no porto de Salvador e contesta a posição do seu vão central. Se é para se fazer a ponte por um capricho, que se faça uma ponte moderna reta, com barreira central móvel, flexibilizando o sentido da demanda.
A Academia de Engenharia da Bahia elaborou estudo sobre a trajetória da ponte oficial e aponta erros graves, como a incapacidade da Via Expressa em absorver o fluxo da ponte e seu impacto no centro da cidade. Ela aponta três alternativas de trajetórias retas ligando a ponte diretamente a BR 324 e Via Metropolitana, sem impacto sobre a cidade, paisagem urbana e a outra navegação, pois preservaria a área de escape de navios em condições meteorológicas adversas, dispensando a dragagem do porto.
Defendo há 15 anos uma envolvente rodoferroviária da BTS que poderia transformá-la numa Côte d’Azur francesa. Solução semelhante da Conder volta à baila defendida pelo ex-deputado Sérgio Carneiro (A Tarde,19/02/23). Para complicar, o estado diz que vai comprar dois novos ferries e eles não serão desativados. Vera Cruz vai se transformar em um favelão como São Gonçalo, junto a Niterói, terminal de carretas e bitrens, que não podem entrar na cidade.
A sina da ilha é ser um porto-seco com pátios de contêineres, galpões, oficinas, borracharias e dormitórios para caminhoneiros. Nos primeiro 20 anos, vamos ter que pagar pedágio sobre quatro faixas ociosas com uma média de 40 mil veículos virtuais dia, ou R$650 milhões ano. Nada disto vai mudar com uma nova trajetória da ponte, mas poderá mitigar seu impacto sobre uma das mais belas baías do mundo, o centro de Salvador e os bairros do Comércio e Boa Viagem. Agora que vai ser feita a sondagem dos pilares, a ponte pode ser relocada. Por que a Prefeitura de Salvador e a Conder, que não foram ouvidas, não podem exigir um impacto menos amargo sobre a cidade e a BTS?
*Arquiteto, Professor Titular da UFBA